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O pedido de suspensão de segurança: uma sucinta sistematização

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13/09/2013 às 14:14
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4. COMPETÊNCIA.

A competência para apreciar o pedido de suspensão de segurança pode ser resumida da seguinte forma: cabe ao Presidente daquele Tribunal que teria competência para julgar eventual recurso interposto em face de provimento liminar ou final. Nessa medida, acaso um juiz de primeira instância defira uma medida liminar ou profira uma sentença, incumbirá ao Presidente de seu respectivo Tribunal ad quem analisar o pedido de suspensão.

Cabe lembrar, todavia, que existem casos em que um juiz estadual desempenha competência de juiz federal (art. 109, § 3º, CF). Esta circunstância fará com que o pedido de suspensão seja direcionado ao Presidente do Tribunal Regional Federal daquela área geográfica.Das lições doutrinárias especializadas extrai-se a seguinte explicação:

Assim, tratando-se de suspensão de segurança de liminar ou sentença proferida por juiz de 1º grau de jurisdição (estadual ou federal), o requerimento será feito ao presidente do Tribunal de Justiça estadual ou Tribunal Regional Federal da respectiva região, respeitando-se os critérios que identificam a causa como sendo de competência federal, ou estadual. Segundo o dispositivo legal que regula a suspensão de segurança para estes casos, o art. 4º, da Lei n. 4.348/64, é competente o presidente do Tribunal ‘ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso’ que poderia ser interposto contra a decisão (liminar ou sentença), cuja eficácia se pretende suspender(Rodrigues, Suspensão de Segurança, 2000, p. 156).

Quando a medida liminar postulada for concedida diretamente no Tribunal, deverá ser aplicado o artigo 25, da Lei nº 8.038/90. O pedido de suspensão deverá se manejado perante o STJ ou STF, a depender do tipo de matéria, se infraconstitucional ou constitucional. Esta é a redação do citado dispositivo:

Art. 25. Salvo quando a causa tiver por fundamento matéria constitucional, compete ao Presidente do Superior Tribunal de Justiça, a requerimento do Procurador-Geral da República ou da pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, suspender, em despacho fundamentado, a execução de liminar ou de decisão concessiva de mandado de segurança, proferida, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal.

Ao que nos parece, o dispositivo não comporta maiores dúvidas quanto a sua adequada interpretação. É que, tanto no mandado de segurança (súmula 622, STF), quanto nos demais processos judiciais,notadamente após a vinda da Lei nº 11.187/2005, que veio a modificar o artigo 527, parágrafo único do CPC, não cabe recurso de agravo interno da decisão do relator[20], podendo-se, então, “ajuizar-se, desde logo, a suspensão liminar ao presidente do STF ou do STJ, sendo a matéria, respectivamente, constitucional ou infraconstitucional”(Freedie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha, 2006, p. 350).Este também é o entendimento doutrinário de Cássio Scarpinella Bueno:

...toda vez que o pedido de suspensão tiver fundamento constitucional deve ser dirigido ao Supremo Tribunal Federal. Quando o fundamento for de cunho legal (assim entendida qualquer fundamentação de cunho infraconstitucional), a competência é do Presidente do Superior Tribunal de Justiça. Esse, inequivocamente, o alcance do ‘caput’ do art. 25 da Lei n. 8.038/90(Bueno, 2003, p. 52).

Sobredita interpretação aplica-se ainda, naqueles casos em que, de uma decisão de primeiro grau,interpôs-se agravo de instrumento com o desiderato de reverter ou obter provimento liminar concedido ou negado pela instância inferior. Na linha do exposto, cita-se o teor do parágrafo 5º do art. 4º da Lei nº 8.437/1992, com a redação dada pela MP nº 2.180-35/2001, bem como o art. 15, § 2º da Lei nº 12.016/2009, respectivamente transcritos:

É cabível também o pedido de suspensão a que se refere o § 4º, quando negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a liminar a que se refere o artigo.

***************

§ 2º É cabível também o pedido de suspensão a que se refere o § 1o deste artigo, quando negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a liminar a que se refere este artigo.

A competência em casos tais será, consequentemente, do STF ou do STJ como mencionado anteriormente. Isto porque, acaso se defenda o entendimento no sentido de que o Presidente do Tribunal poderá analisar o pedido de suspensão de uma decisão proferida pelo relator do recurso de agravo, estar-se-á dizendo, por linhas transversas, que existe primazia hierárquica da presidência para com o relator, o que não é verdade. A doutrina que se reputa correta entende desta forma:

Assim, por exemplo, caso seja concedida pelo relator uma liminar em mandado de segurança de competência originária do Tribunal, o pedido de suspensão da execução da referida decisão deve ser endereçado ao presidente de um dos Tribunais de cúpula (STF ou STJ dependendo se se tratar de matéria constitucional ou não). Se, neste caso, for requerido o pedido de suspensão ao presidente do Tribunal estadual ou federal, então estará havendo usurpação da competência do presidente do Tribunal de cúpula respectivo(Rodrigues, Suspensão de Segurança, 2000, p. 157).

