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Requisição de servidores para a Justiça Eleitoral

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            Código Eleitoral, art. 365 e Resolução TSE nº 20.753/00, art. 1º - "O serviço eleitoral prefere a qualquer outro, é obrigatório e não interrompe o interstício de promoção de funcionários para ele requisitados."

            Dentre os vários problemas enfrentados pela Justiça Eleitoral, responsável pela fiscalização e realização das eleições com segurança e eficiência, destacamos as amarras orçamentárias e o reduzido número de servidores, o que obriga esta Justiça Especializada a requisitar servidores de outros órgãos federais, estaduais ou municipais, para completar o quadro de colaboradores necessários à realização dos pleitos democráticos, em cumprimento aos prazos do calendário eleitoral.

            Atualmente, a requisição de servidores para a Justiça Eleitoral está prevista no Código Eleitoral, Lei n.º 4.373/65, art. 30, inciso XIV, no Regime Jurídico dos Servidores Públicos Federais, Lei nº 8.112/90, art. 93, inciso II, e regulamentado pela Lei Especial nº 6.999/82, e pelas Resoluções do TSE nº 20.753/00 e 20.959/01 (PA 18.701/01).

            Não obstante, o art. 1º, inciso I, do Decreto nº 4.050, de 12 de dezembro de 2001, que regulamenta o art. 93, da Lei 8.112/90, define o instituto da requisição como "ato irrecusável, que implica transferência do exercício do servidor ou empregado, sem alteração da lotação no órgão de origem e sem prejuízo da remuneração ou salários permanentes, inclusive encargos sociais, abono pecuniário, gratificação natalina, férias e adicional de um terço".

            Considerando as dificuldades enfrentadas pelos órgãos da Justiça Eleitoral brasileira, em decorrência do pequeno quadro de servidores efetivos, e com fundamento na legislação acima citada, entendo que o serviço eleitoral é obrigatório e imprescindível à segurança das instituições democráticas, portanto, inescusável.

            O servidor não pode se recusar a prestar o serviço para o qual foi requisitado e, para tanto, a Lei 6.999/82, art. 9º, garante-lhe a manutenção de todas as vantagens inerentes ao exercício de seu cargo efetivo. Pelos mesmos fundamentos jurídicos, a repartição de origem do servidor não pode recusar sua cessão, tampouco suprimir-lhe qualquer vantagem ou benefício.

            Mesmo assim, em que pese o relevante interesse público do serviço eleitoral, muitos servidores requisitados têm enfrentado constrangimentos patrocinados por seus órgãos de origem, ocasionado pela insensibilidade de alguns Administradores Públicos, que pressionam pelo imediato às suas atividades laborais normais, inclusive retirando direitos, gratificações, benefícios sociais como auxílio alimentação, auxílio creche, auxílio transporte, etc.

            Preocupado com esta situação, o Tribunal Superior Eleitoral, julgando o PA nº 18.701/01, Resolução nº 20.959/01 - TSE, de 19 de dezembro de 2001, suspendeu os efeitos do art. 7º, parágrafo único e do art. 14, da Resolução TSE nº 20.753/00, até 30 de junho de 2003, entendendo pela impossibilidade de devolução imediata dos servidores requisitados a seus órgãos de origem, após decorrido o prazo normal de requisição.

            O art. 14 da Resolução nº 20.753 do TSE determinava que as requisições seriam por prazo certo e não excedentes de um ano. Com a suspensão da eficácia deste dispositivo normativo, a Justiça Eleitoral não está mais obrigada a devolver os servidores requisitados após ultrapassado o prazo de requisição, pelo menos até 30 de junho de 2003, como ficou decidido.

            Com efeito, dada a proximidade e magnitude do pleito eleitoral vindouro, seria inconveniente e inoportuno devolver aos órgãos de origem, de imediato, os servidores atualmente requisitados.

            Ad argumentandum tantum, trazemos à baila os argumentos esclarecedores da Ministra Ellen Gracie, em seu voto de vista proferido no julgamento da Resolução nº 20.959/01 (Processo Administrativo nº 18.701), ao justificar a impossibilidade de devolução dos servidores requisitados e a necessidade de ampliação do quadro efetivo de servidores da Justiça Eleitoral, in verbis:

            "(...) a uma porque já se encontram familiarizados com o serviço; a duas, porque despenderia tempo proceder a requisição de novos servidores e, ainda treiná-los para o pleito vindouro (...)."

            Na qualidade de servidor efetivo desta Justiça Especializada, lotado na Seção de Legislação e Normas do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, tive oportunidade de emitir informações em vários processos do interesse de diversos órgãos públicos, solicitando devolução de seus servidores.

            Ciente das dificuldades enfrentadas pela Justiça Eleitoral, resolvi tornar públicas algumas considerações, na tentativa de sensibilizar os Administradores Públicos sobre a realidade do problema.

            No contexto da atual democracia brasileira, a Justiça Eleitoral atua no planejamento e coordenação das eleições, treinamento dos servidores que trabalham efetivamente na recepção e apuração dos sufrágios, controle e fiscalização da propaganda partidária, antes do período eleitoral, e da propaganda eleitoral propriamente dita, bem como no período pós-eleições, julgando os processos e querelas judicias que surgem da disputa democrática para ocupação dos diversos cargos públicos eletivos.

            Devido a freqüência bienal de eleições, podemos mesmo considerar que sempre estamos na véspera de algum pleito eleitoral. Em todo o país, temos observado o julgamento de várias Ações Judicias Eleitorais em primeira ou última instâncias, sejam Investigações Judiciais, Recursos Contra Diplomação de eleitos ou Impugnações de Mandatos Eletivos, decorrentes ainda do último pleito municipal, ocorrido no ano de 2000.

