A aplicação do princípio da proporcionalidade para solução de conflitos entre direitos fundamentais

Leia nesta página:

O desenvolvimento do principio da proporcionalidade em seus diversos aspectos promoveu sua utilização como ferramenta técnica eficaz para a solução de conflitos entre direitos fundamentais.

Resumo

O presente artigo apresenta como temática principal colher os principais elementos de natureza histórica, filosófica e jurídica presentes para a formatação do conceito atual de princípio da proporcionalidade, de modo a colher elementos para a intelecção adequada de sua utilização como técnica para solução de conflitos entre direitos fundamentais. Revela-se importante tal estudo na medida que se observa uma forte tendência de multiplicação de demandas judiciais a desafiar a aplicação dos mecanismos de tutela dos direitos fundamentais. Neste contexto, poderá ser analisado neste trabalho através da utilização de metodologia descritiva e exploratória como o somatório evolutivo dos fundamentos históricos, filosóficos e jurídicos do princípio da proporcionalidade conduziu-o ao atual patamar de técnica para solução de conflitos entre direitos fundamentais.

Palavras-chave: Princípio da proporcionalidade. Conflitos entre direitos fundamentais.

Introdução

Para esta pesquisa, iniciar-se-á com o estudo panorâmico sobre o princípio da proporcionalidade através da investigação dos seguintes elementos: sua formação histórica no Direito europeu continental e no Direito norte-americano, fundamento teórico e normativo, finalidade ou aplicabilidade prática, subprincípios que o compõem, bem como pela averiguação de sua relação com o princípio da razoabilidade, de sorte a possibilitar uma melhor compreensão do que seria este princípio tão discutido no cenário jurídico atual.

Feita análise sobre o princípio da proporcionalidade dentro dos limites delineados como objeto desta pesquisa, seguir-se-á para a investigação do papel deste princípio como técnica de solução em conflitos envolvendo direitos fundamentais, avaliando as possibilidades e limites de sua aplicação por meio de alguns exemplos jurisprudenciais.

1 Do Princípio da Proporcionalidade

Nesta primeira parte do estudo efetuar-se-á uma análise do princípio da proporcionalidade em sua contextualização histórica, subprincípios componentes da sua estrutura, paralelo com o princípio da razoabilidade, buscando apontar as semelhanças e diferenças, a investigação da fundamentação normativa e um estudo sobre as finalidades do princípio, com base na  aplicabilidade prática mais destacada dada ao princípio.

1.1.1 Formação histórica

O princípio da proporcionalidade possui suas raízes históricas assentadas na evolução do Estado Absolutista para o Estado Liberal-Burguês. Inspirada pela necessidade de controle do poder monarca sobre os súditos, época em que este exercia seu “poder de polícia” de forma ilimitada, muitas vezes até abusiva, surgia a idéia do princípio da proporcionalidade como mecanismo de controle das investidas do monarca sobre o indivíduo.

Explanando o contexto histórico de desenvolvimento da idéia do princípio da proporcionalidade, Suzana de Toledo Barros (2003, p. 37) leciona:

Da filosofia ao Direito, o princípio da proporcionalidade, até chegar à modelagem atual, acompanha a história de defesa dos direitos humanos e vai surgir como decorrência da passagem do Estado de Polícia para o Estado de Direito, quando é formulado com o intuito de o poder de coação do monarca, chamado de poder de polícia, porque ilimitado quanto aos fins que poderia perseguir e quanto aos meios que poderia empregar.

Situando, agora, no espaço a formação histórica do princípio da proporcionalidade, observa-se que suas primeiras aplicações mais significativas ocorreram no Direito Administrativo francês, sob o prisma do controle dos atos administrativos, através do recours pour exces de pouvoir (recurso por excesso de poder), instrumento processual adequado para postular-se, perante o Conselho de Estado, a reforma de qualquer decisão administrativa, por violação ao princípio da legalidade ou por desvio de poder, habilitando, assim, os tribunais administrativos  a investigar a compatibilidade intrínseca entre os motivos e as finalidades dos atos discricionários e sua adequação à situação de fato em vista da qual eram editados (BARROS, 2003, p. 42-43).

Uma vez consolidado o princípio da proporcionalidade no Direito Administrativo francês, como mecanismo de controle do “poder de polícia” do monarca no regime absolutista, posteriormente, como instrumento de controle da atividade discricionária da administração estatal, por meio do sopesamento entre os motivos e as finalidades dos atos administrativos no Estado de Direito (teoria do detournement du pouvoir), através da jurisdição administrativa realizada pelo Conselho de Estado, este princípio migrou para o direito alemão, sendo alçado ao patamar de princípio constitucional (BARROS, 2003, p. 47).  

Paulo Bonavides (2006, p. 407) destaca a importância alemã para o desenvolvimento do princípio da proporcionalidade:

A Alemanha é o país onde o princípio da proporcionalidade deitou raízes mais profundas, tanto na doutrina como na jurisprudência. Talvez seja aquele que primeiro guardou consciência da importância de sua natureza de princípio constitucional nessa segunda metade do século XX, embora a respectiva introdução do Direito Constitucional haja ocorrido primeiro na Suíça.

Como resultado da experiência nacional-socialista alemã derrotada na Segunda Guerra Mundial, baseada no totalitarismo do Fürher Adolf Hitler, que rompeu a evolução do Estado Social ensaiada na Constituição de Weimar de 1919, é promulgada a nova Carta alemã em 23 de maio de 1949, a “Lei Fundamental”, promovendo significativas mudanças no sistema de proteção dos direitos fundamentais.

Guerra Filho (2003, p. 72) aponta como os primeiros estudos teóricos dedicados ao tema na Alemanha, a monografia de Rupprecht V. Krauss em 1955 “Der Grundsatz der Verhältnismäβigkeit (in seiner Bedeutung für die Notwendigkeit des Mittels im Verwaltungsrecht)”, sendo o primeiro a utilizar a expressão “princípio da proporcionalidade”. No ano seguinte aparece o ensaio de Dürig no “Arquivo de Direito Público”, em que defende a inclusão do princípio da proporcionalidade no plano constitucional, apto a ser usado em qualquer medida estatal como proteção à dignidade da pessoa humana.

Ainda no plano doutrinário, Guerra Filho (2003, p. 72-73) menciona a importância de Peter Lerche, que em sua obra “Excesso e Direito Constitucional – sobre a vinculação do legislador pelos princípios da proporcionalidade e exigibilidade” consagra a distinção entre esses dois aspectos do princípio, bem como cita os estudos de Manfred Gentz, Peter Wittig e Eberhard Grabitz como autores relevantes para o problema do controle da proporcionalidade de leis, atos administrativos e decisões judiciais.

Chegando ao plano jurisprudencial, Barros (2003, p. 48) ressalta-se a importância do Tribunal Constitucional alemão (Bundesverfassungsgericht) para a afirmação do princípio da proporcionalidade, especialmente como instrumento de controle sobre a atuação estatal em prejuízo dos direitos fundamentais assegurados no artigo 19 da Lei Fundamental de Bonn (Wesensgehaltsgarantie).

O referido artigo 19, n.º 2 da “Lei Fundamental” instituía verdadeira cláusula de proteção ao núcleo essencial dos direitos fundamentais. Schawabe (2003, p. 420) apresenta compilação do art. 19, n.º 2: “En ningún caso se podrá afectar al contenido essencial de un derecho fundamental”.

