Considerações finais
O contrato é um dos institutos jurídicos de maior relevância no direito privado. Diante das transformações percebidas em sua concepção, alguns falam em declínio do contrato, mas não é o instituto em si que perdeu importância, mas somente a sua concepção tradicional.
Aos princípios contratuais fundamentais, de autonomia da vontade, pacta sunt servanda e relatividade dos efeitos, foram acrescidos novos princípios, que evidenciam a maior preocupação com os interesses sociais envolvidos: a boa-fé objetiva, a função social e o equilíbrio das prestações.
A boa-fé objetiva é o modelo de conduta social segundo o qual as partes devem agir com lealdade e correção durante toda a relação obrigacional. Além de impor uma conduta leal e correta, serve para limitar a autonomia da vontade e para criar deveres anexos da contratação – regras secundárias de conduta –, relacionados ao respeito pelos interesses do parceiro contratual.
A função social do contrato estabelece um limite à execução do contrato, sem afastar sua função econômica. De modo que o contrato deve possibilitar a circulação e acumulação de riquezas, mas deve realizar o equilíbrio contratual e favorecer o desenvolvimento e a justiça sociais. O contrato que cumpre com sua função social, além de favorecer as partes envolvidas, favorece a sociedade como um todo.
O princípio da equivalência material tem por objetivo a efetiva igualdade entre os contratantes, pois busca harmonizar os interesses das partes envolvidas, e realizar o equilíbrio real das prestações em todo o processo obrigacional, através da teoria da imprevisão, e dos institutos do estado de perigo e da lesão, que permitem a revisão das condições contratadas.
O Código Civil brasileiro de 2002 não traz uma definição precisa do conteúdo dos princípios sociais dos contratos, mas diante do espírito ético e social que orienta toda a codificação, e de demais normas que tratam da matéria, percebe-se a preocupação do legislador em garantir contratações mais justas e eqüitativas.
De modo que é preciso transcender o formalismo e o individualismo outrora predominantes, para dar lugar à relativização de certos conceitos, com a imposição dos princípios sociais dos contratos, que demonstram a maior preocupação existente atualmente com os interesses sociais envolvidos. Somente com a efetivação dos valores impostos com a recente legislação civil é que a realidade jurídica estará de acordo com os ditames constitucionais e, principalmente, com os anseios da sociedade contemporânea.
Referências
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Notas
[2] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 118.
[3] LOBO, Paulo Luiz Netto. Do contrato no Estado Social: crise e transformações. Maceió: Edufal, 1983, p. 128.
[4] MARQUES, Cláudia Lima. Op. cit., p. 101.
[5] LOBO, Paulo Luiz Netto. Do contrato no Estado Social, op. cit., p. 127.
[6] ROPPO, Enzo. O contrato. Tradução: Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes. Coimbra: Almedina, 1988, p. 348.
[7] LOBO, Paulo Luiz Netto. Princípios sociais dos contratos no Código de Defesa do Consumidor e no novo Código Civil. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, n. 42, abr.-jun. 2002, p. 189; THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 125.
[8] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 64-65
[9] BIERWAGEN, Mônica Yoshizato. Princípios e regras de interpretação dos contratos no novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 48.
[10] STIGLITZ, Rubén S. (Org.). Contratos: teoría general. Buenos Aires: Depalma, 1994, p. 251; LOUREIRO, Luiz Guilherme. Teoria geral dos contratos no novo código civil. São Paulo: Método, 2002, p. 67-70.
[11] STIGLITZ, Rubén S. Op. cit., v. 2, p. 254.
[12] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 19-21; MARTINS-COSTA, Judith; BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 61-63.
[13] MARQUES, Cláudia Lima. Op. cit., p. 105-106.
[14] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social, op. cit., p. 9; BIERWAGEN, Mônica Yoshizato. Op. cit., p. 54.
[15] Sobre as regras secundárias de conduta, ver mais em STIGLITZ, Rubén S. (Org.). Op. cit., v. 1, p. 457-489.
