Os riscos da Modulação dos Efeitos Temporais no Controle de Constitucionalidade:Um Estudo à luz das Teorias Comunitaristas e Procedimentalista
Risks Modulation of Temporal Effects on Judicial Review: A Study in the light of communitarian theories
and proceduralist.
DAVID LOUREIRO SELVATTI SILVA [1]
Advogado; Bacharel em Direito pela Universidade de Barra Mansa; Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Gama Filho.
PALAVRAS-CHAVE
Controle de constitucionalidade. Modulação temporal de efeitos. Supremo Tribunal Federal.
KEY WORDS
Control of constitutionality. Modulation of temporal effects. Supreme Court.
SUMÁRIO
Resumo. Abstract. Introdução. 1. Controle de Constitucionalidade 2. Discussão sobre a natureza jurídica do ato ou lei inconstitucional e teoria da nulidade. 3.Modulação dos Efeitos da decisão em controle de constitucionalidade. 4.Teoria Comunitarista. 5. Teoria Procedimentalista. 6. Supremo Tribunal Federal . 7. Conclusão. 8. Referências bibliográficas
RESUMO
O presente trabalho enfoca sobre os riscos que a modulação temporal dos efeitos no controle de constitucionalidade brasileiro pode causar na ordem constitucional. A modulação temporal de efeitos no controle de constitucionalidade consiste na possibilidade de o julgador limitar a produção de efeitos de determinada decisão judicial no intuito de proporcionar maior segurança jurídica. Trata-se de mecanismo há muito utilizado no Direito estrangeiro, cujo respaldo está na ponderação de valores desenvolvida principalmente por Robert Alexy. No Brasil, embora previsto no artigo 27 da Lei 9.868/99 que trata sobre controle abstrato/concentrado de constitucionalidade, a modulação também é aplicada na via concreta/difusa. A manipulação temporal dos efeitos das decisões judiciais é questionada pelo fato de abrir espaço à arbitrariedade dos julgadores brasileiros, bem como violar a supremacia da constituição. O presente trabalho propõe uma reflexão acerca de como interpretar a constituição, bem como, apontar os riscos que a modulação temporal de efeitos pode causar no ordenamento jurídico, seja através da análise hermenêutica, ou de argumentos das correntes comunitaristas e procedimentalistas no Direito brasileiro.
ABSTRACT
This paper focuses on the risks that the effects of temporal modulation in the control of constitutionality in Brazil can cause constitutional order. The effects of temporal modulation in the control of constitutionality is the ability of the judge to limit production of certain effects of judgment in order to provide greater legal certainty. It's mechanism is widely used in foreign law, whose support is in the weighting of values ??developed mainly by Robert Alexy. In Brazil, although provided for in Article 27 of Law 9.868/99 which deals with abstract control / concentrate constitutionality, modulation is also applied towards concrete / diffuse. The manipulation of the temporal effects of judicial decisions is questioned because of open space to the arbitrariness of Brazilian judges, comes as violating the supremacy of the constitution. This paper proposes a reflection on how to interpret the constitution as well, pointing out the risks that the temporal modulation effects can cause the legal system, whether through hermeneutic analysis, or arguments of communitarians and proceduralists current Brazilian law.
Keywords: Control of constitutionality. Modulation of temporal effects. Supreme Court.
INTRODUÇÃO
“Eu chamo de bravo aquele que ultrapassou seus desejos, e não aquele que venceu seus inimigos; pois a mais dura das vitórias é a vitória sobre si mesmo.” (ARISTÓTELES).
A partir do estudo da modulação dos efeitos temporais no controle de constitucionalidade, procura-se investigar os riscos que esta modulação pode causar no ordenamento constitucional, principalmente em relação aos direitos fundamentais, eis que, no paradigma do Estado Democrático de Direito a tutela dos direitos fundamentais consiste em requisito essencial. Para sua efetivação, cada vez mais os ordenamentos jurídicos buscam mecanismos de efetivação, no intuito de proporcionar maior segurança jurídica na sociedade.
O presente trabalho procura investigar a atuação do Supremo Tribunal Federal como órgão encarregado de proteger a Constituição. O controle de constitucionalidade das leis assume papel de extrema relevância, sendo o mesmo responsável pela manutenção da democracia participativa que, por sua vez, exige a participação das partes na elaboração das decisões juntamente com o juiz. Assim sendo, a fundamentação das decisões judiciais deve ocorrer de forma racional possibilitando o debate sobre suas razões. Em contrapartida, muitas vezes o conteúdo das decisões é majoritariamente político, posto que busca justificar algumas arbitrariedades judiciais, impossibilitando a compreensão e a discussão dos argumentos utilizados. Para tanto, o Judiciário utiliza mecanismos que ampliam seus poderes, às vezes extrapolando suas prerrogativas constitucionais.
A modulação temporal de efeitos no controle de constitucionalidade permite que o julgador, seja na via concreta/difusa ou na via abstrata/concentrada, manipule os efeitos de sua decisão de forma a proporcionar maior segurança jurídica ou excepcional interesse social. Aparentemente trata-se de um mecanismo louvável introduzido no ordenamento jurídico por meio da lei 9868/99.
O presente estudo, também procura investigar a atuação do direito comparado em relação à modulação dos efeitos temporais no controle de constitucionalidade, já que o controle de constitucionalidade foi institucionalizado pela primeira vez no direito Norte-Americano.
Desta forma, o trabalho propõe uma reflexão acerca de como interpretar a constituição, bem como, apontar os riscos que a modulação temporal de efeitos pode causar no ordenamento jurídico, seja através da análise hermenêutica, ou de argumentos das correntes comunitaristas e procedimentalistas no Direito brasileiro.
A corrente comunitarista tem sido utilizada no Direito brasileiro como mecanismo de ponderação de valores, assim este mecanismo tem sido interpretado pelo próprio Supremo Tribunal Federal, como um mecanismo que permite a técnica da modulação dos efeitos no controle de constitucionalidade.