Neste sentido, Suzana de Toledo Barros (2003, p. 48) destaca o papel do Tribunal Constitucional alemão ao utilizar o princípio da proporcionalidade na proteção aos direitos fundamentais:

O Tribunal Constitucional alemão assinalou em larga medida a preocupação com os direitos fundamentais estampada na Lei Fundamental, reconhecendo a necessidade prática de controlar as restrições legais a esses direitos no que se refere aos três aspectos: necessidade (Erforderlichkeith), adequação (Geeignetheit) e proporcionalidade (Verhältnismässigkeit) da medida restritiva.

Paulo Bonavides (2006, p. 409), por sua vez, colaciona decisão proferida em 16 de março de 1971, pelo Tribunal Constitucional, versando sobre armazenagem de petróleo (Erdölbevorratung), bastante elucidativa para o entendimento da estrutura do princípio da proporcionalidade:  

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessário para alcançar o objetivo procurado. O meio é adequado quando com seu auxílio se pode alcançar o resultado desejado; é necessário, quando o legislador não poderia ter escolhido um outro meio, igualmente eficaz, mas que não limitasse ou limitasse da maneira menos sensível o direito fundamental.

 

Além das influências francesa e alemã para o desenvolvimento do princípio da proporcionalidade, destaca-se também a Suíça, um dos primeiros países a inserir tal princípio no seu texto constitucional, Áustria, Itália e Espanha, esta última, desde a Lei de Procedimento Administrativo de 17 de junho de 1958, prevê expressamente a necessidade dos atos administrativos serem adequados aos fins que os justifiquem.

Na Constituição espanhola de 1978, pós-queda do regime “franquista”, restou fixado no artigo 53.1 o caráter vinculante dos direitos fundamentais e o necessário respeito de seu conteúdo essencial pela legislação regulamentadora (BARROS, 2003, p. 53-54). Segundo afirma Bonavides (2006, p. 418), a Espanha pode ser considerada exemplo de valorização doutrinária e jurisprudencial à adoção do princípio da proporcionalidade como categoria de princípio geral de direito apto ao controle judicial do ato estatal desproporcional, inadequado ou desnecessário.

A Constituição portuguesa de 1976, em seu art. 18.1, destacou o princípio da proporcionalidade como parâmetro de controle às restrições estatais aos direitos fundamentais, demarcando a “constitucionalização formal do princípio” (BARROS, 2003, p. 55-56).

Encerrando a formação histórica do princípio da proporcionalidade, observa-se que o Brasil, em sua atual realidade jurídico-constitucional, ainda não cuidou de inseri-lo em texto normativo, contudo, tal lacuna não tem obstado seu reconhecimento e aplicação nos meios doutrinário e jurisprudencial. Neste sentido Paulo Bonavides (2006, p. 434) ressalta:

No Brasil a proporcionalidade pode não existir enquanto norma geral de direito escrito, mas existe como norma esparsa no texto constitucional.

[...]

O Direito Constitucional brasileiro acolhe já de maneira copiosa expressões nítidas e especiais de proporcionalidade, isto é, regras de aplicação particularizada ou específica do princípio, a que se refere a Constituição, sem todavia explicitá-lo, como soi ocorrer, por exemplo, com alguns direitos sociais ou no campo do Direito Tributário (§ 1º do art. 149) ou ainda no Direito Eleitoral relativamente à representação proporcional como regra constitucional de composição de uma das Casas do Poder Legislativo (caput do § 1º do art. 45).

Desse modo, permeando a gradativa evolução histórica do princípio em tela em diversos países, como França, Alemanha, Suíça, Espanha e Portugal, até se chegar ao Brasil, contempla-se o atual momento de consolidação deste princípio no cenário jurídico, revelando-se como verdadeiro axioma constitucional de controle da ação do Estado de Direito, principalmente em suas investidas contra os direitos fundamentais.

1.1.2 Fundamento e finalidade

O princípio da proporcionalidade tem despontado no cenário jurídico atual como um dos princípios mais expressivos para atuar como instrumento de controle da atuação dos órgãos estatais, sendo relevante mecanismo para a proteção dos direitos fundamentais, bem como método de resolução de conflitos entre princípios e direitos constitucionais.

Suzana Toledo de Barros (2003, p. 37) pontua o contexto que fomentou a fundamentação normativa para o surgimento do princípio da proporcionalidade:

O germe do princípio da proporcionalidade, pois, foi a idéia de dar garantia à liberdade individual em face dos interesses da administração. E essa consciência de que existem direitos oponíveis ao próprio Estado e que este, por sua vez, deveria propiciar fossem tais direitos respeitados decorreu das teorias jusnaturalistas formuladas na Inglaterra dos séculos XVII e XVIII.

Steinmetz (2001, p. 159-172) faz um levantamento doutrinário dos fundamentos normativos mais comumente atribuídos para o princípio da proporcionalidade, citando, entre eles: o Estado de Direito, o conteúdo essencial dos direitos fundamentais, o princípio da dignidade da pessoa humana, a cláusula do due process of law, a fundamentação jusfundamental e a corrente que adota a pluralidade de fundamentos normativos, que, em atenção aos limites desta pesquisa, não serão explanados individualmente.

Sendo a estrutura normativa de uma Constituição formada por princípios e regras jurídicas, o princípio da proporcionalidade prescinde de positivação expressa para auferir sua validade em uma ordem jurídica. Explicando a abertura material das Constituições para o reconhecimento de princípios não-expressos, Suzana Toledo de Barros (2003, p. 92) explica:

[...] os princípios jurídicos constitucionais, como “idéias jurídicas materiais que lograram uma consciência jurídica geral”, podem já estar escritos no texto da Constituição, como podem estar implícitos. Logo, por um processo de permanente adequação do sentido da Constituição, é natural que alguns princípios vão sendo descobertos e, graças à sua força de convicção, vão se impondo nesta ordem jurídica como aptos a solucionar os casos concretos, qualificando o sistema interno como sistema aberto.

 

Robert Alexy (2002, p. 111-112) explica os termos em que ocorre a relação entre o princípio da proporcionalidade e a “teoria dos princípios”, mencionando que o princípio da proporcionalidade decorre da própria estrutura das normas principiológicas que consagram direitos fundamentais:

Los princípios son mandatos de optimización con respecto a las posibilidades jurídicas y fáticas. La máxima de la proporcionalidad em sentido estricto, es dicer, el mandato de ponderactión, se sigue de la ralativizacion com respecto a las posibilidades jurídicas. Si una norma de derecho fundamental com carácter de princípio entra em colisión com um principio opuesto, entonces la posssibilidad jurídica de la realización de la norma de derecho fundamental depende del principio opuesto. Para llegar a uma decisión, es necessária uma ponderactión en el sentido de la ley de colisión. Como la aplicación de princípios válidos, cuando son aplicables, está ordenada y como para la aplicación en el caso de colisión se requiere uma ponderación, el carácter de principio de las normas iusfundamentales implica que, cuando entran em colisión con principios opuestos, está ordenada uma ponderación. Pero, esto significa que la máxima de la proporcionalidad em sentido estricto es dedecible del carácter de principio de las normas de derecho fundamental.

 

Desse modo, a despeito de o princípio da proporcionalidade carecer de expressa previsão na maioria das ordens constitucionais, a abertura material destas Cartas Políticas aos princípios compatíveis com a ordem jurídica adotada, a exemplo do disposto no art. 5º, §2º da Constituição brasileira: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”, garante assento normativo ao princípio em exame, legitimando sua possibilidade de aplicação para além do Direito Constitucional e Direito Administrativo, enquanto ramos setoriais da vida jurídica.

