5. Conclusões
É marcante na Constituição Federal de 1988 a intenção do constituinte em ressaltar a importância da proteção do patrimônio cultural nacional, indicando a obrigação do Estado em garantir o pleno exercício dos direitos culturais, bem como, garantir o acesso às fontes da cultura nacional.
A participação da comunidade nos atos de proteção do patrimônio cultural pode ocorrer por duas formas: a primeira, pela participação da comunidade organizada nos conselhos de cultura e nos organismos que decidem os objetos material ou imaterial a serem preservados; a segunda é traduzida pela utilização de mecanismos legais, tais como a ação popular para coibir os atos políticos que ponham em riscos os valores de importância cultural definido pela coletividade.
A Constituição Federal de 1988 evoluiu em comparação as anteriores e definiu com forte delimitação a importância da preservação do patrimônio cultural considerando, inclusive, passível de punição, os danos e ameaças ao patrimônio cultural.
O significado da proteção do patrimônio cultural pelo poder local e a sua importância para a implantação da Democracia Constitucional é marcada pela possibilidade maior, por parte do Município, de preservar a identidade cultural do povo e alcançar o sentimento do povo.
Não é pacífico o entendimento que tenha o Município competência legislativa para editar normas de proteção ao meio ambiente, incluindo, neste caso as de proteção ao patrimônio cultural.
A possibilidade do município legislar sobre normas de proteção do patrimônio cultural está contida no artigo 30, I, da Constituição Federal quando afirma que compete ao Município legislar sobre matérias de interesse local.
O interesse que a Constituição, em seu artigo 30, I, assegura como competência legislativa do município é aquele que diz respeito aos aspectos peculiares, próprios daquela coletividade.
No tocante a normas de proteção ambiental, especialmente, as de proteção ao patrimônio cultural, é possível a sua edição baseada no princípio da autonomia municipal.
No entanto, tais normas somente poderão ser editas e, assim, não ferir a repartição constitucional de competências, quando o objeto a ser protegido seja de interesse restritamente local. Caso contrário, sendo o objeto a ser protegido de interesse, pelo menos regional, falece competência do Município para editar normas de proteção.
A lei 10.257/2001 faz duas referências ao direito de construir. A primeira no artigo 28, quando possibilita a outorga onerosa do direito de construir e a segunda, no artigo 35, quando oferece a possibilidade da transferência do direito de construir para ser alienado ou exercido em outro local diferente do imóvel.
As duas hipóteses do exercício do direito de construir fora do imóvel são exceções ao princípio de que o direito de construir esteja fundamentado no direito de propriedade e dele seja inerente.
A utilização da outorga onerosa do direito de construir exige, dentre outros critérios de ordem legal, a necessidade de contraprestação por parte do beneficiário.
A outorga do direito de construir compete ao Município.
A transferência do direito de construir é a prerrogativa do proprietário de imóvel urbano, privado ou público, de exercer em outro lugar, ou ainda de alienar, o direito de construir previsto no plano diretor ou em legislação urbanística específica desde que o imóvel de sua propriedade seja necessário para fins de interesse público.
Há diferenciações entre o instrumento da outorga onerosa do direito de construir e a transferência do direito de construir. No primeiro, o interesse é do particular que deseja vender o seu direito de construir ao município por não ter interesse em utiliza-lo e, por outro lado, o interesse do beneficiário em adquirir o direito de construir além do seu coeficiente de aproveitamento. Nesta hipótese não existem circunstâncias específicas que interesse ao município a aquisição do direito de construir do particular. O interesse é do administrado que deseja utilizar-se de coeficiente de aproveitamento superior ao permitido pelo plano diretor. No segundo, a transferência de direito de construir se dará como forma de ressarcimento ou incentivo a participação do administrado nas hipóteses da necessidade de utilizar o imóvel na promoção de interesses coletivos.
A determinação política do município em regulamentar, por meio de lei municipal, o instituto da transferência do direito de construir, é possível dentro da autonomia municipal, sem ferimento a repartição constitucional de competências, quando se tratar de objetos cujo interesse de preservação seja eminentemente local e para preservar a identidade cultural do município.
A transferência do direito de construir poderá ser a solução eficiente para a efetivação do tombamento com o afastamento da alegativa de prejuízos e a cessação das condutas criminosas de destruição das obras, muitas vezes as escondidas, outras com a participação omissiva do poder público.
6.Bibliografia
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7. Notas
1. FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil, Rio de Janeiro, UFRJ/IPHAN, 1997, página 30.
2. BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional da Democracia Participativa por um Direito Constitucional de luta e resistência, por uma Nova Hermenêutica, por uma repolitização da legalidade, São Paulo, Editora Malheiros, 2001, páginas 230-234.
3. SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais, 1ª. edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1968, páginas 81-94.
4. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 4ª. edição, São Paulo, Editora Malheiros, 1993, páginas 273/274.
5. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 4ª. edição, São Paulo, Editora Malheiros, 1993, página275.
6. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 4ª. edição, São Paulo, Editora Malheiros, 1993, página 275.
7. BUENO, Pimenta. Direito Público brasileiro e análise da Constituição do Império, Rio de Janeiro, [s.n] [1850?], página 317.
8. SAMPAIO DÓRIA, Antônio Roberto. Autonomia dos Municípios. Revista da Faculdade de Direito de São Paulo, v. 24, página 423.
9. QUINTANILHA, Ellen de Castro. Ensaio sobre competência do município para legislar sobre meio ambiente, Boletim de Direito Muncipal, São Paulo, jan.1990, página 37.
10. MACHADO, Paulo Leme. Direito Ambiental, 7ª. edição, São Paulo, Editora Malheiros, 1999
11. MUKAI, Toshio. Legislação, meio ambiente e autonomia municipal. Estudos e Comentários RDP, vol. 79,, página 131.
12. RODRIGUES, José Eduardo Ramos. Tombamento e patrimônio cultural. In: BENJAMIN, Antônio Hermem V. (Coord). Dano ambiental, prevenção, reparação e repressão, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1993, página 184-185.
13. SILVA, José Afonso da. Ordenação Constitucional da Cultura, São Paulo, Editora Malheiros, 2001, página 43.
14. GOMES, Orlando. O direito de superfície. Revista Jurídica, No. 119, Rio de Janeiro, 1972, paginas 35-41.