Princípios limitadores do poder estatal punitivo

16/07/2014 às 15:35
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Este artigo trata dos Princípios Informadores do Direito Penal Mínimo, segundo o qual o Direito Penal será utilizado somente quando as demais esferas do direito brasileiro forem ineficazes.

Resumo

Este artigo tratou dos Princípios Informadores do Direito Penal Mínimo, sendo eles o da Intervenção Mínima, Adequação Social, Fragmentariedade, Ofensividade, Exclusiva Proteção dos Bens Jurídicos, e, notadamente, o Princípio da Insignificância, com o objetivo de verificar a incidência de cada princípio. Concluiu-se a partir deste estudo que uma das titularidades do poder estatal é o de punir, todavia, a fim de se manter a ordem social, o Direito Penal será utilizado somente quando as demais esferas do ordenamento jurídico brasileiro forem ineficazes.

Palavras-chave: Princípios; Direito Penal; Intervenção Mínima

Introdução

Analisar-se-ão os Princípios Informadores do Direito Penal Mínimo, sendo eles, o da Intervenção Mínima, Adequação Social, Fragmentariedade, Ofensividade, Exclusiva Proteção dos Bens Jurídicos, e, notadamente, o Princípio da Insignificância, a fim de verificar o objetivo de incidir cada um destes princípios nos casos concretos, partindo da premissa de que o Direito Penal tem em seus princípios basilares o objetivo geral de limitar o poder estatal, para assegurar direitos individuais. Para cumprir com este objetivo adotar-se-á o método de pesquisa dedutivo, por meio da pesquisa teórica e qualitativa de material bibliográfico.

Considerações iniciais

Ao realizar análise do artigo 5º da Constituição Federal percebe-se uma limitação ao poder punitivo estatal, contendo princípios implícitos ou explícitos, garantias individuais fundamentais, com objetivos atrelados aos direitos humanos, os quais tiveram origem da idéia de liberdade e igualdade Iluminista, dando ao Direito Penal um caráter menos cruel do que o Direito Penal do Estado Absolutista. Da limitação ao poder punitivo estatal, surge o chamado Direito Penal Mínimo. (BITENCOURT, 2011, p. 55).

Sendo assim, em decorrência destes paradigmas iniciou-se um processo histórico-político de valorização da pessoa humana, que no Brasil se concretizou num Estado Democrático de Direito. Com isso, o Direito Penal tem em seus princípios basilares o objetivo geral de limitar o poder estatal, para assegurar direitos individuais, segundo Luiz Regis Prado (2011, p. 138), os princípios penais,“em síntese servem de fundamento e de limite àresponsabilidade penal”, acrescentando:

Os princípios penais constituem o núcleo essencial da matéria penal, alicerçando o edifício conceitual do delito – suas categorias teoréticas -, limitando o poder punitivo do Estado, salvaguardando as liberdades e os direitos fundamentais do indivíduo, orientando a política legislativa criminal, oferecendo pautas de interpretação e de aplicação da lei penal conforme a Constituição e as exigências próprias de um Estado Democrático de Direito. [...] Tais princípios são considerados como diretivas básicas ou cardeais que regulam a matéria penal, sendo verdadeiros “pressupostos técnico-jurídicos que configuram a natureza, as características, os fundamentos, a aplicação e a execução do Direito Penal. Constituem, portanto, os pilares sobre os quais assentam a instituições jurídico-penais: os delitos, as contravenções, as penas e as medidas de segurança, assim como os critérios que inspiram as exigências político-criminais”. O exercício do direito estatal de punir se manifesta no momento de criação e promulgação das leis e no de sua aplicação aos casos concretos. Assim, há limites impostos pelo Estado de Direito que atuam na construção do sistema penal positivo e na aplicação e execução das sanções penais. (PRADO, 2011, p. 139)

Partindo desta premissa, irá ser realizado estudo dos princípios do Direito Penal Mínimo, princípios limitadores do poder punitivo estatal, uma vez tamanha a importância dos princípios que conforme Celso Antônio Bandeira de Mello (2003 apud Lopes, 2000), “violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção aos princípios implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas todo o sistema de comandos. É mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais. (LOPES, 2000, p. 33).

1.  Princípios Informadores do Direito Penal Mínimo

1.1 Intervenção Mínima

Este princípio refere-se à intervenção estatal face aos atos praticados, a qual somente deve ocorrer em situações extremas, como a última saída (última ratio), deixando para os outros ramos do Direito a disciplina das relações jurídicas, p.e, “a subtração de um pacote de balas em um supermercado, já punida com a expulsão do cliente do estabelecimento e com a cobrança do valor do produto ou sua devolução, já foi resolvida por outros ramos do Direito, de modo que não necessitaria da interferência do Direito Penal” (ESTEFAM, 2010, p. 121).

Este princípio surgiu com a Declaração dos Direito do Homem e do Cidadão, com o objetivo de garantir que somente haverá a intervenção estatal quando for realmente necessário. Mais precisamente, este princípio, no Brasil, deriva do princípio da dignidade da pessoa humana e do fato de o art. 5º, caput, da Constituição Federal, o qual declara a inviolabilidade da “liberdade, da vida, da segurança e da propriedade” (ESTEFAM, 2010, p. 121).

