A crise contemporânea na Ucrânia

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DISSIMULAÇÕES E O CURSO DA TERCEIRA GRANDE GUERRA

A atual crise na Ucrânia, evoluída pela guerra civil, pode agravar a instabilidade político-militar que se apresenta, sobretudo, entre EUA e Rússia (e China, na rebarba). Desde o final da Segunda Guerra Mundial – e início da terceira onda de guerra global, após a desaprovação de que o general George Patton avançasse para o Leste Europeu – as atividades beligerantes entre os impérios são designadas de “conflitos de baixa intensidade”. É óbvio que as guerras da Coreia e do Vietnã provocaram considerável entropia militar em escala regional.

No entanto, já na guerra contra o Eixo nazi-fascista, forças militares não-convencionais foram amplamente utilizadas; forças essas chamadas “comandos” e “operações especiais”. O nome comando vem da Guerra dos Bôeres, no final do século XIX: na comunidade de destemidos camponeses holandeses (comunidade boer); residentes na África do Sul e resistentes ao jugo britânico, destacou-se um grupo miliciano denominado “Kommando”.

Outras táticas foram desenvolvidas pelo capitão francês T. E. Lawrence, em combate contra os turcos na península arábica e na Síria. Imortalizado no filme “Lawrence da Arábia”, treinava seus comandados sob o seguinte refrão: “Assim como nada de material nos é indispensável para viver, é possível não usarmos nada de concreto para matar”.

A ex-URSS aplicou-se à formação de suas “Spetsnaz”; forjadas no coração do Exército Vermelho e especializadas em missões que lançavam mão de táticas especiais, largamente utilizadas contra os cossacos rebelados e, depois, na Guerra do Afeganistão. Assim como o Reino Unido viria desenvolver a SAS (Special Air Service).

No Vietnã e na tomada de Granada, até então uma ilha socialista no Mar do Caribe, os comandos dos EUA tiveram graves problemas e sofreram grandes perdas humanas e de material. Depois, os Comandos britânicos combateram na Guerra das Malvinas (1982) e impuseram extrema violência aos jovens e destreinados recrutas argentinos.

Nas duas guerras ao Iraque estiveram presentes grupamentos especiais de inúmeros países, como: Estados Unidos (EUA), França, Reino Unido, Canadá, Holanda, Nova Zelândia, Alemanha. Ironicamente, no final do século XX, as forças especiais vinham sendo treinadas para combater o terrorismo e o crime organizado.

O kidon (do hebraico, “baioneta”), um dos grupos mais temidos do mundo e que é uma subseção do Mossad (inteligência israelense), é exemplar; pois, treinam o “improviso” na arte de matar, aplicando-se nos treinamentos de eficiente luta marcial: o krav maga.

Faz muito tempo que os EUA fazem uso/abusivo de mercenários, sendo a empresa privada Blackwater a mais conhecida desse ramo. É formada e dirigida por ex-militares, assassinos e torturadores do mundo todo. Conta com especialistas na arte de matar que se titularam no Chile de Pinochet e nos porões da contra-insurgência, por exemplo, da Nicarágua. Também tem, obviamente, ex-comandos aposentados ou desligados das suas respectivas forças.

Em última análise, não se trata de soldados comuns, porque simplesmente não têm “honra militar” (afinal, matam para quem pagar mais) e, certamente, ficariam horrorizados com o Bushido, código que exigia a morte do Samurai desonrado.

Esses mercenários estiveram em Fallujah, no Iraque, atirando de metralhadora calibre .50 nos massacres civis, por exemplo. Não respondem ao direito militar dos EUA, porque não são militares engajados às forças regulares, e nem à Convenção de Genebra, porque os EUA não admitem o direito internacional.

Neste momento, esses mercenários duelam na Síria, contra Bashar al-Assad, e na Ucrânia, contra os russos. Também montam guarda na Amazônia brasileira. Além da empresa Blackwater, batalhões e companhias da Força Delta (elite do exército dos EUA), além de espiões e de assassinos da CIA, também marcam presença na Ucrânia. Podem usar ou estão usando uniformes falsos, como se fossem insurgentes.

O Estado Islâmico, no Iraque e na Síria, treina milicianos para matar com as mãos ou com total improviso – como explicou Lawrence. A Terceira Guerra Mundial, portanto, pode variar entre o emprego de forças convencionais (o próprio exército da Ucrânia), mercenários e meros assassinos, empresas de “senhores da guerra”, forças especiais e comandos.

“Dividem-se categoricamente dois tipos de guerra: uma guerra espacial, de conquista, e uma guerra total, de penetração, de assalto”: o segundo tipo, atual, traz a dor de sermos fustigados por um espinho no pé, inexaurível, sem trégua, ao longo de nossa efêmera vida – conforme ensinou Paul Virilio em seu livro germinal “Velocidade e Política”.

Ou seja, o mundo se encontra em pleno curso da Terceira Guerra Mundial desde 1945. Uma de suas fases capsulares foi conhecida como Guerra-Fria (1945-1991), sob a ameaça do uso maciço de armas nucleares. Inclusive, foi aí que se incrementou a bomba de nêutrons: uma “bomba burguesa”que só mata os viventes, sem prejuízo das edificações, não destruindo o capital.

Hoje, não há porque acreditar em guerra nos moldes da Segunda Grande Guerra, envolvendo diretamente EUA e Rússia como protagonistas do teatro operacional, uma vez que se deve empregar cada vez mais a espionagem, a sabotagem, a simulação, a chantagem e os assassinatos de líderes e de opositores, ou seja, elementos dissimulados, no exato modelo aplicado pelas forças armadas não-tradicionais, além, obviamente, dos boicotes e dos embargos comerciais. Todavia, em política de Titãs, tudo é possível.

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Sobre os autores
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Antenor Alves Silva

Agente Administrativo do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Aluno do curso de Direito (DCJ/UFRO). Doutorando em Geografia na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Geografia pela UFRO. Especializado em Docência do Ensino Superior pela Universidade Castelo Branco (UCB). Licenciado em Geografia pela Universidade Federal de Roraima (UFRR).

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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