Alcançando, agora, a discussão sobre a finalidade do princípio da proporcionalidade no cenário jurídico, cumpre rememorar a sua vocação inicial restrita às questões da limitação da atuação do “poder de polícia” estatal em detrimento das liberdades individuais, ou seja, conforme pôde-se observar na análise da formação histórica do princípio, em um primeiro momento sua aplicação prática circunscrevia-se ao campo do Direito Administrativo.

Ao passo que o princípio em tela foi alçado para o patamar de princípio constitucional, logo sua expansão logrou atingir outros ramos de aplicação. Guerra Filho (2003, p. 85) demonstra sua preocupação com a expansão exacerbada do alcance de aplicação do princípio: “[...] cabe desde já tomar em consideração o problema de sua tendência ao que se chama na doutrina alemã de “Oberdehnung”, “super-expansão”, para designar um exagero ao empregá-lo, que levaria a um “relaxamento” na aplicação da lei”.

Guerra Filho (2003, p. 85) conclui sugerindo a moderada aplicação do princípio para evitar sua “super-expansão”:

Para prevenir que isso aconteça, nada melhor do que atribuir “reflexidade” ao princípio, de modo que só se possa aplicá-lo mediante um exame da “adequação”, “exigibilidade” e “proporcionalidade” de fazê-lo. Com isso pode-se reservar a utilização dele para o momento oportuno e necessário, quando for essa a providência mais de acordo com a finalidade última do ordenamento jurídico: o maior benefício possível da comunidade com o mínimo sacrifício necessário de seus membros individualmente.

Retomando a discussão sobre as finalidades do princípio, iniciar-se-á esta análise pelo papel que tal princípio desempenha na limitação das restrições impostas pelo Legislativo ou pela Administração Pública aos direitos fundamentais. Vale dizer, com a elevação dos direitos fundamentais ao centro de proteção das ordens constitucionais, o princípio da proporcionalidade ganhou destaque como um dos mais eficientes instrumentos de proteção face às excessivas ingerências legislativas e executivas.

Toledo de Barros (2003, p. 95) leciona sobre a finalidade do princípio da proporcionalidade como limite protetivo às ingerências estatais sobre os direitos fundamentais:

O princípio da proporcionalidade, como uma das várias idéias jurídicas fundantes da Constituição, tem assento aí, nesse contexto normativo no qual estão introduzidos os direitos fundamentais e os mecanismos de proteção. Sua aparição se dá a título de garantia especial, traduzida na exigência de que toda intervenção estatal nessa esfera se dê por necessidade, de forma adequada e na justa medida, objetivando a máxima eficácia e otimização dos vários direitos fundamentais concorrentes.

Destarte, sem mais delongas no assunto, em face dos limites desta pesquisa, cumpre avançar para a análise da aplicação do princípio da proporcionalidade como método de resolução de colisões entre princípios constitucionais.

        A colisão entre princípios constitucionais não se resolve no campo da validade, mas no campo do valor (BONAVIDES, 2006, p. 279-280). Se uma determinada situação é proibida por um princípio, mas permitida por outro, não há que se falar em nulidade de um princípio pela aplicação do outro. Assim, no caso concreto, em uma "relação de precedência condicionada", determinado princípio terá maior relevância que o outro, preponderando. Não se pode aceitar que um princípio reconhecido pelo ordenamento constitucional possa ser declarado inválido, por que não aplicável a uma situação específica. Ele apenas retrocede frente ao maior peso, naquele caso, de outro princípio também reconhecido pela Constituição. A solução do conflito entre regras, em síntese, dá-se no plano da validade, enquanto a colisão de princípios constitucionais no âmbito do valor. Neste sentido, veja-se, também, o que diz Joaquim José Gomes Canotilho (2002, p. 1145-1146):

Os princípios interessar-nos-ão, aqui, sobretudo na sua qualidade de verdadeiras normas, qualitativamente distintas das outras categorias de normas, ou seja, das regras jurídicas. As diferenças qualitativas traduzir-se-ão, fundamentalmente, nos seguintes aspectos. Os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optimização, compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionalismos fácticos e jurídicos; as regras são normas que prescrevem imperativamente uma exigência (impõem, permitem ou proíbem) que é ou não é cumprida (nos termos de Dworkin: applicable in all-or-nothing fashion); a convivência dos princípios é conflitual (Zagrebelsky), a convivência de regras é antinómica; os princípios coexistem, as regras antinómicas excluem-se. Consequentemente, os princípios, ao constituírem exigências de optimização, permitem o balanceamento de valores e interesses (não obedecem, como regras, à lógica do tudo ou nada), consoante o seu peso e a ponderação de outros princípios eventualmente conflituantes; as regras não deixam espaço para qualquer outra solução, pois se uma regra vale (tem validade) deve cumprir-se na exacta medida das suas prescrições, nem mais nem menos. Como se verá mais adiante, em caso de conflito entre princípios, estes podem ser objecto de ponderação e de harmonização, pois eles contêm apenas exigências ou standards que, em primeira linha (prima facie), devem ser realizados; as regras contêm fixações normativas definitivas, sendo insustentável a validade simultânea de regras contraditórias. Realça-se também que os princípios suscitam problemas de validade e peso (importância, ponderação, valia); as regras colocam questões de validade (se elas não são correctas devem ser alteradas). (grifos do autor)

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

      Desse modo, na resolução da colisão entre princípios constitucionais devem ser levadas em consideração as particularidades que cercam o caso concreto, para que, pesados os aspectos específicos da situação, prepondere o preceito mais adequado. A tensão se resolve mediante uma ponderação de interesses opostos, determinando qual destes interesses, abstratamente, possui maior peso no caso concreto (v. Alexy, 2002, p. 112).

Bonavides (2006, p. 425-426), aproveitando os ensinamentos de Konrad Hesse, explica esse processo de ponderação de interesses no caso concreto para a solução de princípios em colisão com o denominado “princípio da concordância prática”, entendido como uma projeção do princípio da proporcionalidade.

Outra finalidade que se pode atribuir ao princípio da proporcionalidade é a sua importância como instrumento de apreciação das distinções de tratamento entre pessoas em casos concretos, em face do princípio da isonomia, realizando-se a análise do discrimen por meio dos subprincípios da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Neste sentido afirma Suzana Toledo de Barros (2003, p.189):

Não há incongruência, portanto, na utilização do princípio da proporcionalidade para o fim de constatar se as distinções de tratamento, frequentemente necessárias em face do resultado perseguido, são ou não compatíveis com a idéia de igualdade, porque a proporcionalidade, como já assentado inúmeras vezes, constitui um parâmetro por excelência e não uma medida em si.

Muito se têm discutido na doutrina questões sobre os limites de aplicação do princípio da proporcionalidade, tais como o excesso de “ativismo judicial”, a insegurança jurídica, a quebra da separação entre Poderes, bem como a impossibilidade do princípio contribuir como método de interpretação conforme a Constituição e no controle de constitucionalidade de atos normativos. Para afastar tais desconfianças sobre o princípio, é necessária sua aplicação comedida, de sorte a conformar tal princípio aos referidos fundamentos da ordem jurídica.

