5. A LEGITIMIDADE DO TERMO CIRCUNSTANCIADO REALIZADO PELA POLÍCIA MILITAR
Consoante no que tange a legalidade do termo circunstanciado realizado pela polícia militar, devemos observar os seguintes aspectos legais que regulam esse tema.
O legislador, tratando-se da lei 9.099/95, teve a clara intenção desafogar o Poder Judiciário, por meio de um mecanismo que trata de maneira diferenciada os delitos de menor potencial ofensivo, daqueles de maior gravidade e que necessita de maiores diligências para instruir o juízo. A abrangência do Artigo 69, sem a definição das autoridades que podem lavrar os Termos Circunstanciados, criou em todo País uma disputa por espaço entre as policias administrativas e judiciais. Contudo, hoje a maioria dos juristas defende a confecção e o encaminhamento do Termo Circunstanciado pelas policias militares, visando atender os preceitos que norteiam a Lei nº 9.099/95.
Em conformidade com a legislação vigente, não foi possível identificar nenhum dispositivo que fosse de encontro com as aspirações da Polícia Militar em exercer o legítimo dever de confeccionar e dar o devido encaminhamento aos Termos Circunstanciados. Portanto não é inconstitucional a atuação da Policia Militar em lavrar e encaminhar o Termo Circunstanciado.
A lei n° 9.099/95, inovando a sistemática até então vigente, adotou o modelo consensual de jurisdição, já existente no no ordenamento jurídico dos países mais desenvolvidos, 50 rompendo com os tradicionais dogmas da jurisdição conflitiva seguida pelo CPP. Buscando sempre a agilização da prestação jurisdicional para as infrações de diminuto potencial ofensivo, consagrou novos postulados, como o da supremacia da autonomia da vontade do acusado ou suspeito, sobre princípios antes tidos como obrigatórios, como os da defesa e do contraditório. Nessa nova sistemática, os princípios ora aplicáveis são os da informalidade, celeridade e economia processual, levando-nos a uma releitura da expressão ´´autoridade policial`` , para seus fins específicos. A interpretação mais fiel ao espírito da lei, aos seus princípios e à sua finalidade, bem como a que se extrai da análise literal do texto, é a de que ´´autoridade policial`` para os estritos fins da Lei comentada, compreende qualquer servidor público que tenha atribuições de exercer o policiamento, preventivo ou repressivo. Se interpretarmos a lei nova sob a ótica do CPP, não resta dúvida de que autoridade policial é o Delegado de Polícia (arts. 4º, 6º, 7º, 13, 15, 16, 17, 23, 320, 322. etc.). Se, entretanto, a analisarmos à luz da CF e dos princípios que a informam, encontraremos conceito de maior amplitude, o que atende à finalidade do novo sistema criminal. (DAMÁSIO, 1996, p. 61)
Este atual entendimento sobre o conceito de autoridade policial para fins de aplicação da Lei n.º 9.099/95 abrangendo o policial civil e o policial militar vem sendo confirmado pelo Poder Judiciário, através de provimentos, enunciados de fóruns, encontros e congressos de Presidentes de Tribunais de Justiça e Desembargadores, bem como em decisões judiciais proferidas em todas as instâncias. Tal compreensão vem sendo ratificada, também, pelo Ministério Público, mediante termos de cooperação, pareceres, entre outras formas de posicionamento. A própria doutrina majoritariamente segue este entendimento.
Recentemente, consolidando o alcance e a importância da lavratura do termo circunstanciado pela Polícia Militar, o próprio Poder
Executivo nos Estados vem disciplinando os procedimentos de seus organismos policiais neste sentido. Como exemplos, podem ser citados os Estados do Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina.