            Tudo isso acontece simultaneamente ao planejamento para a realização da eleição seguinte, treinamento dos auxiliares de cartórios, programação das urnas eletrônicas e campanhas publicitárias para conscientização dos eleitores.

            Esquecida em um passado distante a idéia de que a Justiça Eleitoral funciona apenas no dia das eleições e na apuração dos votos, e que nada mais precisa ser feito, antes ou após tais fases do sistema eleitoral e democrático.

            A complexidade dos atuais pleitos eleitorais brasileiros e o enorme contingente de eleitores, distribuídos por todos os recantos deste país com dimensões continentais, bem como a responsabilidade com a lisura dos resultados e com o equilíbrio das oportunidades de todos os concorrentes, inibindo o abuso do poder econômico e o domínio da coisa pública apenas pelas classes sociais financeiramente privilegiadas, requer bem mais tempo e trabalho, antes e após micro processo eleitoral.

            Confirmando nosso raciocínio, ensina a melhor doutrina que o período eleitoral começa um ano antes da data do pleito seguinte, último dia para filiação partidária e fixação de domicílio eleitoral dos que pretendem disputar algum cargo eletivo. Decerto, este é o termo inicial de todo calendário eleitoral.

            Para desempenhar todas estas atividades, o quadro efetivo de colaboradores da Justiça Eleitoral é bastante escasso, correspondendo, na prática, a apenas um terço dos servidores que nela trabalham.

            Em contrapartida, a política neo-liberal do atual Governo impede a criação de novos cargos para ampliação do quadro efetivo de servidores da Justiça Eleitoral, o que permitiria a nomeação de novos colaboradores, selecionados através de concurso público.

            De todo o exposto, concluímos que os servidores requisitados são imprescindíveis ao bom andamento dos trabalhos da Justiça Eleitoral, não podendo esta Justiça Especializada se dar ao luxo de devolvê-los às suas repartições de origem imediatamente após a realização das eleições, mormente quando já devidamente treinados e experientes na realização de suas funções em prol da cidadania e da democracia.

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            Ante a gravidade da situação, a Justiça Eleitoral não está inerte, e tenta solucionar o problema através da realização de um censo funcional, visando alcançar a necessidade real de servidores para a realização de suas atividades normais, como já determinado pela Resolução nº 20.959/01.

            De plano, já temos ciência das dificuldades e da necessidade de ampliação do nosso quadro efetivo de servidores, como solução a longo prazo. No entanto, de imediato, sugerimos a flexibilização das normas que tratam de requisições de servidores e o exame da metodologia, uniformização e racionalização dos serviços eleitorais.

            Em conseqüência, os órgãos da Justiça Eleitoral não podem interpretar literalmente a legislação pertinente, haja vista que a Lei nº 6.999/82, garante-lhes o poder de requisitar tais servidores, em benefício do bem da vida maior, qual seja a garantia da lisura dos pleitos eleitorais e a manutenção das instituições democráticas.

            A cada realização de um novo pleito eleitoral são necessárias novas requisições de servidores, onde sempre verificamos a repetição dos mesmos problemas, destacando-se a insensibilidade dos demais órgãos públicos em ceder servidores para a Justiça Eleitoral.

            De fato, a insensibilidade de alguns administradores é tão lastimável que chegam mesmo a selecionar os servidores menos recomendáveis ao serviço eleitoral: aqueles que estão constantemente de licença médica, que tenham problemas de relacionamento com os colegas, que respondam ou tenham sido punidos em processos disciplinares, que possuam vícios incontroláveis, como jogo ou bebida, e assim por diante.

            Quanto aos constrangimentos por que passam os servidores requisitados, julgo cabível até mesmo mandado de segurança na Justiça Comum, para que se garanta o cumprimento da Lei Federal nº 6.999/82 e do Decreto nº 4.050/2001, que resguardam aos servidores requisitados pela Justiça Eleitoral a manutenção de todos os seus direitos e vantagens, sem prejuízo da remuneração ou salários permanentes, inclusive encargos sociais, abono pecuniário, gratificação natalina, férias, adicional de um terço, etc.

            Em conclusão, considerando a legislação que rege a matéria e os argumentos acima expostos, entendo desaconselhável a devolução imediata destes servidores a seus órgãos de origem, após a realização do pleito eleitoral.

            Nesse prisma, não podemos interpretar literalmente a Lei nº 6.999/82 para restringir a requisição de servidores, até porque vivemos um novo contexto na democracia brasileira, onde são realizadas eleições gerais para todos os cargos eletivos, com frequência bienal dos pleitos, o que exige bem mais trabalho, treinamento e planejamento.

            Por tais motivos, não obstante as opiniões em contrário, defendo a renovação reiterada da requisição destes servidores, até que sejam criados por lei os cargos efetivos necessários para o bom andamento da Justiça Eleitoral.

            Importante esclarecer que não defendo o enquadramento definitivo destes servidores. Ao contrário, entendo inconstitucional qualquer procedimento nesse sentido. No entanto, devemos concluir urgentemente o censo determinado pela Resolução nº 20.959/2001 -TSE, para que possamos encontrar mecanismos que possibilitem a devolução gradativa destes colaboradores a seus órgãos de origem, simultaneamente a abertura de vagas a serem preenchidas por concurso público, conforme a necessidade de cada regional.

            Enquanto isto, continuaremos apelando para o espírito de colaboração que deve nortear a Administração Pública como um todo, sempre amparados na imprescindibilidade do serviço eleitoral, como guardião da democracia brasileira.

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Sobre o autor
Flávio Rogério de Aragão Ramalho

analista judiciário do TRE da Paraíba

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMALHO, Flávio Rogério Aragão. Requisição de servidores para a Justiça Eleitoral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 59, 1 out. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3213. Acesso em: 24 abr. 2024.

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