Bitencourt (2011, p. 43) faz uma interessante análise entre o princípio da legalidade e o princípio da intervenção mínima do Estado, sendo que o primeiro não impede que o Estado crie tipos penais iníquos e comine sanções cruéis e degradantes, por isso se torna realmente necessário realizar uma interpretação sistemática ao legislar, já que o princípio da intervenção mínima do Estado também vem para limitar o arbítrio do legislador, sendo conhecido como ultima ratio, o qual além de limitar, orienta o poder incriminador do Estado, sendo que só há legitimação da criminalização se constituir meio necessário para a proteção do bem jurídico determinado.

O Direito Penal somente será utilizado se não existirem outros meios suficientemente eficazes para o controle social, senão a criminalização de atos é inadequada e não recomendável, argumentando ainda:

Se para o restabelecimento da ordem jurídica violada forem suficientes medidas civis ou administrativas, são estas que devem ser empregadas, e não as penais. Por isso, o Direito Penal deve ser a ultima ratio, isto é, deve atuar somente quando os demais ramos do Direito revelarem-se incapazes de dar a tutela devida a bens relevantes na vida do indivíduo e da própria sociedade. Como preconiza Maurach, “na seleção dos recursos próprios do Estado, o Direito Penal deve representar a ultima ratio legis, encontrar-se em último lugar e entrar somente quando resulta indispensável para a manutenção da ordem jurídica”. Assim, o Direito Penal assume uma feição subsidiária e a intervenção se justifica quando – no dizer de Muñoz Conde – “fracassam as demais formas protetoras do bem jurídico previstas em outros ramos do direito. A razão desse princípio – afirma Roxin – “radica em que o castigo penal coloca em perigo a existência social do afetado, se o situa à margem da sociedade e, com isso, produz também um dano social”.Resumindo, antes de se recorrer ao Direito Penal deve-se esgotar todos os meios extrapenais de controle social, e somente quando tais meios se mostrarem insuficientes à tutela de determinado bem jurídico justificar-se-á a utilização daquele meio repressivo de controle social”, (BITENCOURT, 2011, p. 43-44).

A citação acima trouxe vários pontos, sendo interessante frisar o significado da expressão ultima ratio legis, com base nesta citação, a qual dá ao Direito Penal o objetivo de atuar somente quando outro ramo do direito demonstra-se completamente ineficaz àquela finalidade, ou seja, incapaz de tutelar devidamente os bens relevantes da sociedade, tornando a aplicação do Direito Penal indispensável para manutenção da ordem jurídica, assumindo, dentro deste viés, “uma feição subsidiária”, já que o Direito Penal somente será aplicado quando outra área do direito é ineficaz para tal caso. Quando a intervenção estatal se faz necessária por meio do Direito Penal somente é justificável quando todos os meios extrapenais de controle social se mostrarem insuficientes à tutela deste determinado bem jurídico, daí então utilizar-se-á este meio repressivo de controle social, uma vez que, o castigo penal coloca em perigo a existência social do afetado, produzindo, de certa forma, um dano social. Através deste princípio adquire-se a consciência de que o Direito Penal irá tutelar bens jurídicos relevantes:

Princípio da intervenção mínima: a intervenção penal deve ser fragmentária e subsidiária. Isso é o que caracteriza o chamado Direito penal Mínimo. O princípio da intervenção mínima possui dois aspectos relevantes: (a) fragmentariedade; e (b) subsidiariedade. A fragmentariedadedo Direito penal significa, por sua vez, duas coisas: (a) somente os bens mais relevante dever merecer a tutela penal; e (b) exclusivamente os ataques mais intoleráveis é que devem ser punidos penalmente. [...] A tutela penal deve ser reservada para aquilo que efetivamente perturba o convício social. Em outras palavras, ao estritamente necessário [...]. (GOMES, 2004, p. 113)

Segundo Gomes (2004, p.114), somente quando outros ramos do Direito não solucionam de forma satisfatória os conflitos é que o Direito Penal deve tutelá-lo, sendo, portanto, o Direito Penal subsidiário, em suma, utilizado em ultimo ratio, desta forma, por força do princípio da intervenção mínima, o que acaba sendo proibido no Brasil é o Direito Penal Máximo, que nada mais é do que o abuso do Direito Penal para amenizar a ira da população.

Seguindo este viés realiza crítica René Ariel Dotti (2010, p. 106-107) no sentido de que, o princípio da intervenção mínima traz consigo o quão ineficaz é a “hipercriminalização”, rotineira criação de tipos que não satisfazem as exigências de proteção dos bens jurídicos fundamentais, Montesquieu já afirmava “esse número infinito de coisa que um legislador ordena e proíbe, tornando os povos mais infelizes e nada mais razoáveis”, assim como, Lao Tseu, Le Tao to King: “Quanto mais interdições e proibições houver,/mais o povo empobrece,/ mais se possuirão armas cortantes,/ mais desordem alastra,/mais se desenvolve a inteligência fabriqueira,/ mais estranhos produtos aparecem,/ mais se multiplicam os regulamentos,/ mais florescem os ladrões e os bandidos”, desta forma, conclui-se que o direito penal deve reservar sua penas para lesões graves, de relevância social.