5.1. POSICIONAMENTOS JURISDICIONAIS INSTITUCIONAIS E DOUTRINÁRIOS
É de suma importância destacar que a possibilidade da lavratura do Termo Circunstanciado pela Polícia Militar é matéria pacífica entre os mais destacados órgãos e instituições inseridas neste processo. Seguindo esta linha, o entendimento é um só como passaremos a analisar os posicionamentos pelos seguintes órgãos, jurisdicionais, doutrinários e institucionais.
Esses posicionamentos trazem a intenção puramente de dar ao procedimento, segundo entendimento desses órgãos e doutrinadores, a materialização lena dos princípios norteadores da Lei nº 9.099/95, principalmente a celeridade na realização do procedimento hora analisado, dando assim a legitimidade necessária para a lavratura do Termo Circunstanciado de Ocorrência pela Policia Militar.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pelo Partido Liberal (PL), atualmente Partido da República (PR), contra o Provimento n. 758. do Conselho Superior da Magistratura de SP e Resolução 403/2001 da Secretaria de Segurança Pública de SP, que autorizam a Polícia Militar de São Paulo a elaborar Termo Circunstanciado, foi julgada IMPROCEDENTE pelo Supremo Tribunal Federal por unanimidade dos Ministros presentes.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ATOS NORMATIVOS ESTADUAIS QUE ATRIBUEM À POLÍCIA MILITAR A POSSIBILIDADE DE ELABORAR TERMOS CIRCUNSTANCIADOS. PROVIMENTO 758/2001, CONSOLIDADO PELO PROVIMENTO N. 806/2003, DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO, E RESOLUÇÃO SSP N. 403/2001, PRORROGADA PELAS RESOLUÇÕES SSP NS. 517/2002, 177/2003, 196/2003, 264/2003 E 292/2003, DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ATOS NORMATIVOS SECUNDÁRIOS. AÇÃO NÃO CONHECIDA.7588064035171771962642921. Os atos normativos impugnados são secundários e prestam-se a interpretar a norma contida no art. 69. da Lei n. 9.099/1995: inconstitucionalidade indireta.699.0992. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal pacífica quanto à impossibilidade de se conhecer de ação direta de inconstitucionalidade contra ato normativo secundário. Precedentes.3. Ação Direta de Inconstitucionalidade não conhecida.
(ADI 2862 SP , Relator: CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 25/03/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-083 DIVULG 08-05-2008 PUBLIC 09-05-2008 EMENT VOL-02318-01 PP-00020)
O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, segue a presente direção:
MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL. NULIDADE DA DECISÃO QUE CONCEDEU À POLÍCIA MILITAR A POSSIBILIDADE DE EXERCER ATIVIDADES PRIVATIVAS DA POLÍCIA JUDICIÁRIA. OFENSA AO ARTIGO 144, CAPUT, INC. IV E V E §§ 4º E 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES DO STF. SEGURANÇA CONCEDIDA. 1. A Constituição Federal dispõe acerca das competências funcionais dos órgãos de segurança pública do Estado. 2. Nos termos do artigo 144, § 4º da Constituição da República, compete à polícia judiciária, chefiada por delegados de carreira, exercer, com exclusividade, os atos de investigação criminal. 3. É nula qualquer decisão que atribua a órgão diverso da polícia judiciária a realização de atos de investigação criminal, daí incluídos a lavratura de Termo de Compromisso de Comparecimento e Boletins de Ocorrência, uma vez que viola o texto constitucional. Precedentes do STF. 4. Segurança Concedida.
Mandado de Segurança – Cr Nº 1.0000.11.052202-6/000 – COMARCA DE Santa Bárbara – Impetrante(s): SINDICATO DOS DELEGADOS DE POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE MINAS GERAIS – Autorid Coatora: JD COMARCA SANTA BARBARA – Interessado: POLICIA MILITAR ESTADO MINAS GERAIS, ESTADO DE MINAS GERAIS, ESTADO DE MINAS GERAIS.
