1 INTRODUÇÃO
A liberdade religiosa e de culto, é considerada por boa parte da doutrina como um direito fundamental humano autônomo, dando uma importância maior ao mesmo ao não colocá-lo apenas como vertente do direito fundamental da liberdade, no entanto é sempre de notável importância que verifiquemos que nenhum direito é absoluto, seja ele fundamental ou não.
Tratar acerca deste tipo de liberdade é sempre uma questão delicada, que ultrapassa os limites do direito, nota-se que a pluralidade de religiões, crenças e cultos formam um mundo eclético, e que cada um desses rituais possuem características em comum e adversas, devendo ser respeitados pela sociedade em geral, tendo em vista o valor histórico e sentimental que cada um significa para seus adeptos.
Muito embora, o Estado possua o dever de assegurar a liberdade religiosa e de cultos, temos limites a serem respeitados, como já foi dito anteriormente, não existe direito absoluto no ordenamento jurídico brasileiro, não podendo haver livre disposição acerca dos demais direitos fundamentais da pessoa humana, ou seja, não pode um determinado ritual ferir a saúde ou a integridade física da pessoa humana, assim como obriga-la a renunciar a algum de seus direitos fundamentais.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 tratou acerca da liberdade religiosa e de cultos em dispositivo legal próprio, como se verifica no art. 5º, VI, como dispõe a seguir:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
VI - e inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; “
O presente trabalho ira tratar mais adiante e de forma mais detalhada acerca da liberdade religiosa e suas vertentes, mostrando ainda o papel do Estado na proteção aos locais onde ocorrem os cultos e movimentos religiosos. Mostraremos ainda acerca de temas de notável importância que abrangem os cultos e crenças atuais, como o envolvimento de crianças e animais nos mesmos, assim como de práticas ilegais e desumanas que fazem parte dos chamados sacrifícios presentes em religiões afro-brasileiras, não esquecendo ainda de dispor acerca da poluição sonora causada melos movimentos religiosos, e da utilização de animais para testes laboratoriais denotando acerca do posicionamento do nosso ordenamento jurídico nessa questão.
2 LIBERDADE RELIGIOSA E O DIREITO AMBIENTAL
A liberdade religiosa é uma garantia constitucional, é um direito fundamental, esse direito de liberdade religiosa inclui o direito de se ter uma religião, de se mudar de religião ou crença e o direito de manifestar a religião em público ou particular.
O direito à liberdade religiosa pode entrar em conflito com o direito ambiental, pelo menos em duas situações. Uma delas é o sacrifício de animais, como rito religioso; e o outro, o culto pentecostal em que há uma intensa propagação sonora.
3 IMOLAÇÃO DE ANIMAIS EM RITUAIS RELIGIOSOS
A imolação de animais é uma prática usual em algumas religiões. A história registra que povos, culturas demasiadamente avançadas aos olhos dos ocidentais contemporâneos, a exemplo das culturas inca e asteca, sacrificavam humanos em honra ao Deus sol, no topo de pirâmides cortadas ao meio. Os sacrifícios eram realizados na forma de oferendas, com predomínio da ideia de se aplacar a ira das calamidades.
O sacrifício de animais está presente em quase todas as religiões e, inclusive naquelas consideradas reveladas ou não baseadas em mistérios. O Hinduísmo, o Islamismo, que uma também é uma religião relevada de origem abraâmica semelhantemente ao judaísmo e ao cristianismo, e as religiões de matriz africana, como o Candomblé e a Umbanda praticam sacrifícios de animais.
No caso do islamismo o sacrifício é parte integrante de celebração para lembrar o sacrifício realizado por Abraão no monte Moriá, na oportunidade milhares de animais são sacrificados. Também os judeus por ocasião da sua páscoa, anualmente, promovem o sacrifício de animais, hoje não mais no Templo, visto que foi destruído pelos romanos no ano 70 da era cristã, mas nos seus lares.
Os cristãos, embora não sacrifiquem animais nem humanos, tem na morte de Jesus, o Cristo, ocorrida após condenação por crime político-religioso, condenação conduzida por sacerdotes do judaísmo em articulação com autoridades estatais do Império Romano, é tido como um sacrifício definitivo em substituição àquele sacrifício anual de cordeiros realizados pelos Hebreus no seu Templo, por ocasião da Páscoa. Observe-se que o sacrifício de Jesus é um sacrifício de expiação, a exemplo daquele em que os judeus expulsavam um bode para o deserto a fim de que morresse e assim expiasse os pecados do povo, ou seja, o sacrifício da cruz se destina a purgação dos pecados de todos os homens decaídos desde Adão, não é um sacrifício propiciatório, ou seja, aquele que ofertado em ação de graças à divindade, a Deus.