[16] STIGLITZ, Rubén S. Op. cit., v. 1, p. 467. No mesmo sentido, LOBO, Paulo Luiz Netto. Princípios sociais dos contratos no Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil, op. cit., p. 194.
[17] STIGLITZ, Rubén S. Op. cit., v. 1, p. 465-466.
[18] LOUREIRO, Luiz Guilherme. Op. cit., p. 57-58.
[19] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social, op. cit., p. 27 e 128-129.
[20] LOBO, Paulo Luiz Netto. Princípios sociais dos contratos no Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil, op. cit., p. 191.
[21] TEPEDINO, Gustavo. As relações de consumo e a nova teoria contratual. In: Temas de direito civil, Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 201.
[22] Com esse posicionamento, HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. A função social do contrato. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial. São Paulo, v. 12, n. 45, jul.-set. 1988, p. 141; THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social, op. cit., p. 41-42; REIS, Jorge Renato A função social do contrato e sua efetiva vinculatividade às partes contratantes. Revista do Direito. Santa Cruz do Sul, n. 16, jul.-dez. 2001, p. 126, entre outros.
[23] AZEVEDO, Antônio Junqueira de apud THEODORO JÚNIOR, Humberto. O contrato e sua função social, op. cit., p. 45.
[24] HORA NETO, João. O princípio da função social do contrato no código civil de 2002. Revista de Direito Privado. São Paulo, v. 4, n. 14, abr.-jun. 2003, p. 46.
[25] NALIN, Paulo. Do contrato: conceito pós-moderno em busca de sua formulação na perspectiva civil-constitucional. Curitiba: Juruá, 2001, p. 223.
[26] É de se observar que, para Paulo Nalin, a função social divide-se em a) intrínseca, considerando a relação jurídica em si, e ligada à observância dos novos princípios sociais pelos contratantes; e b) extrínseca, considerando o contrato em relação a coletividade, e que rompe com o princípio da relatividade de seus efeitos. (Do contrato, op. cit., p. 226). É uma visão diferente, por exemplo, da de Humberto Theodoro Junior, para quem a função social não está voltada para a relação interna travada entre as partes, mas para os reflexos do contrato perante a coletividade. (O contrato e sua função social, op. cit., p. 13).
[27] Os direitos contratuais são protegidos pelo artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal, em virtude do qual ninguém pode ser privado dos seus bens e dos seus direitos sem o devido processo legal.
[28] MARQUES, Cláudia Lima. Op. cit., p. 102.
[29] Nesse sentido, BRITO, Edvaldo in GOMES, Orlando. Raízes históricas e sociológicas do código civil brasileiro. São Paulo: Martins Fontes, 2003, nota prévia, p. XV; THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social, op. cit., p. 99.
[30] REALE, Miguel. Visão geral do projeto de código civil. Revista dos Tribunais. São Paulo, v. 87, n. 752, jun. 1998, p. 29.
[31] LOUREIRO, Luiz Guilherme. Op. cit., p. 52-53.
[32] LOBO, Paulo Luiz Netto. Princípios sociais dos contratos no Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil, op. cit., p. 192.
[33] BIERWAGEN, Mônica Yoshizato. Op. cit., p. 30.
[34] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social, op. cit., p. 12; BIERWAGEN, Mônica Yoshizato. Op. cit., p. 66-67.
[35] THEDORO JUNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios, op. cit., p. 252.
[36] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 380.
[37] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios, op. cit., p. 252-253.
[38] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 370.
[39] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios, op. cit., p. 250.
[40] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 374.
[41] LOUREIRO, Luiz Guilherme. Op. cit., p. 228; GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 374.
[42] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 374-375.
[43] SANTOS, Antônio Jeová. Função social: lesão e onerosidade excessiva nos contratos. São Paulo: Método, 2002, p. 190-191.
[44] THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios, op. cit., p. 248; GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 374.
[45] WALD, Arnoldo. A função social e ética do contrato como instrumento jurídico de parcerias e o novo Código Civil de 2002. Revista Forense. Rio de Janeiro, v. 98, n. 364, nov.-dez. 2002, p. 30.