 Desta forma percebe-se que o direito penal intervém somente nas situações em que se considera “relevante dever merecer a tutela penal”, devendo o poder Legislativo ter “critérios sólidos na elaboração da lei penal, elegendo apenas os bens jurídicos dignos de proteção pelo Direito Penal e que guardam estreita relação com a Constituição”. Estando, recepcionado pela Lei Maior, através do dispositivo 5º, § 2º “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Tendo como base o art. 8º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (Paris, 1789), que assegurou que as leis devem penalizar com sanções estritas e evidentemente necessárias, tudo com base nos dizeres de René Ariel Dotti (2010, p. 140-141).

Bitencourt faz uma grande crítica ao ordenamento penal partindo da premissa de que este princípio foi consagrado pelo Iluminismo, a partir da Revolução Francesa, sendo que, a partir da segunda década do século XIX, as normas penais incriminadoras cresceram desmedidamente, a ponto de alarmar os penalistas dos mais diferentes parâmetros culturais:

 Os legisladores contemporâneos – tanto de primeiro como de terceiro mundo – têm abusado da criminalização e da penalização, em franca contradição com o princípio em exame, levando ao descrédito não apenas o Direito Penal, mas a sanção criminal, que acaba perdendo sua força intimidativa diante da “inflação legislativa” reinante nos ordenamentos positivos. Hassemer, falando sobre um Direito Penal Funcional, particularmente sobre a moderna criminalidade, reflete: “nestas áreas, espera-se a intervenção imediata do Direito Penal, não apenas depois que se tenha verificado a inadequação de outros meios de controle não penais. O venerável princípio da subsidiariedade ou da ultima ratiodo Direito Penal é simplesmente cancelado para dar lugar a um Direito Penal visto como sola ratioou prima rationa solução social de conflitos: a resposta surge para as pessoas responsáveis por estas áreas cada vez mais frequentemente como a primeira, senão a única saída para controlar os problemas. (2011, p. 44)

Desta forma, conclui-se que o princípio da intervenção mínima, segundo a citação acima, esta perdendo sua essência, uma vez que o legislador não faz uso deste princípio ao tipificar condutas, fazendo com que o Direito Penal não seja visto como ultima ratio, mas ao contrário, como prima ratio, completamente invertida a solução dos conflitos trazida por este princípio, uma vez que este o Direito Penal é visto, ainda, como a única saída para a solução dos problemas.

1.2 Exclusiva Proteção dos Bens Jurídicos

O princípio da exclusiva proteção dos bens jurídicos, também chamado de princípio do fato, segundo o doutrinador Estefam, trata-se da tutela de bens jurídicos mais relevantes, quais sejam, “vida, integridade física, patrimônio, liberdade individual, liberdade sexual”, não para a “tutela da moral, de funções governamentais, de uma ideologia, de uma religião” (GOMES, 2004, p. 113).

Conforme Estefam, este princípio deriva do princípio da dignidade da pessoa humana, por ser o Brasil um Estado Democrático de Direito, com um enorme ordenamento jurídico, o qual deve possuir conteúdo e adequação social, acrescentando:

“Dele decorre que o direito penal não pode tutelar valores meramente morais, religiosos, ideológicos ou éticos, mas somente atos atentatórios a bens jurídicos fundamentais e reconhecidos na Constituição Federal. De acordo com ClausRoxin, “a proteção de normas morais, religiosas ou ideológicas, cuja violação não tenha repercussões sociais, não pertence, em absoluto, aos limites do Estado Democrático de Direito, o qual também deve proteger concepções discrepantes entre as minorias”. Pensamos que, a par da discussão sobre a finalidade do Direito Penal (se é de fato a proteção subsidiária de bens jurídicos ou a garanti da vigência da norma), normas que alberguem comportamentos puramente antiéticos, imorais ou pecaminosos, por serem incompatíveis com o Estado Democrático de Direito e violarem a dignidade da pessoa humana, são absolutamente inconstitucionais. (ESTEFAM, 2010, p. 121)

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Claus Roxin (apud Estefam, 2010, p. 121) faz uso de palavras chaves ao conceito deste princípio, quais sejam: “repercussões sociais”, ou seja, a exclusiva proteção ao bens jurídicos pretende proteger bens dos quais ao sofrerem violações sofrerão, por consequência, a repercussão social, que nada mais é do que um choque social.

Segundo Dotti (2010, p. 133), a Constituição Federal “indica os mais variados tipos de bens jurídicos materiais, morais e espirituais, a começar pela vida humana. Há bens materiais, como a propriedade, bens morais como a honra e bens espirituais como a liberdade e o lazer”, bens tutelados constitucionalmente, portanto, que ao serem violados “irradiam normas incriminadoras”, nas palavras de Dotti (2010, p. 133), p.e., matar alguém, caluniar alguém, artigos 121 e 138 do Código Penal.

