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Definição de relação de consumo e de seus elementos integrantes

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O STJ vem aplicando o conceito de vulnerabilidade em suas decisões, propriamente a teoria finalista mitigada ou teoria finalista aprofundada.

1. Relação de consumo

Relação de consumo se traduz em toda relação jurídica que existe entre uma pessoa, que deseja adquirir um bem ou prestação de um serviço, e outra que corresponde a este anseio. Desse modo, para que uma relação de consumo seja constituída, é necessária a integração de dois elementos essenciais, quais sejam: o consumidor e o fornecedor.

A relação de consumo é composta, portanto, por vontades sinalagmáticas, opostas. E, para se configurar, faz necessária a participação do consumidor e do fornecedor, que integram posições antagônicas.

Pode-se observar que com o passar do tempo e o crescimento do comércio, essas relações foram se aperfeiçoando, vindo a alcançar a relevância atualmente reconhecida pela sociedade. E hoje as relações de consumo se encontram bastante intensificadas, e por que não dizer, massificadas, resultado do grande crescimento e desenvolvimento econômico das sociedades. E ante esse aumento de negócios realizados, surgiu a necessidade de regulação e controle dessa atividade.

Logo, essas relações passaram a ser tuteladas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), implementado pela Lei 8.078/90, que tem por finalidade regular e protegê-las, assegurando os interesses coletivos.

No que tange ao CDC, cumpre ressaltar que foi de suma importância para a legislação pátria, tendo em vista que foram legitimados os direitos dos consumidores, como a proteção contra publicidade enganosa e abusiva, e foram regulamentadas as relações firmadas com os fornecedores, discriminando expressamente os seus conceitos.


2. Consumidor

Verifica-se que existem vestígios de que o consumidor recebe proteção jurídica há muito tempo. Como exemplo, o Código de Hammurabi, que trazia regras protetivas ao consumidor, mesmo que não de forma direta.

No Brasil, o consumidor recebe a devida proteção jurídica pelo CDC. Sabe-se que dispor sobre “consumidor” não é tarefa nada fácil, havendo ainda discussão na doutrina sobre qual seria o seu melhor conceito. O Código de Defesa ao Consumidor, por sua vez, em seu art. 2º, o conceitua como “[...] toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.

Nesse sentido, consumidor pode ser qualquer pessoa física ou jurídica, desde que ao adquirir ou utilizar produto ou serviço haja como destinatário final, ou seja, não comercialize o bem ou serviço, adquirindo-o ou usando-o para si mesmo ou sua família.

Nessa linha de pensamento, Benjamim, com muita propriedade, dispõe que:

Consumidor é todo aquele que, para o seu uso pessoal, de sua família ou dos que se subordinam por vinculação doméstica ou protetiva a ele, adquire ou utiliza produtos, serviços ou quaisquer outros bens ou informação colocados a sua disposição por comerciantes ou por qualquer outra pessoa natural ou jurídica, no curso de sua atividade ou conhecimento profissionais.

Há, entretanto, na doutrina e nos tribunais, discussão que permeia a expressão destinatário final, no sentido de como devem ser entendidas as pessoas que adquirem ou utilizam o produto como insumo para a sua atividade comercial. Frise-se que, essa pessoa não utiliza ou adquire produtos ou serviços com o fito de comercializá-los, mas o de auxiliá-lo na cadeia de produção de sua atividade.

Existem duas teorias que trataram o assunto. A teoria maximalista, corrente ampla, já superada, dispõe que aquele que utiliza o produto ou serviço como insumo ou elemento de sua cadeia produtiva é considerado destinatário final.

Para a teoria maximalista, o destinatário final seria somente o destinatário fático, pouco importando a destinação econômica que lhe deva sofrer o bem. Assim, para os maximalistas a definição do consumidor é puramente objetiva, não importando a finalidade da aquisição ou do uso do produto ou serviço, podendo até mesmo haver intenção de lucro.

Já a teoria finalista, ou subjetiva, por sua vez, sustenta que, para ser considerado destinatário final, o consumidor deverá retirar o produto do mercado e utilizá-lo para seu consumo. Ainda que não adquira o bem com o fito de comercializá-lo, mas se o empregá-lo como insumo, não será considerado destinatário final, será fornecedor.

A referida doutrina, partindo do conceito econômico de consumidor propõe a interpretação da expressão destinatário final de forma restrita. Diz que somente o consumidor, parte mais vulnerável na relação contratual, merece especial tutela. O consumidor é o não profissional, é aquele que utiliza ou adquire produto ou serviço para uso próprio ou de sua família. É o que retira o bem do mercado ou o utiliza; é aquele que coloca um fim na cadeia de produção e não utiliza o bem para continuar a produzir.

