O instituto da tentativa, previsto no artigo 14, inciso II, do Código Penal Brasileiro, é a não-consumação de um crime, cuja execução foi iniciada e não se concluiu por circunstâncias alheias à vontade do agente. Sua natureza jurídica é de extensão temporal da figura típica causadora da adequação típica mediata ou indireta, antecipando a tutela penal para abarcar os atos executórios prévios à consumação, ensejando um juízo de tipicidade. A tentativa refere-se ao início de execução da violação da norma jurídica e a consumação é a violação completa.
A tentativa faz parte da terceira fase do Iter Criminis (Itinerário ou Caminho do Crime): I) Cogitação, II) Atos Preparatórios, III) Execução e IV) Consumação. Em regra o crime é punido somente na terceira fase dos atos executórios e excepcionalmente punem-se os atos preparatórios como crime autônomo (artigos 288 e 291 do C.P.B.).
Assim como os crimes de mera conduta e os formais, a tentativa possui apenas dois elementos alojados no fato típico. A conduta e a tipicidade. O resultado naturalístico naquele não ocorre e nesse não é exigido para sua integralização.
Em regra os crimes materiais admitem a forma tentada e os formais excepcionalmente. Estes consumam-se em regra com a conduta, sendo o resultado mero exaurimento levado em consideração pelo juiz na aplicação da pena-base nos termos do artigo 59 do Diploma Substantivo. Noutra banda, temos as infrações penais que inadmitem a forma tentada, tais como: as contravenções penais (artigo 4º do Decreto-Lei 3.688/1941), crimes de atentado ou de empreendimento (artigo 352 do C. P.B. E artigo 309 do C. E..), crimes unissubsistentes (inadmitem fracionamento), crimes preterdolosos ou preterintencionais (lesão corporal seguida de morte - artigo 129, §3º, do C. P.B.), crimes habituais (exigem reiteração dos atos isolados), crimes de mera conduta ou de simples atividade, crimes condicionados ao resultado naturalístico (indução, instigação ou auxílio ao suicídio – artigo 122, § 1º, do C. P.B.), roubo impróprio (resultante da fusão do crime de furto tentado ou consumado e emprego de violência física ou grave ameaça para assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa) e os crimes culposos, exceto a culpa imprópria tratada no instituto da descriminante putativa (artigo 20, § 1º, do C. P.B.).
O dolo ou elemento subjetivo na tentativa é de consumação. Este somente não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente. Seus elementos são: a) início de execução, b) não- consumação e c) circunstâncias alheias à vontade do agente.
Em conformidade com o parágrafo único do artigo 14 do Diploma Substantivo (“Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços”), a punibilidade da tentativa é realizada sob a ótica da Teoria Objetiva, Realística ou Dualista, levando-se em conta a lesão ao bem jurídico ou o perigo concreto, e, não a intenção do agente em consumar o delito, caso em que seria aplicada a Teoria Subjetiva, Voluntarística ou Monista. Esta por sua vez, é adotada excepcionalmente pela nossa legislação penal, punindo-se o crime tentado da mesma forma do consumado, v. g., artigo 352 do C. P.B. (“Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa”) e artigo 309 do C. E. (“Votar ou tentar votar mais de uma vez, ou em lugar de outrem”).
Cumpre observar que, o delito tentado deve ser valorado judicialmente na Terceira Fase do Sistema Trifásico, preconizado no artigo 68 do Código Penal, durante a aplicação da pena. Outrossim, realça importância no arbitramento de fiança pelas autoridades policial e judicial, conforme disposto nos artigos 322 e 326 do Código Processual Penal, em observância aos Princípios Constitucionais da Intranscendência e da Individualização da Pena, desenhados no artigo 5º, incisos XLV e XLVI, da Bíblia Política.
O crime tentado também é conhecido por outros rótulos: conatus, crime manco, crime imperfeito, ou, na preferência de Zaffaroni, crime incompleto, em oposição ao crime consumado, reconhecido como completo ou perfeito.