Desta forma, conforme Regis Prado (2011, p. 146) “o pensamento jurídico moderno reconhece que o escopo imediato e primordial do Direito Penal reside na proteção dos bens jurídicos – essenciais ao indivíduo e à comunidade –, dentro do quadro axiológico constitucional ou decorrente da concepção de Estado de Direito Democrático”.

1.3 Princípio da Ofensividade

O princípio da ofensividade traz uma análise crítico ao ato praticado, o qual segundo Bitencourt (2011, p. 52), será tipificado materialmente somente se nele constar “perigo concreto, real efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido”, acrescentando que “a intervenção estatal em termos de repressão penal se houver efetivo e concreto ataque a um interesse socialmente relevante, que represente, no mínimo, perigo concreto ao bem jurídico tutelado”. Percebe-se que há mais um requisito, que é necessário frisar: que para ocorrer a intervenção estatal, por meio do Direito Penal, tem que ocorrer um ataque a algum interesse socialmente relevante.

Bitencourt (2011, p. 52), dentro deste viés, afirma que “são inconstitucionais todos os chamados crimes de perigo abstratos”, já que só há “infração penal quando há efetivo, real e concreto perigo de lesão a um bem jurídico protegido pela norma penal. Sem afetar o bem jurídico, no mínimo colocando-o em risco efetivo, não há infração penal”, neste contexto, esclarece Estefam:

Não há crime sem lesão efetiva ou ameaça concreta ao bem jurídico tutelado –nullum crimen sine injuria. Daí resulta serem inconstitucionais os crimes de perigo abstrato (ou presumido), nos quais o tipo penal descreve determinada conduta sem exigir ameaça concreta ao bem jurídico tutelado. Note-se, entretanto, que a jurisprudência dominante tende a admitir como válidos os delitos de perigo abstrato, por constituírem uma forma legítima de punição de infrações penais em sua fase embrionária (opinião com a qual concordamos). (2010, p. 120).           

Desta forma, têm-se aqui opiniões distintas sobre os crimes abstratos face o princípio da ofensividade. Mas, percebe-se que este princípio, conforme o doutrinador Bitercourt, tem objetivo de “servir de orientação à atividade legiferante” e “servir de critério interpretativo”:

O princípio da ofensividade no Direito Penal tem a pretensão de que seus efeitos tenham reflexos em dois planos: no primeiro, servir de orientação à atividade legiferante, fornecendo substratos político-jurídicos para que o legislador adote, na elaboração do tipo penal, a exigência indeclinável de que a conduta proibida represente ou contenha verdadeiro conteúdo ofensivo a bens jurídicos socialmente relevantes; no segundo plano, servir de critério interpretativo, constrangendo o intérprete legal a encontrar em cada caso concreto indispensável lesividade ao bem jurídico protegido, (2011, p. 52).

Portanto se torna necessário realizar análise deste princípio ao criar tipos penais, assim como para realizar a interpretação legal, no qual deverá constar lesividade, dividindo-se este princípio, em duas funções no Direito Penal:

Constata-se, nesses termos, que o princípio da ofensividade (ou lesividade) exerce dupla função no Direito Penal em um Estado Democrático de Direito: a) função político-criminal – esta função tem caráter preventivo-informativo, na medida em que se manifesta nos momentos que antecedem a elaboração dos diplomas legislativo-criminais; b) função interpretativa ou dogmática – esta finalidade manifesta-se a posterior, isto é, quando surge a oportunidade de operacionalizar-se o Direito Penal, no momento em que se deve aplica, in concreto, a norma penal elaborada. Nesse sentido, destaca com propriedade Luiz Flávio Gomes: “É função que pretende ter natureza ‘material’ e significa constatar ex post factum (depois do cometimento do fato) a concreta presença de uma lesão ou de um perigo concreto de lesão ao bem jurídico protegido”. Em outras palavras, a primeira função do princípio da ofensividade é limitadora do ius puniendi estatal, dirigindo-se especificadamente ao legislador, antes mesmo de realizar sua atividade-fim, qual seja, elabora leis; a segunda configura uma limitação ao próprio Direito Penal, destinando-se ao aplicador da lei, isto é, ao juiz, que é, em última instância, o seu intérprete final”. (BITENCOURT, 2011, p. 52-53)

Acrescenta, ainda, Bitencourt (2011, p. 52-53), que as funções político-criminais e a interpretação ou a dogmática, não são funções “incomunicáveis e inalteráveis, sempre com destinatários específicos, como mencionado acima”, elas são como o Direito, o qual tem que ser modificado conforme a necessidade da sociedade. Nesse viés, ele concretiza a lição exemplificando que caso o legislador tipificar condutas não estando nela o caráter ofensivo da mesma, esta ausência deverá ser suprida pelo intérprete, o qual usará princípios norteadores do Direito Penal para suprir esta omissão, neste caso, utilizará o princípio da ofensividade, com suas funções complementares:

O princípio da ofensividade não se confunde com o princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos, segundo o qual não compete ao Direito Penal tutelar valores puramente morais, éticos ou religiosos; como última ratio, ao Direito Penal se reserva somente a proteção de bens fundamentais para a convivência e o desenvolvimento da coletividade. A diferença entre ambos pode se resumida no seguinte: no princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos, há uma séria limitação aos interesses que podem receber a tutela do Direito Penal; no princípio da ofensividade, somente se admite a configuração da infração penal quando o interesse já selecionado (reserva legal) sofre um ataque (ofensa) efetivo, representado por um perigo concreto ou dano.” (BITENCOURT, 2011, p. 53-54)

Desta forma, percebe-se uma importante particularidade deste princípio, seu objetivo, qual seja: só haverá infração penal quando ocorrer ofensa, perigo concreto ou dano, a um interesse já tutelado, segundo Gomes (2004, 114), “o fato cometido, para se transformar em fato punível, deve afetar concretamente o bem jurídico protegido pela norma; não há crime sem lesão ou perigo concreto de lesão ao bem jurídico tutelado”, concluindo que não haverá crime se o ato realmente não causar ofensa. Deve haver, por parte do legislador abstenção “de tipificar como crime ações incapazes de lesar ou, no mínimo, colocar em perigo concreto o bem jurídico protegido pela norma penal. Sem afetar o bem jurídico, no mínimo colocando-o em risco efetivo, não há infração penal.” (BITENCOURT, 2012, p. 59).

1.4 Princípio da Fragmentariedade

Este princípio tem como fundamento o princípio da intervenção mínima e o da reserva legal, tendo o escopo de traçar limites ao legislador penal, estabelecendo que a proteção estatal tenha que ser direcionada a “valores imprescindíveis para a sociedade. Não se pode utilizar o Direito Penal como instrumento de tutela de todos os bens jurídicos”, (BITENCOURT, 2011, p. 44-45), acrescentando ainda:

Nem todas as ações que lesionam bens jurídicos são proibidas pelo Direito Penal, como nem todos os bens jurídicos são por ele protegidos. O Direito Penal limita-se a castigar as ações mais graves praticadas contra os bens jurídicos mais importantes, decorrendo daí o seu caráter fragmentário, uma vez que se ocupa somente de uma parte dos bens jurídicos protegidos pela ordem jurídica. Isso, segundo Régis Prado, “é o que se denomina caráter fragmentário do Direito Penal. Faz-se uma tutela seletiva do bem jurídico, limitada àquela tipologia agressiva que se revela dotada de indiscutível relevância quanto à gravidade e intensidade da ofensa”. (BITENCOURT, 2011, p. 44-45).

Em síntese, o Direito Penal limita-se a sancionar atos mais graves praticadas contra os bens jurídicos mais importantes, segundo Estefam (2010, p. 121) as normas penais somente devem se ocupar de punir aquelas condutas que violem de forma mais grave os bens jurídicos, ainda, aqueles bens jurídicos mais importantes. Neste sentido, acrescenta Bitencourt:

O caráter fragmentário do Direito Penal – segundo Muñoz Conde – apresenta-se sob três aspectos: em primeiro lugar, defendendo o bem jurídico somente contra ataques de especial gravidade, exigindo determinadas intenções e tendências, excluindo a punibilidade da prática imprudente de alguns casos; em segundo lugar, tipificando somente parte das condutas que outros ramos do Direito consideram antijurídicas e, finalmente, deixando, em princípio, sem punir ações meramente imorais, como homossexualidade ou a mentira. Resumindo, “caráter fragmentário” do Direito Penal significa que o Direito Penal não deve sancionar todas as condutas lesivas dos bens jurídicos, mas tão somente aquelas condutas mais graves e mais perigosas praticadas contra bens mais relevantes” (2011, p. 44-45).

Portanto, o princípio da fragmentariedade defende bens jurídicos mais relevantes que sofrem ataques graves, cabendo ao Direito Penal tipificar condutas das quais outros ramos consideram antijurídicas, excluindo das tipificações atos meramente imorais, como a mentira, atos declarados como pecado por igrejas, atos estes que são atos que desobedecem Deus, não criando repercussões sociais, tendo que o Estado intervir penalmente, p.e., a luxúria.

1.5 Subsidiariedade

Os princípios do Direito Penal Mínimo tem por objetivo limitar o poder punitivo do Estado, segundo Nucci (2011, p. 86), fazendo com que o direito penal não venha a “interferir em demasia na vida do indivíduo, retirando-lhe autonomia e liberdade. Afinal, a lei penal, não deve ser vista como a primeira opção  (prima ratio) do legislador para compor conflitos existentes em sociedade [...]”. Mais precisamente, este princípio deseja que o direito penal seja aplicado subsidiariamente (ultima ratio), conforme Nucci:

Há outros ramos do Direito preparados a solucionar as desavenças e lides surgidas na comunidade, compondo-as sem maiores traumas. O direito penal é considerado a ultima ratio, isto é, a última cartada do sistema legislativo, quando se entende que outra solução não pode haver senão a criação de lei penal incriminadora, impondo sanção penal ao infrator. Como bem assinala Mercedes García Arán “o direito penal deve conseguir a tutela da paz social obtendo o respeito à lei e aos direitos dos demais, mas sem prejudicar a dignidade, o livre desenvolvimento da personalidade ou a igualdade e restringindo ao mínimo a liberdade” (Fundamentos y aplicación de penas y medidas de seguridad em el Código Penal de 1995, p. 36). Caso o bem jurídico possa ser protegido de outro modo, deve-se abrir mão da opção legislativa penal, justamente para não banalizar a punição, tornando-a, por vezes, ineficaz, porque não cumprida pelos destinatários da norma e não aplicada pelos órgãos estatais encarregados da segurança pública. Podemos anotar que a vulgarização do direito penal, como norma solucionadora de qualquer conflito, pode levar ao seu descrédito e, consequentemente, à ineficiência de seus dispositivos. (2011, p. 87)