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DECRETO N. 1.557/2003 DO ESTADO DO PARANÁ, QUE ATRIBUI A SUBTENENTES OU SARGENTOS COMBATENTES O ATENDIMENTO NAS DELEGACIAS DE POLÍCIA, NOS MUNICÍPIOS QUE NÃO DISPÕEM DE SERVIDOR DE CARREIRA PARA O DESEMPENHO DAS FUNÇÕES DE DELEGADO DE POLÍCIA. DESVIO DE FUNÇÃO. OFENSA AO ART. 144, CAPUT, INC. IV E V E §§ 4º E 5º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE.
(ADI 3614, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Relator(a) p/ Acórdão: Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2007, DJe-147 DIVULG 22-11-2007 PUBLIC 23-11-2007 DJ 23-11-2007 PP-00020 EMENT VOL-02300-02 PP-00229 RTJ VOL-00204-02 PP-00682)
Sabe-se que as decisões proferidas pelo Pretório Excelso, em sede de controle de constitucionalidade concentrado, possuem, isto é, produzem eficácia contra todos e efeito vinculante aos demais órgãos do Poder Público, nos termos do § 2º do artigo 102 da Carta Magna:
§ 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
Segundo o Provimento Nº 758/2001 do Conselho Superior da Magistratura, que regulamenta a fase preliminar do procedimento dos Juizados Especiais Criminais.
O CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA, no uso de suas atribuições legais, Considerando o decidido no Processo CG-851/00; Considerando os princípios orientadores do procedimento do Juizado Especial Criminal, que são a oralidade, a simplicidade, a informalidade, a economia processual e a celeridade, Resolve:
Artigo 1º – Para os fins previstos no art. 69, da Lei 9.099/95, entende-se por autoridade policial, apta a tomar conhecimento da ocorrência, lavrando o termo circunstanciado, encaminhando-o, imediatamente, ao Poder Judiciário, o agente do Poder Público investido legalmente para intervir na vida da pessoa natural, atuando no policiamento ostensivo ou investigatório.
Artigo 2º – O Juiz de Direito, responsável pelas atividades do Juizado, é autorizado a tomar conhecimento dos termos circunstanciados elaborados pelos policiais militares, desde 52 que assinados concomitantemente por Oficial da Polícia Militar.
Artigo 3º – Havendo necessidade da realização de exame pericial urgente, o policial militar deverá encaminhar o autor do fato ou a vítima ao órgão competente da Polícia Técnico- Científica, que o providenciará, remetendo o resultado ao distribuidor do foro do local da infração.
Artigo 4º – O encaminhamento dos termos circunstanciados respeitará a disciplina elaborada pelo juízo responsável pelas atividades do Juizado Especial Criminal da área onde ocorreu a infração penal. Artigo 5º – Este Provimento entrará em vigor na data da sua publicação. São Paulo, 23 de agosto de 2001. (aa) Márcio Martins Bonilha, Presidente do Tribunal de Justiça, Álvaro Lazzarini, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, e Luís de Macedo, Corregedor Geral da Justiça.
Segundo posição institucional da secretaria estado da segurança pública e da defesa social – SESED/RN, a realização do procedimento pela Policia Miitar tem cabimento, na forma a seguir, como estampa a PORTARIA Nº 311/2011–GS/SESED Natal, 28 de junho de 2011.
PORTARIA Nº 311/2011–GS/SESED Natal, 28 de junho de 2011
Estabelece a adoção de medidas visando o cumprimento da Recomendação nº 003/2011-19PJ/MPRN.