Houve até decisão do STJ aplicando a teoria maximalista, mas essa discussão há muito foi superada, tendo consolidado a teoria finalista como aquela que melhor indica a interpretação do consumidor.

Ocorre que o STJ vem admitindo certo abrandamento, ou mitigação, da teoria finalista, quando se verificar uma vulnerabilidade no caso concreto. Trata da análise da vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica. O STJ adota as principais vulnerabilidades esposadas na doutrina da prof. Cláudia Lima Marques, conhecida como papisa do direito do consumidor.

Em resumo, vulnerabilidade técnica é aquela em que o comprador não possui conhecimentos específicos sobre o produto ou serviço, sendo facilmente iludido no momento da contratação. Vulnerabilidade jurídica ou científica, como o próprio nome diz, é a falta de conhecimento jurídico ou outros pertinentes, como contabilidade, economia, matéria financeira, etc. E vulnerabilidade econômica ou fática, a meu ver a mais importante, é a vulnerabilidade real diante do parceiro contratual, seja em decorrência do grande poderio econômico deste último, seja pela posição de monopólio, ou em razão da essencialidade do serviço que presta, impondo, numa relação contratual, uma posição de superioridade.

Recentemente a prof. Cláudia Lima Marques apontou outro tipo de vulnerabilidade, a informacional. Seria a necessidade de informação na sociedade atual, pois as informações estão cada vez mais valorizadas, mas o seu déficit está cada vez maior.

Então o STJ vem aplicando o conceito de vulnerabilidade em suas decisões, propriamente a Teoria finalista mitigada ou teoria finalista aprofundada, para admitir alguém que, pela teoria finalista, a princípio, não seria consumidor, mas devido a vulnerabilidade encontrada no caso concreto, se atribui a condição de consumidor.

Outrossim, ainda acerca do conceito exposto no caput, vale salientar que não só pessoas físicas podem ser consumidores, mas também pessoas jurídicas. Para tanto, estas devem adquirir produtos ou utilizar serviços como destinatários finais.

O CDC, em seu art. 2º, parágrafo único, ainda equipara a consumidor “[...] a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”. Segundo Filomeno, este dispositivo versa sobre um conjunto de consumidores, indefinidos, mas que de alguma forma interferiram na relação de consumo.

Emprega-se, portanto, nesta norma, a expressão da coletividade de pessoas, a fim de proteger interesses de um conjunto de consumidores. Busca o CDC, assim, resguardar também os consumidores fora das relações de consumo, mas que tenham sofrido danos provenientes destas.

Desse modo, o CDC equiparou a consumidor pessoas alheias às relações de consumo, com o fito de protegê-las e repará-las pelos prejuízos causados por produtos ou serviços imperfeitos.

Destarte, João Andrades Carvalho entende que o legislador pretendeu com este parágrafo “emprestar a uma coletividade de pessoas, real ou potencialmente vinculada a uma relação de consumo (não necessariamente danos), a legitimidade processual do consumidor indivíduo.” E com a atribuição dessa legitimidade, possibilita ao conjunto de consumidores a obtenção da devida reparação dos responsáveis.

Após fazer um breve estudo sobre o conceito de consumidor, cabe analisar a outra parte essencial na relação de consumo, qual seja, o fornecedor.


3. Fornecedor

Outro elemento essencial que integra a relação de consumo é o fornecedor. A este também é atribuído conceito pelo CDC, disposto no art. 3º:

Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Nota-se que o legislador teve grande preocupação ao conceituar o que seria fornecedor, por apresentar uma definição bem ampla. Segundo o Manual de Direito do Consumidor, o legislador teria apresentado este conceito com o intuito de abarcar todos os fornecedores que disponibilizam no mercado bens ou serviços ao consumidor, podendo ser pessoa física ou jurídica.

E dessa forma, assegurou ao consumidor que o mesmo não ficasse desamparado ou prejudicado nas relações de consumo, atribuindo ao fornecedor uma responsabilidade pelo fornecimento de bens ou serviços, independente de ser fabricante ou comerciante, como já ficou bem demonstrado pela redação do artigo 3º do CDC.