Refutando exagerado ceticismo ao princípio, Paulo Bonavides (2006, p.427) exemplifica os benefícios com a correta utilização do princípio no caso da aplicação do princípio da proporcionalidade na interpretação conforme a Constituição:

O princípio da proporcionalidade, abraçado assim ao princípio da interpretação conforme a Constituição, move-se, pois em direção contrária a esse entendimento e, ao invés de deprimir a missão do legislador ou a sua obra normativa, busca jurisprudencialmente fortalecê-la, porquanto na apreciação de uma inconstitucionalidade o aplicador da lei, adotando aquela posição hermenêutica, tudo faz para preservar a validade do conteúdo volitivo posto na regra normativa pelo seu respectivo autor.

Em suma, fundado nas ordens jurídicas nacionais sob o patamar de princípio constitucional, em sua maioria na forma implícita, o princípio da proporcionalidade vem ganhando gradativamente espaço de aplicação, evoluindo da sua vocação estrita ao controle do “poder de polícia” da administração, para funcionar nas limitações à atividade legislativa restritiva de direitos fundamentais, como método de resolução de conflitos entre princípios e direitos fundamentais, bem como ganhando expansão para outros ramos jurídicos. Precisamente na seara do Direito Privado, analisando-se mais frente sua aplicação nos conflitos entre direitos da personalidade.

2 Proporcionalidade versus razoabilidade

O princípio da razoabilidade retira suas origens históricas na consolidação da garantia do due process of law do antigo direito anglo-saxão. Sob o fundamento da cláusula law of the land, constante no artigo 39 da Magna Charta, de 1215, foi aberto o caminho para o desenvolvimento desta garantia, culminando na sua “constitucionalização formal” através das emendas 5ª e 14 à Constituição norte-americana (BARROSO, 2003, p. 218).

 A jurisprudência norte-americana cuidou desenvolver o princípio do devido processo legal, notabilizando-se esta evolução em duas grandes fases. Assim, afirma Luís Roberto Barroso (2003, p. 219):

O princípio do devido processo legal, nos Estados Unidos, é marcado por duas grandes fases: a primeira, onde se revestiu de caráter estritamente processual (procedural due process), e uma segunda, de cunho substantivo (substantive due process), que se tornou fundamento de um criativo exercício de jurisdição constitucional.

Em atenção aos limites delineados para esta pesquisa, cumpre analisar que embora a referida primeira fase da garantia ainda perdure nos dias atuais, circunscreve-se ao âmbito estritamente processual, a exemplo de garantias como contraditório e ampla defesa. Com esteio nesta fase, não se vislumbra qualquer possibilidade de “ativismo judicial” a permitir ao Judiciário ingerir no controle do arbítrio de atos do legislativo (BARROSO, 2003, p. 219).

Assim, somente a fase substantiva do devido processo legal é que realmente impulsionou a ascensão de um maior espaço de apreciação do Poder Judiciário sob o mérito dos atos do Poder Público, principalmente em defesa das liberdades individuais e coletivas, contribuindo significativamente para a formação da idéia de razoabilidade como parâmetro de valoração dos atos estatais, que devem coadunar-se com o ideal de justiça sob uma relação razoável entre meios e fins, e de legitimidade dos fins.

O princípio da razoabilidade, retirando suas raízes do devido processo legal substantivo, como visto, logrou consolidar-se na jurisprudência da Suprema Corte norte-americana, concomitantemente ao desenvolvimento obtido pelo princípio da proporcionalidade nos cenários doutrinário e jurisprudencial da Europa continental.

Significativa parcela da doutrina atual utiliza as expressões proporcionalidade e razoabilidade como integrantes de um mesmo conteúdo principiológico, baseado na idéia de controle dos atos do Poder Público. O exemplo é de Luís Roberto Barroso (2003, p. 224):

De logo é conveniente ressaltar que a doutrina e a jurisprudência, assim na Europa continental como no Brasil, costumam fazer referência, igualmente, ao princípio da proporcionalidade, conceito que em linhas gerais mantém uma relação de fungibilidade com o princípio da razoabilidade.

No âmbito da jurisprudência nacional, o Supremo Tribunal Federal - STF em vários de seus julgados tem utilizado indistintamente os dois princípios, consolidando seu posicionamento pela fungibilidade dos princípios. Neste sentido conclui Suzana Toledo de Barros (2003, p. 76): “Observa-se que o Supremo Tribunal Federal, mesmo aludindo ao termo proporcionalidade, não deixou de fazer referência à razoabilidade, deixando assente a possibilidade de utilização de ambas as expressões”.

Guerra Filho (2003, p. 69) ensaia uma aproximação dos conteúdos da racionalidade e proporcionalidade com base na significação sinônima dos vocábulos de semelhante origem na matemática, “razão” (latim: ratio) e “proporção” (do latim: proportio).

Contudo Guerra Filho (2003, p. 69) alerta para a necessária distinção entre os princípios, sob pena do esvaziamento de ambos. Entende, o autor, que enquanto o princípio da razoabilidade se restringe à concepção negativista, capaz somente de definir determinado ato administrativo como desviado de sua finalidade quando absurdo ou arbitrário, a proporcionalidade teria função positiva de definir os limites da adequação do ato ao princípio.

Wilson Antônio Steinmetz (2001, p. 183-192), faz um levantamento doutrinário sobre as correntes que sustentam as semelhanças e diferenças entre os princípios em análise, destacando, por exemplo, a dificuldade de se definir traços distintivos sólidos aos princípios com base na literatura administrativa pátria. O autor conclui seu raciocínio sobre tais princípios do seguinte modo:

O que se quer dizer, isso sim, é que o princípio da razoabilidade ainda não apresenta uma definição operacional, o que pode ser constatado, de forma cristalina, na literatura publicista brasileira. Já o princípio da proporcionalidade apresenta indicadores de concreção mediante os princípios parciais da adequação, da exigibilidade e da proporcionalidade em sentido estrito. Por isso, com base nesses argumentos, desenvolvidos a partir das formulações sobre o razoável de Recaséns Siches, Perelman e Aarnio, e nos argumentos de Ávila, conclui-se que o princípio da proporcionalidade não se confunde com o da razoabilidade e que o princípio da proporcionalidade é o princípio apropriado para a solução da colisão de direitos fundamentais.

Helenilson da Cunha Pontes (2000, p. 89-90), por sua vez, destacando a diferença nos conteúdos dos princípios em comento assinala:

Todavia, a proporcionalidade não se esgota na razoabilidade. Em outras palavras, a decisão jurídica que atende aos comandos do princípio da proporcionalidade manifesta razoabilidade, mas não se esgota nela. Com efeito, o ato estatal que atende às exigências do princípio da proporcionalidade apresenta-se razoável e racional, todavia nem sempre um ato razoável (racionalmente aceitável) atende aos deveres impostos pelo princípio constitucional da proporcionalidade.

[...]

Portanto, enquanto a razoabilidade exige que as medidas estatais sejam racionalmente aceitáveis e não arbitrárias, o princípio da proporcionalidade determina que as mesmas, além de preencherem tal requisito, constituam instrumentos de maximização dos comandos constitucionais, mediante a menor limitação possível aos bens juridicamente protegidos.

Desse modo, cumpre considerar a existência de pontos de contato entre os substratos axiológicos dos princípios, assentados na idéia de controle dos atos estatais em função da proteção de valores constitucionais, bem como observar o posicionamento de parte da doutrina e até do Supremo Tribunal Federal em tratá-los como expressões sinônimas de um mesmo princípio.