Portanto, o direito penal deve ser aplicado de forma subsidiária, uma vez existindo outras searas jurídicas, muitas vezes capazes de solucionar o litígio. Com isso o direito penal tem como particularidade a ultima ratio, que ao não ser aplicado acaba por banalizar as punições, levando a ineficácia dos dispositivos, para que ocorra o contrário deve-se abrir mão do uso da lei penal como meio sancionador de condutas que lesionam bem tutelados pelo ordenamento jurídico, para fazer uso dos demais ramos do direito, caso forem mais eficazes, se fracassarem, aí então cabe ao direito penal punir.

1.6 Princípio da adequação social

Luiz Regis Prado (2004, p. 154) afirma que o princípio da adequação social teve sua teoria concebida por Hans Welzel, segundo o qual “apesar de uma conduta se subsumir ao modelo legal, não será considerada típica se for socialmente adequada ou reconhecida, isto é, se estiver de acordo com a ordem social da vida historicamente condicionada”.

Acrescenta Bitencourt (2012, p. 55), que o princípio da adequação social assegura que haverá tipificações somente de condutas que há relevância social, uma vez que condutas “socialmente adequadas” não podem ser consideradas delitos, pois condutas “socialmente adequadas” não se revestem de tipicidade, devendo ocorrer, com isso, uma seleção de comportamentos a serem tipificados. Estefam, por este prisma, exemplifica o absurdo de se incriminar comportamentos socialmente adequados e úteis:

Imaginemos, por exemplo, uma norma que vedasse doações a pessoas carentes, impondo a quem a desrespeitasse pena de detenção. Não há como negar o absurdo em que esta norma resultaria. O legislador não pode agir de modo arbitrário, incriminando toda e qualquer conduta, sem critério algum. Por esse motivo, a tipificação de fato socialmente adequado deve ser repudiada e, dada sua incompatibilidade com o princípio da dignidade da pessoa humana, tida por inconstitucional, (2010, p. 121-122).

Frisa, ainda, que não é por que determinado ato é tolerado por determinado setor que ele será socialmente adequado, como ocorre com o jogo do bicho, o qual é tolerado por muitas pessoas, “ocorre que tal contravenção fomenta a criminalidade organizada, incentivaa corrupção de órgãos policiais e, na quase totalidade dos casos, vem associada com outros crimes, notadamente o porte ilegal de armas de fogo e o tráfico de drogas”. Desta forma, por mais que este ato seja aceito pela sociedade, “a indulgência com o qual muitos brasileiros encaram o jogo do bicho”, este fato jamais deverá influenciar na licitude deste jogo, uma vez “gritante a inadequação social”. (ESTEFAM, 2010, p. 122).

1.7 Princípio da Insignificância

O princípio da insignificância não está previsto explicitamente no ordenamento jurídico, cabendo as doutrinas de Direito Penal atribuir a insignificância um significado, desta forma leciona Lopes (2000, p. 23-24) que “a insignificância ou a bagatela representam idéias desprestigiadoras de algum objeto, no caso, de alguma forma amparada, protegida pelo Direito dentro de seu sistema [...]”, sendo que este desprestígio se manifesta através da desimportância que tal fato passa a receber, mesmo tutelado pelo ordenamento jurídico.

Afirma o autor Luiz Flávio Gomes (2013, p.19) que crimes de bagatela, infrações insignificantes expressam o mesmo sentido, o fato de ninharia, de pouca relevância, de insignificância. Nestes atos há ataque a bens jurídicos tutelados de forma, todavia de modo irrelevante, não necessitando da tutela penal, uma vez que não há justificativa para sua utilização em fatos realmente insignificantes, devendo, com isso, serem sancionados por meio das outras searas do direito, como o administrativo e o civil.

Com a aplicabilidade deste princípio, segundo Lopes (2000, p. 24) há uma “negativação do valor da coisa dentro do sistema positivo”, o que significa que ao “considerar algo insignificante é abrandar-lhe em tal proporção o seu valor, que a justificativa teórica que embasava o funcionamento do aparelho estatal para garantir-lo não mais subsiste, e ele é excluído do sistema jurídico”.

Interessante ainda, esclarecer, que não se confundem as noções dos Princípios Intervenção Mínima e Insignificância, uma vez que, mesmo sendo algumas lesões de relevância social, não há justificativa do Estado de intervir penalmente, sendo o ilícito possível de ser combatido na esfera civil ou administrativa, ainda, o primeiro visa “reduzir o número das normas incriminadoras”, o segundo, dirige-se “ao juiz no caso concreto, quando o dano ou o perigo do dano são irrisórios.”, conforme leciona Dotti (2010, p.142).