O SECRETÁRIO DE ESTADO DA SEGURANÇA PÚBLICA E DA DEFESA SOCIAL, no uso de suas atribuições legais previstas nos incisos I e XIII, do artigo 4, da Lei Complementar nº 163, de 05.02.1999 e,CONSIDERANDO o recebimento da Recomendação nº 003/2011-19PJ/MPRN, que trata das “providências para assegurar a continuidade das atividades essenciais de polícia judiciária e de investigação de infrações penais em face da greve deflagrada pelos policiais civis”;
CONSIDERANDO que, “conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.862-6/SP, é perfeitamente admissível a confecção de boletins de ocorrência e termos circunstanciados de ocorrência por policiais militares, sendo consignadas, no acórdão respectivo, as seguintes argumentações que afastaram a tese da exclusividade da Polícia Civil nessa seara: Min. Ricardo Lewandowski: ‘É um mero relato verbal reduzido a termo’; Min. Carlos Britto: ‘E essa documentação pura e simples não significa nenhum ato de investigação, porque, na investigação, primeiro se investiga e, depois, documenta-se o que foi investigado’; e, por fim, o Min. Cezar Peluso: ‘não se trata de ato de polícia judiciária, mas de ato típico da chamada polícia ostensiva e de preservação da ordem pública – de que trata o §5º do artigo 144 –, atos típicos do exercício da competência própria da polícia militar, e que está em lavrar boletim de ocorrência e, em caso de flagrante, encaminhar o autor e as vítimas à autoridade, seja policial, quando seja o caso, seja judiciária, quando a lei o prevê’, acrescentando que ‘Todo policial militar tem de fazer esse boletim d ocorrência’ ”,CONSIDERANDO que a finalidade maior da distribuição de tarefas entre os órgãos e agentes policiais é a otimização do serviço prestado à população, notadamente prejudicado em função da greve dos Escrivães e Agente de Polícia Civil,
R E S O L V E :
Art. 1º. Fica a Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Norte autorizada a lavrar Boletim de Ocorrência (BO) e Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), de que trata o art. 69, da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 – Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que deverão ser assinados, também, por oficial da Corporação na qual se der o registro.
§ 1º. O disposto neste artigo será executado, em regra, nas unidades operacionais da Polícia Militar existentes em cada Município e, em especial, nas a seguir relacionadas:
I – Batalhão de Polícia Militar (BPM):
a ) 1º BPM – Zona Leste de Natal;
b ) 2º BPM – Mossoró;
c ) 3º BPM – Parnamirim;
d ) 4º BPM – Zona Norte de Natal;
e ) 5º BPM – Zona Sul de Natal;
f ) 6º PBM – Caicó;
g ) 7º BPM – Pau dos Ferros;
h ) 8º BPM – Nova Cruz;
i ) 9º BPM – Zona Oeste de Natal;
j ) 10º BPM – Assu;
k ) 11º BPM – Macaíba.
II – Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM):
a ) 1ª CIPM – Macau;
b ) 2ª CIPM – João Câmara;
c ) 3ª CIPM – Currais Novos;
d ) 4ªCIPM – Jardim de Piranhas.
§ 2º. Cópias dos BO’s e dos TCO’s deverão ser encaminhadas, referencialmente por meio eletrônico e no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, à Delegacia Geral de Polícia Civil – DEGEPOL para o fim do disposto no art. 4º e para que se mantenha a unidade de registros estatísticos.
A rt. 2º. O TCO elaborado pela Polícia Militar será remetido diretamente para o Juizado Especial Criminal competente para processar e julgar o feito, juntamente com o autor do fato, a vítima e os objetos apreendidos, se for o caso.
A rt. 3º. As requisições dos exames periciais necessários relativos aos TCO’s lavrados pela Polícia Militar serão feitas diretamente pelo Oficial da Corporação onde se deu o registro e enviadas diretamente ao Instituto Técnico-Científico de Polícia – ITEP.
A rt. 4º. Todas as diligências determinadas pelo Juizado Especial Criminal serão executadas pela Polícia Civil, independentemente de quem haja lavrado o TCO.
A rt. 5º. Na hipótese de elaboração de TCO com autoria desconhecida, o policial militar responsável o encaminhará, juntamente com os objetos apreendidos, se houver, à DEGEPOL para a execução dos atos de polícia judiciária necessários ao esclarecimento do delito.
