Há pouco mais de uma década a imprensa ocidental comemorava o fato de que a Guerra Fria havia acabado. A URSS havia se desmantelado e seu arsenal de bombas nucleares foi em grande parte desativado. A base de escuta soviética aos EUA em Cuba foi abandonada. Apesar disto, os norte-americanos continuaram a expandir seus gastos militares, declararam guerra permanente ao terror (pretexto para conquista e ocupação permanente das áreas petrolíferas do oriente médio) e construíram um sistema de vigilância virtual global para espionar todo mundo o tempo todo em todos os lugares.
O sonho de construir regimes políticos vassalos com o uso de tropas, abandonado após a humilhante derrota no Vietnã, voltou à agenda da Casa Branca justamente após o fim da Guerra Fria. O Iraque e o Afeganistão foram invadidos e continuam parcialmente ocupados. O terrorismo político pró-americano é financiado pelos EUA no Norte da África, na Ucrânia e em qualquer lugar onde os EUA acreditem ter interesses geoestratégicos.
Uma tímida reação russa e chinesa à ameaça global norte-americana começou a se esboçar nos dois últimos anos. Acordos foram firmados entre Pequim e Moscou, reforçando relações diplomáticas e comerciais e reduzindo as desconfianças militares entre os dois países. Rússia e China seguem priorizando a construção do BRICS para confrontar os norte-americanos nos dois continentes em grande medida abandonados pelos EUA (África e América Latina).
Esta semana a Rússia anunciou a reativação da base de escuta em Cuba http://voiceofrussia.com/news/2014_07_16/Russia-regains-control-of-radio-facility-in-Cubas-Lourdes-base-5506/ . A atitude se justifica por dois motivos: 1) apesar das gestões diplomáticas brasileiras e alemãs na ONU, os EUA não desmantelou seu programa de espionagem global (a NSA continua coletando dados e gravando ligações de celular de todo mundo o tempo todo, inclusive de membros governos considerados simpáticos aos EUA); 2) a atitude hostil da OTAN em favor de Kiev nas proximidades da Rússia evocam temores de uma guerra não desejada pelo Kremlin, mas que não será evitada em caso de agressão direta ao território russo.
Os EUA estão gastando neste momento 1,5 trilhão de dólares em novos caças. A ambição imperial da Casa Branca e do Pentágono virou um pesadelo para os norte-americanos. Várias cidades dos EUA estão caindo aos pedaços e começam a ser rodeadas por favelas de barracas onde centenas de milhares de crianças norte-americanos passam fome e vivem abaixo da linha da pobreza sem assistência médica e acesso à educaçãohttp://economia.estadao.com.br/noticias/geral,pobreza-nos-eua-atinge-novo-recorde,164948e .
Enquanto o governo dos EUA prova que é possível fazer menos pelo povo com mais dinheiro para os militares, os BRICS anunciam a criação de um novo banco para fomentar projetos sociais com 50 bilhões de dólares iniciais. O bem estar das populações dos países que compõe o BRICS é algo mais valioso do que milhares de novos jatos de guerra e custa bem menos. Ao exemplo do desperdício de recursos fartos dado pelos EUA, o BRICS contrapõe o da utilização racional e econômica de recursos escassos. Os norte-americanos querem a guerra, os demais querem a paz.
A máquina de escrever é o símbolo mais emblemático desta nova Guerra Fria. Em razão da espionagem massiva realizada por norte-americanos com o uso da internet e de aplicativos de computador, fatos que foram denunciados por Snowden, a FSB (ex-KBG) mandou seus agentes voltarem a produzir relatórios utilizando máquinas de escrever. Para salvaguardar seus segredos os russos abandonaram os computadores em rede. O mesmo está sendo feito pelos alemães http://www.theguardian.com/world/2014/jul/15/germany-typewriters-espionage-nsa-spying-surveillance?commentpage=6 . A Casa Branca e o Pentágono acharam que poderiam tirar vantagem de uma tecnologia avançada se esquecendo que com uma tecnologia ultrapassada os russos e alemães deixariam todos, inclusive os norte-americanos espertalhões, às cegas.
Um Boeing 777 da empresa aérea Malaysia Airlines caiu na Ucrânia nesta quinta-feira http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/140717_live_aviao_malasia.shtml. Como convêm a quem está em guerra e a pretende ampliar, o regime nazista de Kiev imediatamente acusou a Rússia de ter derrubado o avião usando um míssil terra-ar. Hillary Clinton fez eco, acusando Putin de ter cometido uma atrocidade. Diversos jornais europeus e norte-americanos estamparam a notícia de um ataque russo criminoso ao avião civil. Especialistas negam, porém, que um míssil terra-ar pudesse derrubar um avião na altitude em que o Boing 777 estava voando. O avião da Malaysia Airlines somente poderia ter sido derrubado por um míssil ar-ar ou por um atentado terrorista. A verdade porém parece não interessar aos ucranianos e àqueles que acusam o Kremlin. O governo da Rússia nega qualquer envolvimento com o incidente e acusa os ucranianos de confundirem o avião da Malaysia Airlines com o avião presidencial de Putin (o qual eles eventualmente pretendiam derrubar). As múltiplas versões para o mesmo fato visando um aumento de tensão entre EUA e Rússia confirmam a existência de uma nova Guerra Fria. A quem ela interessa além dos fabricantes de armamentos?
Eu nasci durante a Guerra Fria, num mundo em que ambos os blocos queriam guerra. Cresci num bipolar que estava se desfazendo. E agora chego à maturidade num mundo que novamente se torna bipolar. Os EUA querem guerra ao custo do mal-estar de milhões de norte-americanos, os demais querem a paz e prosperidade para suas populações. Na primeira Guerra Fria não havia mocinhos e bandidos, todos eram bandidos. Nesta os mocinhos querem a paz e os bandidos seguem querendo guerra. O mundo ficou bem mais simples.