Presença do acusado no processo administrativo militar

27/08/2014 às 21:53
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A Constituição Federal de 1988 assegurado a todos aos acusados e aos litigantes em geral a ampla defesa e o contraditório e uma decorrência destes princípios é a presença efetiva do acusado no processo administrativo militar

O Poder Legislativo por força da Constituição Federal de 1988 é o poder responsável pela elaboração das leis, que devem ser gerais e possuírem eficácia e normatividade. Mas, o Poder Executivo, por meio da chamada função atípica, também pode legislar, e é o que ocorre com as denominadas Leis Delegadas e as Medidas Provisórias, que possuem força de lei até serem apreciadas pelo Congresso Nacional. Não existe ainda nenhuma Emenda Constitucional no sentido de rever o art. 62 da CF, que trata desta prerrogativa concedida ao Presidente da República, definindo os conceitos de relevância e urgência.

Deve-se observar, que cada espécie de lei prevista no art. 59, da CF, possui um processo próprio de formação, ou seja, conforme a lei a ser elaborada se adotará um quorum determinado para a sua votação. Nenhuma das leis existentes no sistema jurídico poderá estar em desconformidade com a Constituição Federal, que é a lei fundamental que rege a vida das pessoas no Estado de Direito.

A lei existe para ser observada, e a sua desobediência leva ao crime, à realização de atos ilícitos, ao desequilíbrio social, e muitas vezes ao caos, que poderá trazer sérias consequências para a sociedade. As Instituições não são uma mera ficção, elas existem para serem respeitadas, seja na esfera administrativa, civil ou militar, pois todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer espécie.

A CF de 1988 modificou o direito administrativo militar que até então existia, e que, em determinadas situações, sujeitava o militar a possíveis atos arbitrários. Na atualidade, ainda existem certos julgamentos subjetivos que contrariam as provas dos autos, e buscam apenas a manutenção da disciplina e da hierarquia, que são os fundamentos de uma Corporação Militar. Mas a hierarquia e a disciplina pressupõem antes de tudo o cumprimento das disposições legais, principalmente as garantias fundamentais.

Uma das garantias asseguradas ao cidadão, seja na esfera administrativa (militar ou civil) ou judicial, é ser julgado com justiça, com imparcialidade, sob pena da existência do arbítrio, do abuso de poder, onde a lei torna-se apenas um instrumental, ou muitas vezes, a observância de formalidades para legitimar o ato punitivo.

A responsabilidade existe, as pessoas erram, cometem ilícitos, e devem ser punidas. A democracia também pressupõe a punição exemplar daqueles que violam a lei, mas esta punição deve estar em conformidade com o sistema que foi escolhido a partir do momento em que se abandonou a autotutela, e se elegeu o Estado como o legítimo representante da vontade popular.

O advogado, no processo administrativo militar, existe não para ser mera figura decorativa, sujeitando-se às vontades ou aos humores do julgador. A sua presença é essencial à administração da justiça, e mesmo nos julgamentos administrativos esta garantia se faz presente em atendimento ao art. 5o, inciso LV, da CF. O mesmo ocorre com o acusado que tem o direito de comparecer a todos os atos processuais, sejam eles de oitiva de testemunhas de acusação, ou de defesa, ou para a realização de diligências relacionadas ao processo. A sua ausência às audiências é motivo para a nulidade do ato.

Alguns julgadores administrativos, por falta de conhecimento das regras processuais, que informam o processo administrativo militar, costumam intimar apenas o advogado para a realização do ato processual, como se o acusado fosse dispensável. A administração pública tem intimado o militar apenas no momento da aplicação da pena, quando este poderá ser levado ao cárcere para o seu cumprimento, em regime de detenção.

Quando não se adota o procedimento de intimar apenas o advogado, os julgadores da administração militar intimam apenas o acusado para a realização do ato processual, que por ordem emanada de autoridade militar deverá intimar, seu procurador, ordem esta que fere os preceitos previstos na Constituição Federal, e as garantias asseguradas ao advogado no Estatuto da Advocacia.

O advogado deve ser formalmente intimado para todos os atos do processo administrativo, em atendimento aos princípios da ampla defesa, e do contraditório. O procurador do acusado não é intimado por telefone, ou por comunicação feita por seu constituinte, em atendimento à ordem da autoridade. Esse profissional deve ser intimado por meio do Diário Oficial, ou, quando muito, de forma pessoal por um dos integrantes da administração pública militar à qual pertence o acusado.

O militar, no processo administrativo, não é mero objeto de investigação, ele é sujeito de direitos, uma vez que a CF assegura aos acusados em processo judicial ou administrativo a ampla defesa e o contraditório. Nesse sentido, todo ato processual a ser realizado no processo administrativo deve ter a presença do advogado, e do acusado, regularmente intimados, sob pena de nulidade do ato.

Assim, o acusado, como ocorre no processo penal, poderá deixar a sala de audiências caso seja requerido pela testemunha, que se sinta constrangida por algum motivo de depor na sua presença. Nesse caso, constará do termo o pedido formulado pela testemunha, e a retirada do acusado da sala de audiência. Excetuada esta situação, nas demais hipóteses, o acusado deve estar presente a todos os atos processuais.

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O processo administrativo militar precisa ser aprimorado para se evitar atos ilegais, pois o processo não pertence a ninguém, sendo apenas e tão-somente um instrumento de efetiva aplicação da Justiça. Na ausência de provas que demonstrem a culpabilidade do acusado, aplica-se o princípio in dubio pro reo.

Não se pode permitir que o advogado sofra violações em seus direitos que estão previstos na Lei Federal no 8.906/94, como, por exemplo, ser impedido de ter acesso aos autos. O advogado é um profissional responsável, e não costuma perder os autos, e o acusado não pode ter os seus direitos cerceados, pois se faz representar por meio de profissional técnico.

É importante se observar, que a maioria dos administradores militares tem se pautado pela efetiva aplicação dos preceitos constitucionais, e o respeito aos advogados e seus constituintes, sendo que os abusos de autoridade são uma exceção, muitas vezes, por falta de conhecimento da lei, ou de efetivo preparo para atuar nos processos administrativos.

O direito administrativo militar abrange um grande número de servidores públicos, que são integrantes das Forças Armadas, e Forças Auxiliares, possuindo reflexo junto à população, em decorrência da responsabilidade civil do Estado prevista no art. 37, § 6o, da CF.

A ausência do acusado nos atos processuais realizados pela administração pública militar é motivo para a nulidade do ato, que deve ser reconhecida pelo Poder Judiciário, em atendimento ao art. 5o, inciso XXXV, da CF. Este Poder possui legitimidade para adentrar no mérito do ato administrativo, uma vez que o Brasil adotou o sistema de jurisdição una, contrariando o sistema vigente na França.

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Sobre o autor
Paulo Tadeu Rodrigues Rosa

DOM PAULO TADEU RODRIGUES ROSA é Juiz de Direito Titular da 2ª Unidade Judicial da Justiça Militar do Estado de Minas Gerais, Mestre em Direito pela UNESP, Campus de Franca, e Especialista em Direito Administrativo e Administração Pública Municipal pela UNIP. Autor do Livro Código Penal Militar Comentado Artigo por Artigo. 4ª ed. Editora Líder, Belo Horizonte, 2014.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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O artigo tem por objetivo demonstrar que o direito administrativo disciplinar militar deve estar em conformidade com as normas que foram estabelecidas pela Constituição Federal de 1988.

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