Por outro lado, a corrente procedimentalista entende que a interpretação e aplicação do direito sob o aspecto comunitarista é de grande incerteza no tocante à atuação do Judiciário, posto que sua fixação se respalda em razões de conveniência e oportunidade à critério do julgador.
1. Controle de Constitucionalidade
O controle de constitucionalidade consiste em assegurar a validade da Constituição, bem como, expurgar do ordenamento jurídico normas incompatíveis com a Constituição, ou seja, é o controle, da relação direta de compatibilidade vertical que existe na relação normativa entre norma legal e a constitucional.
Este controle tem por fundamento o Princípio da Supremacia e da Rigidez, haja vista que o controle da constitucionalidade tem por pressuposto que a Constituição é a norma mais importante de um país e por isso deve ser protegidos sua supremacia e os direitos e garantias dela decorrentes, pois, o ordenamento jurídico Brasileiro é um sistema completo e harmônico, do qual a constituição é seu principal fundamento.
Nas palavras de Luis Roberto Barroso:
“A supremacia da Constituição é o postulado sobre o qual se assenta o próprio direito constitucional contemporâneo, tendo sua origem na experiência americana. Decorre ela de fundamentos históricos, lógicos e dogmáticos, que se extraem de diversos elementos, dentre os quais a posição de preeminência do poder constituinte sobre o poder constituído, a rigidez constitucional (v.supra), o conteúdo material das normas que contém e sua vocação de permanência. A Constituição, portanto, é dotada de superioridade jurídica em relação a todas as normas do sistema e, como conseqüência, nenhum ato jurídico pode subsistir validamente se for com ela incompatível. Para assegurar essa supremacia, a ordem jurídica contempla um conjunto de mecanismos conhecidos como jurisdição constitucional, destinados a, pela via judicial, fazer prevalecer os comandos contidos na Constituição. Parte importante da jurisdição constitucional consiste no controle de constitucionalidade, cuja finalidade é declarar a invalidade e paralisar a eficácia dos atos normativos que sejam incompatíveis com a Constituição”. (BARROSO, 2011, pág. 84/85)
A supremacia relevante para fins de controle de constitucionalidade é a supremacia formal da Constituição, que decorre da rigidez constitucional. Somente quando a Constituição é rígida ela possui a supremacia formal.
A violação à Constituição pode acarretar a quebra da unidade do Estado e conseqüentemente sua falência.
Justamente para evitar tal ocorrência é que os ordenamentos jurídicos prevêem o controle de constitucionalidade. Este tem por fim evitar a quebra da harmonia do sistema jurídico de um Estado (atuando de forma preventiva) ou seu restabelecimento (atuando de forma repressiva), isto é, quanto ao momento do controle.
2. Discussão sobre a natureza jurídica do ato ou lei inconstitucional e teoria da nulidade
Existem três correntes principais em relação a natureza jurídica de uma lei inconstitucional ou a um ato inconstitucional.
A primeira corrente entende que a lei só pode pertencer ao ordenamento se feita de acordo com a Constituição. Se não for assim, ela não fará parte do ordenamento, estará fora deste ordenamento e, portanto, juridicamente será inexistente.
O posicionamento mais adotado é o segundo posicionamento, adotado pelo STF e pela maioria da doutrina, que foram influenciadas pelo Direito Norte Americano, sob o fundamento de que a lei inconstitucional é um ato nulo. O direito Norte Americano adota este posicionamento desde o inicio do controle difuso, em 1803, no caso Marbury vs. Madison, decisão dada pelo juiz John Marshall.
Trata-se, nesse sentido, de ato declaratório que reconhece uma situação pretérita, qual seja, “o vício congênito”, de “nascimento” do ato normativo.
Contra este entendimento, destaca-se a terceira corrente, que defende a teoria da anulabilidade, que é aquela em que a o ato é inconstitucional, mas não é ato nulo, mas apenas anulável. Ela depende de uma decisão judicial para declarar essa inconstitucionalidade. Se não houver isso, será válida. Essa teoria tem como principal defensor o austríaco Hans Kelsen e que influenciou a Corte Constitucional Austríaca, caracterizando-se constitutiva a natureza jurídica da decisão que a reconhece.
O fundamento para esta corrente é que existe uma presunção de que as leis são constitucionais.
3. Modulação temporal dos efeitos da decisão judicial em sede de controle de constitucionalidade
A modulação temporal dos efeitos no controle de constitucionalidade foi inserida de modo expresso no ordenamento jurídico brasileiro por meio da lei 9.868/99, precisamente em seu artigo 27, com o seguinte teor:
“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.”
Trata- se de dispositivo, que visa limitar os efeitos das decisões de inconstitucionalidade com fundamento no princípio da segurança jurídica e no interesse social. Esse dispositivo é para controle concentrado, mas de acordo com o STF ele também pode ser aplicado no controle difuso.
De acordo com Gilmar Mendes, nos termos do art. 27 da lei n.9868/99, o Supremo Tribunal Federal poderá proferir, em tese, uma das seguintes decisões:
- “Declarar a inconstitucionalidade apenas a partir do trânsito em julgado da decisão (declaração de inconstitucionalidade ex nunc)”;
- Declarar a inconstitucionalidade, com a suspensão dos efeitos por algum tempo a ser fixado na sentença (declaração de inconstitucionalidade com efeito pro futuro); e eventualmente,
- Declarar a inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade, permitindo que operem a suspensão de aplicação da lei e dos processos em curso até que o legislador, dentro de prazo razoável, venha se manifestar sobre situação inconstitucional (declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade = restrição de efeitos)”.(MENDES, 2011, pág. 1386).
Para Gilmar Mendes:
“A não aplicação da nulidade, assim como no direito português, não se há de basear em consideração de política judiciária, mas em fundamento constitucional próprio. O princípio da nulidade somente há de ser afastado se puder ser demonstrar, com base numa ponderação concreta, que a declaração de inconstitucionalidade ortodoxa envolveria o sacrifício da segurança jurídica ou de outro valor constitucional materializável sob a forma de interesse social.” (MENDES, 2009, pág. 1.386).