Para entender o princípio da insignificância, primeiramente deve se partir do pressuposto que, conforme o doutrinador Bitencourt (2012, p. 58), para que ocorra realmente o injusto penal, não deverá ocorrer apenas ofensa aos bens jurídicos protegidos, mas sim gravidade na lesão, gravidade na tipicidade penal. Acrescenta a este contexto, Lopes (2000, p. 38)., no sentido de que o princípio da insignificância é fundado em pressupostos éticos fundamentais do Estado Democrático, “proteção a vida e a liberdade humanas”, exigindo, com isso, a aplicação de penas em casos extraordinários, juridicamente relevantes, ocasionando um raciocínio superior juridicamente.

Conforme Luiz Regis Prado (2011, p. 156) “o princípio da insignificância é tratado pelas modernas teorias da imputação objetiva como critério para a determinação do injusto penal, isto é, como um instrumento para a exclusão da imputação objetiva de resultados”, ou seja, de forma mais clara, há a exclusão da tipicidade.

Leciona Lopes (2000, p. 24) que este princípio tem dois enfoques básicos e reciprocamente complementares, primeiramente ao aplicar este princípio exclui-se do sistema o que é irrelevante, sendo injustificável sua permanência, por sua vez o outro agrega a consequência de que se não há repercussão jurídica ou social que então não venha a ingressar no sistema legal, conforme Lopes, que acrescenta que “o primeiro adquire um sentido ou um caráter excluidor da falta de relevância jurídica das ações causadoras do delito, enquanto o segundo ganha uma notoriedade inibitória do ingresso dessas ações na esfera jurídica. Há um processo de seleção interno e outro externo ao sistema penal positivo da importância dos atos para a composição do crime”.

O princípio da insignificância, segundo Luiz Flávio Gomes (2013, p. 20-21), o conceito deste princípio não era bem definido, porém atualmente, com o análise de julgados da corte suprema, obtêm-se os critérios analisados para a incidência da insignificância no fato, quais sejam, a ausência de periculosidade social da ação, a mínima ofensividade da conduta do agente – “isto é: mínima idoneidade ofensiva da conduta”, inexpressividade da lesão jurídica causada, e a falta de reprovabilidade da conduta conceituando ainda, no sentido de que, este princípio pode ser aplicado em razão do puro desvalor da ação ou puro desvalor do resultado, ou a combinação de ambos.

Deve recair ao autor da conduta todas as sanções cabíveis, v.g., a civil que consiste na indenização, a administrativa que pode consistir na cassação ou suspensão da licença ambiental; não se justificando, em muitas situações, a aplicação do direito penal para sancionar atos (GOMES, 2013, p. 30), todavia o que “se espera do Direito Penal é que exerça um controle razoável da criminalidade”, (LOPES, 2000, p. 28); portanto, a fim de se controlar esta criminalidade, “a resposta jurídica a tal fato deve ser adequada, viabilizada como instrumento de controle social, deve ser ao mesmo tempo justa e útil” (LOPES, 2000, p. 29).

Partindo deste viés, conforme Lopes, a utilização do direito penal torna-se justa e útil quando se utiliza separação qualitativa dos delitos, um exemplo disso é a criação das infrações de menor potencial ofensivo, do art. 98, inciso I, da Constituição Federal, para diminuir um sistema procedimental específico de apuração daquilo que se poderia chamar de pequena criminalidade, ainda, como instrumento de justiça e utilidade do direito penal, o Princípio da Insignificância representa o instrumento de maior força do Direito Penal contemporâneo para correção dos desvios havidos na aplicação das leis penais ao longo do tempo. (LOPES, 2000, p. 29). Classifica, Gomes, as infrações penais, da seguinte forma:

(a) Infrações bagatelares (que não são puníveis, seja por força do princípio da insignificância [...]); (b) Infrações de menor potencial ofensivo (todas as contravenções e os delitos cuja pena máxima exceda a dois anos; todas essas infrações admitem as soluções consensuais da lei dos juizados); (c) infrações de médio potencial ofensivo (que admitem a suspensão condicional do processo – crimes cuja pena mínima não exceda um ano – ou as penas substitutivas – crimes culposos – todos – e crimes dolosos, salvo se cometidos com violência ou se  pena excede a quatro anos); (d) infrações graves (de alto potencial ofensivo, mas que não recebem a etiqueta de crimes  hediondos: exemplos: homicídio simples, roubo etc.); e (e) infrações hediondas (que estão regidas por um regime jurídico especial: Lei 8.072/1990, com as modificações posteriores decorrentes de outros diplomas legais). (GOMES, 2013, p. 57)

Com o estudo desta classificação, percebe-se que não se confundem os crimes de menor potencial ofensivo, com os crimes de bagatela, o fato de se ter escassa ofensividade ao bem tutelado conforme o princípio da insignificância, ficaria excluído do âmbito de incidência da tipicidade material, ou se tornaria desnecessária a aplicação da pena.Já as infrações de menor potencial ofensivo entram na esfera das decisões dos juizados especiais, que dependendo a cominação da pena podem sofrer a suspensão condicional do processo. Esta distinção se torna importante, uma vez que caso o fato seja de bagatela o procedimento correto é não dar início ao processo e sim o arquivamento da denúncia, ou absolvição sumária, com base no artigo 397, III, CP, (GOMES, 2013, p. 58).

