Os crimes contra a liberdade sexual e a hediondez do estupro

21/08/2014 às 10:17
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O referido trabalho faz abordagem ao tema, comparando a mudança da redação que define estupro e a sua necessidade de realização de perícias técnicas.

RESUMO

Os crimes sexuais por vezes não deixam rastros ou vestígios externos, sendo necessária a realização de perícias técnicas. Pretende-se demonstrar que o Brasil é um Estado Democrático e de Direito e, todo processo deve ser conduzido com a máxima cautela sem espaços para abusos ou omissões, pois nos leva a uma condenação ou uma absolvição, que pode significar um prejuízo de caráter irreversível. Neste tipo de abuso (sexual), geralmente não existem testemunhas, é preciso, além da palavra da vítima, a realização de levantamentos médicos e, quando não for possível a comprovação física de ato libidinoso ou conjunção carnal, exames psicológicos nas vítimas. Também, salienta-se a mudança da redação, onde atualmente também é considerado como estupro qualquer ato libinoso praticado, além de não possuir definição de gênero, podendo ser a vítima do sexo femino ou masculino.

PALAVRAS-CHAVE: Crimes Sexuais. Violência contra crianças. Ausência de vestígios físicos. Dano psicológico. Imprescindibilidade de perícia psicológica.

1.  INTRODUÇÃO

O atual Código Penal, datado de 1940, representou um avanço em relação às legislações anteriores empregando a terminologia “Crimes contra os Costumes ou Crimes Sexuais”. No entanto, apesar de toda evolução, não é privilégio da atualidade a atenção especial com menores vítimas de violência sexual. Pode-se afirmar que, com todas estas medidas legislativas, o número de crimes sexuais envolvendo crianças ainda é alarmante, requerendo do poder público uma atenção ainda maior.

As experiências vividas nessa fase serão refletidas na fase adulta, podendo decorrer sentimentos como medo, raiva e dor, o que irá se materializar, posteriormente, em forma de comportamento inadequado perante a sociedade.

Apesar de leis tão rígidas demonstrando o grau de reprovação social, os criminosos passaram a empenhar-se em não deixar vestígios aparentes em suas vítimas, praticando, assim, modalidades como atos libidinosos, conforme leciona Fonseca (2001, p. 148), que são atos que satisfazem a lascívia independente de cópula (podem ser masturbação, sexo oral, etc.) e insuscetíveis de comprovação pela perícia médica tradicional. Observa-se que grande parte dessas ocorrências acontecem entre quatro paredes, onde não há qualquer testemunha.

Desta feita, o número de impunidades tem crescido, pois abusadores têm sido absolvidos ante a falta de provas, haja vista a perícia psicológica, capaz de colher na vítima marcas do abuso, ter sido frequentemente desprezada. Não se pode esquecer, ainda, que parte das vítimas da violência sexual, são meninos abusados por mulheres, o que dificulta sobremaneira a coleta de vestígios corpóreos.

2.  CRIMES SEXUAIS

Os crimes sexuais ocupam importante espaço na legislação penal brasileira, sendo tratados nos Títulos IV, V e VI do Código Penal (CP), denominados “dos crimes contra os costumes”, do “lenocínio e do tráfico de pessoas” e “do ultraje público ao pudor”, respectivamente. Nesses tópicos do Código Penal são descritos vários capítulos, cada qual de acordo com a forma da violência sexual praticada. Sabe-se, no entanto, que nem todos os crimes sexuais estão previstos no Código Penal. Cita-se, como exemplo, os tipos penais dispostos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e na Lei de Contravenções Penais.

3.  CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL

3.1  Estupro

I - Estupro

Anteriormente era definido como: Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça.

Definição atualizada: Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.

Conforme a descrição anterior, apenas cometia estupro aquele que sujeitava a mulher, mediante violência ou grave ameaça, à conjunção carnal. Qualquer ato libidinoso diverso era considerado atentado violento ao pudor.

Nos dias de hoje, passa a ser estupro tanto a conjunção carnal quanto os atos libidinosos diversos. Verifique que o gênero da vítima não distingue o delito. Logo, o homem pode ser vítima do crime de estupro.

A pena mínima foi equiparada à do homicídio simples, ou seja, 06 (seis) anos de reclusão.

Art. 213.  Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

§ 1o  Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.

§ 2o  Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. 