Contudo, convém registrar o acerto de Braga (2004, p. 123-127) ao sintetizar tal distinção com os seguintes pontos: o primeiro parâmetro para a diferenciação entre os princípios da razoabilidade e proporcionalidade seria a diversidade na origem, respectivamente, oriundos do substantive due process of law da jurisprudência norte-americana e do Tribunal Constitucional Alemão; o segundo seria a diversidade de fundamentos, devido processo legal e Estado de Direito, respectivamente; o terceiro seria a autonomia de conteúdos; o quarto seria a atribuição de subprincípios apenas ao princípio da proporcionalidade; o quinto parâmetro seria o nível de objetividade, sendo a proporcionalidade formada por critérios predefinidos, enquanto a razoabilidade possui conteúdo mais subjetivo; o sexto, e último, ponto seria a diversidade nas funções dos princípios.

3 Os subprincípios do princípio da proporcionalidade

O desenvolvimento doutrinário dado ao princípio da proporcionalidade identificou três elementos parciais ou subprincípios componentes de sua estrutura, quais sejam, adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. De modo que mediante a análise sucessiva de cada um desses elementos parciais no caso concreto é que se poderá averiguar se a medida examinada observou o princípio da proporcionalidade.

3.1. Adequação

O primeiro dos subprincípios imaginado como parte do princípio da proporcionalidade é a adequação, pertinência ou aptidão (Geeignetheit), entendido pelo dever de escolha do meio apropriado para a consecução de determinado fim, representando a aptidão que os meios utilizados devem possuir para produzir os objetivos almejados no caso concreto.

Paulo Bonavides (2006, p. 396-397) analisando este subprincípio tece comparação com o princípio da vedação de arbítrio:

Examina-se aí a adequação, a conformidade ou a validade do fim. Logo se percebe que esse princípio confina ou até mesmo se confunde com o da vedação de arbítrio (Übermassverbot), que alguns com o mesmo significado de princípio geral da proporcionalidade. Com o desígnio de adequar o meio ao fim que se intenta alcançar, faz-se mister, portanto, que “a medida seja suscetível de atingir o objetivo escolhido”, ou, segundo Hans Huber, que mediante seu auxílio se possa alcançar o fim desejado.

 

Verifica-se, então, que o subprincípio da adequação sedimenta-se basicamente na avaliação da relação meio-fim, de sorte que os meios empregados serão examinados quanto à sua aptidão para atingir os objetivos buscados no caso concreto. Segundo Suzana Toledo de Barros (2003, p. 78) a adequação deverá ser a primeira análise verificada em relação ao princípio da proporcionalidade:

Um juízo de adequação da medida adotada para alcançar o fim proposto deve ser o primeiro a ser considerado na verificação da observância do princípio da proporcionalidade. O controle intrínseco da legiferação no que respeita à congruência na relação meio-fim restringe-se à seguinte indagação: o meio escolhido contribui para a obtenção do resultado pretendido?.

Vale destacar que a perquirição acerca de se os meios utilizados são adequados para a produção dos resultados almejados se restringe a um questionamento prévio da probabilidade de se obter, com as medidas que serão empregadas, os fins objetivados, relação esta de meio e fim, de viabilidade que não dever ser confundida com a questão da eficácia dos meios face aos fins.

Assim, Suzana Toledo de Barros (2003, p. 78) explana:

Isto quer dizer que, sob a perspectiva da adequação, resta excluída qualquer consideração no tocante ao grau de eficácia dos meios tidos como aptos a alcançar o fim desejado. A questão sobre a escolha do meio melhor, menos gravoso ao cidadão, já entra na órbita do princípio da necessidade.

Desse modo, seja no campo de atuação legislativa ou administrativa, as medidas tomadas devem guardar relação de adequação aos fins almejados, de sorte que os meios empregados se mostrem viáveis para a produção dos efeitos esperados no caso concreto, sendo assim atendido o primeiro subprincípio do princípio da proporcionalidade.

3. 2 Exigibilidade/Necessidade

O segundo subprincípio visualizado no princípio da proporcionalidade é a exigibilidade ou necessidade (Erforderlichkeit); por este elemento parcial a medida adotada não poderá exceder os limites do indispensável para a obtenção dos fins almejados, não podendo, assim, provocar gravame maior do que o estritamente necessário para o implemento do fim legítimo que se busca.

Luís Roberto Barroso (2003, p. 228) assim leciona o subprincípio da necessidade ou exigibilidade:

Conhecido também, como “princípio da menor ingerência possível”, consiste ele no imperativo de que os meios utilizados para o atingimento dos fins visados sejam os menos onerosos para o cidadão. É a chamada proibição do excesso. Uma lei será inconstitucional, por infringência ao princípio da proporcionalidade, “se se puder constatar, inequivocamente, a existência de outras medidas menos lesivas”

A idéia da necessidade ou exigibilidade como subprincipio da proporcionalidade está fulcrada no imperativo de que no momento da eleição de uma medida no caso concreto deve recorrer-se à medida mais suave, ou menos gravosa, de sorte a alcançar o fim almejado provocando o mínimo de prejuízo e restrições possíveis.    

Analisando o subprincípio da necessidade sob plano diverso, ou em sentido negativo, Suzana Toledo de Barros (2003, p. 82) leciona:

Na consideração de que uma medida é inexigível ou desnecessária, e que, por isso, fere o princípio da proporcionalidade, é importante se possa indicar outra medida menos gravosa – menor restrição – e concomitantemente apta para lograr o mesmo ou melhor resultado – meio mais idôneo.

O mero atingimento do fim inicialmente visado não é, por si só, suficiente para a legitimação da medida adotada excessivamente onerosa, que imponha gravame maior do que outros meios à disposição, devendo o Poder Judiciário, no exame concreto, apreciar a possibilidade de utilização de meios menos lesivos ou mais suaves para o mesmo fim, sob fundamento da afronta ao princípio da proporcionalidade.

No intuito de aprofundar o controle da exigibilidade/necessidade, Joaquim José Gomes Canotilho (2002, p. 270) desenvolve os quatro âmbitos deste subprincípio:

O princípio da exigibilidade, também conhecido como princípio da necessidade ou da menor ingerência possível, coloca a tónica na idéia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível. Assim, exigir-se-ia sempre a prova de que, para a obtenção de determinados fins, não era possível adoptar outro meio menos oneroso para o cidadão. Dada a natural relatividade do princípio, a doutrina tenta acrescentar outros elementos conducentes a uma maior operacionalidade prática: a) a exigibilidade material, pois o meio deve ser o mais poupado possível quanto à limitação dos direitos fundamentais; b) a exigibilidade espacial aponta para a necessidade de limitar o âmbito da intervenção; c) a exigibilidade temporal pressupõe a rigorosa delimitação no tempo da medida coactiva do poder público; d) a exigibilidade pessoal significa que a medida se deve limitar à pessoa ou pessoas cujos interesses devem ser sacrificados. (grifos do autor)

É neste contexto de busca do meio menos interventivo que o subprincípio da necessidade se desenvolveu, será proporcional aquela medida que provoque restrições apenas no limite do exigível, bem como seja a menos gravosa dentre outras aptas ao cumprimento do fim visado.

