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Sinais abióticos.

Putrefação, autólise, maceração, fauna cadavérica, mumificação e saponificação

30/11/2014 às 15:22
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Estudo das condições da evolução da putrefação e fenômenos que podem ensejar a destruição do cadáver – autólise, maceração, putrefação e fauna cadavérica – e/ou a sua conservação – mumificação e saponificação.

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo esclarecer a relevância médico-legal da Tanatologia, especialmente a contribuição que os sinais abióticos fornecem ao Direito, no que tange a respostas de questões envolvendo a morte do indivíduo.

A princípio, estudaremos as condições da evolução da putrefação e fenômenos que podem ensejar a destruição do cadáver – autólise, maceração, putrefação e fauna cadavérica – e/ou a sua conservação – mumificação e saponificação.

Cada um desses itens serão explicados e analisados na perspectiva jurídica, de forma que seja ressaltada a sua importância para o Direito.

Para elaboração do presente trabalho, utilizamos pesquisa doutrinária e internet.


CONDIÇÕES DA EVOLUÇÃO DA PUTREFAÇÃO

A putrefação é o processo de decomposição da matéria orgânica de bactérias e pela fauna macroscópica, que acaba por devolve-la à condição de matéria inorgânica. A putrefação do corpo não é um processo resultante do evento morte, apenas. É necessária a participação ativa de bactérias cujas enzimas, em condições favoráveis, produzem a desintegração do material orgânico. Daí, que nas condições térmica que impeçam a proliferação bacteriana, ou pela ação de substancias antissépticas, o cadáver não se putrefaz. As bactérias encarregadas da putrefação do cadáver, na sua maioria, são as mesmas que, em vida, formam a flora intestinal do individuo. Algumas das substancias intermediárias formadas durante o processo de decomposição das proteínas são altamente fétidas, tornando-se as responsáveis pelo cheiro característico dos corpos em putrefação. A decomposição catalítica dos glúcides e dos lípides, praticamente não exala odores nauseabundos. Esse processo de decomposição paulatina é bastante lento. As larvas de insetos todas com atividade necrofágica, se deixadas agir livremente, podem destruir o cadáver em um tempo bem menor, de quatro a oito semanas.

Com efeito, em um cadáver exposto à intempérie, a putrefação se ve acelerada, sendo certo que os corpos enterrados têm a sua decomposição retardada em até oito vezes com relação aos primeiros.

A putrefação se desenvolve em quatro fases ou períodos distintos e consecutivos, a saber:

  • Primeira fase – Período cromático (Período de coloração, período das manchas): inicio, em geral, de dezoito a vinte e quatro horas após o óbito, com uma duração aproximada de sete a doze dias, dependendo das condições climáticas. Inicia-se pelo aparecimento de uma mancha esverdeada na pelé da fossa ilíaca direita (mancha verde abdominal), cuja cor é devida à presença de sulfometahemoglobina. Nos recém-nascidos e nos afogados, a mancha verde é torácica e não abdominal, com cheiro característico (transformação da hemoglobina).

  • Segunda fase – Período enfisematoso (Período gasoso, período deformativo): inicia-se durante a primeira semana e se estende, aproximadamente, por trinta dias. Os gases produzidos pela putrefação (notadamente gás sulfídrico, hidrogênio fosforado e amônia), infiltram o tecido celular subcutâneo modificando, progressivamente, a fisionomia e a forma externa do corpo. Esta distensão gasosa é mais evidente no abdome e nas regiões dotadas de tecidos areolares como face, pescoço, mamas e genitais externos. Os próprios gases destacam a epiderme do córion, formando extensas flictenas putrefativas, cheias de liquido transudado (posição de lutador).

  • Terceira fase – Período coliquativo (Período de redução dos tecidos): inicia-se no fim do primeiro mês e pode estender-se por meses ou até dois ou três anos. Caracteriza-se pelo amolecimento e desintegração dos tecidos, que se transformam em uma massa pastosa, semilíquida, escura e de intensa fetidez, que recebe o nome de putrilagem. A atividade das larvas da fauna cadavérica auxilia grandemente na destruição total dos restos de matéria. Como mencionado, os insetos e suas larvas podem destruir a matéria orgânica do cadáver com extrema rapidez (quatro a oito semanas).