As tentativas podem ser: a) imperfeita, inacabada ou propriamente dita, b) perfeita, acabada ou crime-falho, c) branca ou incruenta, d) vermelha ou cruenta, e) tentativa abandonada ou qualificada e f) tentativa impossível, inidônea, inadequada ou quase-crime.
A modalidade imperfeita ou inacabada ocorre quando há interrupção do processo executório em razão do agente não praticar todos os atos de execução do crime por circunstâncias alheias à sua vontade. Já na forma perfeita ou acabada, o agente pratica todos os atos de execução, mas por circunstâncias alheias à sua vontade não se dá a consumação. Essas formas tentadas são relevantes no momento da aplicação da pena pelo juiz. Quanto mais perfeita a tentativa, maior será a dosimetria da pena e o quantum da redução, entre um a dois terços, é inversamente proporcional à proximidade da produção do resultado.
Ocorre a tentativa branca quando o objeto material não é atingido. O inverso é tentativa vermelha. Ambas as formas contemplam as tentativas imperfeita e perfeita.
Por sua vez, a tentativa abandonada ou qualificada é a não-consumação de um crime, cuja execução foi cessada pela desistência ou arrependimento do agente. Possui natureza jurídica de causa geradora de atipicidade relativa ou absoluta. Provoca a exclusão da adequação típica indireta, fazendo com que o autor não responda pela tentativa, mas pelos atos até então praticados, salvo quando não configurarem fato típico. Seus elementos são: a) início de execução, b) não-consumação e c) interferência da vontade do agente. Diferencia-se da tentativa em relação à vontade do agente. Enquanto na tentativa o momento consumativo não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente. Nesta é a interferência da vontade do próprio agente que evita a consumação.
As espécies da tentativa abandonada são a desistência voluntária e o arrependimento eficaz, gizado no artigo 15 do Digesto Penal. Na primeira o agente interrompe voluntariamente a execução do crime, impedindo, a sua consumação. Nela dá-se o início de execução, porém o agente muda de ideia e, por sua vontade, interrompe a sequência de atos executórios, fazendo com que o resultado não aconteça. Tem semelhança com a tentativa imperfeita por não esgotar os atos executórios e permanecer na fase de iniciação. A segunda, ocorre quando o agente, após encerrar a execução do crime, impede a produção do resultado. Nesse caso, a execução vai até o final, não sendo interrompida pelo autor. No entanto, após esgotar a atividade executória, arrepende-se e impede o resultado. Tem relação com a tentativa perfeita. Ambos institutos são denominados por Franz Von Liszt de Ponte de Ouro, levando-se em conta a possibilidade do agente desistir ou arrepender-se de seu intento e ser agraciado com a exclusão do delito preordenado.
A tentativa impossível ou inidônea ocorre pela absoluta ineficácia do meio ou por absoluta impropriedade do objeto material, sendo impossível consumar-se o crime, nos termos do artigo 17 do Diploma Penal. Não isenta o agente de pena, mas sim, gera a atipicidade da conduta (ação ou omissão), pois não se concebe queira o tipo incriminador descrever como crime uma conduta impossível de se realizar.
Destarte, neste modesto arrazoado, não pretendemos esgotar o assunto, mas apenas darmos uma noção sobre o tema, para apontarmos que o Código Penal Brasileiro nos termos do artigo 14, inciso II e parágrafo único, adotou a tentativa imperfeita como regra, não exigindo o esgotamento dos atos executórios para a tipificação indireta ou mediata, adotando excepcionalmente, a tentativa perfeita, para valoração da dosimetria da pena no tocante à proximidade ou não da consumação, situação em que oscilará entre um a dois terços.
Referência:
Masson, Cléber. Direito Penal Esquematizado. 2ª ed. São Paulo: Ed. Método, 2009.
Capez, Fernando. Direito Penal: Parte Geral. 13ª ed. São Paulo: Ed. Damásio de Jesus, 2007.
Souza, Luiz Antonio de. Direito Penal:Coleção OAB Nacional.4ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2011.