A doutrina de Lopes (2000, p. 25)  trabalha a partir da premissa de que o princípio da insignificância ao ser aplicado sobre um fato típico tratado como irrelevante, acaba por arrasar a tipicidade material que se projeta sobre o injusto, não existindo mais crime, da mesma forma Gomes:

O fato insignificante (em razão da exiguidade penal da conduta ou do resultado) é formalmente típico, mas não materialmente. Importante recordar, por conseguinte que a tipicidade formal (composta da conduta, resultado naturalístico, nexo de causalidade e adequação do fato à letra da lei) já não esgota toda a globalidade da tipicidade penal, que ainda requer a dimensão material (que compreende dois juízos distintos: de desaprovação da conduta e de desaprovação do resultado jurídico). Nos crimes dolosos, como se sabe, ainda se exige uma terceira dimensão: a subjetiva (imputação subjetiva). Nossa corte Suprema adotou o posicionamento dogmático: o princípio da insignificância exclui efetivamente a tipicidade material (ou normativa): o STF reconheceu, em 29.04.2004 (novamente), a incidência do Direito Penal do chamado princípio da insignificância (ou de bagatela) (cf. Medida Cautelar concedida no HC 84.412-0-SP, rel. Min. Celso de Mello). (2013, p. 75)           

Por isso, com a aplicação do princípio da insignificância há a exclusão da tipicidade do fato, deixando o fato de ser materialmente típico, não bastando assim, que a conduta realizada tenha produzido o resultado naturalístico tipificado, crimes materiais, que haja nexo de causalidade, estes elementos são necessários, mas segundo Gomes (2013, p. 76), não são o suficiente, tem que estarem somados a desaprovação da conduta, desaprovação do resultado jurídico, ainda, nos crimes dolosos, requer a dimensão subjetiva, que são o dolo e outros requisitos subjetivos especiais.

Percebe-se, portanto, que não é necessária a aplicação de pena a qualquer ofensa de bem jurídico assegurado pela legislação. Porém cabe refletir se o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado que, como afirma a própria constituição federal, é essencial para a qualidade de vida, afasta a aplicação da insignificância penal.

Considerações finais

Analisou-se a incidência, o objetivo, de cada Princípio Informador do Direito Penal Mínimo, sendo eles, o da Intervenção Mínima, Adequação Social, Fragmentariedade, Ofensividade, Exclusiva Proteção dos Bens Jurídicos, e, notadamente, o Princípio da Insignificância. Princípios estes que tem como objetivo geral de limitar o poder estatal, com isso, o de fundamentar o Direito Penal.

Verificando-se que os Princípios Intervenção Mínima e Insignificância não se confundem, já que o primeiro visa reduzir o número das normas incriminadoras, já o segundo alcança os juízes nos casos concretos, quando estes têm dano ou perigo de dano irrisórios (DOTTI, 2010, p.142), ou seja, num apanhado geral os princípios do Direito Penal Mínimo têm como objetivo limitar o poder punitivo estatal, especificadamente, o princípio da insignificância incide conforme a gravidade da lesão, gravidade na tipicidade penal, que deverá ser analisada no caso concreto, excluindo a imputação objetiva (BITENCOURT, 2012, p. 58).

Concluiu-se a partir deste estudo que uma das titularidades do poder estatal é o de punir, o qual se dá por meio de um conjunto de normas eticamente assentadas, denominadas de Direito Penal, que objetivam o desenvolvimento da vida social; não sendo somente a esfera penal que se mostra eficaz, porém justificável para o mantimento da ordem e para assegurar o funcionamento do sistema, evitando que condutas que aflorem grandes perturbações para a existência e evolução do sistema social, cumprindo com as expectativas da sociedade, a qual se resume em diminuir a violência extrapenal, assumindo uma função de “autolimitação material a que se refere à intervenção punitiva” (LOPES, 2000, p. 94-96). 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. São Paulo: Saraiva, 2011. 4 v.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. São Paulo: Saraiva, 2012. 3 v.

DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 3. ed. rev., atual. eampl São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. 864 p.

ESTEFAM, André. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2010. 3 v.

GOMES, Luiz Flávio. Direito penal: parte geral: introdução. 2. ed., rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 316 p. (Manuais para concursos e graduação; v.1).

GOMES, Luiz Flávio. Princípio da insignificância e outras excludentes de tipicidade / Luiz Flávio Gomes. – 3. ed. rev. atual. eampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, 237 p. – (Coleçãodireito de ciências afins; v.1)

LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Princípio da insignificância no direito penal. 2.ed São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. v.2 (Princípios fundamentais do direito penal moderno )

PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. 3 v.

PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. 4.ed. rev., atual. e ampliada São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 

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Sobre a autora
Angélica Pereira Possamai

Advogada, Especialista em Direito Público.

Informações sobre o texto

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