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Tutela jurídica dos direitos transindividuais em um Estado Democrático de Direito

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07/10/2014 às 17:07
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CONCLUSÃO

A produção jurídica brasileira preocupa-se ainda, em grande medida, com os direitos individuais (simples), de natureza real ou patrimonial, com como os tratar judicialmente, sem se dar conta de que a teia social encontra-se de tal modo complexizada que os litígios não mais dizem respeito apenas a reintegrações de posse de Caio contra Tício, relativamente a uma gleba de terras.

Emergem da sociedade interesses e direitos transindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), os quais, ansiosos e esperançosos por proteção e concretização, continuam à margem do Código de Processo Civil. E, embora ocupem a atenção de algumas leis esparsas no ordenamento jurídico, esse espaço – visivelmente – ainda não é suficiente.

Urge a necessidade de uma filtragem constitucional das normas do processo civil brasileiro, adequando-as e remodelando-as, assim, ao novo paradigma Democrático instituído em 1988, o qual institui como cláusula pétrea a exigência de uma tutela jurídica efetiva e adequada aos a todos os direitos.

Há que se curar a surdez do “legislador”, para que ouça os gritos das novas demandas sociais e efetive seu labor no sentido de criar condições de possibilidade para o desenvolvimento e proteção desses interesses e direitos transindividuais, característicos de uma terceira dimensão de direitos, desvencilhando-se das correntes dos ideais liberalistas e Iluministas dos séculos passados, garantindo assim perspectiva para sua real proteção/concretização.

A omissão/deformação constatada no ordenamento processual civil, que relega à periferia interesses e direitos tão relevantes no complexo social estabelecido pela atual quadra histórica, não pode resistir aos moldes de um Estado Democrático de Direito, que garante – nominalmente ao menos – sua efetiva e adequada tutela, sob pena de se esvair até mesmo sua legitimidade, e de comprometer o que a duras penas foi alcançado até os dias presentes.


REFERÊNCIAS

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CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988, trad. Ellen Gracie Northfleet.

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____ Da ação abstrata e uniforme à ação adequada à tutela dos direitos. In Processo e Constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbosa Moreia. Org.: FUX, Luiz; NERY Jr., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, pp. 838-869.

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STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.

WARAT, Luis Alberto. A ciência jurídica e seus dois maridos. 2. ed. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000.


Notas

[1] Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 1135.

[2] Utiliza-se o termo dimensão e não geração, à vista da idéia de complementaridade que se sucedeu em tal evolução. Ver em: SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 54.

[3] A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Elsivier, 2004, p. 67-83.

[4] A idéia de Direito Social: O Pluralismo Jurídico de Georges Gurvitch. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 33.

[5] Humberto Dalla Bernardina de Pinho menciona, ainda, a existência de direitos de quarta geração, como “aqueles referentes à biotecnologia, bioética e regulação da engenharia genética.” E direitos de quinta dimensão como “aqueles advindos das tecnologias de informação, Internet, ciberespaço e realidade virtual em geral.” A tutela coletiva no Brasil e a sistemática dos novos direitos. http://www.humbertodalla.pro.br/arquivos/a_tutela_coletiva_e_os_novos_direitos.pdf.

[6] Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 384.

[7] Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 145.

[8] Segundo Lenio Streck (Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 85): “O Estado Democrático de Direito representa, assim, a vontade constitucional de realização do Estado Social. É um plus normativo em relação ao direito promovedor-intervencionista próprio do Estado Social de Direito. Registre-se que os direitos coletivos, transindividuais, por exemplo, surgem, no plano normativo, como conseqüência ou fazendo parte da própria crise do Estado Providência. Desse modo, se na Constituição se coloca o modo, é dizer, os instrumentos para buscar/resgatar os direitos de segunda e terceira gerações, via institutos como substituição processual, ação civil pública, mandado de segurança coletivo, mandado de injunção (individual e coletivo) e tantas outras formas, é porque no contrato social – do qual a Constituição é a explicitação – há uma confissão de que as promessas da realização da função social do Estado não foram (ainda) cumpridas.” (grifos no original)

[9] Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 86.

