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A inconstitucionalidade da incidência do ISS na receita auferida pelas empresas de planos de saúde

01/07/2002 às 00:00
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Atualmente, as empresas de Plano de Saúde estão compelidas ao recolhimento do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, que incide sobre a receita auferida com a venda de planos médicos, odontológicos etc., conforme previsto no item 06 da lista anexa ao Decreto-Lei nº 406/68, com redação dada pela Lei Complementar nº 56/87.

Os artigos 30, III e 156, III, da Constituição Federal vigente, conferiram aos Municípios a possibilidade de editarem leis regulamentadoras do ISS, obedecendo-se porém, os serviços descritos na lista anexa à Lei Complementar nº 56/87, já que a autonomia dos municípios para regular a matéria é contida, na forma do art. 146, III, "a" da Constituição, ou seja, deve obedecer aos preceitos das normas hierarquicamente superiores.

Necessário frisar, que não cabe aos Municípios criar ou acrescentar serviços além dos previstos na lista anexa à Lei Complementar nº 56/87, já que esta é taxativa, ou seja, os Municípios ficam adstritos aos itens descritos na legislação federal.

De outro lado, por força do artigo 11 da Lei Complementar nº 101/00, Lei de Responsabilidade Fiscal, os Municípios não podem ignorar ou suprimir os itens constantes em suas listas, pois desta forma, estariam sendo omissos às regras de arrecadação, o que acarretaria a ingerência dos administradores, e, por conseguinte, a responsabilidade fiscal por tais atos.

Na verdade, a venda de Planos de Saúde não configura uma obrigação de fazer, mas sim uma obrigação de dar. Naquela, é indispensável a prestação de um serviço, que se caracteriza pelo desenvolvimento de trabalho intelectual ou físico de forma onerosa, o que não ocorre com a pura e simples venda de um plano de saúde.

Veja o entendimento do Nobre Jurista José Eduardo Soares de Melo, em sua obra Aspectos Teóricos e Práticos do ISS: "A empresa que se dedica à execução de plano de saúde, usualmente, tem obrigação de dar (reembolso dos custos médicos-hospitalares), suscetível de imposto da União; e não uma obrigação de fazer (prestação de serviços médicos), esta sujeita à competência municipal. Os serviços que vinculam o prestador (médico, hospital) ao tomador (pessoa que adere ao plano), sendo questionável a existência de relação (efetivos serviços de saúde) entre a mera empresa contratante do plano e o referido tomador".

Nesta seara, há efetiva prestação de serviço quando o usuário do plano utiliza-se dos serviços médicos, odontológicos, etc., assim, no sistema de tributação vigente, o Município estaria tributando a venda de planos de saúde e o serviço de saúde efetivamente prestado por determinado profissional, em que pese a ilegalidade na exigência daquele.

Como se alinhará adiante, resta evidente que quanto à receita das empresas de planos de saúde não deve incidir referido tributo municipal, eis que este é devido quando da efetiva utilização do serviço, que só ocorrerá em eventual prestação do serviço de saúde.

Importante lembrar, que o Direito Tributário é regido pelo Princípio da Estrita Legalidade, ou seja, só pode ocorrer tributação em caso de expressa previsão legal, assim, se a lei e a Constituição prescrevem que só serão tributados por ISS os serviços de qualquer natureza, é de se frisar que somente os serviços, em sua essência, deverão ser tributados por ISS, sendo que a atividade que não configure serviço, não pode servir de base de cálculo para o imposto.

Ademais, mesmo estando o serviço agregado à venda do plano de saúde, temos apenas uma expectativa de serviço, não devendo a receita obtida com venda dos planos de saúde ser tributada por meio do imposto sobre serviços, primeiro; porque foge a regra do princípio da estrita legalidade, já que o rol descrito na lista de serviços anexa ao Dec. Lei nº 406/69, com redação dada pela Lei Complementar nº 56/87, é taxativa, não importa ampliações, quanto mais condicionais, segundo; porque mesmo que houvesse um serviço, a base de cálculo deveria ser a diferença entre o valor da venda do plano e a efetiva prestação do serviço.

Veja que a venda de planos de saúde não pode ser tributada por ISS, por não configurar serviço, tampouco por ICMS, pois não configura-se a venda de uma mercadoria (bem corpóreo) e sim de um bem imaterial.

A venda de plano de saúde consiste na obrigação de dar um bem imaterial, podendo gerar um serviço quando da necessidade de intervenção médica ou odontológica, e, neste caso, há configuração de uma prestação de serviço, tendo em vista o esforço técnico dos profissionais da área da saúde, cujas receitas devem ser tributadas por meio de ISS.

A doutrina majoritária, assim como o Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário nº 115.308/RJ, entendem pela não incidência do Imposto Sobre Serviços, nas receitas auferidas pelas empresas de venda de planos de saúde, julgando no mesmo sentido o 1º TAC, nos autos dos Embargos Infringentes nº 703.410-2/01.

No nosso ponto de vista, verifica-se a exigência ilegal por parte dos Municípios, no que tange ao Imposto Sobre Serviços incidente na venda de planos de saúde, todavia, após o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal, não podem deixar de arrecadar, para tanto, necessário que os contribuintes ingressem com medida judicial pleiteando a declaração de inconstitucionalidade dos itens municipais que norteiam as cobranças, possibilitando a recuperação dos valores indevidamente recolhidos ao Erário.

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Sobre o autor
Jean Henrique Fernandes

advogado e sócio da FERNANDES e BASSO advogados, com matriz em São José dos Campos – SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Jean Henrique. A inconstitucionalidade da incidência do ISS na receita auferida pelas empresas de planos de saúde. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2994. Acesso em: 26 abr. 2024.

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