A rt. 6º. Fica o Comandante Geral da Polícia Militar autorizado a baixar os atos necessários à execução dos artigos precedentes desta Portaria.
A rt. 7º. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
P UBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. CUMPRA-SE.
A LDAIR DA ROCHA, Secretário de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social
A Posição institucional da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio Grande Do Sul tem o seguinte posicionamento.
CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. TERMO CIRCUNSTANCIADO. LAVRATURA PELA BRIGADA MILITAR. POSSIBILIDADE. DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA. COMPETÊNCIA SUPLEMENTAR DOS ESTADOS-MEMBROS. Historicamente, a elaboração do inquérito policial constitui uma das funções da Polícia Judiciária, hoje denominada Polícia Civil. Tal atribuição foi mantida com a Constituição Federal de 1988, que prevê em seu art. 144, §4º que "às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem [...] as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares". Segundo TOURINHO FILHO , "o Código de Processo, no seu art. 4º, deixa bem clara tal função: 'A Polícia Judiciária (civil) será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria" TOURINHO FILHO, Fernando da Costa – Processo Penal – 1ª Volume – 19. Ed. Rev. E atual. – São Paulo: Saraiva, 1997, p. 188. Por outro lado, no Capítulo referente ao Poder Judiciário, prevê a Constituição Federal que a União e os Estados membros criarão juizados especiais competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo (CF, art. 98, I). Dando eficácia a tal dispositivo, o legislador editou a Lei n.º 9.099, de 26 de setembro de 1995, reconhecendo à autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência de fato delituoso a função de lavrar o respectivo termo circunstanciado (art. 69). Percebe-se que o legislador na Lei n.º 9.099/95 utilizou-se da expressão autoridade policial, em relação à polícia judiciária do Código de Processo Penal. Nitidamente aquela expressão é mais ampla do que esta. Por tal razão, a doutrina especializada entendeu que "qualquer autoridade policial poderá ter conhecimento do fato que poderia configurar, em tese, infração penal. Não somente as polícias federal e civil, que têm função institucional de polícia judiciária da União e dos Estados (art. 144, §1º, inc. IV e §4), mas também a polícia militar." GRINOVER, Ada Pellegrini e outros – Juizados Especiais Criminais: Comentários à Lei 9.099, de 26.09.1995 – 3. Ed. Ver. E atual. – Sâo Paulo: Editora revista dos Tribunais, 1999, p. 107. Esta também é a posição de NEREU JOSÉ GIACOMOLLI, para quem a Polícia Militar pode "[...] lavrar o termo circunstanciado e apresentar os envolvidos ao Juizado, diretamente, ao invés de levá-los à Delegacia de Polícia”. Juizados Especiais Criminais. Ademais, não se pode perder de vista que o termo circunstanciado é procedimento pré-processual que se insere na esfera do direito processual penal como procedimento, à semelhança do que sucede com relação ao inquérito policial e ao inquérito civil, este em face do direito processual civil. Daí a possibilidade de os Estados-membros legislarem, concorrentemente (competência complementar), com a União acerca de procedimentos em matéria processual (CF, arts. 24, XI c/c 24, §2º), pois "a Constituição brasileira adotou a competência concorrente não cumulativa ou vertical, de forma que a competência da União está adstrita ao estabelecimento de normas gerais, devendo os Estados e o Distrito federal especificá-las, por meio de suas respectivas leis." MORAES, Alexandre de – Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional – 2. Ed. – São Paulo: Atlas, 2003, p. 697. O próprio artigo 98, inciso I, da Constituição Federal ao falar em procedimentos, também autoriza os Estados a legislarem sobre juizados especiais. Sendo assim, perfeitamente possível que determinado Estado-membro, no uso de sua competência complementar (ou suplementar), interprete a expressão autoridade policial, prevista na norma geral do art. 69, da Lei n.