  • Quarta fase – Período de esqueletização: no final do período coliquativo, a putrilagem acaba por secar, desfazendo-se em pó. Desta maneira, surge o esqueleto ósseo, que fica descoberto e poderá conservar-se por muito tempo. Pela ação da fauna e do meio ambiente com a destruição dos tecidos, restando apenas o esqueleto, cabelos e dentes (três anos). Quando o cadáver permanece insepulto e abandonado sobre o solo por razoável tempo, nele se instalam pequenos animais (principalmente insetos) denominados como fauna cadavérica, que seguem certa ordem de instalação: moscas comuns, moscas verdes, coleópteros e lepidópteros.

O estudo da fauna cadavérica pode ser importante para a cronotanatognose, pois o aparecimento de determinados insetos esta relacionado ao tempo de morte. Parte Medicina Legal que trata da investigação da data ou do momento da morte, levando em conta o esfriamento, o enrijecimento, a putrefação do cadáver e outros elementos.

A maceração é o processo de transformação destrutiva em que ocorre o amolecimento dos tecidos e órgãos quando os mesmos ficam submersos em um meio liquido e nele se embebem. Ou mais frequente é que aconteça com a agua e o liquido amniótico. Na maceração, a pele se torna esbranquiçada, friável, corruga-se e faz com que a epiderme se solte da derme e possa até se rasgar em grandes fragmentos. Isto é bastante evidente nas mãos onde a pele se desprende a modo de “luvas” em ambientes úmidos e quentes, destruição em meio liquido, comum nos fetos e nos afogados com formação de bolhas de conteúdo liquido e pardacento, o corpo perde a consistência inicial, o ventre se achata e os ossos se livram dos tecidos, ficando como se estivessem soltos. Externamente, a derme, pelas razões acima apontadas, fica exposta, mostrando-se vermelha brilhante, luzidia por causa do próprio edema que a embebe e a torna túrgida.


FENÔMENOS TRANSFORMATIVOS DESTRUTIVOS

Processo destrutivo

Processo de destruição dos tecidos que ocorre após a morte com a transição dos restos biológicos até sua fossilização. Os fatores que influem para a ocorrência destes fenômenos são, principalmente, a temperatura, a aeração, a higroscopia do ar, o peso do corpo, as condições físicas, a idade do morto e a causa da morte. Podemos observar também a atividade de bactérias e insetos necrófagos.

Autólise

Caracteriza-se por uma série de fenômenos fermentativos anaeróbicos que ocorrem no interior das células do individuo após sua morte, ocorrem independentemente de qualquer ação de outros microrganismos. É o primeiro dos fenômenos cadavéricos.

Na fase latente as mudanças ocorrem apenas no citoplasma da célula, já na fase necrótica o núcleo celular desaparece. As células deixam de receber nutrientes passando por um processo de acidificação devido as fermentações que ocorrem. Assim que o aumento do PH das células de um corpo evidenciam a morte do mesmo.

Os diferentes tecidos do corpo sofrem a autólise em diferentes momentos, dependendo de suas capacidades enzimáticas. A córnea, por exemplo, por não ter vasos sanguíneos, pode ser transplantada sem problemas mesmo horas depois da morte clinica.

Putrefação

Consiste na decomposição fermentativa dos tecidos pela ação de diversos seres microscópicos, em seguida da autólise. O abdômen é onde se inicia este processo, com uma mancha verde característica, fato que só não ocorre nos recém nascidos.

A velocidade da decomposição varia de acordo com diversos fatores particulares bem como a condição do cadáver, uma ferida aberta, por exemplo, pode servir de porta de entrada para larvar, acelerando a decomposição.

O período cromático ou de coloração inicia-se pela mancha verde abdominal, que vai se espalhando pelo corpo e deixando o cadáver com um aspecto azul esverdeado e vai escurecendo até o verde-enegrecido. Tal tonalidade é causada pela formação de hidrogênio sulfurado.