A missa diária dos católicos e a santa ceia dos protestantes e demais segmentos evangélicos, fundados ou não no dogma da transubstanciação, nada mais são do que a reiteração desse sacrifício de substituição.
Para se falar em liberdade religiosa é importante analisar-se o próprio conceito de religião, o conteúdo endógeno dos cultos às divindades, seus princípios filosóficos e morais, uma vez que o que para um homem é religião pode ser considerado por outro como uma superstição primitiva, imoralidade, ou até mesmo crime, não havendo possibilidade de uma definição judicial ou mesmo legal do que venha a ser uma religião.
Esclareça-se que ao contrário das religiões ditas reveladas, Cristianismo, Islamismo e Judaísmo, as religiões de matriz africana são religiões de iniciação e não de conversão, a imolação de animais é parte integrante desse processo e serve também para realizar uma comunicação e troca de benefícios religiosos entre os adeptos e as entidades, sempre obedecendo a regras específicas e sofisticadas, ditadas pela tradição e marcantes nesses rituais. Somado ao transe possessivo, o sacrifício de animais consiste em um dos pilares destas religiões.
Assim, inequívoco que o sacrifício nessas religiões deve sempre ser reconhecido enquanto um fenômeno social que mobiliza diferentes atores com fins específicos, social e legitimamente construídos.
A respeito do tema, na visão da Doutrina, afirma Celso Antonio Pacheco Fiorillo em seu Manual de Direito Ambiental e Legislação Aplicável: “Um dos aspectos do meio ambiente é a cultura do povo. Esta entidade como o conjunto de bens materiais e imateriais que compõem a identidade e formação dos diferentes grupos formadores da sociedade”. “Ora, é sabido e conhecido que a fauna é normalmente utilizada como forma de preservação e exercício da cultura dos diversos grupos da sociedade brasileira, exemplo disso são os rodeios, a farra do boi, o sacrifício de animais no candomblé, etc.”
4 RELIGIÃO AFRO-BRASILEIRA
Com o fim da escravatura dos índios, os colonizadores necessitavam de mão de obra escrava para o trabalho nos engenhos de açúcar e nas minas de ouro, atividades lucrativas predominante na época, a partir dessa carência, teve a chegada de grupos étnicos, principalmente da costa ocidental africana. No decorrer desse período da escravatura dos negros no Brasil, adveio a formação de várias religiões, ou seja, a partir da cultura afro-brasileira, como exemplo o candomblé na Bahia, a Macumba no Rio de Janeiro e o Batuque no Rio Grande do Sul.
4.1 USO DE ANIMAIS EM SACRIFÍCIOS RITUAIS NAS RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS
Não é exclusiva das religiões brasileiras de matriz africana. Nas religiões afro-brasileiras o sacrifício de animal pode ser entendido como uma troca de energias entre o fiel e o animal imolado ou quando o animal é sacrificado para a divindade como uma oferenda. A partir desses sacrifícios os espíritos são fortificados e alimentados e como resultado, os pedidos dos fieis podem ser atendidos.
4.2 OS SACRIFICIOS DE ANIMAIS NO DIREITO BRASILEIRO
No direito brasileiro privilegia a vida, tendo em detrimento de uma manifestação popular, ou seja, decidiram que primeiramente vai proteger a vida dos animais independente ou não da cultura que está sendo seguida. Ao ato de desrespeito aos animais, como maus- tratos, ferir, mutilar, realizar experiência dolorosa em animal ainda vivo é um ato ilícito punível tanto no âmbito civil quanto pena. Por outro lado, a realização de sacrifícios de animais pelos adeptos dessas religiões, não contrariando os dispositivos legais que asseguram aos animais o direito ao bem -estar, vedando condutas que lhe inflijam crueldade e maus-tratos, pelo contrário, entendendo-os como sagrados e dignos de respeito, é recepcionada pelo sistema jurídico brasileiro.
5 POLUIÇÃO SONORA
A poluição sonora refere-se ao efeito danoso provocado por sons em determinado volume que supera os níveis considerados normais para os seres humanos. Sabemos que existem inúmeros problemas em relação ao conflito concreto do Direito de manifestação de fé e manifestação Religiosa dos participantes, de uma determinada religião, e o Direito a tranquilidade dos outros indivíduos. Portanto não se pode coibir o livre exercício de fé de qualquer ser humano, pois este esta constitucionalmente assegurado na nossa Constituição de 1988 na norma contida no artigo 5º, inciso VI.