É esta, além disso, ainteligência do Superior Tribunal de Justiça, para quem cabe inclusive Reclamação, se por ventura a Presidência do Tribunal se imiscuir a sustar decisão de relator, verbis:

Rcl 496 / SP RECLAMAÇÃO

1997/0061058-6 Relator(a) Ministro VICENTE LEAL (1103) Relator(a) p/ Acórdão Ministro PAULO COSTA LEITE (353) Órgão Julgador CE - CORTE ESPECIAL Data do Julgamento 19/08/1998

RECLAMAÇÃO. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA.

Hipótese em que, em face de julgamento do recurso, não mais detinha o presidente do respectivo tribunal competência para a suspensão da liminar.

Usurpação, no caso, de competência do presidente do STJ.

Reclamação julgada procedente.

Fica ainda a dúvida: o art. 15, § 2º da Lei nº 12.016/2009 e o parágrafo 5º do art. 4º da Lei nº 8.437/1992 salientam que cabe o pedido de suspensão quando negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a liminar a que se refere o artigo.Equivale dizer que não basta que o Poder Público tenha o efeito suspensivo de seu agravo de instrumento negado (quando a liminar for deferida por magistrado de 1º grau), ou mesmo que seja proferida decisão de relator de agravo de instrumento (interposto pelo particular) contrária a seus interesses. Em ambas as hipóteses deverá a entidade pública aguardar o desfecho do julgamento do recurso de agravo, porquanto só cabe a suspensão de segurança, seja para o STJ, seja para o STF, após o esgotamento da instância, a despeito da já citada regra do artigo 527, § único do CPC. Das duas uma, ou a entidade legitimada aguarda o julgamento do agravo pela Câmara ou Turma, ou ajuíza, em face da decisão do relator (a que concede o efeito ativo ou nega o efeito suspensivo) mandado de segurança. É do julgamento final do agravo ou do mandado de segurança (que aqui funcionará como sucedâneo de agravo interno) que nasce o direito à apresentação da suspensão de segurança para o STJ ou STF, a depender da matéria. Sobre o tema[21]:

RECURSO. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. Inadmissibilidade. Oposição à decisão concessiva de efeito ativo a agravo de instrumento. Caso de Mandado de Segurança. Agravo improvido. Não cabe pedido de suspensão de segurança contra decisão de relator que concede efeito ativo a agravo de instrumento.

(STA 440 AgR, Relator(a):  Min. CEZAR PELUSO (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 12/08/2010, DJe-159 DIVULG 26-08-2010 PUBLIC 27-08-2010 EMENT VOL-02412-01 PP-00001 LEXSTF v. 32, n. 381, 2010, p. 329-332)

Nesse diapasão: 1) acaso a decisão que se vise suspender seja de juiz de primeiro grau, o pedido de suspensão deve ser dirigido ao Presidente do Tribunal hierarquicamente superior; 2) caso haja pronunciamento do Tribunal de 2º grau, seja ele originário ou não, o pedido de suspensão deverá ser intentado perante o STF ou STJ, a depender de a matéria ser constitucional ou infraconstitucional; 3) se, equivocadamente, na hipótese supra, manejar-se o pedido de suspensão perante a presidência do Tribunal local, sendo este admitido, poderá a parte prejudicada se valer da Reclamação, na medida em que se estará diante de usurpação de competência dos Tribunais Superiores, conforme entendimento jurisprudencial retro.


5. PROCEDIMENTO DO PEDIDO DE SUSPENSÃO.

A parte que pretenda intentar o pedido de suspensão de segurança deverá elaborar petição dirigida ao Presidente do Tribunal competente para apreciá-la. Não há necessidade de maiores formalidades. Se exige, tão-só, que o petitório seja elaborado com uma narrativa clara e fundamentada de forma a demonstrar porquea decisão, cuja suspensão de efeitos se pede, fere a saúde, a economia, a segurança ou a ordem pública.

O Presidente do Tribunal, recebendo a supracitada petição pode: a) determinar sua emenda; b) denegar o pedido; c) instaurar o contraditório e determinar a intimação do autor da demanda originária ou do Ministério Público, para que apresentem suas razões, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, conforme preconizado pelo art. 4º, § 2º da Lei nº 8.437/92; c) conceder, liminarmente, o pedido, paralisando os efeitos da decisão contrastada, acasovisualize, de pronto, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na concessão da suspensão (art. 4º, § 7º, da Lei nº 8.437/92 e art. 15 da Lei nº 12.016/2009).

Apesar de não haver norma acerca do tema, reputa-se conveniente que a parte apresente o pedido de suspensão, junte ao seu requerimento os documentos tidos como essenciais à sua apreciação, sob pena de, em não os colacionar, determinar-se sua apresentação, através de ordem de emenda à petição[22]. Logo, deve, sob nossaótica, ser entendido com alguma ressalva o entendimento doutrinário que sustenta que “o requerimento de suspensão também, por óbvio, não comporta dilação probatória, devendo a postulante trazer com o pedido todos os documentos que sustentem as afirmativas de potencial agressão aos interesses públicos tutelados”(Northfleet, p. 188).

