O brasileiro e suas conveniências
Em junho de 2013, o “gigante” acordou bradando contra, entre infinitas outras coisas, o que achava ser o maior dos absurdos já cometidos pelo governo brasileiro: injetar R$ 8 bilhões de reais na construção de modernos estádios de futebol “Padrão FIFA”. A Copa das Confederações daquele ano se tornou a Copa das Manifestações.
Oras, semana passada, o Supremo Tribunal Federal condenou a União a indenizar, de uma só tacada, uma única empresa, a Varig, no valor corrigido de, aproximadamente, R$ 6 bilhões de reais, por conta do congelamento das tarifas aéreas no governo Sarney. No entanto, nenhuma manifestação popular foi feita contra, apesar do valor que será despendido ser aproximadamente o mesmo dos estádios.
Enquanto que a Copa do Mundo de 2014 trará - senão lucro líquido para a União - milhões de turistas, visibilidade ao país, investimentos em infraestrutura (convenhamos, pouco, mas teve mais do que se não houvesse Copa), - sem contar o incremento da renda bruta de estabelecimentos brasileiros que irão faturar diretamente com um evento desse porte, como hotéis, restaurantes, bares, etc, -, com o acórdão do Supremo a favor da Varig, a União terá apenas prejuízo.
Para o presidente do STF, Joaquim Barbosa, “é preciso ver que o patrimônio da União pertence a todos os brasileiros, inclusive àqueles que nunca tiveram oportunidade de sequer voar. É contrassenso achar que a União deve sustentar empresa privada ou semipública. (...) A ação foi protocolada muito antes da revelação do estado de penúria dos fundos dos aeronautas. Em uma época em que ia tudo muito bem para a Varig. A perspectiva de pagamento de indenização pleiteada na ação sobre a qual versa o recurso serviu como garantia contra a má gestão da companhia. (...) Por que indenizar apenas uma companhia se todas as demais empresas brasileiras se submeteram aos efeitos dessa medida de natureza econômica?”, afirmou Barbosa.
A Procuradoria Geral da República concordou que "toda coletividade sofreu prejuízos" com o Plano Cruzado e que a empresa não deveria ter ganho de causa. Ainda assim, vencido o voto do presidente, o STF decretou que a Varig deve ser indenizada, e nem um pio do povo se ouviu contra.
Não é só o manifestante, generalizadamente, brasileiro um bicho movido pelas conveniências, seduzidos que são pelos holofotes da mídia sobre os grandes eventos mundiais sediados no país (e convenientemente respeitador de algumas decisões judiciais). O manifestante, especificamente, maranhense também tem das suas. Na última quarta, os cidadãos de Bacabal saíram para protestar contra a atual prefeitura.
O Blog do Doutor Rogério Alves (http://doutorrogerioalves.blogspot.com.br/2014/03/armou-e-se-deu-mal.html), com muita lucidez, assim relatou o protesto: “Enquanto a manifestação esteve nas ruas, teve o apoio popular, pois é notório que a buraqueira, o lixo espalhado na cidade, o transito caótico, a iluminação publica precária causa insatisfação com a atual gestão, mas os manifestantes não aceitaram servir de plateia na porta da prefeitura e dispersaram.”
O próprio governo do Estado, no início do ano, passou por uma de suas maiores crises, com a barbárie no sistema prisional, vítima de uma guerra entre facções criminosas, que culminou na morte de uma criança incendiada. Ainda assim, a despeito de ter se tornado assunto nacional, praticamente, nada de manifestação pelas bandas da capital.
Pois é, podemos ver que, no Maranhão, pouco importa o mérito da questão ou quem tem razão. Aqui, funciona de acordo com a conveniência eleitoral e com a situação pessoal: quem está funcionário da prefeitura ou do governo, defende o atual gestor e ataca o passado; quem não está, ataca o atual. E solução, que é bom, nada.
Mas não são só os manifestantes que são movidos pelas conveniências. O próprio Supremo também tem das suas. Enquanto uma só empresa é beneficiada em um caso – como o da Varig -, a decisão sobre os expurgos inflacionários dos Planos Collor I e II, Bresser e Verão, que beneficiaria milhões de brasileiros poupadores, é adiada a perder de vista e a alcançar a prescrição de seus direitos.
“O adiamento do julgamento sobre os planos econômicos, e o pedido de audiência pública feito pelo governo sobre o assunto contribui para o atraso na solução do caso e pode acabar na extinção do direito de poupadores. (...) O interesse dos bancos em adiar a ultimação do julgamento reside na perspectiva de ocorrência de vencimento dos prazos prescricionais das execuções individuais das sentenças coletivas prolatadas contra os bancos”, afirma o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ilmar Galvão.
Já as ações de revisão do saldo do FGTS, tão em voga no mundo jurídico de hoje, que têm o intuito de substituir a Taxa Referencial pelo índice de inflação dos preços no seu reajuste anual, foram suspensas pelo Superior Tribunal de Justiça depois que a Defensoria Pública da União moveu uma Ação Civil Pública. É uma decisão com potencial para sangrar os cofres da Caixa Econômica Federal e que deve ser sacramentada apenas no STF. Será que o Supremo irá agir ao sabor das conveniências, em defesa da empresa pública, ou a favor da justiça, beneficiando toda a coletividade dos trabalhadores brasileiros?