3..3 Proporcionalidade stricto sensu

O terceiro elemento parcial a compor o princípio da proporcionalidade na verdade pode ser visto como uma terceira dimensão para a concretização deste princípio, haja vista que vem em complementariedade aos dois subprincípios referidos, na busca da aferição da proporcionalidade da medida em análise. Assim Suzana Toledo de Barros (2003, p. 84-85) afirma:

Muitas vezes, um juízo de adequação e necessidade não é suficiente para determinar a justiça da medida restritiva adotada em uma determinada situação, precisamente porque dela pode resultar uma sobrecarga ao atingido que não se compadece com a idéia de justa medida. Assim, o princípio da proporcionalidade strictu sensu [sic], complementando os princípios da adequação e da necessidade, é de suma importância para indicar se o meio utilizado encontra-se em razoável proporção com o fim perseguido. A idéia de equilíbrio entre valores e bem é exaltada.

 

Na análise concreta, far-se-á necessário um “sopesamento” entre os valores que estão em jogo, de sorte a se aferir se os valores privilegiados pelos subprincípios da adequação e necessidade se justificam diante dos valores preteridos. Assim, Alexy (2002, p. 112-113) sustenta que enquanto os subprincípios da adequação e necessidade se circunscrevem à esfera da análise do “faticamente possível”, a proporcionalidade em sentido estrito envolve a questão da otimização das possibilidades jurídicas.

O Judiciário, quando da análise de situações que contemplem conflitos entre princípios ou direitos constitucionais, deve exercer um juízo de ponderação entre o direito efetivado pela decisão e o por ela restringido, a fim de ponderar acerca da proporcionalidade da situação amparada. Deve o Juiz valorar, segundo as circunstâncias e peculiaridades do caso concreto, se a decisão obteve um resultado satisfatório, e se o direito limitado deveria ser restringido frente ao efetivado, em uma "relação de precedência condicionada".

Fica conferido ao Judiciário, assim, o dever de examinar a situação concreta e decidir se o direito efetivado não afrontou um direito que deveria prevalecer naquele caso, precedendo ao direito respaldado. É dever do juiz, analisando as circunstâncias, ponderar acerca da proporcionalidade da restrição ao direito dos cidadãos, contrastando os resultados obtidos com a preterição efetuada.

A atuação da proporcionalidade em sentido estrito deve ser feita em associação ao dos subprincípios acima estudados, posto que apenas tendo em mãos a análise das possibilidades fáticas da adequação e necessidade da medida questionada, resta incompleto o exame da proporcionalidade, sendo necessária a ponderação dos valores em jogo. Assim Luís Roberto Barroso (2003, p. 228) afirma:

Cuida-se, aqui, de uma verificação da relação custo-benefício da medida, isto é, da ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos. Em palavras de Canotilho, trata-se “de uma questão de ‘medida’ ou ‘desmedida’ para se alcançar um fim: pesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens do fim”

Com efeito, Joaquim José Gomes Canotilho (2002, p. 270) assim caracteriza o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito:

Quando se chegar à conclusão da necessidade e adequação da medida coactiva do poder público para alcançar determinado fim, mesmo neste caso deve perguntar-se se o resultado obtido com a intervenção é proporcional à carga coactiva da mesma. Está aqui em causa o princípio da proporcionalidade em sentido restrito, entendido como princípio da “justa medida”. Meios e fins são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, com o objectivo de se avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim. Trata-se, pois, de uma questão de medidas ou desmedidas para se alcançar um fim: pesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens do fim.

Muito importante, ainda, é apresentar a conceituação de Willis Santiago Guerra Filho (2003, p. 70-71), definindo a relevância do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito para a proteção do “núcleo essencial” dos direitos fundamentais:

O “princípio da proporcionalidade em sentido estrito” determina que se estabeleça uma correspondência entre o fim a ser alcançado por uma disposição normativa e o meio empregado, que seja juridicamente a melhor possível. Isso significa, acima de tudo, que não se fira o “conteúdo essencial” (Wesensgehalt) de direito fundamental, com o desrespeito intolerável da dignidade humana, bem como que, mesmo em havendo desvantagens para, digamos, o interesse de pessoas, individual ou coletivamente consideradas, acarretadas pela disposição normativa em apreço, as vantagens que traz para interesses de outra ordem superam aquelas desvantagens.

Em suma, somente com a associação do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito ao da adequação e necessidade, cada um agregando seu valor de acordo com seu conteúdo, é que se tornará possível o completo diagnóstico de se a medida adotada em um caso concreto observou ou não o princípio da proporcionalidade.

4 Exemplos jurisprudenciais de utilização do princípio da proporcionalidade para a solução de conflitos envolvendo os Direitos Fundamentais

Para o encerramento deste estudo, uma vez reunidos elementos para melhor compreensão do princípio da proporcionalidade proceder-se-á à análise da aplicação deste princípio como método de solução de conflitos envolvendo direitos fundamentais, pontuando tal possibilidade de aplicação à luz de exemplos jurisprudenciais colhidos nos tribunais pátrios e internacionais.

A profusão legislativa, criando inúmeras previsões normativas a tutelar os direitos fundamentais, a intensificação das relações sociais promovida pelo desenvolvimento tecnológico dos meios de comunicação, transporte etc., são fatores cogitados como causa dos conflitos entre direitos fundamentais em casos concretos tão recorrentes nos dias atuais a demandarem solução dos órgãos jurisdicionais.

O jurista italiano Noberto Bobbio (1992, p. 42) bem demonstrava o dilema posto aos órgãos jurisdicionais quando reclamados a entregar provimento jurisdicional diante de conflitos entre direitos fundamentais:

Na maioria das situações em que está em causa um direito do homem, ao contrário, ocorre que dois direitos igualmente fundamentais se enfrentem, e não se pode proteger incondicionalmente um deles sem tornar o outro inoperante. Basta pensar, para ficarmos num exemplo, no direito à liberdade de expressão, por um lado, e no direito de não ser enganado, excitado, escandalizado, injuriado, difamado, vilipendiado, por outro. Nesses casos, que são a maioria, deve-se falar de direitos fundamentais não absolutos, mas relativos, no sentido de que a tutela deles encontra, em certo ponto, um limite insuperável na tutela de um direito igualmente fundamental, mas concorrente. E, dado que é sempre uma questão de opinião estabelecer qual o ponto em que um termina e o outro começa, a delimitação do âmbito de um direito fundamental do homem é extremamente variável e não pode ser estabelecida de uma vez por todas.

Desse modo, resta investigar os moldes em que vem ocorrendo a aplicação jurisprudencial do princípio da proporcionalidade nos conflitos envolvendo direitos fundamentais.

Paulo Bonavides (2006, p. 425), destaca a utilização do princípio da proporcionalidade na solução de conflitos entre direitos fundamentais no âmbito jurisprudencial das Cortes européias:

Uma das aplicações mais proveitosas contidas potencialmente no princípio da proporcionalidade é aquela que o faz instrumento de interpretação toda vez que ocorre antagonismo entre direitos fundamentais e se busca desde aí solução conciliatória, para a qual o princípio é indubitavelmente apropriado. As cortes constitucionais européias, nomeadamente o Tribunal de Justiça da Comunidade Européia, já fizeram uso freqüente do princípio para diminuir ou eliminar a colisão de tais direitos

Abordando a aplicação do princípio da proporcionalidade como técnica utilizada no âmbito jurisprudencial para a solução de conflitos envolvendo direitos fundamentais, Mendes (1999, p. 91-96) reúne dois casos célebres na Corte Constitucional alemã. O primeiro é a decisão de 24.02.1971, relativa a conflito entre o direito à liberdade artística e o direito da personalidade à honra e imagem, enquanto derivações do princípio da dignidade humana.