Logo a liberdade de culto é garantida bem como o seu exercício e a sua manifestação, devemos então se atender a sua racionalidade que muitas vezes acaba desrespeitando as esferas do exercício regular do Direito de Propriedade, que encontra limitações nas normas de Direito de Vizinhança, assim como também as pessoas que passam por o determinado local que se dar forma exagera ao expressar sua vontade em um volume considera impróprio. Incomodando com uma explosão de barulho mesmo estando de forma lícita.
6 UTILIZAÇÃO DE ANIMAIS PARA TESTES LABORATORIAIS
LEI 11.794/08 – regulamenta o uso científico de animais sancionada em 08 de outubro de 2008 criada para regulamentar a criação e utilização de animais em atividades de ensino e pesquisa científica, em todo território nacional, obedece aos critérios estabelecidos nesta lei. São consideradas atividades de pesquisa científica todas aquelas relacionadas com ciência básica e aplicada, desenvolvimento tecnológico, produção e controle de drogas, medicamentos, alimentos, etc., ou quaisquer outros testados em animais, conforme define o regulamento.
7 CONSELHO NACIONAL DE CONTROLE DE EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL – CONCEA
Esta instituição visa zelar pelo cumprimento das normas, credenciar instituições para criação ou utilização de animais, monitorar e avaliar a utilização de técnicas que substituam o uso de animais.
Rever periodicamente as normas para uso e cuidado dos animais para ensino e pesquisa, juntamente com as normas técnicas para instalação, credenciamento e funcionamento dos centros de criação e pesquisa. Manter o cadastro atualizado dos procedimentos de ensino e pesquisa realizados ou em andamento no pais, apreciar e decidir recursos interpostos contra decisões.
Elaborar e submeter ao ministro de estado da ciência e tecnologia, para aprovação, o seu regimento interno, assessorar o poder executivo a respeito das atividades tratadas nessa lei.
Comissões de ética no uso de animais – CEUAS é condição indispensável para o credenciamento das instituições com atividade de ensino ou pesquisa com animais a constituição previa de CEUAS.
São integrantes: 1 – médicos veterinários e biólogos; 2 – docentes e pesquisadores na área especifica; 3 – um representante da sociedade protetora dos animais, seguindo o regulamento;
Competência: 1- fazer cumprir o disposto em lei sobre a utilização de animais em pesquisa; 2- examinar previamente os procedimentos; 3- manter o cadastro atualizado dos procedimentos de ensino e pesquisa; 4- manter o cadastro dos pesquisadores que realizam procedimentos de ensino e pesquisa; 5-expedir certificados que se fizerem necessários para financiamento de pesquisa; 6-notificar o CONCEA e às autoridades sanitárias sobre qualquer acidente nas instituições credenciadas.
8 DA CRIAÇÃO E USO DE ANIMAIS PARA ENSINO E PESQUISA
Compete ao ministério da ciência e tecnologia licenciar a atividade, tendo em vista que somente instituições credenciadas pelo CONCEA poderão criar e utilizar animais para pesquisas. O animal será submetido a eutanásia, sempre que encerado o experimento, ou em qualquer das fases, for tecnicamente recomendado seu procedimento ou quando ocorrer intenso sofrimento. O CONCEA, levando em conta o nível de sofrimento do animal que se esperem obter, poderá restringir ou proibir experimentos. As penalidades que estão sujeitas as instituições que executem atividades reguladas nesta lei são as advertência, multa de R$ 5.000,00 a R$ 20.000,00, interdição temporária, suspenção de financiamento, interdição definitiva.
9 CONCLUSÃO
Concluímos que a liberdade à crença oferece ao indivíduo o direito de poder crer e seguir a religião que lhe traz um bem-estar maior, não podendo ser privado de assim o fazer. Sendo assim, a religião encontra respaldo na constituição brasileira, onde assegura o Brasil como um Estado laico e o direito de liberdade de crença, culto religioso e suas liturgias. Porém, nem por isso este direito é absoluto, sendo limitado o seu exercício quando em conflito com outros bens jurídicos protegidos.
Nem dentro do templo, nem fora deles, podem os praticantes de um determinado credo prejudicar o direito ao sossego dos que forem vizinhos ou estiverem nas proximidades das práticas litúrgicas.
Cabe destacar, por conseguinte, que a questão dos sacrifícios de animais em atos de crenças que não contrarie os dispositivos legais que asseguram os direitos dos animais é recepcionada pelo direito brasileiro. E também não pode ser típico perante a lei de crimes ambientais, pois quando se realiza o sacrifício não existe o dolo de submeter os animais a maus- tratos.
Por fim, no Brasil sempre permitiu que animais fossem utilizados em pesquisas científicas e testes de medicamentos, drogas e cosméticos. No entanto, foi apenas em 2008 que tivemos uma legislação específica para a regulamentação do uso científico de animais.