Destarte, Gilmar Mendes faz uma análise da questão levando em consideração o Direito americano, que segundo ele, é a matriz do sistema brasileiro de controle.
De acordo com Gilmar Mendes:
“a jurisprudência americana admite a que ao lado da decisão de inconstitucionalidade com efeitos retroativos ou limitados (limited retrospectivity), a superação prospectiva (prospective overruling), que tanto pode ser limitada (limited prospectivity), aplicável aos processos iniciados após a decisão, inclusive processo originário, como ilimitada (purê prospectivity), que nem se quer se aplica ao processo que lhe deu origem.” (MENDES, 2011, pág. 1.173)
Segundo Gilmar Mendes, não só a Suprema Corte americana (caso Linkletter v. Walker), mas também umas séries expressivas de Cortes Constitucionais e Cortes Supremas adotam a técnica da limitação dos efeitos.(MENDES, 2011, pág.1.174)
Por outro lado, insta salientar, que apesar da técnica da modulação ser utilizada pelo STF, Uadi Lammêgo Bulos, entende que nada impede os Tribunais de Justiça dos Estados e os Tribunais Regionais Federais de também aplicarem, por analogia, a Lei 9.868/99, porque inexiste obstáculo intransponível, exceto numa ótica estritamente formalista, à qual não adere. (BULOS, 2011, pág.222)
Cumpre observar, que em uma posição ousada, o regimento interno do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro regulamentou a técnica da modulação em seu art.108,§2, com o teor semelhante ao do art. 27 da lei 9.868/99.
3.1 Princípio da Segurança Jurídica e do Interesse Social
Este princípio é consagrado na constituição no art. 5º da CRFB/88, que assim preconiza:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
Nas palavras de José Afonso da silva, o referido princípio:
“Consiste no conjunto de condições que tornam possível às pessoas o conhecimento antecipado e reflexivo das conseqüências diretas de seus atos e de seus fatos à luz da liberdade reconhecida”. (SILVA, 2012, pág. 433).
Já o interesse social é o interesse coletivo primário, enquanto o interesse da Administração é um dos interesses secundários dispersos e isolados no seio da sociedade. O interesse social vai além dos interesses estatais imediatos, identificando-se com “o interesse que consulta à maioria da sociedade civil”.
Por derradeiro, observa-se, que tanto os princípios da segurança jurídica, quanto o princípio do excepcional interesse social, são princípios com conceitos jurídicos indeterminados, que devem ser analisados pelo órgão jurisdicional no momento da decisão, não havendo limites ou parâmetros pré-estabelecidos para a conceituação dos princípios exigidos pela lei que as institulou para sua correta aplicação.
3.2 Modulação dos efeitos temporais no direito comparado
De acordo com Gilmar Mendes, a fórmula da referida técnica de decisão, apesar de suas especificidades do direito Alemão, os sistemas austríaco, italiano, espanhol e o próprio direito comunitário tem adotado modalidades assemelhadas quanto à restrição de efeitos da declaração de nulidade. A jurisprudência americana também consagrou o modelo mitigador da nulidade absoluta. (MENDES, 2011, pág. 1385).
3.2.1 Áustria
É Previsto a técnica da modulação dos efeitos temporais no art.140 da Constituição Austríaca.
Todavia, até o ano 1929, de acordo com Pedro Lenza, pág.154 a regra geral dos efeitos no controle de constitucionalidade era de negar qualquer retroatividade às decisões de pronunciamento da Corte Constitucional. (LENZA, 2009, pág154)
A partir do ano 1.929 esta regra foi atenuada, fixando a possibilidade de atribuição de efeitos retroativos à decisão anulatória.
Neste diapasão, é a lição de Paulo Bonavides:
“A regulamentação Austríaca remonta a Kelsen, que sustentava a tese segundo a qual Constituição prevê a vigência de leis inconstitucionais ao conter prescrições acerca da invalidação de normas inconstitucionais: “As chamadas normas inconstitucionais são constitucionais, mas invalidáveis mediante um processo especial”. (BONAVIDES, 2008, pág. 336).
3.2.2 Portugal
A Corte Constitucional portuguesa consagra a Técnica da modulação temporal no art. 282, n.4, de forma excepcional ao previsto nos n. os 1 e 2 de sua Constituição.
Registre-se, que apesar da Constituição de Portugal consagrar de forma expressa a técnica da modulação, esta também prevê responsabilidade do Estado legislador pela criação de normas inconstitucionais que causam prejuízo ou afete direitos e garantias dos cidadãos.
Nesta esteira, são as palavras de J.J Gomes Canotilho:
“A responsabilidade do Estado legislador por actos ilícitos cabe também no âmbito de protecção do art.22.º da CRP.Embora se costume argumentar a favor da irresponsabilidade do Estado por facto das leis com a ideia de a disciplina da lei ser geral e abstracta, deve ponderar-se que:(1) algumas leis declaradas ou julgadas inconstitucionais podem ter ocasionado violação de direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para os cidadãos; (2) algumas leis com as características de lei-medida são leis self executing,podendo ter gerado prejuízo sérios sérios aos cidadãos; (3) algumas leis, gerais e abstractas, podem vir a impor encargos apenas a alguns particulares (leis fixadoras de vínculos ecológicos, urbanísticos, de nacionalização de bens, etc..), violando quer o direito de propriedade quer o princípio da igualdade (restrições afectadoras do conteúdo essencial de um direito).Tendo em conta o que se acaba de dizer, impõe-se, no plano jurídico constitucional: (1) reconhecimento da responsabilidade do Estado por actos legislativos ilícitos enquadrável no âmbito normativo do art. 22º; (2) dever de indemnizar por actos legislativos lícitos impositivos de sacrifícios especiais nos cidadãos, de que se pode ver refracção no art.62.º/2 (indenização por expropriação). A possível exigência de um regime legal da reponsabilidade por facto das leis significa não que o legislador possa afastar os deveres de ressarcibilidade e indemnizabilidade que incumbem ao Estado mas que deve concretizar e conformar esse regime através da lei”.( CANOTILHO, 2003, pág. 510).