[10] Art. 81, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor: “interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base”.

[11] Art. 81, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor: “interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato”.

[12] Art. 81, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor: “interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.”

[13] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 474.

[14] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 474.

[15] O direito constitucional e a efetividade de suas normas – limites e possibilidades da Constituição brasileira. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 97-8.

[16] Ética, medicina e técnica. p. 46.

[17] MARINONI, Luiz Guilherme. Da ação abstrata e uniforme à ação adequada à tutela dos direitos. In Processo e Constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbosa Moreia. Org.: FUX, Luiz; NERY Jr., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 845.

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[18] MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil, v. 1: teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 110.

[19] MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil, v. 1: teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 114.

[20] STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 83.

[21] STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 82.

[22] Em outra perspectiva, há que se dizer mais: objetificado, o Direito não responde satisfatoriamente a situações – essas, desde sempre existentes, em qualquer fase histórica – vinculadas a características inerentes ao ser humano. Nas palavras de Adalberto Narciso Hommerding (Fundamentos para uma compreensão hermenêutica do processo civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 101): “O processo é técnico. O afeto, o desejo, o amor – também o ódio, a raiva, a saudade, a melancolia –, enfim, sentimentos que existem em qualquer relação familiar, não são e não podem ser objeto da técnica. Para esse tipo de situação, o processo parece nada resolver.”

[23] HOMMERDING, Adalberto Narciso. Fundamentos para uma compreensão hermenêutica do processo civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 101-2.

[24] Processo e ideologia: o paradigma racionalista. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 318.

[25] Processo e ideologia: o paradigma racionalista. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 302.

[26] Um dos locais de (re)produção do senso comum teórico encontra-se no dogmatismo, sobre cuja superação asseverava Ovídio Araújo Baptista da Silva (Processo e ideologia: o paradigma racionalista. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 306-7): “A compatibilidade entre democracia e individualismo é problema crucial que deve ser tratado quando se pretende um direito processual que supere o dogmatismo, porquanto (...) o dogmatismo é expressão de um regime autoritário. É, em última análise, a expressão jurisdicional do ‘pensamento único’ neoliberal. O acesso hermenêutico às realidades jurídicas contingentes fica, conseqüentemente, vedado ao pensamento dogmático.” (grifos do autor) Mais adiante, o processualista reitera: “Devemos buscar alternativas, sem no entanto perder de vista o problema fundamental enfrentado pela jurisdição estatal. Como dissemos, o pensamento dogmático é incapaz de fornecer esse diagnóstico. Assim como se mostrará sempre disposto a realizar reformas sem antes investigar as causas que a tornem indispensáveis, também não terá remorso em sepultar o moribundo, mesmo que ele ainda tenha cura.” (p. 319)

[27] WARAT, Luis Alberto. A ciência jurídica e seus dois maridos. 2. ed. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000, p. 27. A fim de aclarar o que o autor compreende por “lado masculino”, valho-me de suas palavras: “Vejo o masculino como o limite que nos aparece para viver de acordo com o potencial próprio; ter habilidades que permitam sentir-se contente; estar aberto a experiências novas; viver na temporalidade, o presente como novidade; enfrentar e superar os próprios medos e superar as insatisfações de nossa criança interior. O masculino não deixa de ser uma forma melodramática de ver a vida em branco e preto. Uma incapacidade de fertilizar o novo.” (p. 26-7)

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Sobre o autor
Rochele Vanzin Bigolin

Mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá<br>Procuradora Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BIGOLIN, Rochele Vanzin. Tutela jurídica dos direitos transindividuais em um Estado Democrático de Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4115, 7 out. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29763. Acesso em: 25 nov. 2024.

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