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Caracterização do Estado Federal brasileiro.

Uma contribuição à definição do limite material ao Poder de Reforma Constitucional

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5) A Forma Federativa do Estado como Limite ao Poder Reformador

A Assembléia Constituinte que formulou a Carta de 1988, ciente de que para que esta fosse duradoura e eficaz haveria a necessidade do equilíbrio entre a rigidez do imutável e a vulnerabilidade do dinâmico, estabeleceu, em seu art. 60, a possibilidade da Constituição ser reformada através de Emendas à Constituição. O exercício deste Poder Reformador foi atribuído ao Congresso Nacional que o exercerá seguindo um rito especial constitucionalmente previsto no artigo mencionado, observando rígidos limites. Além deste foi previsto uma outra forma de manifestação do Poder Reformador, a Revisão Constitucional (art. 3° do ADCT) esta, como sabido, foi realizada em evento único e não deverá ser repetida.

Porém, ao Congresso não foi dada a prerrogativa de alterar a Constituição ao seu bel prazer. Além do rito previsto, o Constituinte Originário estabeleceu limites materiais ao seu exercício, com o intuito de evitar que interesses momentâneos descaracterizassem a linha imposta pela Constituição, pois caso isto ocorresse uma Constituição não iria desenvolver-se. (HESSE, 1991, p. 16)

Os limites ao Poder Reformador são classificados pela doutrina como: implícitos e expressos. Os implícitos seriam, de acordo com Alexandre de Moraes, a supressão dos limites expressos e a alteração do titular do Poder Reformador. Já os limites expressos se enquadrariam em três categorias: os limites circunstanciais (art. 60, §1°), os limites formais, referentes ao processo legislativo (art. 60, I, II e III, §§ 2°, 3° e 5°) e os limites materiais (art. 60, §4°). (2005, p.589)

A impossibilidade de Emenda à Constituição tendente a abolir a forma federativa de Estado trata-se de um limite expresso e material. Entretanto, como se pode saber quando uma Emenda deve ser declarada inconstitucional por ferir tal dispositivo?

A resposta desta questão decorre diretamente da caracterização do Estado Brasileiro referida. Seria inconstitucional qualquer Emenda que buscasse prejudicar qualquer uma delas, por exemplo, uma Emenda que retirassem das Assembléias Legislativas dos Estados a legitimidade para propor Ação Direta de Inconstitucionalidade, ou que tivesse por escopo aumentar o número de senadores do Estado de São Paulo por possuir uma maior população, ou seja, qualquer medida que promovesse o desequilíbrio entre as esferas de poder.

Um ponto polêmico, por exemplo, seria no tocante à Intervenção Federal. A possibilidade de Intervenção do Poder Central no periférico, vale ressaltar, é uma exceção prevista pelo Poder Constituinte Originário à autonomia dos Estados-Membros. O aumento das possibilidades de Intervenção Federal, sem dúvida, seria uma medida tendente a abolir o Estado Federal, devendo ser declarada inconstitucional pelo STF com fulcro no art. 60, §4, I.


6) Conclusão

O conceito de Estado Federal traz em si uma série de características essenciais e outras peculiares de cada experiência concreta. A sua estruturação na Constituição da República Federativa do Brasil e os seus diversos desdobramentos devem ser respeitados para que se efetive a Vontade de Constituição, mais ainda por parte dos órgãos do Estado.

Por se tratar de um limite material ao Poder Reformador estabelecido pelo Poder Constituinte Originário faz-se mister uma construção teórica que abrace todos esses desdobramentos, para que desta forma se evite a ruptura da construção Federal por interesses passageiros. Neste artigo buscou-se dar mais um passo ao estabelecimento desta idéia que deve ser analisadas por todos que querem realmente viver em um Estado Democrático de Direito.

A precisão científica destes desdobramentos seguramente fortalecerá o pacto federal e contribuirá para o controle da tendência centrípeta brasileira cada vez mais voraz, preservando autonomias, fortalecendo a democracia, repartindo responsabilidades e afastando a tirania e o autoritarismo.


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NOTA

[1] Sobre os Municípios seguimos a lição do Prof. Dr. José Afonso da Silva que afirma não bastar a autonomia político-constitucional atribuída pela Constituição aos Municípios, para que estes sejam considerados essenciais ao conceito de federação brasileira (SILVA, 1994, p.450).  

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Sobre o autor
João Guilherme de Moura Rocha Parente Muniz

Procurador da Fazenda Nacional. Especialista em Direito Tributário pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MUNIZ, João Guilherme Moura Rocha Parente. Caracterização do Estado Federal brasileiro.: Uma contribuição à definição do limite material ao Poder de Reforma Constitucional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3695, 13 ago. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25065. Acesso em: 8 mai. 2024.

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