3.2.3 Alemanha
O princípio da nulidade da lei inconstitucional é a regra geral, nos termos do §78 da Lei de Bundesverfassungsgericht.
De acordo com Gilmar Mendes, pág 1.388, a Corte Constitucional Alemã prevê a técnica da modulação na lei Orgânica, §31, 2 e 79, 1.(MENDES, 2011, pag. 1.388)
Nas palavras Klaus Schlaich, citado por Paulo Bonavides:
“A segurança jurídica que torna necessário que preceitos, embora inconstitucionais, possam existir ou ter eficácia durante um prazo de transição, levando-se em conta que a invalidade das prescrições das Constituições, ou seja, a supressão da norma por declaração de nulidade, produziria uma situação que aos julgadores se afigura mais “inconstitucional” do que aquela provocada pela conservação temporária da validade da lei declarada apenas “incompatível” com a Constituição”(BONAVIDES apud SCHAICH, 2008, pág. 340)
3.2.4 Estados Unidos
O precedente da modulação dos efeitos temporais no sistema norte-americano é o precedente referente ao caso Likleter v. Walker. (LENZA, 2009, pág. 152)
Nas palavras de Pedro Lenza, apud Gilmar Mendes, o referido precedente foi construído sob o seguinte aspecto:
“A Suprema Corte entendeu que o reconhecimento de inconstitucionalidade de lei que permitia certo sistema de provas não retroagiria para invalidar decisões já tomadas com base naquele sistema.”(LENZA, 2009, pág152/153).
Toda polêmica decorreu do julgamento do caso Mapp v. Ohio 367 US 643 (1961), no qual a Suprema Corte entendeu, nos termos da 4º Emenda, que a prova obtida ilegalmente não poderia ser considerada no juízo penal, seja nas Cortes Federais, como também, e inovando, nas Estaduais, superando-se a doutrina fixada em Wolf v. Colorado, 338 US 25 (1949).
Assim, o pedido de se considerar ilegal, no caso Likletter v. Walker, a obtenção da prova por arrombamento, agora com base no novo precedente fixado em Mapp v Ohio, foi indeferido para se evitar sério problema de administração de justiça ( e a perspectiva de diversos pedidos no mesmo sentido de revisão), surgindo, assim, uma importante atenuação ao princípio da nulidade absoluta da lei.”(LENZA apud MENDES, 2009, pág,153).
Trata-se de decisão do Juiz Clark para não retroagir os efeitos da decisão de inconstitucionalidade no sistema norte americano, sob o argumento que se não efetuasse a modulação, teria “desmedida carga de trabalho para administração da justiça” e perspectiva de diversos pedidos no mesmo sentido de revisão.
4 Teoria Comunitarista
O discurso comunitarista chegou ao Brasil na década de 1980, cujo grande impulso foi Robert Alexy e sua técnica de ponderação de valores. Referida técnica confere um caráter axiológico aos princípios do ordenamento jurídico, aqui entendidos como normas.
A proposta comunitária visa interpretar as normas constitucionais de acordo com os valores consagrados na própria constituição e, no preâmbulo da CRFB/88, esta definida os valores supremos da nação, o Título I (Dos princípios fundamentais) se encarrega de positivá-los, na medida em que o art. 1º, III fixa a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, que é vista como um valor essencial que dá unidade de sentido à Constituição Federal.
Na linha do Constitucionalismo comunitário, a Constituição permite que, frente a um conflito de direitos fundamentais, juízes e tribunais possam recorrer aos valores supremos que se expressam nos princípios fundamentais para dar solução ao caso, utilizando-se do critério da ponderação.
Para o constitucionalismo comunitário, a atividade jurisdicional não pode ficar adstrita a uma legalidade positivista e abstrata, destituída, assim, de qualquer função política. (CITTADINO, 2004, pág. 65.)
Todavia, um dos problemas principais da discussão atual sobre interpretação dos direitos fundamentais é a ponderação. Diversos autores fazem a objeção do irracionalismo e da subjetividade. Alexy tenta demonstrar que estas objeções são infundadas. Para essa finalidade, a ponderação é assentada em uma teoria do constitucionalismo discursivo, que enlaça o conceito de ponderação com os de direitos fundamentais, de discurso, de jurisdição constitucional e de representação. As teses principais dizem que, primeiro na base da ponderação está uma forma de argumento que pode ser explicitada por uma “fórmula peso”, e que, segundo, uma jurisdição constitucional, que cumpre essa fórmula com argumentos, satisfaz às exigências da legitimação democrática se ela consegue ser uma representação argumentativa do povo.
De acordo com Alexy, “o procedimento do discurso é um procedimento de argumentação. Isso distingue a teoria do discurso, fundamentalmente, de teorias procedimentais da tradição hobbessiana, que trabalha com procedimentos de negociação e decisão.”(ALEXY, 2008, pág. 25).
O constitucionalismo discursivo é uma teoria que nasce do enlace de 5 conceitos: 1 dos direitos fundamentais;2 da ponderação;3 do discurso;4 do de jurisdição constitucional;5 de representação.
4.2 Teoria da Ponderação
Segundo Alexy:
“O mandamento da ponderação corresponde ao terceiro princípio parcial do princípio da proporcionalidade do direito constitucional alemão. O primeiro é o princípio da idoneidade do meio empregado para a obtenção do resultado com ele aspirado, o segundo, o da necessidade desse meio.Um meio não é necessário se existe um meio atenuado, menos interveniente”.(ALEXY, 2008, pág. 67)
Segundo a lei da ponderação, a ponderação deve realizar-se em três graus. No primeiro grau deve ser determinada a intensidade da intervenção. No segundo grau da importância dos fundamentos que justificam a intervenção. Somente no terceiro grau realiza-se, então a ponderação no sentido restrito e verdadeiro.
