Historicamente, o Direito foi marcado pela segregação dos diferentes. Assim se deu no apogeu dos regimes Nazi – Fascista e do Apartheid. As diferenças religiosas, mentais, raciais, sexuais e culturais sempre foram consideradas mecanismos fortes de exclusão e rejeição social.
O Direito endossou, ao menos em alguns momentos, e de forma obliqua e velada, essa postura de exclusão de parcelas sociais e do próprio fato social. Vale, neste tocante, mencionar a construção Kelsiana, para quem a norma deveria rejeitar qualquer influência externa ao Direito, desconsiderando aspectos sociais, axiológicos, históricos, culturais, filosóficos ou psicológicos na distribuição da lei.
Diz, seu positivismo, que o ordenamento jurídico tem como fonte precípua a Norma Hipotética Fundamental. Desta perspectiva, o Direito seria, puramente, uma operação lógica de aplicação da lei.
Data Venia, o Direito, em sua gênese, é composto pela experiência histórica assistida e pela necessidade social sentida. Entendimento diverso negaria a sua própria função social, ao longo da inexorável evolução da humanidade. Logo, se a sociedade evolui, o Direito deve buscar atender aos novos anseios humanos gerados, sob pena de se tornar estático, anacrônico, defasado e segregador.
Indo ao tema, pode – se asseverar que a Psiquiatria, hoje, revela – se imprescindível à construção e à exegese da normativa. Vive - se tempos de loucos, em que a regra é a anormalidade. A normalidade é vista como rara exceção, ao menos em face do extenso rol de doenças mentais compiladas no Código Internacional de Doenças (CID - 10).
Neste contexto, fácil perceber que o formalismo e a axiologia do Direito (punitivo, por essência) devem dialogar com a informalidade, com o espírito reflexivo e compreensivo da Psicologia e da Psiquiatria (restaurativos, por natureza).
Considerar as vicissitudes mentais no momento da elaboração e interpretação normativa contribui, sobremaneira, para a humanização das Ciências Jurídicas, para o cumprimento da função da pena, que não só prevê o punir, como também o ressocializar. Atende – se, ainda, o Próprio Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, de índole Constitucional, e os Direitos da Personalidade, inseridos no texto civil.
Em tempos de “loucos de todo gênero”, da expansão da psiquiatria na descoberta e no tratamento de moléstias mentais, seria, no mínimo, um contrassenso, empregar o velho modelo de segregação manicomial ou de reclusão em cárcere, no caso de delitos praticados por agentes “insanos”, sem “juízo crítico” ou “discernimentos”.
Não que o “louco” não deva cumprir reprimendas pelo seu desajuste social. Mas, se realmente, o foco for reinseri - lo na teia social, mister que se traga o avanço médico em seu benefício.
Mira – se, com isso, resgatar o ser humano adoecido, ao revés de lhe dispensar tratamento desumano e desapropriado, recolhendo – o em meio a verdadeiros criminosos.
Tal leitura – (a da “loucura” e a do “louco”) - deve ser feita com parcimônia, cum grano salis, casuisticamente, por profissionais capacitados (em regra, em equipe), de sorte a elidir injustiças e o excesso de “psiquiatrismo”.
Assim, dar – se – á “a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, em um autêntico gesto de adequação da norma e distribuição da justiça.