Necessário se faz esclarecer a diferença principal entre indignidade e deserdação. Aquela tem como fundamentação a vontade presumida, a vontade do de cujus, visto que não há uma vontade declarada por parte do testador; já a deserdação só pode fundar-se na vontade expressa do testador, que declarará em seu testamento, de forma inequívoca, quem deserda e por que deserda.
Primeiramente faz-se necessário conceituar a deserdação e assim o faz muito bem Carlos Roberto Gonçalves: “Deserdação é o ato unilateral pelo qual o testador exclui da sucessão herdeiro necessário, mediante disposição testamentária motivada em uma das causas previstas em lei” ¹.
Lembremos que, são herdeiros necessários aqueles que possuem vocação hereditária, ou seja, os descendentes; ascendentes e cônjuges, nesta linha. Para efeito de esclarecimento, os parentes colaterais não são herdeiros necessários, sendo que, caso não seja da vontade do testador lhe conferir alguma propriedade, basta não os contemplá-los com o testamento.
Importante salientarmos também, que o cônjuge mesmo sendo herdeiro necessário não é passível de deserdação, por não estar esta exclusão prevista no Código Civil, como veremos adiante. Sendo assim, o cônjuge só será excluído da sucessão por meio da indignidade.
Assim, veremos a seguir de forma detalhada que os motivos da deserdação são específicos, estando este rol taxativo disposto no artigo 1.962, incisos, do Código Civil.
“Art. 1.862. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:
I – ofensa física;
II – injúria grave;
III – relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;
IV – desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade”.
O primeiro inciso trata da “ofensa física”. Tal motivo de deserdação gera polêmica e nos permite uma explanação quanto à sua natureza, pois o legislador não menciona, em momento algum, se trata-se de uma lesão corporal leve, grave ou gravíssima. Desta forma, entende-se que apenas “lesão física “já autoriza a deserdação, independente do seu grau e de condenação criminal, pois se busca a “prova absoluta de falta de afeto, respeito ou gratidão para com seu ascendente, não sendo justo, por isso que lhe suceda”².
Todavia, o inciso segundo do aludido dispositivo menciona injúria “grave”, não dando brechas para quaisquer outras modalidades, contudo, deve o magistrado usar de bom senso e avaliar também a condição social das pessoas envolvidas, para apreciar a questão.
Esclarece Carlos Gonçalves “a injuria grave constitui ofensa moral à honra, dignidade e reputação da vítima, sendo praticada por palavras ou escritos, tais como cartas, bilhetes, telegramas, bem como por meio de gestos obscenos e condutas desonrosas.”³
As “relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto” são a terceira causa de deserdação tratada pelo artigo em questão. A expressão “relações ilícitas” abrange outros atos libertinos, como o namoro, beijos lascivos, entre outras intimidades, não sendo uma exigência por sua vez a conjunção carnal.
Mesmo o inciso terceiro não prevendo relações ilícitas com o companheiro ou com a companheiro do autor da herança, Zeno Veloso, entende que “o filho que mantém relações ilícitas a companheira do pai pode ser deserdado”. ?
A última causa de deserdação trata do “desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade”. Neste inciso, o ascendente por ser qualquer um, sendo que tal desamparo e abandono pode ser de esfera material, espiritual ou moral.
Assim como os ascendentes podem deserdar seus descendentes, o inverso também pode ocorrer, com respaldo no artigo 1.814, C.C.
Os efeitos da deserdação são pessoais, sendo assim, por analogia ao que está previsto para os indignos, a exclusão não passará da pessoa do deserdado, não atingindo assim seus descendentes.
Para a efetivação da deserdação, após a morte do autor da herança um interessado qualquer ajuizará no prazo de 04 (quatro) anos, a contar da abertura do testamento, Ação Declaratória de Deserdação, onde deverá elaborar provas a fim de ser declarada a deserdação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1- Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões, Vol. 7, 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2013., p. 423.
2 - Maria Helena Diniz, Manual de Direito Civil: Direito de Família e das Sucessões, Vol. 6, p.193
3- Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões, Vol. 7, 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2013., p. 431.
4 - Zeno Veloso, Comentários, cit., v.21, p. 334.