Parece-nos que o formalismo exacerbado caminha na contramão do princípio do livre acesso ao judiciário (art. 5º, XXXV, CR/88). O mesmo se diga quanto à máxima efetividade constitucional técnica que, segundo UadiLammêgoBulos, tem como desiderato “imprimir eficácia social ou efetividade às normas constitucionais, extraindo-lhes o maior conteúdo possível, principalmente em matéria de direitos fundamentais”(Bulos, 2007, p. 336). Impossibilitar a apresentação de documentos, que eventualmente não tenham sido trazidos no momento de apresentação do requerimento,contraria, com a devida venia, o princípio da instrumentalidade das formas, explicado pela doutrina desta forma: “Por este princípio, a forma se destina a alcançar um fim. Essa é a razão pela qual a lei regula expressamente a forma em muitos casos. Mas, não obstante expressa e não obstante violada, a finalidade em vista pela lei pode ter sido alcançada. Para a lei isso é o bastante, não havendo razão para anular-se o ato”(Santos).

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É claro que, se o pedido for devidamente instruído, mas não contiver em seu bojo razões suficientes para convencer o julgador acerca de seu deferimento, pode ele, indeferi-lo de plano, sem necessidade de instaurar-se o contraditório, até porque não haverá prejuízo para a parte adversa. Se, todavia, a um primeiro olhar, o Presidente vier a entedender pela admissão do requerimento, inclinando-se pela suspensão liminar dos efeitos das decisões, deverá ser instaurado o contraditório. Neste caso, devem ser intimados o Ministério Público e o autor para apresentarem suas respectivas manifestações, tal como disposto no artigo 4º, § 2º, da Lei nº 8.437/92, verbis:

O presidente do Tribunal poderá ouvir o autor e o Ministério Público, em setenta e duas horas.

É que, o substantive dueprocessoflaw:

impõe a justiça razoabilidade das decisões restritivas a direitos. Vale dizer, parte do pressuposto de que não basta a garantia da regular instauração formal do processo para assegurar direitos e liberdades fundamentais, pois vê como indispensável que as decisões a ser tomadas nesse processo primem pelo sentido de justiça, de equilíbrio, de adequação, de necessidade e proporcionalidade em face do fim que se deseja proteger.(Júnior, 2008, p. 677)[23].

Logicamente, se o tempo entre a instauração do contraditório prévio e a eventual concessão da suspensão puder vir a causar grave lesão ao patrimônio público, poderá aquele, ser diferido, até porque não existem direitos fundamentais absolutos[24], que não comportam relativização. Estar-se-á diante de evidente colisão entre o princípio da efetividade do processo (art. 5º, XXXV, da CR/88) e o do contraditório (art. 5º, LV, CR/88), que deverá ser dirimido por meio da proporcionalidade.

Nas palavras de Paulo Bonavides, para tais casos, o princípio da proporcionalidade pretende instituir “a relação entre fim e meio, confrontando o fim e o fundamento de uma intervenção com os efeitos desta para que se torne possível o controle do excesso.”(Bonavides, 2003, p. 393).

Ainda segundo o autor supra, os elementos que compõem o princípio da proporcionalidade são três, a saber: a) a pertinência ou aptidão, que revela “se determinada medida representa ‘o meio certo para levar a cabo um fim baseado no interesse público’”(Bonavides, 2003, pp. 396-397), examinando-se, pois, “a adequação, a conformidade ou a validade do fim”(Bonavides, 2003, p. 397), de modo a analisar se a medida é suscetível de atingir o fim escolhido; b) a necessidade, que indicará se a medida “não há de exceder os limites indispensáveis à conservação do fim legítimo que se almeja”(Bonavides, 2003, p. 397), de forma que se houver mais de uma medida que igualmente atendam à consecução de um fim, deve ser eleita aquela que seja menos nociva aos interesses do cidadão; c) a proporcionalidade (em seu sentido estrito), que conduz o agente público à escolha de meio que, no caso específico, mais leve em conta o conjunto de interesses em jogo(Bonavides, 2003, pp. 397-398).

Concorda-se, com Leonardo José Carneiro da Cunha, para quem:

a obediência do contraditório não poderia chegar ao ponto de subtrair da prestação jurisdicional a efetividade garantida pelo mesmo texto constitucional, fazendo com que pereça o direito da parte, sobretudo quando se trata da Fazenda Pública, que tem subjacente o interesse público primário a ser tutelado e que precisa de um provimento de urgência destinado a conferir penhor e efetividade à sua postulação de contracautela.(A Fazenda Pública em Juízo, 2007, p. 453).

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Sobre o autor
Leonardo Zehuri Tovar

Advogado em Vitória (ES), Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade Cândido Mendes de Vitória, Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade de Direito de Vitória, Mestrando em Direitos e Garantias Constitucionais Fundamentais pela Faculdade de Direito de Vitória, autor de artigos em revistas especializadas

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança: uma sucinta sistematização. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3726, 13 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25270. Acesso em: 1 mai. 2024.

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