No período gasoso ou enfisematoso é aquele em que do interior do corpo os gases da putrefação vão formando bolhas na epiderme, o cadáver incha. Há projeção dos olhos e da língua, bem como a distensão do abdômen.

O período coliquativo ou de liquefação é aquele em que as partes moles se decompõem, a derme se descola da epiderme e o corpo perde sua forma. Nesta fase há a presença de larvas e insetos necrófagos em grande número.

Por fim, no período de esqueletização, os ossos se apresentam quase livres, unidos por algumas articulações. O crânio se destaca do restante do corpo e ainda resta uma massa denominada putrilagem, resto decomposto das vísceras. Este período dura de 3 a 5 anos, os ossos resistem muito tempo, porém vão perdendo sua estrutura e peso com o passar do tempo.

Quando de uma exumação ou perícia em um corpo já morto há algum tempo a fase da putrefação bem como o estudo da fauna de insetos, bactérias e fungos encontrada pode dar importantes pistas acerca da causa da morte bem como do tempo em que se sucedeu.

Maceração

A maceração é um fenômeno de transformação que ocorre no cadáver quando em meio aquoso como nos afogados (maceração séptica), ou pode ocorrer no feto quando morre no útero da mãe do sexto ao nono mês de gestação (maceração asséptica).

Há o destacamento de amplos segmentos cutâneos, devido ao fenômeno da embebição da hemoglobina, fazendo com que a epiderme se solte facilmente, além dos órgãos soltarem-se dentro do ventre.

Apresenta diversos sinais, como o de Spalding (cavalgamento dos ossos da abóboda craniana), Harley (perda da configuração da coluna vertebral), Damel (halo pericraniano translucido), Spangler (achatamento da abóboda craniana), entre outros.

Pode se apresentar em graus: a) no primeiro grau há presença de flictenas na epiderme contendo líquido serosanguinolento (primeira semana de morte); b) no segundo grau há ainda as flictenas, liquido amniótico sanguinolento e epiderme arroxeada (segunda semana de morte); c) no terceiro grau há a deformação craniana, infiltração hemoglobínica das vísceras e córion de tonalidade marrom escura.


FENÔMENOS TRANSFORMATIVOS CONSERVADORES

Mumificação

A mumificação é um processo transformativo conservador do cadáver, que pode ser natural, artificial ou misto; tem relevante importância médico-legal porque possibilita, mais facilmente do que nos demais processos, o diagnóstico da causa da morte e a identificação do cadáver.

Os processos naturais exigem condições ambientais – clima quente e seco – que garantam a desidratação rápida do cadáver, de modo a impedir a ação microbiana responsável pela putrefação; e pode ser condicionado a fatores como idade, sexo e causa da morte.

Os processos artificiais cuidam da submissão do cadáver a técnicas especiais de conservação. Entre essas técnicas especiais, destaca-se o embalsamamento, há muito praticados pelos egípcios, pelos nativos das Ilhas Canárias e pelos incas no Peru. Os processos artificiais serão sempre realizados a pedido dos familiares, justificado por motivações piedosas ou por fins didáticos. As duas hipóteses estão disciplinadas por legislação específica.

Os processos mistos resultam do favorecimento de um processo artificial por fatores ambientais na conservação do corpo.

O cadáver mumificado apresenta peso reduzido; pelé dura, seca, enrugada e de tonalidade enegrecida; cabeça diminuída de volume; traços fisionômicos da face vagamente conservados: os músculos, tendões e vísceras destroem-se pela pressão leve, transformando-se em pó, e os dentes e as unhas permanecem bem conservados.

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Saponificação

A saponificação é um processo transformativo conservador do cadáver que ocorre de forma espontânea; tem relevante importância médico-legal porque permite realizar uma série de exames algum tempo depois da morte.

Assim, será possível estudar melhor certas lesões pela conservação maior do tecido celular subcutâneo, como nas feridas produzidas por ação de projéteis de arma de fogo ou de arma branca. O mesmo se diga da possibilidade de se estudarem lesões do pescoço quando produzidas por laços os estrangulamentos e enforcamentos. E, por fim, levando em conta a razoável conservação das vísceras, podem-se ter contribuições valiosas através de exames toxicológicos e histopatológicos.

