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Crédito público

20/09/2014 às 10:36

Resumo:


  • O crédito público é uma prática antiga que envolve o Estado em operações de empréstimo, seja como credor ou devedor, e está inserido no ordenamento jurídico brasileiro com o intuito de regular sua operacionalização e fiscalização.

  • Existem classificações e conceitos específicos para o crédito público, que podem ser divididos conforme o uso do poder de império do Estado, a origem dos recursos e outros critérios, desempenhando papel fundamental no desenvolvimento econômico e social.

  • Os fundamentos jurídicos do crédito público estão presentes na Constituição Federal, na Lei de Responsabilidade Fiscal e em resoluções do Senado, estabelecendo limites, condições e fiscalização para as operações de crédito envolvendo entes públicos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O crédito público é tema fortemente regulado no nosso ordenamento, possuindo base constitucional e sendo tratado também por meio de leis complementares e resolução do Senado Federal. Evidencia-se assim a preocupação do legislador em impor limites aos governantes no uso desse meio de obter recursos para o financiamento dos serviços e obras públicas.

1 Introdução

O crédito, como operação na qual um agente que dispõe de recursos empresta a quem está em situação deficitária, é uma prática que remonta a mais longínqua data da história humana. E não podia ser diferente quando se considera o crédito público, aquela relação creditícia em que o Estado participa, pois basta lembrar que tal entidade surgiu há mais de 3000 a.C.

O presente estudo busca fazer uma análise do crédito público inserido no ordenamento jurídico brasileiro, fazendo uma abordagem exploratória  dos principais aspectos envolvidos com esse instituto, especialmente os jurídicos. Como a lei define esse tipo de receita, como estabelece a competência dos órgãos políticos na fixação do seu limite e a fiscalização de sua operacionalização.

Utilizou-se de definições e classificações da doutrina financista para ajudar a melhor compreensão do assunto sob tela.

Outrossim, inseriu o crédito público no contexto mais amplo da economia e da sociedade. Passando-se a ideia de que ele tem uma função que extrapola o simples mecanismo de canalizar renda aos cofres públicos. E também o colocando em consonância com a função estatal de fomento ao desenvolvimento econômico e social.

A relevância do estudo do crédito público é plenamente compreensível no cenário atual, visto que muitos países passam por crises nas contas públicas justamente pela falta de instrumentos de controle para fazer a gestão do nível e risco do endividamento do Estado. Muitas nações estão quase decretando moratória, por falta de recursos para saldar suas obrigações.


2 Conceito de Crédito Público

A própria origem da palavra crédito nos dá uma ideia de seu significado, ela se originou do latim credere – acreditar, confiar. E no campo das finanças, possui a mesma acepção. É um ato que envolve transferência de recursos baseada na confiança naquele que toma emprestado por parte do que empresta.

Como neste artigo trata-se do crédito público, ele assume mais um significado, por ser público significa que em um dos pólos da relação jurídica figura o Estado, entendido como aquela pessoa jurídica de direito público interno.

Alguns autores do ramo financista consideram apenas aquela relação em que o Estado é o tomador do empréstimo; todavia, essa é uma visão reducionista do fenômeno sob estudo, haja vista a importância que o crédito público assume naqueles casos em que o ente público figura como emprestador, provocando, como será visto, efeitos profundos na economia e na sociedade.

Portanto, podemos conceituar crédito público como sendo a operação de crédito em que o Estado toma emprestado ou empresta recursos, isto é, ocorre uma transferência de liquidez.


3 Classificação do Crédito Público

A doutrina elaborou uma divisão dos tipos de crédito público levando em consideração critérios classificatórios. Na primeira forma, tem-se como base o uso do poder de império por parte do Estado. Se esse o exerce, há o empréstimo público compulsório, como no caso em que os bancos são obrigados a reservar parte dos recursos como garantia de suas operações; e se não existe o uso do poder de império, ocorre os chamados empréstimos públicos voluntários, no qual segue-se o princípio da autonomia da vontade, típico do direito privado.

Outra classificação comum, é a que leva em conta a origem dos recursos, se forem de emprestadores nacionais, empréstimo interno. Caso provenha de fontes internacionais, empréstimos externos. A consequência prática entre esses dois tipos, é que os empréstimos externos são mais dispendiosos para o conjunto da economia nacional, já que se transfere recursos para outro país, diminuindo a liquidez da economia doméstica.


4 Usos e operacionalização do crédito público

Como dito na conceituação de crédito público, esse se presta não apenas como fonte de recurso para cobrir as despesas do ente governamental que o contraiu. Outra importante atribuição que tem sido usada pelos diversos estados dos mais variados pontos do mundo, é sua eficácia como forma de intervir no desenvolvimento econômico e social. No Brasil há previsão inclusive constitucional nesse sentido, o art. 174 da carta magna estatui:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

Esse reconhecimento constitucional do papel do crédito público como forma do Estado promover a expansão da economia revela-se acertado em uma sociedade com variadas e complexas demandas, que o ente público não conseguiria atendê-las sozinho.

Caracteriza-se este por ser uma forma de incentivar a iniciativa privada de interesse público. Difere do serviço público, porque neste, o Estado assume como sua uma atividade de atendimento a necessidades coletivas, para exercê-las sob regras total ou parcialmente públicas; no fomento, o Estado deixa atividade na iniciativa privada e apenas incentiva o particular que queira desempenhá-la, por se tratar de atividade que traz algum benefício para a coletividade. (PIETRO, 2005, p. 248 - 249)

Mas o uso mais rotineiro e antigo do crédito público é para cobrir as despesas da Administração Pública, que não conseguiu pagá-las com a receita advinda dos impostos. Aqui, o Estado é o tomador do empréstimo, ficando obrigado a restituir o principal acrescido de juros.