º 9.099/95, como gênero de que são espécies as polícias civil e militar. No Estado do Rio Grande do Sul, a Secretaria da Justiça e da Segurança expediu a Portaria SJS n.º 172, de 16 de novembro de 2000, resolvendo que "todo policial, civil ou militar, é competente para lavrar o Termo Circunstanciado previsto no artigo 69 da Lei n.º 9.099, de 26 de setembro de 1995", sendo que a lavratura por Policiais Militares somente ocorrerá nas Comarcas em que houver acordo entre a Polícia Estadual e o Ministério Público, o que restou ajustado por meio do Termo de Cooperação n.º 03, de 22 de janeiro de 2001, celebrado entre o Governo do Estado e o Ministério Público. Sendo assim, a norma geral federal estampada no artigo 69 da Lei dos Juizados Especiais foi complementada pela Portaria SJS n.º 172 em conjunto com o termo de cooperação. Admitida a possibilidade de a Brigada Militar confeccionar o Termo Circunstanciado, logicamente cumpre a ela instruir o feito com os documentos necessários à prova da materialidade, podendo para tanto requisitar as perícias que se fizerem necessárias (quem pode o mais, pode o menos). Observa-se que, dentro dos princípios que norteiam a Lei n.º 9.099/95 (celeridade, oralidade, informalidade, economia processual), para a primeira fase do procedimento sumaríssimo (fase preliminar) precinde-se de laudo pericial formal, podendo ser postergado ante a existência de outro documento que permita aferir a materialidade (Lei n.º 9.099/95, art. 77, §1º). Seria inconcebível conferir atribuição à Brigada Militar para confecção de Termo Circunstanciado e exigir que a perícia seja realizada por intermédio de requisição de Delegado de Polícia. Conclui-se, portanto, não haver conflito de atribuições entre as polícias civil e militar, tendo em vista a atribuição conferida à Brigada Militar para a confecção dos Termos Circunstanciados, de acordo com a interpretação doutrinária e jurisprudencial dominantes acerca da abrangência do termo "autoridade policial" prevista no art. 69, da Lei n.º 9.0099/95, bem como por haver legislação estadual tão somente complementando a referida norma geral federal.
Segundo o tema, os posicionamentos doutrinários são claros e ratificam as decisões. Diante disso, cabe salientar o posicionamento da jurista Ada Pellegrini Grinover, integrante da comissão de juristas que elaborou o anteprojeto da Lei 9.099/95, assinalou que:
Qualquer autoridade policial poderá dar conhecimento do fato que poderia configurar, em tese, infração penal. Não somente as polícias federal e civil, que têm a função institucional de polícia judiciária da União e dos Estados (art. 144, § 1º, inc. IV, e § 4º), mas também a polícia militar." (GRINOVER, 1995, p. 96/97).
Para Cândido Rangel Dinamarco:
Impõe-se interpretar o art. 69. no sentido de que o termo só será lavrado e encaminhado com os sujeitos dos juizado, pela autoridade, civil ou militar, que em primeiro lugar haja tomado contato com o fato. Não haverá a interferência de uma Segunda autoridade policial. A idéia de imediatidade, que é inerente ao sistema e está explícita na lei, manda que, atendida a ocorrência por uma autoridade policial, ela propicie desde logo o conhecimento do caso pela autoridade judiciária competente: o emprego do advérbio imediatidade no texto do art. 69, está a indicar que nenhuma pessoa deve mediar entre a autoridade que tomou conhecimento do fato e o juizado, ao qual o caso será levado.(DINAMARCO, 1995, p. 1).
O mestre Damásio E. de Jesus segue raciocínio no mesmo sentido do até aqui exposto:
A interpretação mais fiel ao espírito da lei, aos princípios e a sua finalidade, bem como a que se extrai da análise literal do texto, é a de que 'autoridade policial', para os estritos fins da Lei comentada, compreende qualquer servidor público que tenha atribuições de exercer o policiamento, preventivo ou repressivo. (DAMASIO, p. 61)