Da necessidade do prévio requerimento administrativo para obtenção do benefíco previdenciário

05/12/2014 às 10:07
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Há necessidade do prévio requerimento na via administrativa, como condicionante à propositura de ações de natureza previdenciária?

INTRODUÇÃO

Primeiramente, urge destacar que o presente estudo objetiva traçar uma análise acerca do instituto chamado prévio requerimento administrativo para o ajuizamento de ação previdenciária.

Ou seja, a questão a ser analisada diz respeito à necessidade de que o segurado ou seu dependente promova o requerimento administrativo de benefício previdenciário perante o INSS antes de ingressar com a ação judicial em postulação à prestação previdenciária, sob pena de falta de interesse de agir, conforme preceitua Frederico Amado, em seu curso de direito previdenciário (p. 711).


DO ENTENDIMENTO FIRMADO NA JURISPRUDÊNCIA ACERCA DO TEMA.

 Conforme lição de Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, em Manual de Direito Previdenciário (p.935), “A exigência de comprovação do prévio ingresso na via administrativa como condição para a propositura de ação de natureza previdenciária, embora seja assunto há muito debatido em nossos Tribunais, é tema frequente e atual nas lides previdenciárias”.

Ainda, segundo lição dos estudiosos, acima citados:

“A necessidade de prévia manifestação do Poder Público como condição para invocar a prestação jurisdicional pode, aparentemente, significar lesão ao direito de ação garantido pela Constituição, no art. 5º, inciso XXXV. Observamos, no entanto, que esse dispositivo estabelece que somente os casos de lesão ou ameaça de lesão a direito serão apreciados pelo Poder Judiciário.

Não se trata de forma de submissão do direito de ação à prévia manifestação da administração a respeito do pedido, mas de comprovação do legítimo interesse para o exercício desse direito, o qual é exigido pelo art. 3º do Código de Processo Civil. Sem a demonstração da existência de um conflito de interesses, não há como ser invocada a prestação jurisdicional”.

De efeito, conforme ensinamentos de Frederico Amaro, o caráter substitutivo da jurisdição apenas deverá se operar quando houver litígio, ou seja, pretensão dos beneficiários do RGPS resistida pelo INSS, a fim de que os atos da Administração Pública sejam validados ou revistos pelo Poder Judiciário.

Ou seja, caso um segurado da previdência social intente uma ação judicial contra o INSS, sem provocar previamente a autarquia previdenciária, inexistirá, no caso, lesão ou ameaça a direito subjetivo do proponente.

De outra banda, dispensar o prévio requerimento administrativo para ajuizamento de ação previdenciária, segundo a doutrina, contrariaria os arts. 267, VI, do CPC e 5º, XXXV, da CF/88.

Por outro lado, a jurisprudência que se filia ao entendimento da não obrigatoriedade de prévio requerimento administrativo no âmbito do INSS, para que a parte possa ajuizar ação previdenciária, está fundada, em suma, no respeito ao amplo acesso à Justiça.

Entretanto, a corrente que se tornou majoritária foi aquela que defendia a demonstração de prévio requerimento administrativo para ajuizamento de ação previdenciária, a fim de demonstrar a existência da própria lide deduzida perante o judiciário. Segundo esse posicionamento, decisão em sentido contrário ofende diretamente o artigo 5º, XXXV, da CF.

No Supremo Tribunal Federal foi reconhecida a presença de repercussão geral na matéria em exame no RE 631.240/MG, Rel. Min. Joaquim Barbosa.

Além disso, houve a afetação do referido tema ao rito do recurso especial repetitivo na decisão proferida no REsp n° 1.369.834/SP, publicada no DJe de 04/06/2013, Rel. Min. Benedito Gonçalves.

Quanto ao recurso especial repetitivo nº 1.369.834/SP, o mesmo ainda está pendente de julgamento no e. STJ.

Já quanto ao Recurso Especial nº 1.310/042/PR, na Sessão do dia 15.05.2012, a Segunda Turma do Eg. STJ, ao negar provimento ao recurso especial interposto pela parte autora, alterou seu entendimento acerca da matéria, passando a defender a exigência de prévio requerimento administrativo para o ajuizamento de ação previdenciária, sob pena extinção do processo, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 267, VI, do CPC, ante a falta de uma das condições da ação, a saber, o interesse processual.