Nessa última modalidade do crédito público, é muito comum duas formas de obtê-lo junto ao mercado. Podem-se emitir títulos de créditos, que são uma parte do empréstimo, para ser negociado no mercado financeiro. No Brasil existem inúmeros tipos de títulos, entre os quais: Letras Financeiras do Tesouro, Letras do Tesouro Nacional, Certificados da Dívida Pública etc.

Também podem ser feitos contratos diretos com instituições financeiras, que passam a financiar o Estado. Tanto entidades nacionais como internacionais. Dessas últimas, exerce papal mundialmente relevante o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Bird (Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento). Nosso país começou a contrair empréstimo como o FMI em 1954, para financiamento de projetos de infraestrutura e resolver problemas monetários.


5 Fundamentos jurídicos do crédito público

O crédito público vem regulado em vários diplomas normativos, desde a Constituição até leis ordinárias e complementares. Aqui tratar-se-á dos aspectos mais importantes sobre o tema discorrido na legislação.

O art. 21 da Constituição atribui a União o papel de fiscalizadora das operações de crédito público, e o art. 22 deixa a cargo da mesma a competência privativa para legislar sobre o assunto.

A função de fiscalizar atribuída a União é exercida pelo Ministério da Fazenda, que tem essa competência amparada pelo art. 32 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece que tal órgão verificará o cumprimento dos limites e condições relativos à realização de operações de crédito de cada ente da Federação. E que os entes devem encaminhar seu pleito fundamentado técnico e juridicamente, demonstrando o interesse social e econômico, a existência de autorização prévia em lei orçamentária, inclusão no orçamento dos recursos e observância dos limites e condições fixados pelo Senado.

Em seu art. 52, a Carta Magna estabelece que compete privativamente ao Senado Federal:

[...]

V - autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios;

VI – fixar por proposta do Presidente da República, limites globais para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

VII – dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal;

[...]

Como se vê pela leitura do artigo retrotranscrito, o Senado deve dar o aval para serem realizados os contratos de créditos envolvendo entidades externas. Bem como, fixar até que ponto o Poder Executivo pode comprometer o orçamento com o pagamento de dívidas e juros e as condições sob as quais serão realizadas essas operações de crédito. O Senado editou em 2007, a Resolução Nº 48 que estabelece os limites globais para operações de crédito e concessão de garantia nessas operações. O art. 6° dessa Resolução, alude ao limite estabelecido no art. 167, inciso III, da Constituição, de que as operações de créditos não devem exceder o montante das despesas de capital, com exceção dos créditos suplementares ou especiais. A citada Resolução fixa como critério de verificação desse limite, o previsto no art. 32, § 3° da Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece que nas despesas de capital não serão computados os empréstimos e financiamentos com o intuito de promover incentivo fiscal para fins de fixação do limite das operações de crédito.

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A Lei de Responsabilidade Fiscal, esclarece o que é dívida consolidada, de acordo com seu art. 29, inciso I:

Dívida pública consolidada ou fundada: montante total, apurado sem duplicidade, das obrigações financeiras do ente da Federação, assumida em virtude de leis, contratos, convênios ou tratados ou da realização de operações de crédito, para amortização em prazo superior a doze meses.

Vale destacar que a dívida consolidada ou fundada tem prazo de amortização superior a doze meses, com exceção das autorizações de operações de crédito feitas no orçamento e os precatórios judiciais não pagos durante a execução do orçamento que tiverem sido incluídos.

A citada lei complementar também conceitua operação de crédito no art. 29, inciso III:

[...]

Operação de crédito: compromisso financeiro assumido em razão de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros.

[...]

Como se vê, o legislador tratou de estabelecer no tocante às operações de créditos, toda a conceituação jurídica, visando dar o máximo de segurança, controle, transparência e limite nesse tipo de procedimento.


6 Conclusão

O crédito público é tema fortemente regulado no nosso ordenamento, possuindo base constitucional, com vários artigos tratando do assunto, estabelecendo competência para legislar, fiscalizar, limite global e condições de operações de crédito público. É tratado ainda por lei complementar, que traz definições precisas sobre vários aspectos envolvendo esse tipo de operação, e por resolução editada pelo Senado Federal.

Nota-se claramente a preocupação do legislador em impor limites aos governantes no uso desse meio de obter recursos para o financiamento dos serviços e obras públicas. Fixaram-se critérios legais que devem ser obrigatoriamente atendidos para que esses recursos sejam considerados regulares.

Também restou claro que a norma jurídica cuidou de estabelecer definições técnicas sobre o assunto para não deixar na discricionariedade dos administradores sua conceituação. Com isso deu-se segurança a operacionalização desse instituto.


Referências

NASCIMENTO, Sávio. Lei de Responsabilidade Fiscal. 1 ed. Rio de Janeiro: Elsevvier, 2013.

ABRAHAM, Marcus. Curso de Direito Financeiro Brasileiro. 1 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005, pg. 248 – 249.

PASCOAL, Valdecir. Direito Financeiro e Controle Externo. 8 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

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Sobre o autor
José Alison Dias de Meneses

estudante do 9° período de Direito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENESES, José Alison Dias. Crédito público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4098, 20 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29439. Acesso em: 22 dez. 2024.

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