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Aspectos legais da ortodontia: da obrigação à responsabilidade

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3  CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos dias atuais muito se fala da responsabilidade civil dos cirurgiões-dentistas frente a uma possível ação judicial proposta pelo paciente. Com o aumento expressivo dessas ações, são até oferecidos no mercado os seguros de responsabilidade civil para profissionais liberais e pessoas jurídicas, com a finalidade de dar cobertura ao pagamento de indenizações devidas em processos judiciais.

Certamente não existe nenhum tipo de “blindagem” do profissional para evitar que seja alvo de qualquer processo judicial. Deve o prestador de serviços de saúde agir de acordo com o princípio da boa fé e respeitar o seu dever de informar ao paciente sobre todos os aspectos inerentes ao tratamento proposto, assim como qualquer intercorrência que ocorra durante o tratamento.

Todavia, se eventualmente o paciente entender que sofreu qualquer dano decorrente da atuação profissional, poderá acionar o prestador do serviço judicialmente. Este, então, poderá responder subjetivamente ou objetivamente, a depender da forma como presta do serviço e do entendimento jurisprudencial baseado na corrente doutrinária que sustenta seu posicionamento.

Desta forma, o profissional liberal possui maior margem para sua defesa quando sua responsabilidade civil é subjetiva, pois tem maior capacidade de argumentação e pode se valer de mais teses de defesa em comparação àquele que atua com responsabilidade objetiva. Consequentemente há um maior risco financeiro quando a prestação do serviço odontológico é feita através de uma pessoa jurídica.

Deve-se destacar que a natureza da obrigação dos ortodontistas não é determinada pela vontade das partes, é sim uma característica intrínseca da obrigação.

Quando a obrigação for considerada de meio, não se pode exigir que o profissional liberal alcance o resultado por uma questão de impossibilidade total. Todavia, é importante destacar que se o profissional liberal oferecer a obtenção de um determinado resultado com o intuito de induzir o consumidor a realizar o contrato, estará vinculado à oferta e, por consequência, deverá cumprir o acordado sob pena de suportar o ônus do inadimplemento.

Ressalte-se que o dever de informação é fundamental na relação contratual em questão, o que vai ao encontro do princípio constitucional do direito à informação.

Quando a obrigação for considerada de resultado, esta característica não poderá ser alterada para obrigação de meio através de cláusula contratual, contudo, no silêncio do contrato, cabe à parte interessada argumentar os posicionamentos doutrinários aceitos para cada caso concreto. Significa dizer que existem posicionamentos doutrinários divergentes em relação à classificação de certas obrigações, se de meio ou de resultado.

Todavia, é válida cláusula contratual que determina quais resultados estão sendo pactuados no contrato de prestação de serviços. O profissional liberal poderá se eximir de obter determinados resultados, desde que estes estejam discriminados no contrato e devidamente informados ao consumidor. Este, por sua vez, deverá cumprir com todos os seus deveres contratuais e contribuir para a obtenção do resultado sob pena de dar causa ao inadimplemento.

Como visto, para a constatação de que a obrigação assumida pelo ortodontista é considerada de meio ou de resultado se faz necessário uma análise criteriosa de cada caso concreto, e somente após, poderá ser determinado a quem pertence o ônus da prova da culpa pelo inadimplemento contratual.

Certamente que a classificação das obrigações de meio ou de resultado não pode basear-se unicamente nos interesses das partes contratantes. Para o consumidor será sempre desejado um resultado mais promissor, ou seja, um resultado que lhe ofereça maior proveito da relação contratual.

De outro lado o fornecedor busca cumprir plenamente com o contrato, uma vez que seu ofício se resume na busca pela excelência na conclusão do serviço, fato que torna o profissional liberal destacado no mercado de consumo.

Neste cenário, surge a necessidade de se classificar a obrigação assumida pelo fornecedor, se de meio ou de resultado. Ressalte-se que em regra não se exige o resultado do médico pela simples razão de que ele não pode curar a todos. Por outro lado, se exige o resultado do profissional que tem total controle sobre os meios necessários à obtensão dos fins almejados.

Desta forma, é preciso que se desenvolva um método científico orientador do operador do direito no sentido de ponderar os interesses em análise, para que se tenha maior segurança jurídica nas relações contratuais que envolvam obrigações de meio ou de resultado.

Para tal, há a necessidade de distinção entre as várias escalas ou níveis de controle dos meios utilizados pelos fornecedores para obter o resultado. Se o fornecedor não possuir total controle sobre tais recursos, ou seja, uma vez que o consumidor tenha necessariamente que contribuir ativamente durante a execução do serviço, sendo imprescindível sua conduta para a obtenção do resultado, tal obrigação deve ser classificada como de meio.

Por outro lado, apenas quando o fornecedor possuir controle exclusivo sobre os meios necessários ao alcance do resultado pactuado, é que se poderá determinar que sua obrigação seja de resultado.


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Notas

[1] Jornal do Conselho Federal de Odontologia, Ano 21, Nº 106, jan-fev-mar de 2013. Disponível em : http://cfo.org.br/jornal/jornal-anteriores/edicao-n%C2%BA-106/

[2] ALCÂNTARA, Christian Mendez. LOPER, Alexandre Augusto. Vantagens fiscais da formação de sociedades civis de prestação de serviços odontológicos, Acesso em 06 de agosto de 2012. http://www.jornaldosite.com.br/arquivo/anteriores/christian/christian3.htm

[3] Jornal Correio Associação Brasileira de Odontologia, Seção de Minas Gerais, ed. 279, Pessoa física X pessoa jurídica, http://abomg.no-ip.com/abo/(S(cfh5iyyg5gpos3xzxcrke3go))/noticia.aspx?ID_NOT= 8 , acesso em 12/10/2012.

[4] Código de Defesa do Consumidor, art. 14, § 4º: A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

[5] DE PAGE apud CAVALIERI FILHO, Sérgio, Programa de Responsabilidade Civil. 9ª ed. Revista e ampliada, São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010, pág. 29.

[6] Coelho, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial: Direito de empresa, 20º ed. rev. atual. São Paulo, Saraiva, 2008. Págs. 116 e 117.

[7]- REsp 236708/MG, Rel. Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ FEDERAL CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 10/02/2009, DJe 18/05/2009.

[8] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 9ª ed. Revista e ampliada, São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010, pág. 396.

[9] RECURSO ESPECIAL Nº 1.238.746 - MS (2010/0046894-5) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, Brasília (DF), 18 de outubro de 2011(Data do Julgamento).

[10] Superior Tribunal de Justiça, 3ª T., REsp 122.505/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Acórdão de 04/06/1998, v. u., Diário da Justiça, Brasília, 24/08/1998.

[11] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 9ª ed. Revista e ampliada, São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010, pág. 400.

[12] ALMEIDA, Álvao Henrique Teixeira, Breves apontamentos a respeito da responsabilidade civil dos cirurgiões-dentistas, NIGRE, André Luis [organizador]. A Odontologia à Luz do Direito. Rio de Janeiro: Rubio, 2012.

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BARRETO, Luiz Carlos Neto Pacheco. Aspectos legais da ortodontia: da obrigação à responsabilidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4227, 27 jan. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31227. Acesso em: 24 abr. 2024.

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