Mendes (1999, p. 91-93) relata o caso em que o filho adotivo de falecido ator de teatro Gustaf Gründgen postulava a proibição da publicação do romance Mephisto sob a alegação de que se cuidava de biografia injuriosa à memória do ator falecido. Após sucessivas decisões em instâncias inferiores, o Tribunal Constitucional procedeu à ponderação dos valores (liberdade artística versus direito à honra e imagem) em conflito no caso concreto com base na técnica da proporcionalidade, visando assegurar a máxima efetividade aos direitos em disputa, impondo restrições à liberdade artística com base na dignidade da pessoa humana:

 Nº.16

  1. Art. 5, III, 1º. Período da Lei Fundamental representa uma norma básica da relação entre o Estado e o meio artístico. Ele assegura, igualmente, um direito individual.
  2. A garantia da liberdade artística abrange não só a atividade artística, como a apresentação e a divulgação das obras de arte.
  3. O direito de liberdade artística protege também o editor.
  4. À liberdade artística não se aplicam nem a restrição do art. 5º., II, nem aquela contida no art. 2º., I, 2º. Período
  5. Um conflito entre a liberdade artística e o âmbito do direito de personalidade garantido constitucionalmente deve ser resolvido com fulcro na ordem de valores estabelecida pela Lei Fundamental; a garantia da inviolabilidade do princípio da dignidade humana consagrada no art. 1º, I”. (Decisão da Corte Constitucional, vol. 30, p. 173)

O segundo caso célebre citado por Mendes (1999, p. 94) envolvendo aplicação da técnica da ponderação de interesses do princípio da proporcionalidade, ficou conhecido como o “caso Lebach”, de 05.06.1973, em que um homicida requisitava impedir a divulgação de filme sobre  assassinato por ele cometido, pelo Canal de Televisão Zweites Deutsches Fernsehen – ZDF, sob a alegação de que tal divulgação dificultaria sua ressocialização pela ofensa à sua imagem e honra.

Após sucessivas decisões em instâncias inferiores o caso foi definitivamente julgado pelo Tribunal Constitucional alemão. Em síntese, feita a ponderação dos valores no caso concreto, através do princípio da proporcionalidade, a Corte Constitucional entendeu pela preponderância da proteção à imagem e honra do reclamante diante do direito à liberdade artística do Canal de Televisão:

Todavia, além de considerar a intangibilidade da esfera íntima, tem-se que levar em conta sempre o princípio da proporcionalidade. Por isso, nem sempre se afigura legítima a designação do autor do crime ou a divulgação de fotos ou imagens ou outros elementos que permitam a sua identificação.

Elucidativo julgado proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal revela a aplicação do princípio da proporcionalidade como técnica para a solução de conflitos envolvendo direitos da personalidade também na jurisprudência pátria:

 

PROCESSO CIVIL E CONSTITUCIONAL. CONFLITO DE NORMAS-PRINCÍPIOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. DIREITO À IINTIMIDADE E LIBERDADE DE IMPRENSA.

1. Os conflitos de normas-princípios, ao contrário do conflito entre normas-regras, são aclarados de acordo com o princípio da proporcionalidade, ou seja, basicamente com a ponderação de valores, mantendo-se o núcleo essencial da norma e verificando-se, sempre no caso concreto, seu âmbito de proteção.

2. Cotejando-se o direito à intimidade e a liberdade de imprensa, e verificando-se que, no caso concreto, não deve prevalecer, prima facie, o primeiro ao último, não se pode autorizar uma tutela específica no sentido de impedir o exercício da liberdade de imprensa, sob pena de cerceio de uma atividade assegurada constitucionalmente.

 

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores da Primeira Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Ana Maria Duarte Amarante - Relatora, Waldir Leôncio Júnior e Antoninho Lopes - Vogais, sob a presidência do Desembargador Eduardo de Moraes Oliveira, em conhecer e desprover. Unânime, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília-DF, 03 de junho de 2002.

Revela-se proveitoso observar a integra do voto da Relatora, seguido com unanimidade pela 1ª Turma Cível do TJ/DF:

                                                       VOTOS

 

       Desa. Ana Maria Duarte Amarante (Relatora) - Cabível e tempestivo, conheço do recurso.

       No mérito não está a merecer provimento.

       Pede o agravante que seja concedida liminar em cautelar, com efeitos inibitórios, impedindo que o ora agravado continue a manifestar-se de forma pejorativa sobre sua pessoa. Ademais, pleiteia a exclusão do site de notícias dos pronunciamentos anteriormente dispostos.

       Trata-se, inicialmente, de conflitos de normas-princípios que, a contrário do conflito entre normas-regras, são aclarados com as regras do princípio da proporcionalidade, ou seja, basicamente com a ponderação de valores, mantendo sempre núcleo essencial da norma, verificando-se, sempre no caso concreto, seu âmbito de proteção.

       Portanto, a hipótese vertente, exige, antes de tudo, a ponderação dos interesses em conflito, requerendo do intérprete a concordância prática entre os direitos em jogo, impedindo, assim, o sacrifício de um em relação ao outro. Nesse procedimento, funciona o princípio da proporcionalidade, no dizer de Suzana de Toledo Barros (in Princípio da proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais, Editora Brasília Jurídica, 1ª edição, p. 26), como “parâmetro técnico: por meio dele verificam-se se os fatos de restrição tomados em consideração são adequados à realização ótima dos direitos colidentes ou concorrentes. Afinal, o que se busca é a garantia aos indivíduos de uma esfera composta por alguns direitos, tidos por fundamentais, que não possam ser menosprezados a qualquer título.”

       Assim, como bem anota a mencionada professora, citando J.J. Gomes Canotilho, (ob. cit. p. 27) “o princípio considerado significa, no âmbito das leis interventivas na esfera de liberdades dos cidadãos, que qualquer limitação a direitos feita pela lei deve ser apropriada, exigível e na justa medida, atributos que permitem identificar o conteúdo jurídico do cânone de proporcionalidade em sentido amplo: exigência de adequação da medida restritiva ao fim ditado pela própria lei; necessidade da restrição para garantir a efetividade do direito e a proporcionalidade em sentido estrito, pela qual se pondera a relação entre a carga da restrição e o resultado.”

       Portanto, para aferição do mencionado princípio, deve-se seguir um procedimento metódico, dividido em etapas próprias que nos levarão a inferir qual o direito que deve prevalecer à espécie em concreto. Assim resume o professor Paulo Gustavo Gonet Branco (in Princípio da proporcionalidade no controle da constitucionalidade das leis e a Constituição de 1988, site IDP), quanto aos referidos obstáculos: “Como é sabido, uma norma passará no teste do princípio da proporcionalidade se vencer os desafios dos subprincípios constitutivos deste. Esses subprincípios são o princípio da adequação dos meios, o da necessidade e o da proporcionalidade em sentido estrito. O princípio da adequação dos meios pode ser traduzido como a exigência de que a medida em estudo seja apta para atingir a finalidade perseguida. O princípio da necessidade é também conhecido como princípio da ‘menor ingerência possível’ e constitui uma decorrência do postulado do favor libertatis, que participa da essência mesma do Estado democrático de direito. Não se admite, no Estado democrático, que os cidadãos se vejam num status de sujeição generalizada ao Poder Público. A interferência sobre direitos fundamentais individuais deve ser tão reduzida quanto possível, limitando-se ao estritamente necessário para atingir a finalidade que a justifica. Por último, o princípio da proporcionalidade em sentido estrito, exige que o resultado que se pretende obter com a medida se justifique ante a carga coativa que ele provoca. Põe-se em confronto o objetivo projetado com os meios empregados. Há de ser recusado o remédio eficaz para curar a doença, mas que acarreta efeitos colaterais ainda mais danosos do que ela.”