4.2.1 A fórmula do peso
De acordo com Alexy, a legitimidade da ponderação no direito depende de sua racionalidade. (ALEXY, 2008, pág. 131)
Assim, os princípios parciais da idoneidade e da necessidade expressam o mandamento de otimização relativamente às possibilidades fáticas.
Já o princípio da proporcionalidade em sentido estrito expressa o mandamento de otimização relativamente à possibilidade jurídica. (ALEXY, 2008, pág. 132)
Segundo Alexy, a lei da ponderação reconhece que a ponderação deixa decompor-se em três passos parciais, quais sejam:
“Em um primeiro passo deve ser comprovado o grau do não cumprimento ou prejuízo de um princípio. A esse deve, em um segundo passo, à seguir, seguir a comprovação da importância do cumprimento do princípio em sentido contrário. Em um terceiro passo deve, finalmente, ser comprovado se a importância do cumprimento do princípio em sentido contrário justifica o prejuízo ou o não- cumprimento do outro”.(ALEXY, 2008, pág.133).
Em caso de empate a ponderação não determina nenhum resultado.
5. Teoria Procedimentalista
Habermas elabora sua teoria do agir comunicativo, contida na obra "Direito e democracia: entre facticidade e validade", para analisar as instituições jurídicas e propor um modelo onde se interpenetram justiça, razão comunicativa e modernidade.
A razão comunicativa seria o valor central para a teoria do discurso. Ela tenta assimilar a tensão entre facticidade (Caráter próprio da condição humana pelo qual cada homem se encontra já comprometido com uma situação não escolhida.) e validade.
Nas palavras de Habermas:
“Argumentos não são disposições para se ter opiniões que possam ser descritas naturalisticamente, eles constituem, ao invés disso, a garantia de uma troca discursiva.“Sociedades modernas são integradas não somente através de valores, normas, e processos de entendimento, mas também sistematicamente, através de mercados e do poder administrativo. Dinheiro e poder administrativo constituem mecanismos da integração social formadores de sistema, que coordenam as ações de forma objetiva, como que por trás das costas dos participantes da interação, portanto não necessariamente através de sua consciência intencional ou comunicativa. Com muita freqüência o direito confere a aparência de legitimidade ao poder ilegítimo (HABERMAS, 2003, pág. 61/62).
A teoria procedimentalista do direito procura defender, antes de tudo, as condições do procedimento democrático. O procedimento democrático demonstra que a qualquer momento um determinado tema poderá ser debatido na esfera pública política. Isto pressupõe, porém, o acatamento da opinião pública, tanto por parte de um parlamento quanto por parte da administração.
5.1 Proposta Habermasiana
Esta proposta estabelece uma conexão entre direitos humanos e soberania popular.
Por estabelecer uma relação interna entre soberania popular e direitos humanos, que Habermas critica a idéia comunitarista, pois esta, em determinadas ocasiões opressões de minorias culturais, por exemplo, é necessário restringir direitos individuais em favor dos direitos coletivos. (CITTADINO , apud HABERMAS, 2004, pág. 175).
Ocorre que, ninguém é livre se a liberdade de uma pessoa é obtida em opressão de outra.
De acordo com Habermas:“As normas pretendem definir o que é igualmente bom para todos, ao passo que a atratividade dos valores está vinculada ao que é bom para alguns”.CITTADINO apud HABERMAS, 2004, pág. 176).
O modelo hermenêutico proposto por Habermas pretende compatibilizar o processo político deliberativo e uma interpretação constitucional que considera o sentido deontológico das normas e não teleológico, como faz a teoria comunitarista.
“Habermas reconhece que “a disputa sobre a correta compreensão paradigmática do sistema jurídico é essencialmente uma disputa política”. (CITTADINO apud HABERMAS, 2004, pág. 207).
Esta proposta de paradigma procedimental, segundo Habermas, representa o individuo como cidadão que participa de uma deliberação política, de forma a assegurar a todos e a cada um o direito de tomar parte na interpretação da Constituição, resgatando o conceito de comunidade de intérpretes da Constituição, formulado por Peter Haberle e, central para o constitucionalismo comunitário brasileiro.
Destarte, a idéia de Habermas é:
“Que a vontade democrática dos cidadãos deve sair da periferia e, atravessando as “comportas” dos procedimentos estabelecidos pelo Estado Democrático de Direito, exercer influência e controle sobre o “centro”, isto é sobre o parlamento, os tribunais e a administração pública, Nesta perspectiva, o direito é o meio pelo qual a vontade democrática dos cidadãos migra da “periferia” para o “centro” do poder político”. (CITTADINO apud HABERMAS, 2004, pág. 211).
“Uma interpretação constitucional orientada por valores, que opta pelo sentido teleológico das normas e princípios constitucionais, ignorando o caráter vinculante do sistema de direitos constitucionalmente assegurados, desconhece, segundo Habermas, não apenas o pluralismo das democracias contemporâneas, mas fundamentalmente a lógica do poder econômico e do poder administrativo.” (CITTADINO apud HABERMAS, 2004, pág. 213).
5.2 O embate entre as teses procedimentalistas e comunitaristas
De inicio , insta salientar, que a discussão sobre o ideal de uma sociedade justa e da sua estrutura normativa- teve inicio com a publicação, em 1971, de A Theory of Justice, de Rawls e passou a ocupar um lugar central no âmbito da filosofia à partir dos anos 80”.
Destarte, a discussão sobre o papel da jurisdição constitucional, e a sua interpretação representa o embate entre as teses comunitaristas, procedimentais e os liberais. A discussão teve o seu inicio no âmbito da filosofia política contemporânea e organiza-se em torno dos debates sobre relações entre ética, direito e política.
