O sistema prisional segundo a teoria da finalidade da pena

17/05/2014 às 15:48
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A importância de se compreender a teoria da pena aplicada ao sistema prisional está na própria finalidade a que pena se presta. Importante se faz a compreensão do modelo adotado e se tal modelo vem sendo respeitado na aplicação da pena por parte do Estado

Nas palavras de Rogério Greco, “o homem, a partir do momento em que passou a viver em comunidade, também adotou o sistema de aplicação de penas toda vez que as regras da sociedade na qual estava inserido eram violadas”.

Diante dessa necessidade social de aplicação de sanções aos indivíduos violadores das regras sociais, surgiu no decorrer da história o sistema prisional, com a finalidade de abrigar tais indivíduos no decorrer do cumprimento de suas penas.

Tão ou mais importante, quanto compreender o funcionamento do sistema prisional é compreender qual o seu sentido, função e finalidade para a aplicação da pena, segundo o modelo de pena adotado pelo Estado, que no decorrer da história teve diversas variações, desde as mais desumanas e degradantes imagináveis até a ideia de humanização e recuperação do individuo condenado por transgredir as normas sociais.
 
O atual ordenamento jurídico pátrio adota a teoria mista ou unificadora da pena, como se pode compreender pela inteligência extraída da parte final do artigo 59 do Código Penal de 1940 . Trata-se de teoria que configura uma junção das teorias absoluta e preventiva.

Segundo a teoria absoluta, também conhecida como retributiva, a pena tem a finalidade única de causar um mal ao condenado em retribuição ao mal por ele causado à vítima de seu delito e à sociedade como um todo. Tal teoria toma por base o dever do Estado em punir para manter o equilíbrio e a ordem social diante de um ato atentatório causado por um indivíduo.

Nas palavras de Cesar Roberto Bitencourt:

Segundo esse esquema retribucionista, é atribuída à pena, exclusivamente, a difícil incumbência de realizar a justiça. A pena tem como fim fazer justiça, nada mais. A culpa do autor deve ser compensada com a imposição de um mal, que é a pena, e o fundamento da sanção estatal está no questionável livre-arbítrio, entendido como a capacidade de decisão do homem para distinguir entre o justo e o injusto.

Assim, o indivíduo tem a capacidade e liberdade para tomar suas decisões, mas, deve estar ciente que seus atos não podem ir de encontro ao bem estar social defendido pelo Estado que, neste caso, infligirá ao infrator das normas sociais uma sanção que compense o mal em consequência ao ato praticado.

Opostamente a esta ideia, encontra-se a teoria preventiva, que teoriza a prevenção dos delitos como um meio de evitar que o Estado tenha de reprimir os atos praticados novamente, ou seja, visa a não reincidência do delito por meio de uma ação do Estado no sentido de impor uma sanção, que continua sendo necessária, mas, com a finalidade de evitar que o condenado volte a delinquir.

A presente teoria divide-se em dois métodos diversos que visam ao mesmo objetivo, a prevenção de delitos, por parte do cidadão em geral, por meio de uma teoria preventiva geral, e por parte daquele que já delinquiu, por meio de uma teoria preventiva especial.

Como explica Humberto Barrionuevo Fabretti, "[...] as teorias relativas ou utilitaristas são divididas entre: a da prevenção especial – que atribui o fim preventivo à pessoa do criminoso, e a da prevenção geral – que atribui o fim preventivo aos demais cidadãos". 

A teoria preventiva geral tem por objeto o impacto que a pena produz nos cidadãos comuns, ou seja, neste caso, aqueles que ainda não delinquiram. Ao aplicar a pena ao individuo que infringiu as normas impostas ao meio social, o Estado demonstra aos demais indivíduos as consequências advindas da prática destes delitos e, assim, não somente inibe tendências criminosas, como também difunde no meio social uma ideia de respeito às normas impostas.

A teoria preventiva especial, por sua vez, tem por objeto o impacto que a pena produz no próprio condenado, que, ao ser condenado à pena privativa de liberdade, é retirado do convívio social e impossibilitado de praticar novos delitos naquele meio. Mesmo não se tratando de pena privativa de liberdade, a pena deve ter o condão de trazer ao condenado um sentimento ressocializador, impelindo-o a abandonar futuras práticas delitivas.

A respeito da teoria preventiva especial, Cezar Roberto Bitencourt preleciona que, “a prevenção especial não busca a intimidação do grupo social nem a retribuição do fato praticado, visando apenas aquele indivíduo que já delinquiu para fazer com que não volte a transgredir as normas jurídico-penais”. 

Assim, a teoria mista ou unificadora da pena, apregoa o agrupamento, num único conceito, de alguns elementos proclamados pelas teorias já citadas, conjuntamente a um senso de justiça social. Segundo tal teoria o senso retribuição deve ser aceito diante do princípio da culpabilidade, ou seja, a pena deve estar fundamentada no fato praticado e não visar à repressão social ou mesmo a intimidação do próprio condenado, portanto, a pena deve servir para a ressocialização do condenado e não para retirar seus direitos e garantias individuais.

No âmbito do ordenamento jurídico pátrio, a teoria mista resta refletida não somente no Código Penal, mas também, em nossa Carta Magna, que determina que não haja aplicação por parte do Estado de penas de morte, salvo em caso de guerra declarada, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento ou que sejam cruéis , e, no mesmo sentido a Lei de Execuções Penal, que consagra em seu artigo 1º que, “a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.

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Em se falando do sistema prisional sob as normas de finalidade da pena, tem-se que o instrumento normativo que aplica estas finalidades é a Lei de Execuções Penais (LEP), sem prejuízo do uso de outras normas, de direito nacional e internacional, tais como os tratados dos quais o Brasil é signatário.

O artigo 41 da Lei de Execução Penal traz um rol de direitos que o Estado deve garantir ao preso no decorrer do cumprimento se sua sentença, estabelecendo:

Art. 41 - Constituem direitos do preso:
I - alimentação suficiente e vestuário;
II - atribuição de trabalho e sua remuneração;
III - Previdência Social;
IV - constituição de pecúlio;
V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;
VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;
VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;
VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
XI - chamamento nominal;
XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena;
XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento;
XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;
XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.
XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente.
Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento.

Diante do acima exposto, o sistema prisional deve proporcionar ao condenado, ao longo da execução de sua pena, meios de ressocialização através de uma pena humanizada, que lhe proporcione um mínimo de dignidade, possibilidade de trabalho, que tem sentido de formação de caráter não voltado ao delito e, ainda, a não imposição de qualquer meio cruel de pena, o que se caracteriza, em sentido amplo, na não obediência dos direitos inerentes ao condenado no decorrer do cumprimento de sua pena.


Bibliografia utilizada

Art. 41 da Lei nº 7.210, de 11 de Julho de 1984.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: Causas e Alternativas. 2º Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2001. P 106/107.

_________________________. Tratado de Direito Penal. 6 º Ed. São Paulo. Editora Saraiva: 2012. Vol. 4. p.111

FABRETTI, Humberto Barrionuevo. Direito Penal do Inimigo: Uma Análise sob os Aspectos da Cidadania. 2008. p.31 Tese (Pós-Graduação em Direito Político e Econômico) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp061767.pdf>. - Consultado em 22 de Fevereiro de 2014

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 10º Ed. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2008. Vol. I. p. 487

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Sobre o autor
Renato Carvalho de Araujo

Bacharel em direito, formado pela faculdade de direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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