Eis a ementa do referido julgado:

“PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CONCESSÓRIA DE BENEFÍCIO. PROCESSO CIVIL. CONDIÇÕES DA AÇÃO. INTERESSE DE AGIR (ARTS. 3º E 267, VI, DO CPC). PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE, EM REGRA.

1. Trata-se, na origem, de ação, cujo objetivo é a concessão de benefício previdenciário, na qual o segurado postulou sua pretensão diretamente no Poder Judiciário, sem requerer administrativamente o objeto da ação.

2. A presente controvérsia soluciona-se na via infraconstitucional, pois não se trata de análise do princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). Precedentes do STF.

3. O interesse de agir ou processual configura-se com a existência do binômio necessidade-utilidade da pretensão submetida ao Juiz. A necessidade da prestação jurisdicional exige a demonstração de resistência por parte do devedor da obrigação, já que o Poder Judiciário é via destinada à resolução de conflitos .

4. Em regra, não se materializa a resistência do INSS à pretensão de concessão de benefício previdenciário não requerido previamente na esfera administrativa.

5. O interesse processual do segurado e a utilidade da prestação jurisdicional concretizam-se nas hipóteses de a) recusa de recebimento do requerimento ou b) negativa de concessão do benefício previdenciário , seja pelo concreto indeferimento do pedido, seja pela notória resistência da autarquia à tese jurídica esposada.

6. A aplicação dos critérios acima deve observar a prescindibilidade do exaurimento da via administrativa para ingresso com ação previdenciária, conforme Súmulas 89/STJ e 213/ex-TFR.

7. Recurso Especial não provido.”.

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Ou seja, a jurisprudência do STJ caminha no sentido de adotar o prévio requerimento, principalmente porque, como veremos a seguir, o Supremo Tribunal Federal, recentemente, com o julgamento do feito admitido como de repercussão geral, RE nº 631.240, consolidou sua jurisprudência passando entender pela necessidade da exigência do requerimento administrativo prévio para a concessão do benefício previdenciário, antes da postulação na via judicial.

Vejamos, em síntese, o teor da referida decisão:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 631.240 MINAS GERAIS

RELATOR :MIN. ROBERTO BARROSO

RECTE.(S) :INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

[...]

Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.

1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.

2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.

3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.

4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.

[...]

Os ilustres Ministros do STF embasaram sua decisão ao fundamento de que:

[...]

II. INTERESSE EM AGIR: BREVE CONCEITUAÇÃO E JUSTIFICATIVA

6. Como se sabe, o interesse em agir, ou interesse processual, é uma condição da ação com previsão legal expressa (CPC, arts. 3º; 4º; 267, VI; 295, III), que possui três aspectos: utilidade, adequação e necessidade. Sem a pretensão de examinar todas as nuances teóricas que envolvem o tema, exaustivamente explorado pela doutrina, sintetizo abaixo o entendimento corrente, apenas para maior clareza da exposição.

7. A utilidade significa que o processo deve trazer proveito para o autor, isto é, deve representar um incremento em sua esfera jurídica. Assim, por exemplo, diz-se que não tem interesse em recorrer a parte que obteve provimento totalmente favorável. Em tal hipótese, eventual recurso não será conhecido, ou seja, não terá o mérito apreciado.

8. A adequação, por sua vez, traduz a correspondência entre o meio processual escolhido pelo demandante e a tutela jurisdicional pretendida. Caso não observada a idoneidade do meio para atingir o fim, não pode haver pronunciamento judicial de mérito, uma vez que o requerente carece de interesse na utilização daquela via processual para os objetivos almejados. Por exemplo: caso o autor pretenda demonstrar sua incapacidade para o trabalho por prova pericial, não poderá lançar mão de mandado de segurança, ação que inadmite dilação probatória.

9. A necessidade, por fim, consiste na demonstração de que a atuação do Estado-Juiz é imprescindível para a satisfação da pretensão do autor. Nessa linha, uma pessoa que necessite de um medicamento não tem interesse em propor ação caso ele seja distribuído gratuitamente.

[...]

III. INTERESSE EM AGIR E PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO

12. A exigência de prévio requerimento administrativo liga-se ao interesse processual sob o aspecto da necessidade. Seria isto compatível com o preceito segundo o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (CRFB/1988, art. 5º, XXXV)?

[..]