Julga-se ser o estupro o mais grave dentre aqueles cometidos contra a liberdade sexual. Caracteriza-se pela conjunção carnal mediante violência. Quanto à figura fundamental, é necessário que haja a conjunção carnal, constrangimento mediante violência presumida, real ou grave ameaça.

Antes da Lei 12.015 de 2009, e segundo Tadeu Silva: “tutelava-se neste artigo, a autodeterminação ou a liberdade sexual da mulher, enquanto liberdade individual” e não somente sua integridade física. No que tange a liberdade dinâmica, a mulher tem o direito de escolher seu parceiro sexual e, da forma que achar mais conveniente, dispor de seu corpo e, em relação à liberdade estática é concretizada no direito de não ser envolvida passivamente em prática de um ato sexual sem seu desejo. Neste sentido, a prostituta também pode ser sujeito passivo de um estupro, caso seja obrigada a prática sexual contra a sua vontade.

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O nosso código penal previa que nesta modalidade criminosa, o sujeito passivo era sempre a mulher e o ativo, o homem. Já em outras legislações, como a italiana, é feita referência a ambos os sexos como possíveis vítimas de estupro.

Por fim, cabe ressaltar que o estupro é considerado crime hediondo.

Importante salientar que houve uma reunião do crime de estupro com atentado violento ao pudor, com isso, todo e qualquer ato libidinoso se transforma em estupro.

O art. 213, trás a denominação “estupro” para qualquer ato libidinoso que seja praticado através de violência ou grave ameaça, por isso, qualquer pessoa pode ser sujeito passivo ou ativo de um crime de estupro.

O referido artigo foi acrescido de dois parágrafos que somaram ao crime duas qualificadoras; se o crime for cometido contra maior de 14 anos e menor de 18 anos e/ou resulta lesão grave, e se resulta em morte.

3.1.1  A Hediondez do Estupro

Para dar um fim ao confuso artigo 1º, V, da Lei 8.072/90, a redação foi alterada para “estupro”, sem qualquer menção à cumulação com outro artigo.

O estupro de vulnerável também foi incluído entre os crimes hediondos.

Esse artigo visava proteger a liberdade sexual no que se refere à inviolabilidade carnal contra atos libidinosos violentos, podendo ser qualquer pessoa, de qualquer sexo, como sujeito passivo ou ativo, não sendo, portanto, um crime próprio, diversamente do estupro.

O artigo mencionava ainda o ato libidinoso diverso da conjunção carnal como elemento do tipo, ou seja, aquele diverso da relação sexual vaginal. Sendo assim o ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR passa a integrar o artigo 213 do CP. A Lei 12.015/2009 revogou integralmente o artigo 214 do Código Penal.

Foram feitas também, modificações consideráveis nos artigos 215 e 216-A, o art. 216 foi revogado, tendo sua redação agregada ao art. 215.

Violação sexual mediante fraude

Art. 215.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.

Assédio sexual

Art. 216-A. […] § 2o  A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos.

No art. 216-A trata de assédio sexual.

4. CONCLUSÃO

A partir das análises quantitativas, constata-se que crianças vítimas de abuso sexual sofrem transtornos psicológicos, passíveis de constatação por meio exame realizado por profissional devidamente habilitado.

Verifica-se, portanto, a obrigatoriedade dos profissionais envolvidos com a investigação criminal encaminharem crianças vítimas de violência sexual para a realização de exames psicológicos, sobretudo nos casos em que inexistem vestígios físicos, cumprindo o determinado no artigo 158 do código de processo penal que afirma que nas situações em que a infração deixar vestígios é imprescindível a realização de exame de corpo de delito e o dano psicológico nos crimes sexuais, reconhecidamente pela medicina forense, existem e são aferíveis.

5. REFERÊNCIAS

BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto-Lei N°3.689 de 03 de Outubro de 1941.

BRASIL. Código Penal Brasileiro Decreto-lei 2.848 de 7de dezembro de 1940.

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988.

CASTRO, Leonardo. A Reforma do Código Penal. Disponivel em http://advogadoleonardocastro.wordpress.com/2009/08/10/breves-comentarios-a-lei-12-0152009/. Acesso em 03 mar. 2014.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei Nº 8.069 de 13 de Julho de 1990.

LEI Nº 12.015, DE 7 DE AGOSTO DE 2009. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12015.htm. Acesso em 10 mar. 2014.

SILVA. Tadeu Antônio Dix. Crimes sexuais: reflexões sobre a Nova Lei nº 11.106/2005. São Paulo. J.H. Mizuno. 2006.

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