Dispõe Daniel Diniz Manucci, em seu artigo jurídico:

Uma pequena observação a ser feita com relação ao tema é de que o fornecedor não necessita ser necessariamente uma pessoa jurídica, já que o texto legal traz a figura dos entes despersonalizados, podendo se entender assim por uma interpretação "latu sensu", de que também figuram como fornecedores aqueles que praticam atividades definidas em lei como fornecedor, podendo ser definidos como tais as pessoas que atuam na economia informal, autônomos, etc.

O referido autor aduz ainda que, “os entes de direito público que prestam serviços essenciais à sociedade como serviços de fornecimento de água, luz e esgoto também se enquadram na figura de fornecedores com base no artigo 3º da lei 8078/90.”

Mas cumpre informar que não trata de fornecedor, aos olhos do CDC, aquele que efetua um negócio esporádico com outra pessoa. Para ser fornecedor deve exercer uma das atividades contidas no art. 3º supramencionado.

Diante da dificuldade ao realizar o enquadramento de determinada pessoa como fornecedora de produtos ou serviços, cumpre mencionar que a expressão contida no conceito “desenvolvem atividade” deve ser observada. Isso quer dizer que somente será considerado fornecedor o agente que pratica determinada atividade com habitualidade.

 

 


4. Objeto da Relação de Consumo

Por fim, cabe tecer algumas considerações acerca do objeto da relação de consumo efetuada entre o fornecedor, responsável por fornecer o objeto, e o consumidor, que trata do sujeito que o adquire.

Para tanto, necessário trazer o dispositivo do CDC que trata da matéria. In verbis:

Art. 3°. [...]

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

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Observa-se, portanto, que o objeto da relação de consumo poderá ser um produto ou prestação de um serviço.

Acerca do produto, que trata de bem, pode ser classificado como móvel ou imóvel. O conceito de bem móvel é bastante elucidativo no Código Civil (CC):

Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.

Art. 83. Consideram-se móveis para os efeitos legais:

I - as energias que tenham valor econômico;

II - os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes;

III - os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.

Art. 84. Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio.

Sobre bem imóvel, também vale reproduzir o disposto no CC, que diz:

Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente.

Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais:

I - os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram;

II - o direito à sucessão aberta.

Art. 81. Não perdem o caráter de imóveis:

I - as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local;

II - os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem

Com relação ao serviço, a partir do conceito amplo presente no CDC, infere-se que trata de atividade fornecida por uma pessoa a outra, mediante remuneração.

Vale salientar que o CDC salvaguardou as relações de caráter trabalhista, posto que o serviço ofertado por um trabalhador, através de sua mão de obra, mediante remuneração, evidentemente não trata de relação de consumo.


5. Referências

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BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas normas. Limites e Possibilidades da Constituição Brasileira. 8. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

BENJAMIM, Antônio Herman V. O conceito jurídico de consumidor. Revista dos Tribunais. São Paulo, 1988, nº 628.

BENJAMIM, Antônio Herman V; FILOMENO, José Geraldo Brito et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do Anteprojeto. 9. ed. rev., atual., e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

BESSA, Leonardo Roscoe. O Consumidor e os limites dos Bancos de Dados de Proteção ao Crédito, São Paulo: RT, 2003.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Vade Mecum Acadêmico de Direito. Organização: Anne Joyce Angher. 7. ed. São Paulo: Rideel, 2008. (Coleção de Leis Rideel).

CARVALHO, João Andrades. Código de Defesa do Consumidor – Comentários- Doutrina- Jurisprudência. 1. ed. Rio de Janeiro: Aide Editora, 2000.

CANOTILHO, J.J.Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 1993.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (Lei 8.078/1990). Vade Mecum Acadêmico de Direito. Organização: Anne Joyce Angher. 7. ed. São Paulo: Rideel, 2008. (Coleção de Leis Rideel).

COELHO, Fábio Ulhoa et al. Comentários ao código de proteção do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1991.

COVIZZI, Carlos Adroaldo Ramos. Práticas abusivas da Serasa e do SPC. 3. ed. Atualizada com o novo CC. São Paulo: Edipro, 2003.

FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

GOMES, Orlando. Obrigações. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990.

GRECO, Marco Antônio. Jornal do Advogado. fev./ 1998.

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 5 ed. Local: Biblioteca jurídica universitária, 1998.

Ministério da Justiça/ ESCOLA NACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Manual de Direito do Consumidor. Brasília/DF-Brasil, 2008.

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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 30 ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

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Sobre a autora
Ana Carolina Tourinho S. Castro

Advogada. Pós-Graduada em Direito do Estado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTRO, Ana Carolina Tourinho S.. Definição de relação de consumo e de seus elementos integrantes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3909, 15 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26875. Acesso em: 22 nov. 2024.

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