A teoria procedimentalista critica a teoria comunitarista sob o aspecto do seu método da ponderação, bem como, da irracionalidade de suas decisões, pois esta toma dos direitos fundamentais sua força normativa, ou seja, relativiza a própria constituição. Habermas recusa o processo hermenêutico de aplicação das normas como se fossem valores.
Alexy constrói a fórmula peso para aplicar a técnica da ponderação e fundamentar a racionalidade das decisões sob o prisma da fundamentação, de modo a suprir a crítica da teoria procedimentalista de Habermas.
Ocorre que apesar disto, Habermas continua não concordando com a racionalidade das decisões construídas pela fórmula peso e ainda faz uma segunda objeção, pois tal técnica teria um problema conceitual.
Deste modo, assim se manifesta Habermas:
“a construção da ponderação, o direito é sacado do âmbito do válido e inválido, do correto e falso e do fundamentar e transplantado em um âmbito que é definido por idéias como a de uma conveniência maior e menor e por conceitos como o do poder discricionário. O ponderar conduz o decidir jurídico para fora do âmbito do jurídico e antijurídico, do correto e falso e do fundamentar e leva para dentro de um âmbito, que é caracterizado pelas distinções como a entre o adequado e o inadequado e conceitos como o poder discricionário. De uma ponderação de bens devem, sem dúvida, poder resultar sentenças, uma tal ponderação, porém, nunca nos pode autorizar a considerar a sentença correta. A sentença é, então, mesma uma sentença de valor, que nos quadros de um ordenamento de valores concretos reflete, mais ou menos conveniente, uma forma de vida, que articula nisso, mas de modo algum, mais está relacionada com a alternativa, se a decisão pronunciada é correta ou falsa” (ALEXY apud HABERMAS, 2008, pág. 109 ).
Ocorre que, as teses matérias-substanciais colocam ênfase na regra contramajoritária (freios às vontades de maiorias eventuais), o que, para os substancialistas, reforça a relação Constituição-democracia; para os procedimentalistas, entretanto, isso enfraquece a democracia, pela falta de legitimidade da justiça constitucional.
Todavia, apesar da teoria procedimentalista ser democrática, o professor: Lênio Streck entende que a teoria procedimentalista de Habermas está distante da realidade de países como o Brasil, eis que:
“Por sua especificidade formal, longe estão de estabelecer as condições de possibilidade para a elaboração de um projeto apto à construção de uma concepção substancial de democracia, em que a primazia (ainda) é a de proceder a inclusão social (afinal), existem mais de trinta milhões de pessoas vivendo na miséria, ao mesmo tempo em que a Constituição estabelece que o Brasil é uma República que visa erradicar a miséria e a desigualdade...) e o resgate das promessas da modernidade, exsurgente da refundação da sociedade proveniente do processo constituinte”. (STRECK, 2009, pág. 30).
Destarte, Lênio Streck se apóia na teoria comunitarista em busca de uma resposta correta para a interpretação e aplicação do Direito, pois:
“Argumentos para a obtenção de uma resposta adequada à constituição (resposta correta) devem ser de princípio, e não de política. Dito de outro modo, não se pode“ criar um grau zero de sentido” a partir de argumentos de política (policy), que justificam atitudes/decisões meramente baseadas em estratégias econômicas, sociais ou morais”. (STRECK, 2009, pág. 546/547).
Todavia, a ressalva que se faz sobre resposta correta por princípios é, o perigo de um ativismo judicial abrir caminho para um governo de juízes, pois um juiz pratica ativismo quando decide a partir de argumentos de política, moral, enfim, quando o direito é substituído pelas convicções pessoais de cada magistrado ou de um conjunto de magistrados, haja vista que a resposta correta por princípios não é uma resposta racional, de acordo com a teoria procedimentalista.
6. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Este Supremo Tribunal, de cunho estritamente político, haja vista a forma de sua própria composição, tem aplicado cotidianamente a técnica da modulação dos efeitos no controle de constitucionalidade, sob o argumento de que em alguns casos concretos seria necessário fazer uma ponderação, assim o Tribunal deixaria de declarar a nulidade de normas inconstitucionais, por razões de segurança jurídica e excepcional interesse social, conforme se pode verificar nos seguintes julgados:
ADI 3.022, de 18-08-2004; ADI 3601 ED/DF, rel. Min. Dias Toffoli, 17.6.2010.; ADI 3.458/GO – Depósitos judiciais ; ADI 4414; RE nº 197.917-8/SP, rel.Min Gilmar Mendes (lead case Mira Estrela);
Todavia, insta salientar, que há duas ações diretas de inconstitucionalidade pendentes de julgamento no STF que pleiteiam a declaração de inconstitucionalidade do artigo 27 da lei nº 9.868/ 99, quais sejam: a Adin nº 2.154-SP proposta pela CNPL – Confederação Nacional das Profissões Liberais e a Adin nº 2.258-DF, impetrada pela OAB- Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, com o principal argumento de que o dispositivo acima referido possui um vicio formal, pois se trata de disposição que modifica todo o sistema jurídico de apreciação de inconstitucionalidade das normas.
7.CONCLUSÃO
Apesar da técnica da modulação temporal dos efeitos no controle de constitucionalidade ser vista por alguns doutrinadores como um avanço constitucional, sua constitucionalidade é duvidosa, seja pelo ângulo das teorias comunitaristas e procedimentalista, eis que, sua aplicação pode gerar efeito ao revés, e ocasionar riscos sob ótica da própria segurança jurídica do ordenamento constitucional.
O poder constituinte originário é a expressão das decisões soberanas da maioria de um povo em determinado momento histórico, decisão esta que pode ser exteriorizada por meio de eleições que selecionam os membros de uma Assembléia Constituinte, por uma revolução ou mesmo pela aceitação presumida das regras impostas pelo ocupante do poder.
Contudo, a técnica da modulação dos efeitos temporais no controle de constitucionalidade, relativiza a supremacia da constituição e retira a soberania do povo, uma vez que este instituto confere validade a normas inconstitucionais por certo período de tempo, como se constitucional fosse.