15. A concessão dos benefícios previdenciários em geral ocorre a partir de provocação do administrado, isto é, depende essencialmente de uma postura ativa do interessado em obter o benefício. Eventual demora não inibe a produção de efeitos financeiros imediatos, já que a data do requerimento está diretamente relacionada à data de início de vários benefícios, como se vê dos arts. 43, § 1º; 49; 54; 57, § 2º; 60, § 1º; 74; e 80, todos da Lei nº 8.213/1991. A mesma regra vale para o benefício assistencial (Lei nº 8.742/1993, art. 37).

16. Assim, se a concessão de um direito depende de requerimento, não se pode falar em lesão ou ameaça a tal direito antes mesmo da formulação do pedido administrativo. O prévio requerimento de concessão, assim, é pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário. Eventual lesão a direito decorrerá, por exemplo, da efetiva análise e indeferimento total ou parcial do pedido, ou, ainda, da excessiva demora em sua apreciação (isto é, quando excedido o prazo de 45 dias previsto no art. 41-A, § 5º, da Lei nº 8.213/1991). Esta, aliás, é a regra geral prevista no Enunciado 77 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais – FONAJEF (“O ajuizamento da ação de concessão de benefício da seguridade social reclama prévio requerimento administrativo”).

17. Esta é a interpretação mais adequada ao princípio da separação de Poderes. Permitir que o Judiciário conheça originariamente de pedidos cujo acolhimento, por lei, depende de requerimento à Administração significa transformar o juiz em administrador, ou a Justiça em guichê de atendimento do INSS, expressão que já se tornou corrente na matéria. O Judiciário não tem, e nem deve ter, a estrutura necessária para atender às pretensões que, de ordinário, devem ser primeiramente formuladas junto à Administração. O juiz deve estar pronto, isto sim, para responder a alegações de lesão ou ameaça a direito. Mas, se o reconhecimento do direito depende de requerimento, não há lesão ou ameaça possível antes da formulação do pedido administrativo. Assim, não há necessidade de acionar o Judiciário antes desta medida. Daí porque não cabe comparar a situação em exame com as previstas nos arts. 114, § 2º, e 217, § 1º, da CRFB/1988, que instituem condições especiais da ação, a fim de extrair um irrestrito acesso ao Judiciário fora destas hipóteses.

18. As regras acima valem para pretensões de concessão original de outras vantagens jurídicas que, embora não constituam benefícios previdenciários, também dependem de uma postura ativa do interessado: é o caso, e.g., dos pedidos de averbação de tempo de serviço.

[...]

Deste modo, vislumbramos que incumbe ao autor da ação demonstrar concretamente a existência do direito violado ou, ao menos, uma ameaça concreta de violação mediante conduta comissiva ou omissiva do requerido, no caso, a autarquia previdenciária, sob pena de inexistir uma demanda a ser apreciada pelo Poder Judiciário (Frederico Amado, p. 712).

Assim, foi o entendimento adotado pela Suprema Corte ao decidir que o acesso ao judiciário pressupõe uma pretensão resistida, uma lesão ou ao menos uma ameaça de lesão ao direito do segurado, sem a qual o judiciário tornar-se-ia um mero administrador, ou guichê de atendimento do INSS.


CONCLUSÃO

Assim, podemos concluir que em nosso ordenamento jurídico atual vigora a necessidade de se pleitear primeiramente na via administrativa o benefício previdenciário, visto que o acesso ao judiciário pressupõe tenha havido uma pretensão resistida do INSS, o que não se dá no caso em que a parte autora não manifesta administrativamente a sua intenção em receber o benefício previdenciário.

Concluindo, o prévio requerimento de concessão do benefício, assim, é pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário. Eventual lesão a direito decorrerá, por exemplo, da efetiva análise e indeferimento total ou parcial do pedido, ou, ainda, da excessiva demora em sua apreciação.
Ademais, segundo o entendimento adotado pelo STF, caracteriza pretensão resistida quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.


BIBLIOGRAFIA

- AMADO, Frederico. Curso de direito previdenciário, 5ª Edição. Salvador: Ed. Juspodivm, 2014;

- CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Manual de direito Previdenciário/ Carlos Alberto Pereira de Castro, João Batista Lazzari. – 16. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2014;

- Constituição Federal de 1988, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm, consulta em 26 de novembro de 2014.

- Lei nº 8.213/91, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm, consulta em 26 de novembro de 2014.

- http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=3966199

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