Geneval Veloso de França explica que a saponificação não é um processo inicial: “surge depois de um estágio mais ou menos avançado de putrefação quando certas enzimas bacterianas hidrolisam as gorduras neutras, dando origem aos ácidos graxos, os quais em contato com elementos minerais da argila se transformam em ésteres”.

O processo inicia-se após a sexta semana depois da morte, em meio onde haja água estagnada e pouco corrente, e solo argiloso, úmido e de difícil acesso ao ar atmosférico. Também está sujeito a fatores como idade, sexo, obesidade e doenças que originam degeneração de gordura.

O cadáver saponificado apresenta consistência untuosa, mole e quebradiça, de tonalidade amarelo-escura, que dão aparência de cera ou sabão. Além disso, exala odor de queijo rançoso.

A doutrina diverge sobre quais são os tecidos passíveis de saponificação: somente a gordura normal ou todos os demais tecidos. A primeira tese explica que a putrefação ocorre antes da saponificação, o que justificaria o desaparecimento dos músculos; contudo, há casos em que a saponificação compromete apenas a superfície do cadáver.


CONCLUSÃO

A palavra morte vem do grego tanatus e do latim mors, que significam a “extinção da vida” ou “a cessação definitiva de todas as funções de um organismo vivo”.

Na medicina legal, a morte é caracterizada pela presença dos sinais abióticos que, apresentados em conjunto, indicam ausência de vida. Logo após dos sinais abióticos imediatos, onde ocorre a morte encefálica, temos a presença dos sinais abióticos mediatos, causados a partir da parada da função metabólica do cadáver.

Referida matéria possui interesses nas áreas médicas, sociais, religiosas, jurídicas, filosóficas e sanitárias. Com relação à área jurídica, podemos afirmar que a morte é um fenômeno que possui ligação íntima com a matéria, pois a partir do momento da morte de um ser humano, abre-se um leque de consequências jurídicas como a cessação da personalidade civil adquirida com o nascimento, término da capacidade jurídica do “de cujus”, extinção de direitos e de punibilidade.

Ainda, por ter sido o Código Penal criado como um dos instrumentos de controle da conduta humana, é imprescindível que se esclareça, através da Medicina Forense, todos os atos de violência ou agressões que possam ter sido cometidos contra o cadáver, uma vez que o laudo médico será imprescindível para auxiliar os magistrados do Poder Judiciário que tem como dever aplicar de forma adequada as Normas Legais do Direito ao causador do dano.

Concluímos, então, que a Medicina Forense é uma matéria de suma importância no mundo jurídico, sendo imprescindível ao jurista seu estudo, a fim de que este esteja apto a avaliar os laudos que recebe, suas limitações, bem como saber o momento correto de solicitá-los. É necessário que este jurista possua noções sobre como ocorrem as lesões corporais e as conseqüências delas decorrentes, os sinais que aparecem logo após a morte e as alterações relacionadas a esta, como os fenômenos cadavéricos e os conceitos diferenciais ocasionados por embriaguez e uso de entorpecentes, a fim de excluir as mortes ocasionadas por causas naturais ou uso indevido de substâncias pelo próprio morto e fazer jus ao direito daquele que um dia habitou o mundo dos vivos.

Cumprimos todos os objetivos propostos porque respondemos todos os questionamentos levantados a partir do estudo da Tanatologia e da compreensão de como ela se manifesta em face das questões que se apresentam à sociedade.

A importância da elaboração do presente trabalho vai além do conhecimento e compreensão do tema. Esse primeiro contato com a Tanatologia permitiu o desenvolvimento do raciocínio jurídico, bem como o aperfeiçoamento de competências, como investigação, seleção, organização e comunicação da informação.

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Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GALLI, Lorena Bognar. Sinais abióticos.: Putrefação, autólise, maceração, fauna cadavérica, mumificação e saponificação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4169, 30 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33919. Acesso em: 21 nov. 2024.

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