Destarte, não há que se falar que a teoria comunitarista aprova tal mecanismo, pois apesar da teoria comunitarista ser um grande avanço para os métodos da hermenêutica, e conferir um caráter axiológico aos princípios do ordenamento jurídico, aqui entendidos como normas, interpretar a constituição por esta teoria em relação à modulação dos efeitos temporais no controle de constitucionalidade causa um risco à segurança jurídica, supremacia da constituição, bem como à própria unidade da constituição, se esta teoria não for interpretada de forma correta, pois esta teoria não traz critérios objetivos para a solução do caso concreto e, dependendo do intérprete, este pode subverter o ordenamento constitucional, transformando a teoria em um instrumento de realização política, eis que, é possível diante de um mesmo fato, ter decisões antagônicas, sob o prisma da ponderação de valores, haja vista que o judiciário no caso concreto, sob o prisma do princípio da razoabilidade e proporcionalidade pode decidir qual o princípio que ele vai dar primazia e qual o princípio que ele vai sacrificar, eis que, o limite da teoria da ponderação é o princípio da proporcionalidade e razoabilidade
Com efeito, ao analisar os critérios de Robert Alexy para a técnica da ponderação, percebe-se, que pelo primeiro passo deve ser comprovado o grau do não cumprimento ou prejuízo de um princípio, que no caso em tela (técnica da modulação dos efeitos temporais) consiste em não cumprir o princípio da supremacia da constituição e, o seu prejuízo é a quebra da unidade da própria constituição.
Já o segundo passo, consiste em comprovar a importância do cumprimento do princípio em sentido contrário, que no caso da referida modulação, seria aplicar o princípio da segurança jurídica ou do interesse social.
Por derradeiro, pelo terceiro passo deve ser comprovado se a importância do cumprimento do princípio em sentido contrário justifica o prejuízo ou o não- cumprimento do outro, (caso da modulação), que no meu entender, não justifica, pois a “segurança jurídica” é a segurança da supremacia de uma ordem constitucional democrática, e o interesse social é que não haja normas inconstitucionais dentro do ordenamento jurídico.
Tendo em vista que teoria comunitarista se apóia na técnica da ponderação de valores, esta técnica não é racional, pois a técnica da ponderação de valores dá margem à discricionariedade, conforme foi dito pelo Habermas, e conseqüentemente pode levar a arbitrariedade do julgador, bem como, dar poder aos juízes de decidirem o caso por conveniências política e não jurídica.
Contudo, o próprio Ministro Gilmar Mendes ao julgar o caso de Mira Estrela, se ampara no precedente do Caso Mapp Ohio do direito norte-americano para modular os efeitos.
Todavia, o argumento utilizado pelo Juiz Clark, para não retroagir os efeitos no sistema norte americano foi “desmedida carga de trabalho para administração da justiça” e perspectiva de diversos pedidos no mesmo sentido de revisão.
No entanto, este argumento é por demais frágil, tendo em vista a supremacia da Constituição, deste modo não pode ser utilizado pelo ordenamento jurídico Brasileiro para relativizar a teoria da nulidade, corolário à ordem constitucional
Apesar de a teoria comunitarista ser muito bem sucedida no direito norte-americano, não quer dizer que no Brasil ela seja de boa aplicação, pois nos EUA o seu sistema é comow Law, onde a fonte do seu direito é a equidade (fazer justiça no caso concreto) e não decidir o caso concreto de acordo com a lei, como é no Brasil, sistema civil law.
Apesar da critica realizada sob a teoria comunitarista, talvez, seria licito modular os efeitos em sede de controle de constitucionalidade sob esta teoria, quando a segurança jurídica ou interesse social for interpretada a favor da dignidade da pessoa humana, direitos e garantias individuais do povo e, não em favor do Estado, sob pena de incentivar a criação de leis inconstitucionais, bem como ferir o princípio da democracia participativa.
Por outro lado, sob aspecto da teoria procedimentalista, não deve prevalecer a técnica da modulação dos efeitos temporais no controle de constitucionalidade, uma vez que tal técnica relativiza a constituição e fere o princípio da democracia, pois o próprio poder constituinte originário, cujo titular é povo, não fez esta previsão.
Para a teoria procedimentalista o Direito Constitucional consiste em um procedimento democrático deliberativo, tornando-se normas legítimas de caráter obrigatório e não podem ser vistas, como desejam os comunitários, enquanto valores.
Pela teoria procedimentalista, Habermas pretende buscar uma prestação e interpretação constitucional de acordo com aquilo que é correto e, não como defendem os comunitários, aquilo que é preferencialmente bom, dada uma ordem de valores.
Habermas reconhece que “a disputa sobre a correta compreensão paradigmática do sistema jurídico é essencialmente uma disputa política”. (HABERMAS, 2003, pág. 207).
Todavia, apesar da teoria procedimentalista recusar a técnica da modulação dos efeitos temporais no controle de constitucionalidade, do modo que é realizado hoje, não quer dizer, que esta técnica seria totalmente incompatível com a constituição, pois se o titular do poder, o povo, assim o desejasse, através de um procedimento democrático poderia ser compatível com a Constituição, desde que a maioria aceitasse, eis que, teoria procedimentalista do direito procura defender, antes de tudo, as condições do procedimento democrático. O procedimento democrático demonstra que a qualquer momento um determinado tema poderá ser debatido na esfera pública política.
A teoria procedimentalista de Habermas é o desejável, mas consiste em uma utopia, haja vista que a povo brasileiro não detêm conhecimento político suficiente, e de acordo com Lênio Streck está distante da realidade de países como o Brasil, eis que, o objetivo da nossa constituição é de proceder à inclusão social (afinal), existem mais de trinta milhões de pessoas vivendo na miséria, ao mesmo tempo em que a Constituição estabelece que o Brasil é uma República que visa erradicar a miséria e a desigualdade.
É sabido que, para resolver tal impasse, e oferecer maior segurança jurídica as partes, é necessário recorrer aos métodos hermenêutica.
Sob o víeis dos instrumentos da hermenêutica, o art. 27, da lei 9.868/99 é inconstitucional sobre o aspecto formal, pois, trata-se de disposição que modifica todo o sistema jurídico de apreciação da inconstitucionalidade das normas, haja vista que tal técnica relativiza a constituição, bem como, direitos e garantias individuais, pois, esta técnica confere validade a normas inconstitucionais por certo período de tempo, como se o direito constitucional estivesse em período de exceção.
Desse modo, a referida técnica deveria ter sido introduzida no ordenamento constitucional por meio da vontade do poder constituinte originário e, não por meio de uma lei ordinária.
Cumprem ressaltar, que os direitos e garantias individuais são clausulas pétreas, previsto no art. 60,§4 da IV da CRFB/88, portanto, dependo do caso concreto, nem a inserção da técnica da modulação por emenda constitucional seria licito, pois violaria direitos consagrados por cláusulas pétreas.
No aspecto material, há uma incompatibilidade vertical, pois, quando o STF aplica a técnica da modulação, ele confere validade a normas inconstitucionais por certo período de tempo, como se constitucional fosse, violando de forma direta o comando da norma suprema, que é a Constituição.
Utilizando o método mens legistationis da hermenêutica, essa não foi a vontade do constituinte originário, pois se fosse, este faria de modo expresso. O que corrobora este fundamento, é o fato de que durante a Assembléia Nacional Constituinte fora rejeitada emenda modificativa do senador da República Maurício Corrêa, o qual dispunha acerca da possibilidade de o STF decidir se o ato declarado inconstitucional perderia a sua eficácia desde a sua entrada em vigor, ou após a publicação da decisão declaratória.
Vale destacar, que o próprio STF entende que a sua decisão que cassa o ato ou lei inconstitucional, tem natureza declaratória de nulidade e, pela teoria da nulidade absoluta dos atos declarados inconstitucionais, em especial em sede de controle concentrado, todo ato que é contrário à Constituição é nulo ab initio, ou seja, é nulo desde o seu nascedouro.
Com efeito, o STF mitiga esta nulidade, deixando de pronunciar a nulidade, com fundamento no princípio da segurança jurídica e interesse social, violando nitidamente o princípio da supremacia da constituição.
Certo, é que o STF é o guardião da CRFB/88 e o legitimado para assegurar a sua supremacia, portanto, quando este se depara com normas inconstitucionais, não pode se eximir ou deixar de declarar a sua nulidade, sob pena de violação funcional (seu poder deve de agir).
“Por outro lado apesar do Ministro Gilmar Mendes fazer referencia no direito comparado, insta salientar, que na “Áustria e em Portugal” o sistema de modulação dos efeitos temporais é consagrado de forma expressa na própria constituição e não por uma lei ordinária, como é previsto no ordenamento Brasileiro.
Na Áustria, o direito constitucional adota teoria diversa do ordenamento constitucional Brasileiro, pois a Constituição Austríaca, com forte influencia de Hans Kelsen, adota a teoria da anulabilidade dos atos declarados inconstitucionais e sua decisão tem natureza constitutiva e não declaratória.
Em Portugal é previsto uma reparação dos danos em face do Estado-Legislativo, quando causa prejuízo aos cidadãos, ou, viola direitos individuais em virtude de leis inconstitucionais, o que não ocorre no Brasil.
Ao analisar as decisões do STF, percebe-se que os ministros invocam, ao votarem, a segurança jurídica e/ou um “interesse coletivo de relevância reconhecida”, de forma genérica e imprecisa, tratando-os como duas categorias que se confundem. Conforme foi possível verificar por meio da leitura das ementas dos acórdãos, também em nenhum dos votos foi possível identificar qualquer raciocínio ponderativo dos interesses em jogo, no sentido em que foi estabelecido.
A idéia de que a modulação de efeitos permitiria ao STF preservar outros valores encontraria, segundo os ministros, fundamento na própria constituição.
Entretanto, a conclusão aponta para a falta de consistência nas decisões da corte, seja ao fundamentar a necessidade de modulação dos efeitos, seja ao fixar os limites temporais dessa modulação. Isso, de certo modo, também poderia colocar em xeque a idéia de que o resultado da modulação não seria discricionário.
Conclui-se, que a modulação dos efeitos temporais no controle de constitucionalidade por razões de segurança jurídica gera o risco de violar o princípio da unidade da constituição, bem como sua supremacia.
Por derradeiro, em sede de declaração de inconstitucionalidade das leis, independentemente da aplicação da modulação dos efeitos temporais, seja sob a luz da teoria procedimentalista ou comunitarista, o importante é conferir proteção jurídica ao titular do poder, “o povo”, quando é prejudicado em face de leis inconstitucionais.
8. REFERÊNCIAS
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BARROSO, Luís Roberto Barroso. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: Os conceitos fundamentos e a construção do novo Modelo. 2 Ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2011.
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BULOS, Uadi Lammêgo Bulos. Direito Constitucional ao alcance de todos. 3 ed.(cidade) Ed.Saraiva, 2011.
CANOTILHO, J.J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. Ed. Coimbra: Almedina, 2003.
CITTADINO, Gisele. Pluralismo Direito e Justiça Distributiva. 3 ed.Rio de Janeiro:Editora Lumen Juris, 2004.
HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia entre facticidade e validade I. 2. Ed. Rio de Janeiro: Biblioteca Tempo Universitário 101, 2003.
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MENDES, Gilmar Ferreira Mendes. Curso de Direito Constitucional. 6ª Ed. São Paulo: editora Saraiva, 2011.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 35ª Ed., Malheiros, São Paulo, 2012.
STRECK, Lênio Luiz Streck. Verdade e Consenso. 3ª Ed.Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2009.
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