       Com efeito, podemos vislumbrar que a restrição aos direitos da imprensa, impedindo, por meio de uma tutela específica denominada pela moderna doutrina de inibitória, o exercício de seu direito de criticar, neste particular de forma irônica, a postura de determinadas pessoas públicas, vem a esbarrar, no mínimo e prima facie, na última etapa do princípio da proporcionalidade, qual seja, a proporcionalidade em sentido estrito. Ausente se encontra, portanto, dentro da análise estreita permitida pelo presente recurso, o fumus boni iuris ensejador da concessão da liminar em cautelar.

       Cotejando-se, neste caso concreto, o direito à intimidade a liberdade de imprensa (artigo 220, § 1º, da Carta Política), não deve prevalecer, prima facie, o primeiro ao último, mormente quando os fatos noticiados no site são pretéritos, não atuais. Somente o dano porventura suportado a sua imagem é que poderia ser passível de indenização. Não se autoriza, destarte, a exclusão das críticas passadas, porquanto os efeitos que já produziram, se é que produziram, foram no passado, não gerando qualquer efeito futuro. Ademais, muito menos poderia ser autorizada uma tutela específica no sentido de impedir, neste caso concreto, o exercício da liberdade de imprensa, sob pena de cerceio a uma atividade assegurada constitucionalmente. É escorreito que abusos devem ser impedidos, contudo não vislumbro, em princípio, motivos que poderiam ensejar a proibição de se divulgar bisbilhotices da vida de pessoas públicas.

       Dessa forma, dentro dos lindes estreitos do recurso ora interposto, deve prevalecer a decisão proferida pelo juízo a quo.

       ISTO POSTO, nego provimento ao recurso.

       É como voto. 

       Des. Waldir Leôncio Júnior (Vogal) - Com a Relatora. 

       Des. Antoninho Lopes (Vogal) - Com a Turma.

DECISÃO

        Conhecido e desprovido. Unânime.

Arrematando esta abordagem, pôde-se observar que a aplicação do princípio da proporcionalidade como técnica para a solução de conflitos entre direitos fundamentais está gradativamente se difundindo na jurisprudência européia como na jurisprudência pátria. Dessa sorte, através da utilização dos subprincípios e da técnica da ponderação de interesses, buscar-se-á garantir a máxima efetividade aos direitos da personalidade em disputa, com o mínimo de prejuízo.

Conclusão

O princípio da proporcionalidade pode ser apontado como um dos temas de mais destaque no cenário doutrinário e jurisprudencial atual. Não obstante tal princípio ainda não haver sido inserido expressamente na maioria das ordens constitucionais, vem sendo introduzido nos respectivos ordenamentos jurídicos como princípio implícito ou deduzido, com base na “abertura material” das Constituições aos princípios e direitos conformes aos valores adotados.

 Neste contexto, a evolução do princípio da proporcionalidade do âmbito estrito do Direito Administrativo para o plano constitucional potencializou sua aplicação para além da sua vocação inicial de parâmetro para o controle do exercício do “poder de polícia” do Estado. Sob o patamar de princípio constitucional, o princípio da proporcionalidade ganhou a atenção como importante ferramenta para a proteção dos direitos fundamentais.

Observa-se certo consenso doutrinário e jurisprudencial na composição dos elementos parciais ou subprincípios da proporcionalidade, precisamente a adequação (meio utilizado apto à produção do resultado objetivado), necessidade (utilização do meio mais suave para o fim visado) e a proporcionalidade em sentido estrito (ponderação dos interesses em conflito, visando a máxima otimização), que comporão em um procedimento trifásico a aplicação do princípio da proporcionalidade em um caso concreto.

Embora boa parte da doutrina, principalmente a administrativista, entenda pela fungibilidade entre os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, sustenta-se a autonomia destes, uma vez respeitados os diferentes processos evolutivos – razoabilidade, no direito norte americano, sob a base do devido processo legal substantivo  e proporcionalidade, no direito europeu continental, sob a necessidade de controle do “poder de polícia” e proteção dos direitos fundamentais -, bem como consideradas  as diferenças de conteúdo dos princípios.

 No que pese a investigação da aplicação jurisprudencial do princípio da proporcionalidade como técnica para a solução de conflitos envolvendo direitos fundamentais, constata-se que a tendência de utilização do princípio para a resolução de colisões entre princípios e direitos fundamentais consolidou-se com sucesso nos tribunais internacionais e pátrios como método eficaz a trazer solução para o caso concreto com o mínimo de prejuízo para os valores em litígio.

Concluindo, com base na pesquisa da aplicação do princípio da proporcionalidade mais precisamente para a resolução de conflitos envolvendo direitos fundamentais, constata-se a aplicação deste princípio como meio eficaz para apresentar a solução concreta demandada aos órgãos jurisdicionais, conferindo máxima proteção aos direitos fundamentais ameaçados ou violados, a exemplo dos julgados do Tribunal Constitucional alemão e do Tribunal de Justiça do Distrito Federal analisados, que legitimam a ampla aplicação do princípio para a solução do litígio.

REFERÊNCIAS

ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução de Ernesto Garzón Valdés.  Madrid: Centro de Estudios Políticos Y Constitucionales, 2002.

BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 3. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2003.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 5. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2003.

______. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BRAGA, Valeschka e Silva. Princípio da Proporcionalidade & da Razoabilidade. Curitiba: Juruá, 2004.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, Senado, 1988.

______. Lei 10.406/02, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil brasileiro. Brasília, DF, Senado, 2002.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

CAMBLER, Everaldo Augusto. et.al. Comentários ao Código Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2005.  v. 1.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002.

DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Agravo de Instrumento. Disponível em: <http:www//juris.tjdf.gov.br/revista/D702.doc >: Acesso em: 30  out. 2006.

FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos: A honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. 2. ed. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2000.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. 3. ed. São Paulo: Celso Bastos, 2003.

MARTINS, Flademir Jerônimo Belinatti. Dignidade da Pessoa Humana. Curitiba: Juruá, 2003.

MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 2. ed. São Paulo: Celso Bastos, 1999.

MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1993. v. 4.

MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

PONTES, Helenilson Cunha. O princípio da proporcionalidade e o direito tributário. São Paulo: Dialética, 2000.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

______. Constituição, Direitos Fundamentais e Direito Privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

SCHWABE, Jürgen. Cincuenta años de jurisprudência del Tribunal Constitucional Federal Alemán. Tradução de Marcela Anzola Gil. Bogotá. Ediciones Jurídicas Gustavo Ibáñez – Konrad -Adenauer-Stiftung, 2003.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do Direito. São Paulo: Malheiros, 2006.

STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão de Direitos Fundamentais e o princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Tibério Celso Gomes dos Santos

Procurador-Chefe da Fazenda Nacional no Estado do Amazonas<br>Diretor Estadual no Amazonas do Centro de Altos Estudos da Procuradoria da Fazenda Nacional – 2012/2013<br>Especialista em Direito Público pela Universidade Anhaguera/Uniderp<br>Graduado em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR<br>

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

O desenvolvimento do histórico do principio da proporcionalidade culminou na recente identificação de que tal princípio pode atuar de modo válido como técnica para a solução de conflitos entre direitos fundamentais.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos