RESUMO
A pesquisa tem como tema a abstrativização ou objetivação do controle difuso de constitucionalidade, traduzida na aproximação dos efeitos do controle concentrado à declaração de inconstitucionalidade proferida em controle difuso. Em algumas oportunidades, o Supremo Tribunal Federal concedeu eficácia erga omnes, efeito vinculante e modulação dos efeitos temporais a decisões proferidas em sede de controle concreto de constitucionalidade. Observe-se que a atribuição de tais efeitos a decisões em controle difuso é atípica, uma vez que a sentença nesse tipo de controle, em regra, obriga apenas as partes da lide processual, somente sendo possível eficácia contra todos quando da edição de resolução do Senado Federal, conforme art. 52, X, da Constituição Federal. Além disso, a modulação dos efeitos é possibilidade com expressa previsão legal apenas para as decisões exaradas em controle concentrado, ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade, em atenção à Lei 9.868/99. A abstrativização em que se baseia esta monografia não defende a supressão do papel do Senado Federal, apenas a aceitação formal do Supremo como apto à realização de atividade que há algum tempo praticada. Assim, a critério do Supremo, a abstrativização se daria pelo quorum de maioria absoluta, como no controle concentrado. Como medida garantidora de segurança jurídica e, para refutar teses que questionem sua legalidade, sugere-se, por fim, uma proposta de emenda constitucional para inserir a abstrativização, de uma vez por todas, como medida legítima no ordenamento jurídico brasileiro.
Palavras-chave: Controle de constitucionalidade. Controle difuso. Controle concreto. Controle concentrado. Controle abstrato. Abstrativização do controle difuso de constitucionalidade. Senado Federal. Efeito vinculante. Eficácia erga omnes. Modulação dos efeitos temporais.
ABSTRACT
The research has as its theme the abstractiveness or objectification of diffuse control of constitutionality, translated in the approximation of the effects of control concentrate declared it unconstitutional in fuzzy control. On some occasions, the Supreme Court granted erga omnes effect, binding effect and modulation effects of temporal judgments in the control seat concrete constitutionality. Note that the assignment of such effects the decisions in fuzzy control is atypical, since the sentence in this type of control, as a rule, only binds the parties to the dispute procedure, only being effective against all possible when editing resolution Senate, pursuant to art. 52, X, of the Constitution. Furthermore, the modulation of the effects is possible only with express legal provision for decisions entered in the concentrated control, direct action of unconstitutionality and declaratory actions of constitutionality, in consideration of Law 9.868/99. The abstractiveness that underpin this thesis does not advocate the abolition of the role of the Senate, only the formal acceptance of the Supreme as fit to carry out activity for some time practiced. Thus, at the discretion of the Supreme, the abstractiveness would be by absolute majority quorum, as in the concentrated control. As far guarantor of legal security and to refute arguments which question its legality, it is suggested, finally, a proposed constitutional amendment to insert abstractiveness, once and for all, as a legitimate Brazilian legal system.
Keywords: Control of constitutionality. Fuzzy control. Concrete control. Concentrated control. Abstract control. Abstractiveness the diffuse control of constitutionality. Senate. Binding effect. erga omnes effect. Modulation of temporal effects.
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa intitulada “Abstrativização do controle difuso de constitucionalidade: uma tendente mudança de paradigma no Supremo Tribunal Federal” realiza uma análise da moderna inclinação do STF a conferir eficácia erga omnes, efeitos vinculantes e modular os efeitos temporais em sentenças proferidas em controle difuso-concreto, assim como ocorre no controle concentrado-abstrato.
Visando corrigir estas distorções e incongruências do sistema de controle de constitucionalidade brasileiro, há recentemente uma tendência à aproximação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade no controle difuso e no controle concentrado, movimento capitaneado pelo Supremo Tribunal Federal.
Essa temática é de suma importância tendo em vista ser um tema atual e que opera verdadeira mutação constitucional – compreendida como alteração informal (sem alteração do enunciado normativo) da norma constitucional.
A abstrativização do controle difuso ou concreto consiste em equiparar os efeitos do controle difuso àqueles que são próprios do controle concentrado. Isto é: conceder eficácia erga omnes e efeito vinculante nas declarações de inconstitucionalidade julgadas em sede de Recursos Extraordinários e/ou Habeas Corpus, bem como modular os efeitos de decisões tomadas no curso do controle difuso.
A controvérsia sobre essa nova tendência reside no fato de que, ao conceder eficácia erga omnes em sede de controle difuso, o STF estaria excluindo o papel do Senado Federal na suspensão da lei, conforme o artigo 52, X, da Constituição.
Ademais, ao conceder efeito vinculante às decisões do controle difuso, mediante maioria absoluta, estaria o STF desrespeitando o quorum de dois terços exigidos para a aprovação de súmula vinculante, conforme preceitua o artigo 103-A da Constituição.
Além disso, a modulação dos efeitos temporais da decisão é própria do controle abstrato, porquanto é prevista pelo artigo 27 da Lei 9.868/99, que regula o processo e julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade e a Ação Declaratória de Constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.
Este trabalho visa, portanto, discutir esta tendência de abstrativização do controle difuso de constitucionalidade, explorando, consequentemente, o novo papel que o Poder Judiciário em geral e o Supremo Tribunal Federal em particular, desempenham no atual contexto brasileiro.
O primeiro capítulo abordará diversos conceitos e tipos de Constituição e de inconstitucionalidade. A análise não se limitará ao Brasil, de forma que os principais modelos estrangeiros serão trazidos à baila com o intuito de fornecer melhor base para compreensão do tema.
Em seguida, os modelos adotados pelo ordenamento jurídico nacional serão analisados: controles difuso e concentrado, com suas principais características, especificidades e efeitos.
O último capítulo deste ensaio, além de analisar a objetivação do recurso extraordinário, foca no estudo de casos concretos, os quais servirão de base para a comprovação da teoria da abstrativiziação como realidade no Brasil. Aborda-se, ademais, soluções para a implementação concreta da proposta aqui apresentada, mostrando a objetivação como meio de conferir celeridade, efetividade e garantia de segurança jurídica às decisões tomadas pelo Supremo no controle difuso-concreto de constitucionalidade.
1 CONCEITOS E O DIREITO COMPARADO
{C}1.1 {C}A Constituição
Com maestria, José Afonso da Silva (2005, p. 37) entende que em todas as interpretações de “Constituição” há a ideia “de modo de ser de alguma coisa e, por extensão, a de organização interna de seres e entidades. Nesse sentido é que se diz que todo Estado tem Constituição, que é o simples modo se ser do Estado”. Dessa forma, subsume-se que somente com uma Constituição é que se forma, de maneira efetiva, um Estado.
Paulo Bonavides (2005, p. 80), a seu turno, diferencia os sentidos etimológico e político de Constituição, sendo o primeiro aquele já abordado outrora, referente à essência das coisas, enquanto no segundo “a expressão se delimita pelo adjetivo que a qualifica, a saber, a Constituição política, isto é, a constituição do Estado”.
Para Canotilho (1993, p. 62), o conceito ideal de constituição defendido por Carl Schmitt no início do século XIX, tem estreita ligação com os postulados político-liberais. Schmitt entendia que a Constituição deveria consagrar um sistema de garantias da liberdade, sendo esta interpretada no sentido de reconhecimento dos direitos individuais do cidadão, os quais deveriam participar dos atos do Poder Legislativo por meio do Parlamento. Ademais, para que se efetivasse o conceito em apreço, era necessário haver uma divisão dos poderes, que funcionaria como uma proteção contra possíveis abusos por parte do Estado. Por fim, a constituição ideal deveria ser escrita.
Ferdinand Lassale (2001, p. 42) entende Constituição sob um prisma sociológico. Para ele, todos os Estados possuem Constituições reais e efetivas, ainda que não sacramentadas em um documento solene, “folha de papel”, uma vez que são produto da soma dos fatores reais de poder de cada sociedade.
Carl Schmitt (1928, apud SILVA, 2005, p. 38), por sua vez, entende que a Constituição tem um aspecto puramente político, sendo a “decisão política fundamental, decisão concreta de conjunto sobre o modo e forma de existência da unidade política”.
Konrad Hesse (1991) defende uma fusão entre os fatores reais de poder defendidos por Lassale (2001) e a “vontade da constituição”, que consiste na vontade humana de executar os preceitos constitucionais, tendo como resultado uma Constituição com força verdadeiramente ativa.
Mas, a força normativa da Constituição não reside, tão-somente, na adaptação inteligente a uma dada realidade. A Constituição jurídica logra converter-se, ela mesma, em força ativa, que se assenta na natureza singular do presente. Embora a Constituição não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de concretizar essa ordem. Concluindo, pode-se afirmar que a Constituição converter-se-á em força ativa se fizerem-se presentes, na consciência geral -particularmente, na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional - , não só a vontade de poder (Wille zur Macht), mas também a vontade de Constituição (Wille zur Verfassung) (HESSE, 1991, p. 19).
Defende, ainda, o autor, que a efetividade de uma Constituição só pode ser comprovada em situações críticas e não em tempos de paz e tranquilidade, de forma que o estado de necessidade é esclarecedor da real força normativa de uma constituição, sendo ela efetiva quando, mesmo em situações adversas, suas normas prevalecerem sobre os fatos.
Para Kelsen, (2000, p. 215) “o fundamento de validade de uma norma apenas pode ser uma outra norma”. Segundo esta ótica, a norma principal, que serviu como fundamento da segunda, seria superior, enquanto a derivada, inferior. Dessa forma, o conceito de norma fundamental estaria ligado a uma norma pressuposta:
se por Constituição de uma comunidade se entende a norma ou as normas que determinam como, isto é, por que órgãos e através de que processos – através de uma criação consciente do Direito, especialmente o processo legislativo, ou através do costume – devem ser produzidas as normas gerais da ordem jurídica que constitui a comunidade, a norma fundamental é aquela norma que é pressuposta quando o costume, através do qual a Constituição surgiu, ou quando o ato constituinte (produtor da Constituição) posto conscientemente por determinados indivíduos são objetivamente interpretados como fatos produtores de normas (KELSEN, 2000, p. 221).
Sendo assim, norma fundamental seria não somente aquela enraizada na vivência de uma comunidade, mas, também as criadas por um poder constituinte. Tais normas seriam aptas a gerar todo o ordenamento jurídico de um povo.
Nesse diapasão, conclui que
a ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da conexão de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez, é determinada por outra; e assim por diante, até abicar finalmente na norma fundamental – pressuposta. A norma fundamental – hipotética, nestes termos – é, portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade desta interconexão criadora (KELSEN, 2000, p. 247).
Em sua obra, Cretella Júnior (2000, p. 18) acompanha a ideia de escalonamento das normas, sustentando a superioridade constitucional: “a Constituição é a lei das leis, suprema lex. Pairando acima de todas as demais normas do Estado, o dispositivo constitucional impede que qualquer outro dispositivo, interno ou externo, o contrarie”. Sendo assim, a inconstitucionalidade se daria no momento em que houvesse norma inferior conflitante com norma constitucional. O autor pugna, também, pela propagação da Constituição às outras áreas do direito, pois acredita que todas elas ramificam-se da Constituição Federal.
No mesmo sentido, Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior (2003, p. 3) entendem a Constituição como a base do Estado, regulamentando em seu teor os elementos que o estruturam. Defendem ser imprescindível que a Constituição elenque elementos garantidores das liberdades individuais devendo “abrigar as normas definidoras dos direitos fundamentais do indivíduo, pena de desfiguração de sua própria razão de existir”.
Na concepção de Paulo Bonavides (2005, p. 80), do ponto de vista material,
a Constituição é o conjunto de normas pertinentes à organização do poder, à distribuição da competência, ao exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como sociais. Tudo quanto for, enfim conteúdo básico referente à composição e ao funcionamento da ordem política exprime o aspecto material da Constituição [...] Debaixo desse aspecto, não há Estado sem Constituição, Estado que não seja constitucional, visto que toda sociedade politicamente organizada contém uma estrutura mínima, por mais rudimentar que seja.
Em contrapartida, salienta a existência de normas constitucionais assim classificadas apenas porque estão previstas no texto da Constituição, mas que lá não deveriam estar, possuindo apenas aparência constitucional. “Assim se designa exclusivamente por haver sido introduzida na Constituição, encertada no seu corpo normativo e não porque se refira aos elementos básicos ou institucionais da organização política” (BONAVIDES, 2005, p. 81). Nesses casos, se estaria diante do conceito formal de Constituição.
Introduzido por Bastos (2002), há, ainda, o conceito substancial de normas, segundo o qual a norma seria definida como constitucional ou inconstitucional após analisado seu teor.
Se regular um aspecto fundamental da comunidade política, indispensável à sua concepção ou à sua permanência, se tratar da distribuição do poder dentro da sociedade, se versar, enfim, sobre algo que, alterado, abalaria as próprias vigas mestras do ente político, será constitucional (BASTOS, 2002, p. 62).
Saliente-se, no entanto, que o referido conceito não se enquadra no sistema brasileiro, visto que se adota aqui o conceito formal de Constituição: “eis que tudo que consta da constituição formal recebe o mesmo tratamento jurídico” (BASTOS, 2002, p. 62), sendo irrelevante seu conteúdo.
Como notável exemplo, é possível citar o § 2º do artigo 242 da Constituição Federal, assim redigido: “O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal”. Observe-se que, apesar de o parágrafo em análise não tratar de norma substancialmente constitucional, seu texto é constitucional.
Na visão de Capelletti,
A Constituição pretende ser, no Direito moderno, uma forma legalista de superar o legalismo, um retorno ao jusnaturalismo com os instrumentos do positivismo jurídico. Um retorno, porém, que é também consciência da superação dos velhos esquemas jusnaturalistas: de um direito natural entendido como absoluto e eterno (e, portanto, imóvel) valor, a um jusnaturalismo histórico, direito natural vigente. A norma constitucional, sendo também norma positiva, traz, em si, uma reaproximação do direito à justiça. Na verdade, na concepção moderna, a norma constitucional outra coisa não é senão a tentativa – talvez impossível, talvez “faustiana”, mas profundamente humana – de transformar em direito escrito os supremos valores, a tentativa de recolher, de “definir”, em suma, em uma norma positiva, o que, por sua natureza, não se pode recolher, não se pode definir – o Absoluto. A justiça constitucional é a garantia desta “definição”; mas também ao mesmo tempo, o instrumento para torná-la aceitável, adaptando-a às concretas exigências de um destino de perene mutabilidade (CAPPELLETTI, 1992, p. 130).
Concluindo, porém, sem esgotar a questão conceitual de Constituição, cite-se a nobre definição dada por Orlando Bitar (1965, p. 1): “o Direito Constitucional é um sistema de normas que regulam a organização, o funcionamento e a proteção de um determinado Estado e os direitos e deveres fundamentais de seus jurisdicionados”.
Diante dos inúmeros critérios adotados pelos doutrinadores de Direito Constitucional para a classificação das diferentes espécies de Constituição, sob o risco de tornar-se demasiadamente longo, este trabalho abordará apenas as classificações que auxiliem a compreensão do controle de constitucionalidade das leis, quais sejam:
a) Constituições escrita e não escrita
De acordo com este critério, a Constituição pode seguir duas vertentes: escrita e não escrita. A primeira trata de Constituições que possuem codificações de seus preceitos em forma de texto positivo e sistematizado em um único documento formal, o qual será elaborado pelo órgão competente. Esse tipo de Constituição garante estabilidade ao sistema e segurança jurídica aos cidadãos. As primeiras Constituições escritas foram a Constituição Americana, de 1787, e a Constituição Francesa, de 1791.
A segunda vertente, também conhecida como costumeira, inorgânica ou consuetudinária, adotada pela Inglaterra, se refere às Constituições criadas e somente embasadas nos costumes, práticas, tradições, jurisprudências, as quais dispensam uma codificação textual fixa e única. Há quem defenda a melhor adequação desse tipo de Constituição, justificando-se na impossibilidade de reunir e organizar a complexidade de um Estado e de uma sociedade em um único texto escrito.
Nesse sentido, sob a ótica do controle de constitucionalidade, observa-se grande dificuldade em sua realização numa Constituição não escrita, tendo em vista não haver objetividade no parâmetro adotado para tal feito. Clève (2000, p. 28) entende que isso somente seria possível em Constituições formais ou escritas, sendo esse um dos pressupostos para sua realização, uma vez que não se pode realizar controle de uma constituição não palpável, estabelecida, formalizada.
b) Constituições imutável, rígida, semirrígida e flexível
As Constituições imutáveis são aquelas que refutam qualquer tipo de alteração, possuindo um texto único e eterno, a exemplo do Código de Hamurabi e a Lei das XII Tábuas. Entende Bastos (2002, p. 71) que “hoje em dia já se toma por absurdo que um Texto Constitucional se pretenda perpétuo, quando se sabe que é destinado a regular a vida de uma sociedade em contínua mutação”.
A imutabilidade, no entanto, pode ser apenas temporal, tendo seu conteúdo petrificado por certo período de tempo, após o qual poderá sofrer alterações, desde que respeitado o procedimento estabelecido para esse fim, como a Constituição Brasileira de 1824, por exemplo.
Segundo Novelino (2008, p. 49) “fixas eram aquelas Constituições que não podiam ser modificadas senão pelo mesmo Poder Constituinte que as elaborou, quando convocado para isso. É o caso das Constituições francesas da época de Napoleão I”. Assim como as Constituições imutáveis, as fixas possuem apenas valor histórico.
Já as Constituições rígidas exigem um procedimento mais complexo e solene para sua alteração. Como exemplo, o art. 60 da Constituição Federal Brasileira.
Em contrapartida, a iniciativa das leis ordinárias e complementares será aprovada em um único turno se obtiver maioria simples ou absoluta, respectivamente. No Brasil, à exceção da Constituição de 1824, todas as demais eram consideradas rígidas.
A seu turno, as Constituições semirrígidas ou semiflexíveis, como os próprios nomes sugerem, podem ser consideradas como o meio termo entre as rígidas e as flexíveis, tendo em vista possuírem partes que somente podem ser alteradas mediante processo especial, ao mesmo tempo em que possuem partes passíveis de alteração por simples processo ordinário, da mesma forma que as leis comuns. A Constituição do Império do Brasil de 1824 fazia tal diferenciação ao disciplinar em seu artigo 178 que “é constitucional só o que diz respeito aos limites e atribuições respectivos dos poderes políticos, e aos direitos políticos e individuais dos cidadãos; tudo o que não é constitucional pode ser alterado, sem as formalidades referidas, pelas legislaturas ordinárias”.
Por fim, há as Constituições denominadas flexíveis ou plásticas, que têm como característica a livre modificação através do mesmo processo adotado para as leis ordinárias. Nesses casos, não haverá distinção hierárquica entre leis constitucionais e leis comuns, possuindo, ambas, a mesma força normativa.
Em que pese Constituição flexível não seja sinônimo de Constituição não escrita, raramente se verá tais características dissociadas, a exemplo da Constituição Inglesa: não escrita e flexível.
Para Cretella Jr (2000, p. 102), é da distinção entre Constituição rígida e Constituição flexível, bem como entre os Poder Constituinte originário e derivado, que decorre o controle de constitucionalidade.
Observe-se a grande importância da classificação constitucional quanto à mutabilidade de seu conteúdo, pois não haveria sentido em estabelecer diferenciação entre leis comuns e constitucionais, caso exigissem o mesmo procedimento para mutação. Se assim fosse, ambas ocupariam o mesmo plano, inexistindo hierarquia, bem como sentido para o controle de constitucionalidade.
{C}1.2 {C}Conceitos e tipos de inconstitucionalidade
Por inconstitucionais serão entendidas as leis que contrariarem ou mostrarem-se incompatíveis com o estatuído nas disposições constitucionais. Nesses casos, haverá um ataque à hierarquia constitucional, uma vez que normas inferiores estarão em situação conflitante com as normas supremas.
Nas palavras de Bastos (2002, p. 626):
A inconstitucionalidade de uma lei é, pois a circunstância de uma determinada norma infringir a Constituição, quer quanto ao processo a ser seguido pela elaboração legislativa, quer pelo fato de, embora tendo a norma respeitado a forma de criação da lei, desrespeitar a Constituição quanto ao conteúdo adotado.
As espécies de inconstitucionalidade podem dividir-se em total e parcial, formal e material, por ação e por omissão, bem como originária e superveniente, hipóteses que serão analisadas a seguir.
1.2.1 Inconstitucionalidade total e parcial
A existência de divergências entre uma lei inferior e a Constituição não acarreta que a primeira deva sucumbir em sua totalidade. Havendo confronto parcial, motivada geralmente por um vício material, apenas a parcela divergente deverá ser considerada inconstitucional, permanecendo tudo o mais que não destoar da Lei Maior. “Assim, não deverá ser declarada a inconstitucionalidade total de uma lei (no sentido material ou formal) caso apenas parte dela esteja tomada por vício ou vícios propiciadores da ilegitimidade constitucional” (CLÈVE, 2000, p. 48).
Em contrapartida, quando houver confronto total entre a Constituição e uma lei comum ou ato normativo, esta será declarada inconstitucional, sendo considerada nula em sua totalidade, o que ocorre, na maioria dos casos, em decorrência de um vício formal.
1.2.2 Inconstitucionalidade formal e material
Quando elaborada em desatenção ao procedimento legislativo exigido, a lei, ou melhor, o ato de criação dessa lei padecerá de inconstitucionalidade formal propriamente dita, pois desatendido requisito formal objetivo.
Diz-se que uma lei é formalmente inconstitucional quando elaborada por órgão incompetente (inconstitucionalidade orgânica) ou quando segue procedimento diverso daquele fixado na Constituição (inconstitucionalidade formal propriamente dita). Pode, então, a inconstitucionalidade formal resultar de vício de elaboração ou de incompetência (CLÈVE, 2000, p. 39).
Por sua vez, ocorre a inconstitucionalidade formal orgânica quando a iniciativa legislativa for tomada por autoridade desprovida de competência para tanto, como, por exemplo, um Estado legislando sobre matéria de competência exclusiva da União, caso em que será desatendido requisito formal subjetivo, ocorrendo o vício de iniciativa.
A definição de lei inconstitucional deve denotar não só a incompatibilidade resultante de contradição ou contrariedade entre conteúdos normativos (legal e constitucional), mas também a proveniente da desconformidade entre procedimento de produção normativa (legislativa) e conteúdo normativo (constitucional). No primeiro caso apresentam-se relações nomoestáticas de incompatibilidade normativa vertical, enquanto no segundo estas relações são nomodinâmicas (NEVES, 1988, p. 74).
Nesses casos, ainda que o disposto na lei ou no ato normativo não desobedeça à Constituição no que se refere ao conteúdo, o desatendimento à exigência procedimental é vício que os contamina em sua totalidade, o que acarreta a inconstitucionalidade total da norma.
A inconstitucionalidade material se dá quando o dispositivo da lei comum violar preceito ou princípio constitucional e “incidirá sobre o ato normativo integralmente (inconstitucionalidade total) ou parcialmente (inconstitucionalidade parcial), sem preferência. Por isso, não é possível afirmar que ela será, em princípio, total ou parcial” (CLÈVE, 2000, p. 49). Sendo assim, observa-se a possibilidade de declaração parcial de inconstitucionalidade, com exclusão da parte em desacordo com a Lei Maior, caso a incompatibilidade não seja absoluta. Do contrário, como já abordado em momento anterior, será necessária a exclusão total da norma comum.
1.2.3 Inconstitucionalidade por ação e por omissão
A inconstitucionalidade por ação se dá quando a ordem constitucional é violada mediante uma conduta positiva do legislador, um fazer. Por sua vez, a inconstitucionalidade por omissão ocorre em razão de uma abstenção, de um silêncio legislativo.
Para Clève (2000, p. 51), a “inércia do Poder Público e o silêncio legislativo igualmente podem conduzir a uma modalidade específica de ilegitimidade definida, pelo direito contemporâneo, como inconstitucionalidade por omissão”.
Entendem Mendes, Coelho e Branco (2007, p. 975) que “o instituto da inconstitucionalidade por omissão é relativamente recente, pois antes a inconstitucionalidade da lei configurava sempre uma conduta positiva do legislador”.
Ainda nesse sentido, entende Clève (2000, p. 52) que
Antes as normas programáticas eram vistas como meros avisos, lembretes desprovidos de qualidade jurídica, o que acarretava a perda de prestígio da Constituição escrita. Atualmente essa ótica restou superada, desta forma, o direito contemporâneo vem buscando uma série de remédios para afastar a inércia do Poder Público e especialmente o silêncio legislativo inconstitucional. É o caso da iniciativa legislativa popular, do mandado de injunção e da ação de inconstitucionalidade por omissão, no Brasil.
Sendo assim, não apenas atos comissivos poderão ser questionados, também aquelas situações em que o Poder Público deveria, mas não agiu, sendo esta inconstitucionalidade tão grave quanto as demais, visto que deixa de prover ao povo direito que lhe é inerente.
Canotilho (1993, p. 1089), de maneira acertada, enfatiza o conceito de omissão sob a ótica constitucional:
o conceito de omissão legislativa não é um conceito naturalístico, reconduzível a um simples ‘não fazer’, a um simples ‘conceito de negação’. Omissão, em sentido jurídico-constitucional, significa não fazer aquilo a que se estava constitucionalmente obrigado. A omissão legislativa, para ganhar significado autónomo e relevante, deve conexionar-se com uma exigência constitucional de acção, não bastando o simples dever geral de legislar para dar fundamento a uma omissão inconstitucional.
Observa-se, portanto, que tanto condutas positivas quanto negativas por parte do legislador são capazes de ferir a Constituição. A omissão, talvez mais que a ação, causa prejuízos à ordem constitucional uma vez que a falta de densidade legislativa ordinária pode vir a enfraquecer macro-princípios constitucionais, deixando-os inócuos.
1.2.4 Inconstitucionalidade originária e superveniente
As inconstitucionalidades originária e superveniente levam em consideração o momento de edição do ato normativo. Se a norma for editada durante a vigência da Constituição, devendo estar, portanto, de acordo com seus preceitos, mas sendo com ela incompatível, estará evidenciada a inconstitucionalidade originária.
Já a inconstitucionalidade superveniente ocorre quando há alteração na própria Constituição, tornando a lei inferior com ela incompatível. A norma é inicialmente constitucional, mas “deixa de sê-lo em virtude de reforma constitucional, diante de renovada interpretação do dispositivo constitucional, ou, ainda, em decorrência de mudança nas circunstâncias fáticas” (CLÈVE, 2000, p. 54).
No Direito brasileiro, apesar de a doutrina majoritária defender a teoria da inconstitucionalidade superveniente, o entendimento prevalecente no Supremo Tribunal Federal é absolutamente contrário. Para a Suprema Corte, o que pode ocorrer é o fenômeno da recepção da norma editada em momento anterior à vigência da nova Constituição, caso sejam materialmente compatíveis, ou a revogação, quando a lei comum padecer de vício material.
Sendo assim, para o STF está descartada a existência de inconstitucionalidade superveniente, material ou formal, devendo a alteração da norma constitucional, seja por reforma ou pela promulgação de uma nova carta, ser resolvida no plano da legalidade e não da constitucionalidade.
{C}1.3 O controle de constitucionalidade no direito comparado
O modelo de controle de constitucionalidade adotado pelo Brasil é o modelo misto, sendo a fusão dos modelos americano e europeu. Para melhor compreensão do procedimento nacional é imprescindível, inicialmente, a análise no direito comparado dos elementos que lhe serviram de base.
{C}1.3.1 Modelo inglês
O modelo constitucional adotado na Inglaterra é o chamado não escrito, onde as bases de estruturação do Estado são fixadas pelos costumes e tradições da sociedade. Dessa forma, praticamente não há diferença de hierarquia entre leis constitucionais e ordinárias criadas pelo Poder Legislativo. "Ali, pois, a Constituição pode mudar incessantemente, ou melhor, não existe. O Parlamento, ao mesmo tempo que é um corpo Legislativo, é um corpo constituinte" (TOCQUEVILLE, 1977, p. 83).
Tal força atribuída ao Parlamento se deu com o intuito de moderar os abusos e excessos praticados pela monarquia. Assim, Clève (2000, p. 58) sustenta que “se a vontade do Parlamento, expressão da maioria, é ilimitada, inexistindo Constituição escrita, então não há lugar para a instituição de um mecanismo de fiscalização de constitucionalidade”.
Segundo Gilmar Mendes e Ives Gandra Martins (2005, p. 3), tem havido uma diminuição do poder do Parlamento:
o Reino Unido vem dando mostras de uma revisão de conceitos. O Parlamento já não mais se mostra um soberano absoluto. O “European Communities Act”, de 1972, atribuiu hierarquia superior ao direito comunitário em face de leis formais aprovadas pelo Parlamento. Essa orientação tornou-se realidade no caso Factortame Ltd. V. Secretary of State for Transport (1991). Com a aprovação do Human Rights Act, em 1998, confiou-se aos Tribunais britânicos a aferição da legitimidade das leis em face das disposições da Convenção de Direitos Humanos. Embora não se declare a nulidade ou a invalidade da lei, pode-se constatar a incompatibilidade e assegurar à parte uma indenização. Daí identificarem-se também no Reino Unido o contornos de uma jurisdição constitucional de caráter geral ou não especializada.
Pode-se afirmar, por fim, que o modelo britânico de controle de constitucionalidade, em razão de não utilizar uma constituição escrita como parâmetro, é considerado um modelo sui generis, visto que, em regra, a aferição da constitucionalidade de determinada lei é realizada através do confronto entre seu conteúdo e o conteúdo das normas constitucional e formalmente previstas.
{C}1.3.2 Modelo francês
Em razão dos históricos abusos da monarquia, bem como dos excessos e omissões do Judiciário no período pré-revolucionário, o Poder Legislativo francês teve dificuldades em aceitar um controle de constitucionalidade. Por esse motivo e também por adotar a teoria da separação dos poderes, de Montesquieu, evita-se a todo custo interferência do Judiciário no Legislativo francês.
Conforme a teoria de Rousseau, sendo as decisões do Legislativo reflexo da vontade popular, não há sentido em interferência do Judiciário com o intuito de contrariar tal vontade. Exatamente por isso, a França adotou o modelo de controle de constitucionalidade preventivo e político, cujo controle é realizado pelo Conseil Constitutionnel (Conselho Constitucional).
Com a reforma constitucional de 2008, adotou-se, também, o controle repressivo de constitucionalidade, que ocorrerá quando, em qualquer processo judicial ou administrativo, for suscitada uma questão prioritária de constitucionalidade. Quaisquer das partes do processo podem impugnar a constitucionalidade de uma norma que entender violar direitos e liberdades garantidas pela Constituição.
O Conselho Constitucional francês é composto por ex-presidentes e nove conselheiros, sendo sua escolha realizada pelo Presidente, pela Assembleia Nacional e pelo Presidente do Senado, ficando a cargo de cada um a escolha de três conselheiros.
Visando a cumprir seu objetivo precípuo, evitar interferência no Legislativo, o Conseil Constitutionnel não faz parte do Poder Judiciário, cabendo a este aplicar a norma e àquele velar pela Constituição.
No controle preventivo, como ensina Capelletti (1992, p.27), após a elaboração do conteúdo da norma, antes de sua promulgação, o Primeiro Ministro, o Presidente da República ou o Presidente de uma das câmaras do Parlamento pode enviá-lo ao Conseil Constitutionnel para apreciação e pronunciamento acerca de sua conformidade com a Constituição. Este pronunciamento torna-se obrigatório apenas quando tratar-se de lei referente à organização dos poderes públicos.
O mesmo autor (ibid, p. 29) sustenta que tal instituto não é um verdadeiro controle (a posteriori) da legitimidade constitucional de uma lei para ver se ela é ou não é valida e, por conseguinte, aplicável mas antes, um ato (e precisamente um parecer vinculatório) que vem a se inserir no próprio processo de formação da lei – e deste processo assume, portanto, a mesma natureza.
Já no controle repressivo, a questão prioritária de constitucionalidade pode ser suscitada em qualquer fase processual, sendo vedada, no entanto, a proposição ação diretamente no Conselho. Observe-se, por oportuno, que o controle repressivo só poderá ser realizado se a norma não houver sido considerada constitucional em sede de fiscalização preventiva, ou seja, se não for caso de lei que regulamente a organização dos poderes públicos.
O Tribunal que conhecer da questão realizará imediatamente um controle de admissibilidade. Se cumpridos os critérios exigidos pela lei orgânica, a questão prioritária de constitucionalidade será remetida ao Conselho de Estado ou ao Tribunal de Cassação, jurisdição administrativa ou judicial, respectivamente. Em seguida, será realizada uma análise mais aprofundada da questão, somente após o que será remetida ou não ao Conselho Constitucional.
A peculiaridade do controle constitucional repressivo se encontra no momento em que é realizado: antes da promulgação da lei, confundindo-se com a última fase do processo legislativo.
{C}1.3.3 Modelo norte-americano
Motivados pela colonização britânica e pelos excessos legislativos por parte da Coroa Inglesa durante esse período, o povo estadunidense desenvolveu o ideal de um Judiciário poderoso e suficientemente forte para enfrentar as incoerências legislativas.
Entendia-se ser mais lógico que os tribunais atuassem como mediadores entre a vontade do povo e os limites estabelecidos ao Poder Legislativo, ficando a cargo dos magistrados decidir os conflitos entre normas de mesma força, bem como os existentes entre normas hierarquicamente diferentes, sendo que nestes as normas superiores deveriam prevalecer.
O caso Marbury x Madison, decidido em 1803 por John Marshall, o então Chief Justice da Suprema Corte, é considerado a fonte do controle de constitucionalidade no direito americano. Naquele leading case “permitiu-se ao Poder Judiciário, mediante casos concretos postos em julgamento, interpretar a Carta Magna adequando e compatibilizando os demais atos normativos com suas superiores normas” (MORAES, 2003, p. 582).
Partiu assim Marshall para uma proposição evidente e incontestável: ou a Constituição controla todo ato legislativo que a contrarie, ou o legislativo, por um ato ordinário, poderá modificar a Constituição. Não há meio-termo entre tais alternativas. Logo, afirma ele: ou a Constituição é lei superior e suprema, que se não pode alterar por vias ordinárias, ou entra na mesma esfera e categoria dos atos legislativos ordinários, sendo como tais suscetível também de modificar-se ao arbítrio da legislatura (BONAVIDES, 2005, p. 307).
A partir de então, solidifica-se a teoria de predominância da Constituição diante dos atos legislativos ordinários.
O sistema norte-americano de controle de constitucionalidade é conhecido como difuso, pois todo juiz, no curso de uma demanda processual, pode decidir incidenter tantum pelo afastamento de uma lei que entenda ser inconstitucional. Dessa maneira, “todos os órgãos judiciários, inferiores ou superiores, federais ou estaduais, têm o poder e o dever de não aplicar as leis inconstitucionais aos casos concretos submetidos a seu julgamento” (CAPPELLETI, 1992, p. 77).
Para evitar decisões conflitantes em casos essencialmente iguais, tendo como objetivo garantir segurança jurídica, passou-se a adotar o instituto do “stare decises”, segundo o qual as decisões das cortes superiores vinculam as cortes inferiores, produzindo eficácia ex tunc e erga omnes.
As lides constitucionais chegam à Suprema Corte apenas através de recursos das decisões juízes singulares, uma vez que não se trata de um tribunal constitucional e sim da mais alta corte da justiça ordinária.
{C}1.3.4 Modelo austríaco ou europeu
Até o início do século XX, por razões históricas, grande parte dos países europeus não havia adotado sistemas de controle de constitucionalidade. Foi justamente nesse período que surgiu a obra intelectual de Hans Kelsen, a qual introduziu a doutrina americana de controle judicial de constitucionalidade.
Apesar de ser um controle judicial, possuía estrutura essencialmente diferente da adotada pelo modelo americano. Agora, o controle de constitucionalidade das leis seria confiado a um único órgão: o Tribunal Constitucional. A existência de um sistema submetido ao controle por um único ente rechaçava a ideia de controle difuso estadunidense.
O modelo concentrado de controle de constitucionalidade sugerido por Kelsen foi adotado na Constituição austríaca de 1920, denominada Oktoberverfassung, e aprimorado na reforma de 1929.
No sistema concentrado, enquanto o Tribunal Constitucional não houver afastado a aplicação de determinada lei, está vedado a qualquer outro órgão judiciário aferir a legitimidade constitucional da referida norma, ou seja, enquanto não apreciada pelo Tribunal Constitucional, a lei deverá ser considerada válida.
No sistema austríaco, até a emenda de 1929, o controle de constitucionalidade era exercido tão somente pela via principal, prerrogativa exclusiva dos órgãos políticos. A reforma não apenas possibilitou como exigiu que os órgãos judiciários ordinários recorressem ao Tribunal Constitucional para que fosse realizado o controle de constitucionalidade de leis aplicáveis a casos concretos que estivessem submetidos à sua apreciação, ou seja, apenas de forma incidental.
Estes órgãos judiciários, mesmo continuando a não poder efetuar, eles próprios, controle algum da legitimidade constitucional das leis, foram, então, (e são) legitimados a requerer à Corte Constitucional que efetue este controle, limitadamente às leis aplicáveis ao caso concreto submetido a seu julgamento (CAPPELLETTI, 1992, p. 107).
No sistema austríaco-kelseniano, as decisões do Tribunal Constitucional não geram nulidade da lei, acarretam apenas sua anulabilidade com efeitos, erga omnes, ex nunc, constitutivos e genéricos, ressalte-se, porém que nos casos submetidos a apreciação pelos órgãos judiciários, os efeitos da decisão serão ex tunc nos casos concretos.
Outro efeito interessante das decisões desse modelo é o efeito repristinatório, que restabelece a lei anterior revogada pela lei nova, agora declarada inconstitucional, salvo posicionamento contrário do Tribunal Constitucional.
Entre as críticas ao modelo austríaco há a de que apenas alguns órgãos do Judiciário são legitimados a requerer a apreciação da Corte Constitucional. Para Clève (2000, p. 69), “aos demais órgãos da magistratura ordinária incumbe, simplesmente, aplicar a lei, ainda quando sobre ela pairem dúvidas quanto à sua compatibilidade com o texto da normativa constitucional”. Além disso, há quem discorde do caráter eminentemente político, uma vez que os integrantes do Tribunal são geralmente apontados pelos poderes Executivo e Legislativo, acabando por dar prioridade aos interesses do Estado em detrimento dos interesses e garantias individuais.
{C}1.3.5 Modelo brasileiro
Na Constituição de 1824, o Brasil não adotava qualquer tipo de controle de constitucionalidade, provavelmente devido à influência da concepção inglesa de supremacia do Parlamento e da concepção francesa de rígida separação dos poderes, cabendo ao Imperador solucionar conflitos entre Judiciário, Executivo e Legislativo.
Em 1891, inspirado na doutrina da judicial review, passou-se a adotar o controle judicial das leis, porém, apenas com a reforma de 1926 o poder de controle pelo Judiciário tornou-se induvidoso e explícito, entendimento reproduzido na Constituição de 1934.
Um retrocesso, no entanto, com a Constituição de 1937, quando atribuiu ao Poder Executivo a possibilidade de tornar sem efeito as decisões de inconstitucionalidade proferidas pelo Tribunal. Além disso, o Judiciário ficou expressamente proibido de julgar questões exclusivamente políticas.
Com a Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de setembro de 1946, restaurou-se a efetividade do sistema difuso de controle de constitucionalidade. Em 1965, no entanto, em razão da Emenda Constitucional nº 16, adotou-se também o modelo concentrado de controle, efetivando-se, então, o sistema misto de controle, que vigora até os dias de hoje. De maneira geral, ressalvadas algumas alterações, as Constituições de 1967 e 1988 mantiveram o sistema eclético de controle de constitucionalidade das leis.
Atualmente as questões relativas ao controle de constitucionalidade são realizadas por membros do Poder Judiciário, controle esse denominado de jurisdicional.
De acordo com o momento de realização do controle, ele pode ser classificado como preventivo, antes da promulgação da norma, ou repressivo, após promulgada. Ambos os tipos de controle podem ser realizados pelo Poder Legislativo, Executivo e Judiciário (Novelino, 2008, p. 105).
Como assevera Novelino (2008, p. 105),
o Poder Legislativo exerce o controle preventivamente por meio das Comissões de Constituição e Justiça, o Poder Executivo pode exercer o controle vetando (“veto jurídico”) um projeto de lei que entenda ser inconstitucional (art. 66, § 1º), por sua vez, o Poder Judiciário, ainda que de forma excepcional, também poderá exercê-lo caso seja impetrado um mandado de segurança por Parlamentar, em razão da inobservância do devido processo legislativo constitucional, como no caso de deliberação de um proposta de emenda tendente a abolir cláusula pétrea.
O controle repressivo será realizado pelo Legislativo nos casos de sustação de atos normativos do Poder Executivo quando este exceder seu poder regulamentar ou os limites de delegação legislativa elencados no artigo 49, V da Constituição. Ademais, realizará o controle repressivo quando rejeitar medida provisória em desacordo com as exigências constitucionais de relevância e urgência, bem como dos demais impeditivos do artigo 62 da Constituição Federal.
O Chefe do Poder Executivo municipal, estadual ou federal pode negar cumprimento a uma lei que entenda ser inconstitucional, independentemente de ter sido elaborada pela União, pelo Estado-membro ou pelo Município. Para que não pratique crime de responsabilidade (artigo 1º do Decreto-Lei nº 201/67), deverá explicar o motivo de sua recusa por escrito e dar publicidade do ato (NOVELINO, 2008, p. 108).
O Judiciário, por sua vez, é o principal encarregado do controle repressivo de constitucionalidade. No Brasil, adota-se o modelo misto de controle, em que a fiscalização pode ser realizada de maneira difusa, por todos os juízes, ou concentrada, pelo Supremo Tribunal Federal.
Sobre a legitimidade da justiça constitucional, Dalmo de Abreu Dallari (1977, p. 87) afirma que
O juiz recebe do povo, através da Constituição, a legitimação formal de suas decisões, que muitas vezes afetam de modo extremamente grave a liberdade, a situação familiar, o patrimônio, a convivência na sociedade e toda uma gama de interesses fundamentais de uma ou de muitas pessoas. Essa legitimação deve ser permanentemente complementada pelo povo, o que só ocorre quando, segundo a convicção predominante, os juízes estão cumprindo o seu papel constitucional, protegendo eficazmente os direitos e decidindo com justiça. Essa legitimação tem especial importância pelos efeitos políticos e sociais que podem ter as decisões judiciais.
Superadas as fases introdutória e conceitual sobre Constituição e modelos nacional e estrangeiros de controle de constitucionalidade, serão analisados com maior afinco no capítulo seguinte o controle de constitucionalidade pelas vias difusa e concentrada.
2 CONTROLES DIFUSO E CONCENTRADO
Como já explanado outrora, o Brasil adota o modelo misto de constitucionalidade, no qual se aplicam, simultaneamente, os controles difuso e concentrado, aquele de origem americana e este de origem europeia.
Segundo Mendes, Coelho e Branco (2007, p. 955-956) nos modelos mistos, em geral,
defere-se aos órgãos ordinários do Poder Judiciário a prerrogativa de afastar a aplicação da lei nas ações e processos judiciais, mas se reconhece a determinado órgão de cúpula – Tribunal Supremo ou Corte Constitucional – a competência para proferir decisões em determinadas ações de perfil abstrato ou concentrado. Talvez os exemplos mais eminentes desse modelo misto sejam o modelo português e o modelo brasileiro.
Assim, permite-se às instâncias inferiores, a realização de controle de constitucionalidade quando, em uma lide específica, surge, de maneira incidental, dúvida quanto à legitimidade de determinada norma, ficando a cargo do Supremo Tribunal Federal sua análise em última instância, além da apreciação da legitimidade de leis objeto de ações diretas.
De maneira diversa, André Ramos Tavares (2007, p. 220) defende a impossibilidade de correlação entre os modelos difuso e concreto, o que impossibilitaria a existência de um modelo misto. Na sua concepção, a referida união se mostra contraditória, tendo em vista que só há, de fato, duas possibilidades: modelo difuso, com controle de constitucionalidade exercido por todos os órgãos, ou modelo concentrado, com um órgão superior encarregado da análise das questões constitucionais.
Outro entendimento adota Tavares (2007), para o qual o modelo brasileiro não seria misto e sim “combinado”, sendo que o uso daquela terminologia exigiria o fornecimento de maiores detalhes.
Visando maior compreensão dos sistemas, o segundo capítulo deste estudo será dividido em dois: controle difuso e controle concentrado.
{C}2.1 Do Controle difuso de constitucionalidade
Realiza-se o controle difuso de constitucionalidade no curso de uma demanda judicial concreta, e de maneira incidente, por qualquer juiz ou Tribunal. Tal exame pode ser suscitado por ambas as partes, sob a alegação de que a parte contrária objetiva ver aplicada ao caso uma lei ou ato inconstitucional. Oportuno salientar que o objeto principal da ação não é a declaração de inconstitucionalidade de uma lei, mas o afastamento de sua aplicação na demanda principal.
Bem resume Paulo Bonavides (2005, p. 302), para quem “tal controle ocorre quando, no curso de um pleito judiciário, uma das partes levanta, em defesa de sua causa, a objeção de inconstitucionalidade da lei que se lhe quer aplicar”.
No entendimento de Luis Roberto Barroso (2012, p. 113)
o controle incidental de constitucionalidade é exercido no desempenho normal da função judicial, que consiste na interpretação e aplicação do Direito para a solução de litígios. Pressupõe, assim, a existência de um processo, uma ação judicial, um conflito de interesses no âmbito do qual tenha sido suscitada a inconstitucionalidade da lei que deveria reger a disputa. Se o juiz ou tribunal, apreciando a questão que lhe cabe decidir, reconhecer que de fato existe incompatibilidade entre a norma invocada e a Constituição, deverá declarar sua inconstitucionalidade, negando-lhe aplicação ao caso concreto.
Objetivando maior compreensão do tema, vale tecer breves considerações sobre as diversas nomenclaturas adotadas pelo modelo ora estudado:
Controle difuso: o controle será dito difuso quando puder ser realizado por qualquer juiz, independente do grau de jurisdição, numa demanda judicial e será concentrado quando, ao contrário, for realizado por um único órgão com competência para tanto.
Fala-se em controle concreto quando é realizado no decorrer de uma questão judicial, de maneira material, ao contrário do controle abstrato, onde será questionada a lei em tese.
Já as denominações “incidental”, “indireta” e “incidenter tantum” se aplicam quando a constitucionalidade é questionada no decorrer de uma demanda concreta, que não tem como objetivo principal a declaração de constitucionalidade de uma lei em tese, sendo ela questão prejudicial à questão principal. Por outro lado, no controle por via principal ou direta, a constitucionalidade de determinada da lei em tese é atacada através de demanda autônoma, com fim específico.
Nesse mesmo sentido, quando a inconstitucionalidade é questionada de maneira incidental no curso de um processo, diz-se que o controle é realizado pela via de exceção ou defesa. Em contrapartida, quando questionada em processo autônomo, é realizado pela via de ação.
Por fim, será considerado subjetivo o controle que tiver por finalidade defender o interesse subjetivo de uma das partes, sendo objetivo o controle realizado com o fito único de resguardar a Constituição.
Saliente-se, no entanto, conforme assevera Clève (2000, p. 77-78), que
Não há uma correspondência necessária entre a via incidental (de exceção ou de defesa) e a fiscalização difusa, ou entre a via de ação (principal) e a fiscalização concentrada. A correlação é verdadeira no Brasil, onde a fiscalização difusa é desencadeada incidentalmente (por via de exceção ou de defesa), sendo certo que a concentrada é provocada por via de ação (principal). Mas a correspondência não é verdadeira em outros sistemas. Na Áustria, na Alemanha, na Itália e na Espanha a questão de constitucionalidade suscitada por via incidental (de defesa ou exceção) conduz a uma fiscalização concentrada. Com efeito, nesses países, uma vez levantada a questão de constitucionalidade cumprirá ao juiz ou tribunal a quo, em regra geral, não mais do que suspender o feito para aguardar a decisão da Corte Constitucional a propósito da matéria.
Ressalvadas pequenas diferenças entre as definições acima elencadas, na presente monografia tais conceitos serão usados como sinônimos.
2.1.1 Legitimidade ativa
A legitimidade ativa para suscitar a questão constitucional é de todas as partes ou terceiros (assistentes, litisconsortes, opoentes) integrantes da relação processual. O autor, por sua vez, pode requerer a declaração de inconstitucionalidade de lei logo na peça inicial, na réplica e, inclusive, em sede de recurso.
O levantamento da questão constitucional pode ocorrer até mesmo mediante alguns remédios constitucionais. Quando, por exemplo, um contribuinte quiser evitar o pagamento de determinado tributo que se fundamente em dispositivo de lei de efeitos concretos que entenda inconstitucional, poderá impetrar mandado de segurança preventivo.
Da mesma forma, se considerado que determinada persecução penal baseou-se em lei de constitucionalidade duvidosa, poderá ser impetrado habeas corpus.
Segundo Barbosa Moreira (1974, p. 37) “não há preclusão em se tratando de quaestio iuris. Nada importa que a questão de inconstitucionalidade só venha a ser suscitada, pela primeira vez, em segundo grau de jurisdição”.
Em razão disso, doutrinadores como Ada Pellegrini, Zeno Veloso, Marcelo Novelino se opõem às denominações “pela via de exceção”, “pela via de defesa”, visto que os referidos incidentes não são suscitados unicamente pelos réus.
Legitimidade ativa também é conferida ao Ministério Público ao atuar como parte ou fiscal da lei. Nas palavras de Veloso (2003, p. 43), “sempre que for arguida a inconstitucionalidade, no curso de uma ação, mesmo que o processo fosse daqueles em que o Ministério Público não tivesse que intervir, há necessidade de convocá-lo, para que se manifeste sobre a questão prejudicial”. Isto se dá em decorrência do que preceitua o artigo 127 da Constituição Federal, o qual incumbe ao parquet a defesa da ordem jurídica.
No entendimento de Zeno Veloso (2003) a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público não se trata de mera possibilidade conferida aos magistrados. Para ele, a inconstitucionalidade, mesmo que não questionada pelas partes, e, considerando, inclusive, o princípio iura novit curia, deve ser declarada de ofício pelo juiz. Sendo assim, diante de lei ou ato normativo contrário à Constituição, relacionado à demanda sob seu julgamento, tem o magistrado dever funcional de declarar sua inconstitucionalidade e não aplicabilidade ao caso objeto da lide.
A tese do ilustre doutrinador deve ser observada com necessária ressalva no que tange ao recurso extraordinário, tendo em vista a necessidade de prequestionamento da matéria constitucional, em atenção à Súmula nº 282 do Supremo Tribunal Federal, in verbis: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada”. Assim, não há que se falar em RE contra decisão que não abordou a questão legal constitucional recorrida.
2.1.2 Ações judiciais
A inconstitucionalidade de norma incompatível com a Lei Maior, na via incidental, pode ser suscitada no decorrer de qualquer lide com objetivo concreto, devendo focar-se no direito subjetivo de um dos polos da ação. Pode a constitucionalidade, assim, ser questionada em ações declaratórias, constitutivas, cautelares e outras.
Segundo Clève (2000) a questão da inconstitucionalidade pode ser levantada em ações constitucionais como mandado de segurança, habeas corpus e habeas data, podendo também ocorrer em nas ações civis públicas e ações populares.
Em que pese o entendimento esposado acima, o artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública atribui efeitos erga omnes à sentença final, os quais abrangerão os limites da competência do órgão prolator, excetuados os casos de improcedência por insuficiência de provas.
Como pode ser observado, os efeitos conferidos àquela decisão ultrapassariam o limite autor/réu, o que poderia ser usado para fins transversos, além de caracterizar verdadeira usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.
Há, no entanto, possibilidade de proteção constitucional através da ação civil pública, como bem exemplificam Alexandrino e Paulo (2008, p. 731):
Para ilustrar, o Ministério Público poderia, por exemplo, ajuizar uma ação civil pública visando à anulação de um concurso público estadual, realizado com base em lei supostamente inconstitucional aprovada pelo respectivo estado membro. Nessa situação, o magistrado poderá incidentalmente, declarar a inconstitucionalidade da lei estadual e, em decorrência, determinar a anulação do respectivo concurso público, com efeitos exclusivamente para as partes alcançadas pela ação, naquele caso concreto.
Assim, entendem a doutrina e a jurisprudência pela possibilidade de levantamento da questão constitucional em ação civil pública desde que não esteja como pedido, apenas como causa de pedir.
2.1.3 Competência
Considerando que o questionamento da constitucionalidade de lei ocorre de maneira incidental e prejudicial no curso de um processo, a competência para apreciar e julgar a causa se estende à divergência constitucional de maneira que a declaração concreta de inconstitucionalidade pode ser realizada tanto por um juiz singular quanto pelo Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal.
2.1.3.1 Reserva de plenário
Em observância aos princípios da segurança jurídica e da presunção de legalidade das leis, a Constituição Federal estatuiu a cláusula de reserva de plenário, também conhecida como full bench, em seu artigo 97, segundo o qual a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo somente será possível pelo voto da maioria absoluta dos membros de um tribunal ou órgão especial.
Em análise ao referido dispositivo constitucional, entendem Alexandrino e Paulo (2008, p. 773) que
Ao impor necessidade de maioria absoluta para que os tribunais possam declarar a inconstitucionalidade, o constituinte reforçou sobremaneira a presunção de constitucionalidade das leis, pois sempre que não se logre atingir esse quorum, a norma será tida por constitucional; fica afastada a possibilidade de um dos membros do tribunal (ou alguns poucos de seus integrantes) decidir, isoladamente, que uma lei deva ser considerada inconstitucional.
Observe-se, no entanto, que a obrigatoriedade se vincula unicamente à primeira apreciação sobre determinado fato, conforme preceitua o art. 481 do Código de Processo Civil. Sendo assim, a aplicação da reserva de plenário está dispensada a partir do segundo julgamento sobre questão fundamentalmente idêntica que já tenha sido objeto de apreciação no âmbito dos próprios tribunais ou do plenário do Supremo Tribunal Federal, de maneira que restarão respeitadas a economia e celeridade processuais.
2.1.3.2 Procedimento da declaração incidental
Não há no ordenamento previsão de procedimento para declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo quando suscitada de maneira incidental perante juiz singular, sendo levantada como fundamento de uma pretensão ou de resistência à pretensão da parte contrária.
No que tange aos tribunais, argüida a inconstitucionalidade em processo originário ou recursal, o Código de Processo Civil, em seus artigos 480 a 482, estabelece que deverá o relator, após manifestação do ministério público, submeter a questão constitucional à turma ou câmara a que couber o conhecimento da causa.
Rejeitada a arguição de inconstitucionalidade, o julgamento da lide correrá normalmente ainda na turma ou câmara. No entanto, se acolhida a tese da inconstitucionalidade, lavrar-se-á o acórdão para que a questão seja, então, submetida ao Tribunal Pleno ou órgão especial.
Na lição de Alexandrino e Paulo (2008, p. 733):
(...) sempre que acatada uma argüição de inconstitucionalidade pelo órgão fracionário, o incidente deverá ser submetido ao Plenário ou ao órgão especial, para que este decida sobre a questão constitucional, por maioria absoluta de seus membros. Decidida a questão constitucional, os autos são devolvidos ao órgão fracionário, para que este julgue o caso concreto e lavre o respectivo acórdão (aplicando ao caso concreto, evidentemente, a posição firmada pelo plenário ou órgão especial sobre a inconstitucionalidade argüida).
Ainda em análise da questão procedimental, os §§ 1º e 2º do artigo 482, acrescentados pela Lei 9.868 de 1999, possibilita ao Ministério Público, bem como às entidades públicas responsáveis pelo ato questionado e aos legitimados previstos no artigo 103 da Constituição Federal, manifestação no incidente de inconstitucionalidade em curso nos tribunais.
Também incluído pela Lei 9.868 de 1999, o § 3º do artigo 482 do Código Processual Civil prevê a admissão, pelo relator, de manifestação de outros órgãos ou entidades no incidente de inconstitucionalidade, considerada a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, sendo o referido preceito a consagração da figura do amicus curiae no direito positivo brasileiro.
Em que pese a impossibilidade de declaração de inconstitucionalidade de lei pela câmara, turma, seção ou outro órgão fracionário do tribunal, é possível o reconhecimento da constitucionalidade da norma. Segundo Barroso (2012, p. 123), nesses casos não haverá a necessidade de encaminhamento da questão constitucional ao plenário, devendo prosseguir o julgamento da lide.
Ainda segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, não há necessidade de aplicação da cláusula de reserva de plenário às leis pré-constitucionais, pois seu reconhecimento resolve-se no plano intertemporal, com análise da legalidade, não da constitucionalidade, visto que lei nova revoga lei anterior.
2.1.4 Recurso Extraordinário
Percorridas todas as instâncias judiciais anteriores, o Recurso Extraordinário, de competência do Supremo Tribunal Federal, apenas pode ser utilizado nas hipóteses de ofensa à Constituição elencadas no inciso III do artigo 102 da Lei Maior que: a) contrariem dispositivo constitucional; b) declarem a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julguem válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição Federal; ou d) julguem válida lei local contestada em face de lei federal.
Ensina Barroso (2012, p. 130) que a admissibilidade do Recurso Extraordinário, assim como no Recurso Especial, se divide em dois momentos. Uma primeira análise, ainda no tribunal de origem é exercida pelo respectivo presidente e será limitada às hipóteses constitucionais de cabimento e aos requisitos formais exigidos. Tal função pode ser delegada ao vice-presidente ou a algum deles, caso haja mais de um. Da decisão contrária ao seguimento do recurso, caberá agravo ao Supremo.
O segundo momento em que será analisada a admissibilidade do Recurso Extraordinário se dá já no âmbito do Supremo Tribunal Federal e foi introduzida pela Emenda Constitucional nº 45/2004 ao inserir o § 3º do artigo 102 da Constituição Federal, segundo o qual deverá ser demonstrada a repercussão geral das questões constitucionais controvertidas no caso a ser apreciado.
2.1.5 Efeitos da decisão
No que tange aos efeitos da decisão de inconstitucionalidade em sede de controle difuso, onde o ato incompatível com a Lei Maior será considerado nulo, prevalece o entendimento de que a declaração de inconstitucionalidade afetará apenas as partes litigantes, fulminando o ato e todas as relações jurídicas dele derivadas, retroagindo a decisão à origem do ato. Mesmo entendimento é adotado por Alexandrino e Paulo, para quem
a decisão no controle de constitucionalidade incidental só alcança as partes do processo (eficácia inter partes), não dispõe de efeito vinculante e, em regra, produz efeitos retroativos (ex tunc). A decisão só alcança as partes do processo porque no controle incidental o interessado requer a declaração da inconstitucionalidade da norma como a única pretensão de afastar a sua aplicação ao caso concreto.
Resumidamente, o controle de constitucionalidade pela via difusa gera efeitos inter partes e ex tunc.
Em regra, ainda que a declaração de inconstitucionalidade seja proferida pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento de recurso extraordinário, seus efeitos aplicar-se-ão apenas ao caso concreto objeto da lide.
De maneira geral, essa decisão poderia gerar leis ou atos normativos constitucionais para uns e inconstitucionais para outros. Diante disto, foi outorgada ao Senado Federal a competência para avaliar a aplicabilidade da decisão de inconstitucionalidade a toda a população, com a suspensão da lei ou do ato, ou seja, atribuição de efeitos erga omnes às decisões advindas do controle incidental.
A modulação dos efeitos da decisão no controle difuso de inconstitucionalidade será abordada com mais afinco no terceiro capítulo deste estudo, o qual é dedicado unicamente à referida análise.
2.1.6 Função do Senado Federal
Como abordado em tópico anterior, a Constituição Federal, no inciso X de seu artigo 52, atribuiu ao Senado a possibilidade de conferência de efeitos erga omnes às decisões proferidas em casos concretos. Tal competência é originária da Constituição de 1934 e tem como objetivo evitar discrepâncias e ambigüidades nos julgados, além de evitarem novas lides com o mesmo objeto.
Asseveram Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior (2003, p. 29) que
o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a matéria, trata de reconhecer, ou não, inconstitucionalidade do tema, fato que, por si, não determina a expulsão da norma do sistema, pois, no caso, a coisa julgada restringe-se às partes do processo em que a inconstitucionalidade foi argüida. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal deve comunicar a decisão ao Senado Federal, que, utilizando a competência do artigo 52, X, da Constituição Federal, tem a faculdade de, por meio de resolução, suspender a execução da norma.
Tal previsão estabelece competência privativa do Senado Federal para suspensão da execução, no todo ou em parte, de lei ou ato com inconstitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal.
Não se pode interpretar, no entanto, como uma liberalidade conferida ao Senado no sentido de determinar a abrangência da suspensão. Ocorrerá apenas a atribuição de efeito erga omnes às decisões proferidas pelo STF, seja pela inconstitucionalidade total ou parcial da lei.
No que tange à obrigatoriedade da atribuição de efeitos para todos pelo Senado Federal, observe-se não se tratar agora de obrigação que lhe é imposta. Trata-se de ato discricionário e essencialmente político conferido ao Senado pela Lei Maior. “Assim, ao Senado Federal não só cumpre examinar o aspecto formal da decisão declaratória da inconstitucionalidade, verificando se ela foi tomada por quorum suficiente e é definitiva, mas também indagar da conveniência dessa suspensão” (MORAES, 2005, p. 644).
Noutro sentido posiciona-se Veloso (2003, p. 57), para quem a discricionariedade do Senado acarretaria nova apreciação da inconstitucionalidade, resultando na prevalência da consideração política sobre a verificação jurídica.
Doutrina majoritária sustenta que a obrigatoriedade da suspensão dos efeitos da norma ou do ato declarado inconstitucional pelo Senado feriria o princípio da separação dos poderes.
Adotam Araújo e Nunes Júnior o entendimento de que
sustentar a retroeficácia dessa deliberação implica afirmar que o Senado pode postergar o momento de edição da Resolução, para, em seguida, atribuir invalidade a todos os atos jurídicos praticados sob a égide dos atos normativos impugnados anteriores à edição desta, inclusive aqueles que vieram a lume no período em que o ato normativo submeteu-se ao juízo discricionário do Senado, que, dessa feita, prorrogaria a eficácia de uma norma, legitimando um sem número de atos jurídicos, que preconcebia inválidos e, portanto, predestinados ao desfazimento. (...) Não fosse essa linha correta de interpretação da Constituição, estar-se-ia atribuindo ao Senado o poder de postergar uma decisão, permissiva da produção de atos que seriam invalidados – num segundo momento – pela própria decisão postergada.
O posicionamento que defende a irretroatividade das decisões do Senado afirma que, se de outra forma fosse, estar-se-ia desrespeitando a discricionariedade do Senado Federal, uma vez que o período compreendido entre a decisão do STF e a Resolução do Senado, período esse de “maturação da decisão”, restaria prejudicado, pois, para essa corrente, cumpre ao Senado, também, analisar a estabilidade dos julgados e da jurisprudência do Supremo.
Por sua vez, Alexandrino e Paulo (2008, p. 741) entendem que
a palavra “suspensão” induz à noção de que os efeitos seriam prospectivos, ex nunc. Também milita em favor da ideia de que a atuação do Senado produziria efeitos doravante o fato de que a atividade legislativa é tipicamente prospectiva, vale dizer, não é dado ao Poder Legislativo, no exercício de atividade legislativa, anular leis, desconstituindo-as retroativamente. Nesse caso – serem os efeitos ex nunc -, a suspensão da lei pelo Senado Federal seria equiparável à revogação dessa lei.
Nessa toada, a consideração da tese dos efeitos ex nunc da Resolução do Senado acarretaria a perda do fundamento lógico da previsão constante do inciso X, artigo 52, da CF, tendo em vista que o intuito da suspensão é exatamente evitar o ajuizamento de novas ações com o mesmo objeto (ALEXANDRINO; PAULO, 2008, p. 742).
Mesmo entendimento é esposado por Motta Filho e Santos (2002), para quem a atribuição de efeitos retroativos à Resolução do Senado implica na preservação da democracia e isonomia, uma vez que impedirão a permanência de normas ou leis já declaradas inconstitucionais. “Outro problema é que o efeito ex nunc obriga as pessoas a buscarem o judiciário apenas para obter o efeito ex tunc” (MOTA FILHO; SANTOS, 2002, p. 626), resultando no alto índice de questionamento sobre situações já decididas pelo Supremo. “Isto tem sido muito comum em questões envolvendo tributos já declarados inconstitucionais e já objeto de Resolução do Senado que, tendo efeito apenas ultrativo, não basta para evitar que empresas deixem de sofrer a indevida cobrança” (MOTA FILHO; SANTOS, 2002, p. 626).
Gilmar Mendes (2007, p. 1029), um dos maiores defensores da retroatividade das decisões do Supremo no controle de difuso, faz a seguinte indagação:
se o Supremo pode, em ação direta de inconstitucionalidade, suspender, liminarmente, a eficácia de uma lei, até mesmo de emenda constitucional, por que haveria a declaração de inconstitucionalidade, proferida no controle incidental, valer tão-somente para as partes?
O Ministro também defende a ideia da mutação constitucional do artigo 52, X, da Constituição Federal. Para ele, é necessária uma reinterpretação do papel do Senado no controle de constitucionalidade pela via de exceção, pois a introdução do controle pela via principal teria acarretado perda de parte do sentido da Resolução do Senado.
É possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação do sistema jurídico e, por conseguinte, da nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X, da Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui de uma autêntica reforma da Constituição sem expressa modificação do texto (MENDES, 2004, p. 165).
Apesar de tratar dos efeitos da resolução senatorial apenas no âmbito da administração pública federal, o Decreto nº 2.346/97 pode ser usado como argumento para a conferência de efeitos ex tunc suspensão da lei ou norma declarada inconstitucional, in verbis:
Art. 1º As decisões do Supremo Tribunal Federal que fixem, de forma inequívoca e definitiva, interpretação do texto constitucional deverão ser uniformemente observadas pela Administração Pública Federal direta e indireta, obedecidos aos procedimentos estabelecidos neste Decreto. § 1º Transitada em julgado decisão do Supremo Tribunal Federal que declare a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, em ação direta, a decisão, dotada de eficácia ex tunc, produzirá efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional, salvo se o ato praticado com base na lei ou ato normativo inconstitucional não mais for suscetível de revisão administrativa ou judicial. § 2º O disposto no parágrafo anterior aplica-se, igualmente, à lei ou ao ato normativo que tenha sua inconstitucionalidade proferida, incidentalmente, pelo Supremo Tribunal Federal, após a suspensão de sua execução pelo Senado Federal.
Assim, observada a explanação retro, deve prevalecer a tese de atribuição de efeitos ex tunc, pois, além de tratar-se do posicionamento que melhor expressa a vontade da Constituição (HESSE, 1991), a atribuição de efeitos retroativos é a regra no controle de constitucionalidade.
{C}2.2 Do controle concentrado de constitucionalidade
O controle concentrado da constitucionalidade, realizado através de uma ação direta cujo pedido principal é a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público em confronto com a Constituição, pode ser realizado através das seguintes ações diretas: ação direta de inconstitucionalidade (ADI), ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADI por omissão), ação direta de inconstitucionalidade interventiva, ação declaratória de constitucionalidade (ADC) e arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF).
Em que pese o rol de ações para impugnação ou declaração de constitucionalidade, o presente estudo aprofundar-se-á na análise da ADI genérica, visto tratar-se de modelo clássico de controle de constitucionalidade, além de ser base para análise da teoria da abstrativização, objeto desta monografia, sem prejuízo, no entanto, de uma abordagem superficial acerca dos demais meios de controle concentrado de constitucionalidade.
{C}2.2.1 Ação direta de inconstitucionalidade por omissão
Assim como a ADI genérica, a ADI por omissão tem como legitimados para sua propositura os integrantes do rol taxativo do artigo 103 da Constituição Federal e como pressuposto uma omissão legislativa, melhor dizendo, uma abstenção indevida ou atuação insatisfatória do poder público diante daquilo que estava constitucionalmente obrigado a fazer. Em regra, a omissão prejudica a aplicabilidade de normas de eficácia limitada, tendo como consequência a ineficiência da previsão constitucional.
Em respeito ao princípio da separação dos poderes, não será proferida decisão que obrigue o Congresso a legislar sobre a matéria. De maneira simplificada, o STF apenas declara a omissão quanto à norma regulamentadora, sem qualquer atitude no sentido de obrigar o legislador a saná-la.
Por outro lado, há autores, como Gilmar Mendes (2007, p. 1141) que entendem pelo caráter mandamental da decisão emanada da Corte Máxima.
Sendo a missão proveniente de órgão da administração, estabelece o artigo 103 da Constituição, prazo de trinta dias para a tomada das providências necessárias.
2.2.2 Ação direta de inconstitucionalidade interventiva
Em que pese o teor do artigo 18 da CF, que reconhece a autonomia entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, existe, também na Constituição, em seus artigos 34 e 35, a previsão da intervenção da União nos Estados e destes nos Municípios através da ação direta de inconstitucionalidade interventiva.
Pontuam Alexandrino e Paulo (2008, p. 845) que
a Constituição admite o excepcional afastamento da autonomia política, diante do interesse maior de preservação da própria unidade federativa, por meio da intervenção de uma entidade política sobre outro. Por essa razão, frise-se, o afastamento temporário e parcial da autonomia de um ente federado é medida drástica e excepcional, que somente se justifica com o escopo de evitar um mal ainda maior: a desagregação da Federação.
A intervenção pode ocorrer de maneira direta espontânea ou provocada. A primeira situação ocorre quando o chefe do Executivo, sem intervenção de outros órgãos, decide pela intervenção. A segunda, por sua vez, a partir de iniciativa do Procurador-Geral da República, e está vinculada a prévia decisão do STF.
Para Clève (2000, p. 125), a ação direta de inconstitucionalidade interventiva pode ser descrita como um “procedimento fincado a meio caminho entre a fiscalização da lei in thesi e aquela realizada in casu”, ocorrendo, assim, o controle de um caso concreto, porém, por meio de uma ação direta.
2.2.3 Ação declaratória de constitucionalidade
Com o intuito de evitar discussões acerca da constitucionalidade das leis, mesmo diante da conhecida presunção de legalidade das normas, foi alterado pela Emenda Constitucional 03/93 o conteúdo da alínea “a”, do inciso I do artigo 102 da Constituição Federal, passando a admitir o julgamento, pelo Supremo, de ação declaratória de lei ou ato normativo federal.
A nova Emenda também instituiu eficácia erga omnes e efeito vinculante às decisões proferidas pelo STF nas ações declaratórias de constitucionalidade, conforme artigo 102 do texto constitucional, que antes os admitia apenas nas ações diretas de inconstitucionalidade.
A interpretação controversa da constitucionalidade do dispositivo configura-se como pressuposto para o conhecimento da ADC, visto não haver lógica em declarar a constitucionalidade de dispositivo de interpretação uníssona quanto a sua conformidade com a Lei Maior.
Assim, se a jurisdição ordinária, através de diferentes órgãos, passar a afirmar a inconstitucionalidade de determinada lei, poderão os órgãos legitimados, se estiverem convencidos de sua constitucionalidade, provocar o STF para que ponha termo à controvérsia instaurada (MENDES, 2007, p. 1077).
No que se refere à legitimidade para propositura da ação em comento, observa-se que em nada difere do rol de legitimados à ADI, conforme art. 103 da Constituição Federal. Contudo, no que tange à legitimidade passiva, merece destaque o fato de inexistirem legitimados para tanto. Ora, se o objetivo da ação é afastar a insegurança jurídica decorrente de interpretações judiciais diversas sobre a constitucionalidade de uma lei, diferentemente do que ocorre na ADI, não há que se falar em sujeito passivo em sede de ação declaratória de constitucionalidade, motivo pelo qual o Advogado Geral da União não precisará ser ouvido.
2.2.4 Arguição de descumprimento de preceito fundamental
A ADPF é considerada um instituto novo e único no direito brasileiro, pois foi introduzida no ordenamento jurídico apenas na Constituição Federal de 1988 e não possui correspondente no direito comparado. A ação em comento é regulada pela Lei 9.882/99 e garantida constitucionalmente pelo art. 102, § 1º da CF.
A legitimidade ativa para propositura da ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental é a mesma da ação direta de inconstitucionalidade, artigo 103 da Lei Maior.
Em razão da não delimitação da abrangência do conceito de “preceito fundamental”, a ADPF pode ser utilizada para controle de constitucionalidade de leis municipais em face da Constituição Federal e do controle de leis pré-constitucionais, questões estas que antes não poderiam ser impugnadas.
2.2.5 Ação direta de inconstitucionalidade
Introduzida no ordenamento jurídico brasileiro em 1965 através da Emenda Constitucional nº 16, que alterava a Constituição de 1946, a ação direta de inconstitucionalidade surgiu como uma representação contra lei ou ato normativo que destoe da Lei Maior, sendo, então, encaminhada a julgamento no Supremo Tribunal Federal pelo Procurador Geral da República.
Com o advento da Constituição de 1988, passou a chamar-se expressamente ação direta de inconstitucionalidade, conforme se depreende da leitura do art. 102, I, alínea “a”, que atribui competência originária ao Supremo para processar e julgar “ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativa federal ou estadual”.
É uma ferramenta através da qual se realiza o controle concentrado-principal de constitucionalidade, defendendo de maneira genérica todas as normas existentes na Constituição.
Uma vez provocado, o Supremo Tribunal Federal examina se a lei ou ato normativo impugnado confronta-se verticalmente ou não com uma norma constitucional. Observe-se que não há lide nesse tipo de ação, visto que não se constitui em razão de um conflito de interesses. Será atacada lei em tese de forma abstrata.
2.2.6 Competência
Nos moldes do sistema europeu, o controle concentrado no Brasil é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal ou dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito federal, de acordo com a norma questionada, conforme artigos 102, I, e 105, § 2º, da Constituição Federal.
Importante destacar que o controle concentrado exercido pelos Tribunais Estaduais e do Distrito Federal somente é legítimo com relação a leis estaduais e municipais que afrontem a Constituição Estadual de cada ente.
Nesse sentido, observa Barroso (2012, p. 184 e 185) que não serão competentes os Tribunais de Justiça para apreciar “a constitucionalidade de lei federal em face da Constituição Estadual, tampouco de lei municipal em face da Constituição Federal”, caso este que deverá ser objeto de ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental perante o STF.
2.2.7 Legitimidade ativa
A Constituição de 1988 trouxe uma grande inovação à ADI no que se refere à legitimidade ad causam. Retirando o monopólio das mãos do Procurador-Geral da República, previu a possibilidade de propositura da ação direta de inconstitucionalidade por outras autoridades, órgãos e entidades.
Entende Mendes (2007, p. 1048) que essa ampliação do rol de legitimados à propositura da AD resultou numa diminuição do significado do controle realizado pela via difusa, uma vez que muitas questões constitucionais importantes passaram a ser submetidas ao Supremo pela via direta.
De acordo com os incisos do artigo 103, CF, podem propor a ADI:
I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito
Federal;
V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Como abordado anteriormente, na ADI não há lide e, por consequência, não há pólos ativo e passivo, diferentemente do que ocorre no controle concreto. Dessa forma, os legitimados acima citados serão partes meramente formais, por tratar-se de ação de caráter objetivo. Da mesma forma, não podem ser consideradas partes passivas os elaboradores da lei, tampouco o Advogado-Geral da União, que deverá, obrigatoriamente, ser citado para defesa do ato normativo impugnado.
No que concerne à atuação do Advogado-Geral da União na ADI, entende o Supremo ter aquele o papel de “curador da presunção de constitucionalidade da lei”, tendo como dever sua defesa incondicional, ainda que em desfavor da própria União.
De acordo com o artigo 131 da Constituição, o AGU deverá, ainda, prestar consultoria e assistência jurídica ao Poder Executivo. Sendo assim, em ADI proposta por Presidente da República, fundada em parecer do próprio AGU, este também deverá atuar.
O Procurador-Geral da República, por sua vez, terá uma dupla atuação nas ações diretas de inconstitucionalidade. Ao mesmo tempo em que lhe é conferida pelo inciso VI do art. 103, legitimidade para propor a ADI, prevê o § 1º do mesmo artigo que o PGR deverá ser ouvido em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal.
É possível, inclusive que o PGR se manifeste pelo indeferimento de ADI ajuizada por ele próprio, tendo em vista sua plena autonomia funcional e a não vinculação de sua atuação a entendimentos pretéritos.
Apesar de não reconhecer contradição entre a defesa do ato impugnado e o exercício da função determinada pelo artigo 131 da CF, o Supremo Tribunal Federal abrandou a norma estabelecida pelo § 3º do artigo 103 de forma que será inexigível a atuação do AGU em casos semelhantes quando houver entendimento pacífico do Supremo pela inconstitucionalidade da lei.
Embora não haja distinção constitucional entre legitimados à propositura da ADI, a jurisprudência do STF tem exigido dos Governadores de Estados, Mesas da Assembléia Legislativa, confederações sindicais e das entidades de classe nacionais a chamada “pertinência temática”, um “interesse de agir” demonstrando uma relação lógica entre o conteúdo da norma objeto da ação e os interesses defendidos por esses legitimados.
Dos dois primeiros casos, incisos IV e V do artigo 103, é imperioso que a lei ou ato normativo impugnado tenha ligação, de algum modo, com as respectivas coletividades políticas. Já nos casos do inciso X, o conteúdo da norma questionada deve dizer respeito às finalidades estatutárias das confederações sindicais e entidades de classes de âmbito nacional.
Nas demais hipóteses do artigo 103, CF, o Supremo Tribunal Federal entende ser inexigível a pertinência temática, pois esses legitimados possuem interesse, em razão de suas atribuições, na preservação da Constituição Federal.
Dessa forma, a jurisprudência do Supremo define dois tipos de legitimados à propositura da ADI: os não universais ou especiais, incisos IV, V e X, do art. 103, da CF; e os universais, demais integrantes do rol do referido artigo.
Quanto à capacidade postulatória, entende o Pretório Excelso que o Presidente da República; as Mesas do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, da Assembléia Legislativa e Governador de Estado ou do Distrito Federal; o Procurador-Geral da República e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil não necessitam fazer-se representar por advogado.
Por outro lado, entende não disporem de capacidade postulatória o partido político com representação no Congresso Nacional, a confederação sindical e a entidade de classe de âmbito nacional, já tendo decidido pela imprescindibilidade de apresentação de procuração com outorga de poderes específicos para que a ADI seja proposta.
2.2.8 Objeto
Em atenção ao artigo 102, I, da Constituição Federal, a competência para julgamento de ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou federal e de ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal é exclusiva do Supremo, de maneira que é incabível ADI para atacar leis municipais, poderão ser, excepcionalmente, apreciadas pelo STF em caso de recurso extraordinário (controle difuso).
Entendia o Supremo que não poderiam ser atacadas via ação direta de inconstitucionalidade normas editadas antes da Constituição de 1988, não sendo possível, portanto, a realização de controle concentrado de normas pré-constitucionais.
Esses vazios no controle de constitucionalidade foram sanados como advento da Lei 9.882/99, que dispõe sobre a ADPF e estabelece entre suas finalidades a fiscalização de normas municipais e pré-constitucionais, evitando que tais normas permanecessem isentas de controle.
Na capital federal, o controle de constitucionalidade foge à regra, uma vez que leis distritais que versem sobre competência legislativa estadual serão submetidas à apreciação pelo Supremo. Já nos casos de competência legislativa municipal da Câmara Legislativa, o controle será realizado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.
A jurisprudência da Corte defendia o entendimento de que o controle via ação direta somente era admissível para normas de caráter geral e abstrato, ficando excluídas as de efeitos específicos e concretos.
Gilmar Mendes (2007) e Clèmerson Merlin Clève (2000) se opunham a tal entendimento. Para eles, a Constituição não delimitou a abrangência da ADI no que se refere aos efeitos das normas passíveis de impugnação. Sendo assim, todas elas, de efeitos abstratos e concretos, estão sujeitas à fiscalização abstrata, desde que emanadas pelo poder público.
Recentemente, no entanto, o Supremo Tribunal Federal, modificou sua jurisprudência, passando a admitir o controle abstrato de constitucionalidade em lei de efeitos concretos, conforme ADI 4.048-MC.
De acordo com Barroso (2012, p. 200-211) podem ser objeto de controle de constitucionalidade via ação direta: as emendas constitucionais, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções, decretos autônomos, legislação estadual e tratados internacionais. Em contrapartida, atos normativos secundários, leis e atos de efeitos concretos, leis anteriores à Constituição em vigor, leis já revogadas, leis municipais em face da Constituição Federal, proposta de emenda constitucional ou projetos de lei e as súmulas estão excluídas de tal fiscalização.
2.2.9 Parâmetro de controle
Para análise da constitucionalidade de uma norma, é necessário o confronto com outra, esta integrante do texto constitucional, que servirá como base para a conclusão pela validade ou não da lei ou ato normativo impugnado, ou seja, a norma ofendida.
Pontuam Alexandrino e Paulo (2008, p. 768) que “há sempre uma relação entre a norma objeto de impugnação e o texto constitucional em face do qual aquela está sendo impugnada denominado 'texto constitucional parâmetro' cuja supremacia pretende-se ver respeitada”.
Em se tratando de normas revogadas, assevera Mendes (2007, p. 1067) que “constantes mudanças ou revogações de textos constitucionais levaram o Supremo Tribunal Federal a reconhecer a inadmissibilidade do controle abstrato de normas, se se cuida de aferição de legitimidade de ato em face de norma constitucional já revogada”.
Consideram-se como parâmetros para a ADI e a ADC todas as normas constitucionais e princípios implícitos. Ademais, a EC nº 45/2004 estendeu este parâmetro aos tratados e convenções internacionais de direitos humanos desde que obedecido o procedimento exigido para as Emendas Constitucionais.
2.2.10 Processo e julgamento
A Lei 9.868/99 tomou lugar do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal na regulação do processo de julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade.
Dispõe o artigo 3º da referida lei que a petição inicial deve ser apresentada em duas vias e conter o dispositivo da lei ou ato normativo impugnado, além dos fundamentos jurídicos do pedido em cada uma das impugnações.
Nesse contexto, assevera Mendes (2007, p. 1068) ser
interessante notar que, a despeito da necessidade legal da indicação dos fundamentos jurídicos na petição inicial, não fica o STF adstrito a eles na apreciação que faz da constitucionalidade dos dispositivos questionados. É dominante no âmbito do Tribunal que na ADI (e na ADC) prevalece o princípio da causa petendi aberta.
Sendo assim, o Supremo Tribunal Federal pode decidir pela inconstitucionalidade de uma lei sem, contudo, restringir-se aos fundamentos invocados pelas partes, uma vez que o controle concentrado rege-se pelo princípio da “causa de pedir aberta”.
Preceitua o artigo 4º, da Lei 9.868/99, que haverá o indeferimento liminar das petições iniciais ineptas, não fundamentadas ou manifestamente improcedentes. Após proposta a ação declaratória de constitucionalidade, não será admitida desistência. Isso ocorre porque é um processo objetivo, tendo como finalidade a defesa do ordenamento constitucional.
Recebida a petição inicial, o relator requisitará informações aos órgãos ou entidades das quais tenha emanado a norma questionada. Em se tratando de lei federal, deverão ser prestadas informações pelo Congresso Nacional e pelo Presidente da República. As informações por parte do Presidente da República não serão exigidas caso tenha ele exercido poder de veto ao projeto de lei.
Tratando-se de lei estadual, as informações serão solicitadas à Assembleia Legislativa e ao Governador do Estado, observada a mesma exceção existente para o Presidente da República. Já nos casos de ato normativo simples, as informações deverão ser prestadas por quem o editou.
Em regra, inadmite-se intervenção de terceiros no processo de ação direta de inconstitucionalidade, no entanto, o art. 7º da Lei 9.868/99 prevê a possibilidade, considerada a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, admitir, por despacho irrecorrível, a manifestação de outros órgãos e entidades.
Na visão de Moraes (2005, p. 677),
Essa inovação passou a consagrar, no controle abstrato de constitucionalidade brasileiro, a figura do amicus curiae, ou o “amigo da Corte”, cuja função primordial é juntar aos autos parecer ou informações com o intuito de trazer à colação considerações importantes sobre a matéria de direito a ser discutida pelo Tribunal, bem como acerca dos reflexos de eventual decisão sobre a inconstitucionalidade da espécie normativa impugnada.
Não sem hesitação, o STF acabou por firmar entendimento no sentido de admitir pedido de ingresso no feito até a remessa dos autos à Mesa, para julgamento. Importante observar, no entanto, que a participação do amicus curiae continua a cargo do relator, mas, uma vez admitido, reconhece-se, também, o direito a sustentação oral.
Superado o período de informações, deverão ser ouvidos, nessa ordem, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, os quais terão o prazo de quinze dias para apresentar manifestação. Em seguida, será lançado o relatório pelo Ministro relator do processo, com encaminhamento de cópia aos demais. Nessa oportunidade, será requerida data para julgamento.
Havendo, ainda, notória insuficiência das informações ou necessidade de esclarecimento quanto a matéria ou circunstância de fato, a critério do relator, serão requisitadas informações adicionais, designação de perito singular ou comissão para emissão de pareceres sobre a questão, ou fixação de data para audiência pública, oportunidade em que serão ouvidas pessoas com experiência e autoridade na matéria.
Supera-se, dessa forma, e em boa ora, a crença dominante de que a ação direta não comportaria fase probatória, devido a seu caráter estritamente objetivo. Na moderna dogmática jurídica, os fatos, a natureza dos problemas e as conseqüências práticas das soluções preconizadas desempenham papel de crescente importância na interpretação constitucional. Já não corresponde mais às demandas atuais uma interpretação asséptica e distanciada da vida real, fundada apenas no relato da norma (BARROSO, 2006, p. 165, sic).
2.2.11 Medida cautelar
A possibilidade de concessão de medida cautelar na ADI é expressamente prevista pela Constituição, sendo aplicada, em regra, como medida excepcional. Em razão do congestionamento da pauta do Supremo, o que acarreta demora na análise do mérito, o deferimento ou indeferimento de liminar pode ganhar contornos definitivos.
Como requisitos à concessão da medida, a jurisprudência do Supremo exige a presença de fumus boni iuris, periculum in mora, irreparabilidade ou insuportabilidade dos danos emergentes do ato impugnado, necessidade de garantia da eficácia da decisão final, relevância e conveniência do pedido. A exigência dos dois últimos, no entanto, não está presente em todos os julgados.
Ao contrário do indeferimento, o deferimento de medida cautelar tem efeito vinculante, suspendendo o julgamento de processos relacionados à norma impugnada no âmbito do STF. Observe-se que da concessão da medida não é cabível pedido de reconsideração da decisão. Em contrapartida, na negativa de concessão da medida, havendo fatos supervenientes que justifiquem a reapreciação do pleito, é possível reiteração.
Em que pese a previsão de concessão de medida cautelar somente por decisão da maioria absoluta dos membros da Corte, será admitida, excepcionalmente, por decisão do Presidente do Supremo, no período de recesso.
De acordo com o art. 10 e parágrafos, da Lei 9.868/99, a autoridade ou órgão de quem emanou a norma atacada deverá manifestar-se sobre o pedido de liminar dentro de cinco dias, prazo que será dispensado em casos de urgência. A critério do relator, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República serão ouvidos em três dias.
Os efeitos da medida serão, em regra, erga omnes e ex nunc, excetuada a previsão do § 1º, art. 11, da Lei, que admite atribuição de efeitos ex tunc à cautelar por decisão do Tribunal.
2.2.12 Decisão final
A Lei 9.868/99 trata tanto das decisões em ação declaratória de constitucionalidade quanto em ação direta de inconstitucionalidade e, em ambos os casos, só poderá ser proferida pelo voto de seis Ministros, maioria absoluta do Tribunal, artigos 22 e 23 da Lei.
O artigo 24 acentua o caráter “dúplice” ou “ambivalente” da ação direta de inconstitucionalidade ou da ação declaratória de constitucionalidade, estabelecendo que, proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou procedente eventual ação declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação declaratória (MENDES, 2007, p. 1074).
Declarada a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da norma, será comunicado o órgão ou autoridade expedidora do ato, e dez dias após o trânsito em julgado da sentença, será publicado o dispositivo do acórdão no Diário da Justiça e no Diário Oficial da União.
Da sentença caberão apenas embargos de declaração, os quais serão oferecidos pelos polos do processo, sendo vedada ação rescisória, quaisquer outros tipos de recurso e interposição de embargos declaratórios por terceiros, incluindo-se nessa vedação, inclusive, o AGU.
{C}2.2.13 Efeitos da decisão
Salvo expressa deliberação em contrário, a decisão na ADI tem efeitos retroativos e eficácia erga omnes, conforme art. 27 da Lei. Da mesma forma dispõe o artigo 102, § 2º, da Constituição Federal, que passou a prever expressamente essa possibilidade a partir da Emenda Constitucional nº 45.
Além disso, são conferidos à decisão em sede de ação direta efeitos repristinatórios e vinculantes. A seguir, serão abordados individualmente e de maneira mais aprofundada cada um deles.
2.2.13.1 Eficácia erga omnes
Como abordado outrora, os arts. 102 e 28, da Constituição Federal e Lei 9.868/99, respectivamente, atribuem às decisões positivas ou negativas de constitucionalidade de leis eficácia contra todos, não apenas entre as partes, como nas decisões em via difusa.
Afirmar que a decisão é dotada de eficácia erga omnes significa dizer que a decisão tem força geral, contra todos, alcançando todos os indivíduos que estaria sujeitos à aplicação da lei ou ato normativo impugnado. Desse modo, todas as pessoas que se encontrem abrangidas pela situação prevista na lei ou ato normativo serão atingida pela decisão da ação direta. (ALEXANDRINO; PAULO, 2008, p. 792)
Ainda de maneira diversa de como ocorre no controle concreto, não há necessidade de atuação do Senado Federal para avaliação e decisão quanto ao cabimento de efeitos erga omnes nas ações diretas. Tal dispensa ocorre em razão de o controle abstrato não defender direitos individuais, mas exercer a guarda da Constituição em si, excluindo do ordenamento jurídico as normas que dela destoem.
2.2.13.2 Efeito ex tunc
A decisão no controle concentrado-principal, segundo doutrina majoritária, tem natureza declaratória, reconhecendo a nulidade da lei ou ato normativo, em regra, desde seu nascedouro. Sustenta Clève (2000, p. 244) que, por apenas reconhecer uma nulidade preexistente, a declaração de inconstitucionalidade nas ações diretas tem efeito retroativo.
A Lei Lei 9.868/99, contudo, prevê a possibilidade, consideradas razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social, de o Supremo, pelo voto de dois terços dos seus membros, restringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, fixando momento a partir do qual ela terá eficácia.
Com a modulação dos efeitos temporais das decisões em via direta, objetivou-se resguardar a segurança jurídica de atos constituídos sobre norma inconstitucional, uma vez que a anulação destes atos pode, muitas vezes, acarretar prejuízos, como no caso de vantagens salariais recebidas de boa-fé.
2.2.13.3 Efeito repristinatório
Como abordado no tópico anterior, as decisões em ADI, em regra, retroagem ao nascedouro da lei ou ato normativo, acarretando a nulidade de todos os seus efeitos. Por esse motivo, quando a norma inconstitucional houver revogado norma constitucional, deverá esta voltar a viger, tendo em vista que, inclusive, a revogação teria sido nula. Esse fenômeno é chamado de efeito repristinatório.
Nesse sentido, o STF:
A declaração final de inconstitucionalidade, quando proferida em sede fiscalização normativa abstrata, importa – considerado o efeito repristinatório que lhe é inerente – em restauração das normas estatais anteriormente revogadas pelo diploma normativo objeto do juízo de inconstitucionalidade, eis que o ato inconstitucional, por juridicamente inválido (RTJ 146461-462), não se reveste de qualquer carga de eficácia derrogatória (STF – ADI 2.884RJ, rel. Min. Celso de Mello).
Em resumo, se uma lei foi declarada inconstitucional, deixa de produzir efeitos desde sua criação. Assim, se, em razão de sua promulgação, lei anterior foi revogada, voltará esta a viger, visto que se considera a revogação efeito da lei nova posteriormente declarada inconstitucional.
Alexandrino e Paulo (2008, p. 795) bem exemplificam tal situação:
Imagine-se que a lei Beta tenha revogado a lei Alfa em 10.08.2005. Posteriormente, em 10.02.2007, a lei Beta foi declarada inconstitucional em ação direta de inconstitucionalidade. Nessa situação, com a declaração da inconstitucionalidade da lei Beta, restaura-se a vigência da lei Alfa, como se sua revogação nunca tivesse existido, uma vez que os efeitos da pronúncia de inconstitucionalidade são retroativos (ex tunc).
Há, contudo, possibilidade de a norma repristinada ser também inconstitucional. Nesse sentido, pontua Clève (2000, p.250) que uma vez “detectada a manifestação de eventual eficácia repristinatória indesejada, cumpre requerer, igualmente, já na inicial da ação direta, a declaração da inconstitucionalidade, e, desde que possível, a do ato normativo ressuscitado”. Dessa forma, fica a cargo do autor, logo na inicial, requerer a inconstitucionalidade de ambas as normas.
2.2.13.4Efeito vinculante
O efeito vinculante das decisões do Supremo em sede de ADI é relativamente novo, sendo introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 9.868/99. Em 2004, com a Emenda Constitucional nº 45, nova redação foi dada ao §2º do art. 102, da Constituição Federal, passando a existir, então, previsão constitucional para a vinculação dos efeitos das decisões em ação direta de inconstitucionalidade.
Segundo Alexandrino e Paulo (2008, p. 793), essa vinculação “significa que todos os demais órgãos do Judiciário e todos os órgãos da Administração Pública direta e indireta, nas três esferas de governo, ficam vinculados à decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, não podendo desrespeitá-la”, sendo excluído apenas o próprio STF e o Poder Legislativo. Isso garante que não haja um engessamento constitucional.
O art. 102, I, “l”, da Constituição Federal, estatui a reclamação constitucional como medida cabível para preservar a competência do Supremo e garantir a autoridade de suas decisões, cabendo ao próprio STF processar e julgar a reclamação.
O art. 103-A, § 3º, estende o cabimento da reclamação constitucional também contra ato administrativo ou decisão judicial que contrarie súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar. Em caso de procedência da reclamação, o ato administrativo será anulado ou a decisão cassada, caso este em que será determinado seja proferida outra em seu lugar.
Quanto à legitimidade para propor a reclamação constitucional, Alexandrino e Paulo (2008, p. 793) explicam que “toda e qualquer pessoa atingida por decisões contrárias ao entendimento firmado pelo STF, no julgamento cautelar ou de mérito proferido em ação direta, é considerada como parte legítima para a propositura da reclamação”.
Analisadas a diferenças e especificidades dos modelos difuso e concentrado de constitucionalidade, no próximo capítulo deste estudo monográfico será abordada a abstrativização do controle difuso de constitucionalidade em si.
3 ABSTRATIVIZAÇÃO DO CONTROLE DIFUSO
A controversa aproximação dos efeitos das decisões proferidas em controle difuso em última instância dos efeitos próprios do controle concentrado não é mais tema recente, possuindo muitos defensores na doutrina e jurisprudência nacionais, como o Ministro Gilmar Mendes.
Em resumo, a proposta da abstrativização é a reinterpretação do inciso X, art. 52, da Constituição Federal de maneira a retirar das mãos do Senado o poder discricionário de decisão quanto à abrangência das sentenças no controle concreto de constitucionalidade, quando realizado em última instância, de maneira que a informação ao Senado cumpriria papel estritamente formal.
No que se refere ao dispositivo supracitado, impende ressaltar a já existente interpretação restritiva de seu conteúdo, uma vez que seu texto confere privativamente ao Senado a função de “suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”, sem especificar em qual tipo de controle tal decisão seria proferida.
Assumindo seu papel de poder constituinte reformador, o Supremo Tribunal Federal acrescentou implicitamente ao dispositivo a expressão “de maneira incidental”, redefinindo, assim, competências de órgãos estatais. Dessa forma, o efeito vinculante e a eficácia erga omnes passaram a ser inerentes às decisões proferidas no controle concentrado.
Para Andrea Alves (2008, p. 02), no que se refere à abstrativização do controle difuso,
Têm-se como argumentos justificadores de tal tendência: a força normativa e a supremacia da Constituição, a função institucional do STF como guardião e intérprete máximo da Constituição e a dimensão política de suas decisões, e a economia, efetividade e celeridade do processo. Ou seja, com a tese da abstrativização, o Recurso Extraordinário, antes destinado apenas ao controle concreto de constitucionalidade, deixa, em determinados casos, de ser utilizado como mais um grau de jurisdição às partes na lide privada, para se tornar mais objetivo, na defesa da ordem constitucional.
Assim, além de garantir isonomia e segurança jurídica aos julgados do Supremo, independente do tipo de controle em que sejam proferidos, a objetivação é, além de tudo, uma forma de conferir a celeridade e a economia tão desejadas num processo judicial.
Indispensável citar, ainda no que tange à abstrativização do controle difuso, o posicionamento do ilustre Ministro Teori Albino Zavascki no Recurso Especial 828.106/SP, quando Ministro do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Embora tomada em controle difuso, é decisão de incontestável e natural vocação expansiva, com eficácia imediatamente vinculante para os demais tribunais, inclusive o STJ (CPC, art. 481, § único: "Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão" ), e com força de inibir a execução de sentenças judiciais contrárias, que se tornam inexigíveis (CPC, art. 741, § único; art. 475-L, § 1º, redação da Lei 11.232/05: “Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal”).
Sob esse enfoque, há idêntica força de autoridade nas decisões do STF em ação direta quanto nas proferidas em via recursal. Merece aplausos essa aproximação, cada vez mais evidente, do sistema de controle difuso de constitucionalidade ao do concentrado, que se generaliza também em outros países (SOTELO, José Luiz Vasquez. “A jurisprudência vinculante na 'common law' e na 'civil law'”, in Temas Atuais de Direito Processual Ibero-Americano, Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 374; SEGADO, Francisco Fernandez. La obsolescência de la bipolaridad 'modelo americano-modelo europeo kelseniano' como critério nalitico del control de constitucionalidad y la búsqueda de una nueva tipología explicativa”, apud Parlamento y Constitución, Universida de Castilla-La Mancha, Anuario (separata), nº 6, p. 1-53). No atual estágio de nossa legislação, de que são exemplos esclarecedores os dispositivos acima transcritos, é inevitável que se passe a atribuir simples efeito de publicidade às resoluções do Senado previstas no art. 52, X, da Constituição. É o que defende, em doutrina, o Ministro Gilmar Ferreira Mendes, para quem “não parece haver dúvida de que todas as construções que se vêm fazendo em torno do efeito transcendente das decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Congresso Nacional, com o apoio, em muitos casos, da jurisprudência da Corte, estão a indicar a necessidade de revisão da orientação dominante antes do advento da Constituição de 1988" (MENDES, Gilmar Ferreira. “O papel do Senado Federal no controle de constitucionalidade: um caso clássico de mutação constitucional”, Revista de Informação Legislativa, n. 162, p. 165). (STJ, Primeira Turma, RESP 828.106/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgamento em 2-5-06, DJ de DJ: 15/05/2006).
A objeção à aproximação dos efeitos nos controles concreto e abstrato de constitucionalidade se fundamenta no entendimento de que, ao fazê-lo, se estaria excluindo o papel do Senado Federal na suspensão da lei. Da mesma, a vinculação das decisões em controle concreto, por maioria absoluta, desrespeitaria o estabelecido pelo artigo 103-A da CF, que exige para aprovação de súmula vinculante o quorum de dois terços. Ademais, no que se refere à modulação dos efeitos da decisão em controle abstrato, argumenta-se que tal possibilidade é própria do controle concentrado, prevista na Lei 9.868/99, art. 27.
Neste capítulo serão analisados casos referenciais da abstrativização.
3.1 Objetivação do recurso extraordinário
O recurso extraordinário surgiu no Brasil em 1980, através do Decreto 848. Foi importado do ordenamento jurídico estadunidense e em 1891 passou a ser previsto constitucionalmente. Embora tenha sido reproduzido como cópia fiel do recurso americano, no Brasil não há vinculação de seus efeitos, consequência da falta de adaptação do recurso à realidade jurídica brasileira.
Atualmente, o recurso extraordinário é previsto pela legislação pátria no art. 102, III, da CF; e na seção II, do capítulo V, do Código de Processo Civil, juntamente com o recurso especial.
A partir de 2004, com a Emenda Constitucional nº 45, mudanças relevantes foram introduzidas na legislação no que tange ao recurso ora em análise. Inicialmente, ampliou-se o rol de requisitos à admissibilidade do RE com a inclusão do § 3º ao artigo 102, CF, que exige a repercussão geral para que seja admitido, ficando a cargo da legislação infraconstitucional a disciplina dessa nova regra.
Em 2006, por consequência, foi editada a Lei 11.418, a qual acrescentou dois novos artigos à supracitada seção do Código de Processo Civil. O art. 543-A reproduziu em seu caput a previsão constitucional de exigibilidade de repercussão geral. Além disso, previu a irrecorribilidade das decisões que não conhecerem do recurso, salvo embargos declaratórios.
Já o artigo 543-B, do CPC, prevê o destaque de algum ou alguns recursos que representem a questão constitucional, os quais serão submetidos à análise, pelo Supremo, quanto à existência daquele pressuposto, enquanto os demais ficarão suspensos até o julgamento definitivo da questão. Por fim, se negada a existência de repercussão geral nos processos analisados, os recursos sobrestados considerar-se-ão, também, não admitidos.
São as alíneas a, b, c, e d do inciso III do já citado artigo 102 da Constituição Federal que dispõem sobre o cabimento do RE nas hipóteses em que a decisão recorrida, numa lide concreta, contrariar dispositivo constitucional, declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição ou julgar válida lei local contestada em face da Constituição.
Em que pese o papel do RE como recurso máximo nas questões incidentais de casos concretos, hodiernamente observa-se que tal instituto vem tomando outra forma. Cada vez mais o recurso extraordinário tem sido utilizado como ferramenta do controle abstrato de constitucionalidade, a esse fenômeno dá-se o nome de objetivação do recurso extraordinário.
O Ministro Gilmar Ferreira Mendes é, também, um dos grandes defensores dessa evolução do RE e do controle de constitucionalidade como um todo, tendo explicitado seu posicionamento na ocasião do processo administrativo nº 318.715/STF. Segundo ele, o recurso extraordinário
Deixa de ter caráter marcadamente subjetivo ou defesa de interesse das partes, para assumir, de forma decisiva, a função de defesa da ordem constitucional objetiva. Trata-se de orientação que os modernos sistemas de Corte Constitucional vêm conferindo ao recurso de amparo e ao recurso constitucional (Verfassungsbeschwerde). [...]
A função do Supremo nos recursos extraordinários — ao menos de modo imediato — não é a de resolver litígios de fulano ou beltrano, nem a de revisar todos os pronunciamentos das cortes inferiores. O processo entre as partes, trazido à corte via Recurso Extraordinário, deve ser visto apenas como pressuposto para uma atividade jurisdicional que transcende os interesses subjetivos.
Fredie Didier Júnior (2010, p. 455) elenca uma série de manifestações do RE como instrumento do controle abstrato de constitucionalidade na jurisprudência e legislação pátrias, a exemplo: a súmula vinculante e a repercussão geral; o caso Mira Estrela (RE 197.917/SP) e o caso da progressão de regime dos crimes hediondos (HC 82.959/SP); a dispensa do prequestionamento no AI 375.011/RS; a aceitação da causa de pedir aberta no RE 298.694/SP; a aceitação do amicus curiae em sede de controle difuso; a dispensa do reexame necessário em casos de sentença baseada no posicionamento tomado pelo Pleno do STF (475, §3º do CPC); a desnecessidade de afetação do incidente de inconstitucionalidade ao plenário dos Tribunais Estaduais, quando já houver pronunciamento do Pleno do STF sobre a questão (481 do CPC); e o cabimento da Reclamação ante o desrespeito de súmula vinculante (103-A, §3º da CF).
Para o referido autor, esses exemplos levariam ao entendimento quanto ao cabimento de reclamação constitucional “para abranger os casos de desobediência a decisões tomadas pelo Pleno do STF em controle difuso de constitucionalidade, independentemente da existência de enunciado sumular de eficácia vinculante” (DIDIER JR, 2010, p. 456).
Não se pode negar uma já existente aproximação entre os modelos de controle de constitucionalidade existentes no Brasil. A adoção da repercussão geral como requisito ao RE e a criação da súmula vinculante contribuíram para que o controle difuso se assemelhasse ao controle concentrado, em que o julgamento da questão constitucional transcende as questões subjetivas das partes, uma vez atribuído efeito vinculante às decisões incidentais. É esse o entendimento de Beçak (2007, p. 11), afirmando, a propósito do tema, que “com a criação do mecanismo da ‘repercussão geral’ e da súmula vinculante, o próprio modelo difuso parece estar adquirindo características do modelo abstrato”.
A alteração trazida pela EC nº 45/2004, exigência de repercussão geral para que seja analisado o mérito pelo STF, objetivou a diminuição da demanda de recursos remetidos ao Supremo, bem como a realização de uma filtragem, depois do qual resistiriam apenas as questões de real importância constitucional, excluindo as que tratem de interesses meramente privados.
De acordo com Beçak (2007, p. 8), “no sistema anterior, havia como que uma pressuposição genérica, a de que qualquer eventual ofensa objetiva à Constituição seria relevante. Hoje, não mais. É necessário um plus”. Esse “plus”, então, é previsto no § 1º, do artigo 543-A, CPC, que exige, para que se configure a repercussão geral, a existência “de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa”.
Dessa forma, observa-se clara objetivação do recurso extraordinário, bem como aproximação do controle difuso do concentrado, uma vez que a análise não é mais realizada sobre um caso concreto e sim sobre lei em tese.
Por sua vez, a súmula vinculante estabeleceu eficácia vinculante às decisões proferidas em sede de controle difuso, efeito este próprio do controle concentrado, sem a participação do Senado Federal, como exige o inciso X do art. 52, da Constituição Federal. Dessa forma, tomadas pelo STF reiteradas decisões no mesmo sentido, editada súmula vinculante, estará a Administração Pública vinculada a seu conteúdo. Ademais, em caso de ato administrativo em desconformidade com súmula vinculante editada pelo Supremo, pode o interessado propor reclamação constitucional para que nova decisão seja proferida.
Na visão de Sabrina Jucá (2008), as súmulas vinculantes confirmam a tendência de abstrativização do controle difuso de constitucionalidade, tendo em vista serem editadas após reiteradas decisões em casos concretos. A autora aduz, ainda, que tais decisões adquirem força “de observância obrigatória daqueles mesmos efeitos por todas as pessoas, sendo defeso a qualquer juiz ou tribunal decidir de forma divergente” (JUCÁ, Sabrina Silva de Souza. Abstrativização dos efeitos do controle concreto de constitucionalidade. Disponível em: <http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080926164818735&mode=print>. Acesso em: 15 de jan. 2013).
No mesmo sentido, Glauco Leite (2007), para quem as súmulas vinculantes, em razão deste efeito, atuariam como elos entre a jurisdição constitucional difuso-concreta e a concentrado-abstrata. Para ele, a atribuição de força obrigatória às decisões, em controle difuso, pelo STF, acaba por promover “um maior entrosamento da jurisdição difuso-concreta com a concentrado–abstrata, atenuando a conhecida tensão dialética que caracteriza a convivência desses modelos” (2007, p. 1999).
Para Dalton Santos Morais (2008, p. 7), a exigência de repercussão geral para admissibilidade de recurso extraordinário não se resume à diminuição da remessa de recursos ao STF, sendo esta a função conferida à súmula vinculante, em suas palavras:
Ressalte-se que, apesar de importar na diminuição no número de recursos extraordinários submetidos ao julgamento do STF, o que inclusive é objeto de crítica de parte da doutrina constitucionalista brasileira, o objetivo fundamental da instituição da “repercussão geral” não é de ordem quantitativa, mas sim qualitativa com fim precípuo de alçar à Corte Constitucional brasileira apenas os recursos de relevante ordem constitucional que importem em alteração ou violação à realidade político-social desejada pela Constituição. A súmula vinculante, sim, é que foi criada sob o aspecto meramente quantitativo, com o fim de propiciar a prestação jurisdicional de forma célere e compatível com o princípio da segurança jurídica resguardado pela própria Constituição (MORAIS, 2008, p. 7).
A abstrativização do controle difuso mostra-se como evolução dos métodos de controle de constitucionalidade no Brasil. Sua efetivação parece ser inevitável, visto que cada vez mais são criados ou adaptados, pelos mais diversos motivos, mecanismos que viabilizam sua ocorrência. Nesse sentido, são conferidas ao controle concreto características próprias do controle abstrato, como a vinculação de decisões mediante súmula vinculante e exigência de repercussão geral, em que a lei não é mais considerada apenas na lide concreta.
Ainda como demonstração dessa evolução do controle de constitucionalidade no que se refere ao RE, importante citar o posicionamento do STF, em voto da então Ministra e relatora do AI 375.011, Ellen Gracie, que dispensa o prequestionamento no referido recurso:
Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, em recentes julgamentos, vem dando mostras de que o papel do recurso extraordinário na jurisdição constitucional está em processo de redefinição, de modo a conferir maior efetividade às decisões. Recordo a discussão que se travou na Medida Cautelar no RE 376.852, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes (Plenário, por maioria, DJ de 27.03.2003). Naquela ocasião, asseverou Sua Excelência o caráter objetivo que a evolução legislativa vem emprestando ao recurso extraordinário, como medida racionalizadora da efetiva prestação jurisdicional. Registro também importante decisão tomada no RE 298.694, rel. Min. Pertence, por maioria, DJ 23/4/2004, quando o Plenário desta Casa, a par de alterar antiga orientação quando ao juízo de admissibilidade e de mérito do apelo extremo interposto pela alínea “a” do permissivo constitucional, reconheceu a possibilidade de um recurso extraordinário ser julgado com base em fundamento diverso daquele em que se lastreou a Corte a quo. Esses julgados, segundo entendo, constituem um primeiro passo para a flexibilização do prequestionamento nos processos cujo tema de fundo foi definido pela composição plenária desta Suprema Corte, com o fim de impedir a adoção de soluções diferentes em relação à decisão colegiada. É preciso valorizar a última palavra - em questão de direito - proferida por esta Corte. (STF - RE 375.011/RS - 05/10/2004 - Rel. Min. Ellen Gracie)
Da mesma forma posicionou-se o STF no RE 298.694/SP ao decidir, por maioria, pela possibilidade de julgamento de recurso extraordinário com fundamento diverso do utilizado pelo tribunal recorrido. De maneira semelhante ao que ocorre no controle concentrado, a Corte Máxima reconheceu que “a causa de pedir (no caso, a causa de pedir recursal) é aberta, permitindo que o STF decida a questão da constitucionalidade com base em outro fundamento, mesmo que não enfrentado pelo tribunal” (DIDIER JR, 2006, p. 5).
Os então Ministros Sepúlveda Pertence e Carlos Ayres Britto seguiram o mesmo entendimento. Nas palavras deste,
Nada na Constituição, nada na lógica jurídica autoriza a inaplicabilidade do iura novit curia às decisões da Casa, em sede de recurso extraordinário. Não é a extraordinariedade do recurso que vai forçar o Supremo Tribunal Federal a restringir o seu próprio âmbito de apreciação da matéria. (STF - RE 298.694/SP - Rel. Min. Carlos Ayres Britto - 06/08/2003).
Da mesma forma manifestou-se Cézar Peluso, também Ministro à época, para quem “o Tribunal não está vinculado ao fundamento que o recorrente invoque no recurso extraordinário”.
Outra prova da evolução do controle de constitucionalidade brasileiro, configurada na aproximação dos controles difuso e concentrado, é a possibilidade de intervenção do amicus curiae no controle concreto, figura esta prevista na Lei 9.868/99, reguladora do controle concentrado de constitucionalidade, ADI e ADC.
O Supremo, por maioria, admitindo a abstrativização do controle difuso, frise-se, manifestou-se na forma a seguir:
considerando a relevância da matéria, e, apontando a objetivação do processo constitucional também em sede de controle incidental, especialmente a realizada pela Lei 10.259/2001 (arts. 14, § 7º, e 15), resolveu questão de ordem no sentido de admitir a sustentação oral da Confederação Brasileira dos Aposentados, Pensionistas e Idosos - COBAP e da União dos Ferroviários do Brasil (STF – RE 416827/SC e RE 415454/SC - Rel. Min. Gilmar Mendes - 21.9.2005).
Nesse contexto, o § 6º do artigo 546, CPC, reconheceu a possibilidade de intervenção de terceiros na análise da repercussão geral, obedecidos os termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
Segundo Sarmento Vaz (2009), essa permissão tem repercussão direta na atribuição de efeitos erga omnes às decisões do Supremo, sem manifestação do Senado, através de recurso extraordinário:
Essa previsão estaria na onda da maximização da feição objetiva do controle difuso. Franqueando-se aos interessados a possibilidade de manifestação sobre a questão posta em juízo, estar-se-ia ampliando a discussão para além das partes. Posto isso, os efeitos oriundos da coisa julgada extrapolariam o caso concreto para atingir a todos. (VAZ, Deivid Sarmento. Abstrativização dos efeitos do controle concreto de constitucionalidade. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/12318/a-abstrativizacao-do-controle-concreto-de-constitucionalidade-e-o-papel-do-senado-federal/3>. Acesso em: 25 de jan. 2013).
Dessa forma, a figura do amicus curiae eleva a questão constitucional para além do interesse subjetivo das partes, garantindo a pluralidade de opiniões e a democratização do controle de constitucionalidade, perfazendo-se numa figura muito semelhante ao amigo da corte existente no controle concentrado.
Ao dispensar o duplo grau de jurisdição para as sentenças baseadas em jurisprudência do plenário do Supremo ou em súmulas por ele editadas, o § 3º do art. 475, CPC, confirma a tendência de abstrativização do controle difuso de constitucionalidade. Como se vê, o legislador não pretendeu fazer distinção entre decisões tomadas no curso do controle subjetivo ou objetivo, da mesma forma, não diferenciou posicionamentos sumulados ou não. Sua única exigência é de que a decisão embasadora da sentença tenha sido tomada pelo pleno do STF.
Da mesma forma, o Código de Processo Civil também não faz distinção ao dispor no artigo 481, parágrafo único, que, nos incidentes de constitucionalidade perante os Tribunais de Justiça, “os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição (sic) de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão”. Assim como no artigo anterior, há o requisito único de que a decisão tenha sido tomada pelo plenário da Corte.
Esse posicionamento corrobora a tendência de abstrativização ao entender não haver diferença entre o tipo de controle em que a decisão tenha sido proferida, uma vez que o Pleno do Supremo, no controle concreto ou abstrato, é o mesmo.
Observe-se que a análise do incidente de inconstitucionalidade pelos Tribunais de Justiça, apesar de ferramenta própria do controle difuso, é feita de maneira abstrata, como bem assevera Montez (2007), “trata-se de incidente de caráter objetivo – processo objetivo – semelhante ao utilizado nas ações diretas de constitucionalidade” (MONTEZ, Marcus Vinícius Lopes. Abstrativização do controle difuso. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.14253>. Acesso em: 25 de fev. 2013).
Outro exemplo de aproximação dos tipos de controle de constitucionalidade existentes no Brasil é a inserção, pela EC nº 45/2004, do artigo 103-A na Constituição Federal, o qual prevê, em seu parágrafo terceiro, o instituto da reclamação constitucional para cassação de ato ou decisão contrária a súmula vinculante. Observe-se que a edição da referida súmula se dá a partir de reiteradas decisões tomadas pelo Supremo em sede de controle difuso. Segundo Didier Júnior (2006, p. 6-7), seria necessária uma ampliação do conceito de “reclamação constitucional” para que fossem abrangidos
os casos de desobediência a decisões tomadas pelo Pleno do STF em controle difuso de constitucionalidade, independentemente da existência de enunciado sumular de eficácia vinculante. É certo, porém, que não há previsão expressa neste sentido (fala-se de reclamação por desrespeito a “súmula” vinculante e a decisão em ação de controle concentrado de constitucionalidade). Mas a nova feição que vem assumindo o controle difuso de constitucionalidade, quando feito pelo STF, permite que se faça essa interpretação extensiva, até mesmo como forma de evitar decisões contraditórias e acelerar o julgamento das demandas.
Diante da explanação trazida neste tópico, facilita-se a visualização da objetivação do recurso extraordinário, além de sua transformação em ferramenta do processo objetivo, o que contribui com a cristalização da tendência de abstrativização do controle difuso de constitucionalidade.
3.2 Senado Federal
3.2.1 Atuação
Como abordado em tópico anterior, a Constituição Federal, no inciso X de seu artigo 52, atribuiu ao Senado a possibilidade de conferência de efeitos erga omnes às decisões proferidas em casos concretos. Tal competência é originária da Constituição de 1934 e tem como objetivo evitar discrepâncias e ambigüidades nos julgados, além de evitarem novas lides com o mesmo objeto.
Asseveram Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior (2003, p. 29) que
o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a matéria, trata de reconhecer, ou não, inconstitucionalidade do tema, fato que, por si, não determina a expulsão da norma do sistema, pois, no caso, a coisa julgada restringe-se às partes do processo em que a inconstitucionalidade foi argüida. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal deve comunicar a decisão ao Senado Federal, que, utilizando a competência do artigo 52, X, da Constituição Federal, tem a faculdade de, por meio de resolução, suspender a execução da norma.
Tal previsão estabelece competência privativa do Senado Federal para suspensão da execução, no todo ou em parte, de lei ou ato com inconstitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal.
Não se pode interpretar, no entanto, como uma liberalidade conferida ao Senado no sentido de determinar a abrangência da suspensão. Ocorrerá apenas a atribuição de efeito erga omnes às decisões proferidas pelo STF, seja pela inconstitucionalidade total ou parcial da lei.
No que tange à obrigatoriedade da atribuição de efeitos para todos pelo Senado Federal, observe-se não se tratar agora de obrigação que lhe é imposta. Trata-se de ato discricionário e essencialmente político conferido ao Senado pela Lei Maior. “Assim, ao Senado Federal não só cumpre examinar o aspecto formal da decisão declaratória da inconstitucionalidade, verificando se ela foi tomada por quorum suficiente e é definitiva, mas também indagar da conveniência dessa suspensão” (MORAES, 2005, p. 644).
Noutro sentido posiciona-se Veloso (2003, p. 57), para quem a discricionariedade do Senado acarretaria nova apreciação da inconstitucionalidade, resultando na prevalência da consideração política sobre a verificação jurídica.
Doutrina majoritária sustenta que a obrigatoriedade da suspensão dos efeitos da norma ou do ato declarado inconstitucional pelo Senado feriria o princípio da separação dos poderes.
Adotam Araújo e Nunes Júnior o entendimento de que
sustentar a retroeficácia dessa deliberação implica afirmar que o Senado pode postergar o momento de edição da Resolução, para, em seguida, atribuir invalidade a todos os atos jurídicos praticados sob a égide dos atos normativos impugnados anteriores à edição desta, inclusive aqueles que vieram a lume no período em que o ato normativo submeteu-se ao juízo discricionário do Senado, que, dessa feita, prorrogaria a eficácia de uma norma, legitimando um sem número de atos jurídicos, que preconcebia inválidos e, portanto, predestinados ao desfazimento. (...) Não fosse essa linha correta de interpretação da Constituição, estar-se-ia atribuindo ao Senado o poder de postergar uma decisão, permissiva da produção de atos que seriam invalidados – num segundo momento – pela própria decisão postergada.
O posicionamento que defende a irretroatividade das decisões do Senado afirma que, se de outra forma fosse, estar-se-ia desrespeitando a discricionariedade do Senado Federal, uma vez que o período compreendido entre a decisão do STF e a Resolução do Senado, período esse de “maturação da decisão”, restaria prejudicado, pois, para essa corrente, cumpre ao Senado, também, analisar a estabilidade dos julgados e da jurisprudência do Supremo.
Por sua vez, Alexandrino e Paulo (2008, p. 741) entendem que
a palavra “suspensão” induz à noção de que os efeitos seriam prospectivos, ex nunc. Também milita em favor da ideia de que a atuação do Senado produziria efeitos doravante o fato de que a atividade legislativa é tipicamente prospectiva, vale dizer, não é dado ao Poder Legislativo, no exercício de atividade legislativa, anular leis, desconstituindo-as retroativamente. Nesse caso – serem os efeitos ex nunc -, a suspensão da lei pelo Senado Federal seria equiparável à revogação dessa lei.
Nessa toada, a consideração da tese dos efeitos ex nunc da Resolução do Senado acarretaria a perda do fundamento lógico da previsão constante do inciso X, artigo 52, da CF, tendo em vista que o intuito da suspensão é exatamente evitar o ajuizamento de novas ações com o mesmo objeto (ALEXANDRINO; PAULO, 2008, p. 742).
Mesmo entendimento é esposado por Motta Filho e Santos (2002), para quem a atribuição de efeitos retroativos à Resolução do Senado implica na preservação da democracia e isonomia, uma vez que impedirão a permanência de normas ou leis já declaradas inconstitucionais. “Outro problema é que o efeito ex nunc obriga as pessoas a buscarem o judiciário apenas para obter o efeito ex tunc” (MOTA FILHO; SANTOS, 2002, p. 626), resultando no alto índice de questionamento sobre situações já decididas pelo Supremo. “Isto tem sido muito comum em questões envolvendo tributos já declarados inconstitucionais e já objeto de Resolução do Senado que, tendo efeito apenas ultrativo, não basta para evitar que empresas deixem de sofrer a indevida cobrança” (MOTA FILHO; SANTOS, 2002, p. 626).
Gilmar Mendes (2007, p. 1029), um dos maiores defensores da retroatividade das decisões do Supremo no controle de difuso, faz a seguinte indagação:
se o Supremo pode, em ação direta de inconstitucionalidade, suspender, liminarmente, a eficácia de uma lei, até mesmo de emenda constitucional, por que haveria a declaração de inconstitucionalidade, proferida no controle incidental, valer tão-somente para as partes?
O Ministro também defende a ideia da mutação constitucional do artigo 52, X, da Constituição Federal. Para ele, é necessária uma reinterpretação do papel do Senado no controle de constitucionalidade pela via de exceção, pois a introdução do controle pela via principal teria acarretado perda de parte do sentido da Resolução do Senado.
É possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação do sistema jurídico e, por conseguinte, da nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X, da Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui de uma autêntica reforma da Constituição sem expressa modificação do texto (MENDES, 2004, p. 165).
Apesar de tratar dos efeitos da resolução senatorial apenas no âmbito da administração pública federal, o Decreto nº 2.346/97 pode ser usado como argumento para a conferência de efeitos ex tunc suspensão da lei ou norma declarada inconstitucional, in verbis:
Art. 1º As decisões do Supremo Tribunal Federal que fixem, de forma inequívoca e definitiva, interpretação do texto constitucional deverão ser uniformemente observadas pela Administração Pública Federal direta e indireta, obedecidos aos procedimentos estabelecidos neste Decreto. § 1º Transitada em julgado decisão do Supremo Tribunal Federal que declare a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, em ação direta, a decisão, dotada de eficácia ex tunc, produzirá efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional, salvo se o ato praticado com base na lei ou ato normativo inconstitucional não mais for suscetível de revisão administrativa ou judicial. § 2º O disposto no parágrafo anterior aplica-se, igualmente, à lei ou ao ato normativo que tenha sua inconstitucionalidade proferida, incidentalmente, pelo Supremo Tribunal Federal, após a suspensão de sua execução pelo Senado Federal.
Assim, observada a explanação retro, deve prevalecer a tese de atribuição de efeitos ex tunc, pois, além de tratar-se do posicionamento que melhor expressa a vontade da Constituição (HESSE, 1991), a atribuição de efeitos retroativos é a regra no controle de constitucionalidade.
3.2.2 Necessidade de reinterpretação de sua competência na suspensão da execução de lei declarada inconstitucional pelo Supremo
Este tópico é de suma importância no presente ensaio, visto que em torno dele gravita a própria ideia de objetivação ou abstrativização do controle difuso de constitucionalidade no direito brasileiro.
A Constituição Federal prevê literalmente que compete privativamente ao Senado “suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”.
Necessário advertir, mais uma vez, que este dispositivo somente se aplica aos casos de declaração de inconstitucionalidade quando do julgamento em sede de controle difuso, ou seja, quando há declaração de inconstitucionalidade de maneira incidental, visto que nos casos de controle concentrado de constitucionalidade – por meio de ação direta de inconstitucionalidade ou de ação declaratória de constitucionalidade – é desnecessária a suspensão da lei pelo Senado, já que uma vez declarada inconstitucional pelo Supremo o dispositivo é excluído do ordenamento jurídico.
Interpretação diversa, no sentido da necessidade de suspensão da execução da lei pelo Senado também no controle concentrado, retiraria a razão de ser do controle concentrado de constitucionalidade pelo Supremo, uma vez que a eficácia da sua decisão ficaria condicionada ao aval do Senado.
Feita esta ressalva, necessário frisar que as várias reformas inseridas no ordenamento jurídico pátrio após a promulgação da Constituição Federal de 1988 fizeram com que parte da doutrina e, mais recentemente, da jurisprudência, questionassem a racionalidade em se aplicar o art. 52, X, da CF em sua literalidade.
Levanta-se a seguinte questão: qual a racionalidade em se conferir efeitos apenas inter partes a uma decisão em recurso extraordinário que analise a constitucionalidade de determinado dispositivo se ela é dada pelo plenário do STF, mesmo órgão responsável pela análise da constitucionalidade em sede de ação direta de inconstitucionalidade e de ação declaratória de constitucionalidade, ocasião em que ela, a decisão, tem eficácia erga omnes?
Segundo Gilmar Mendes (2010, p. 366),
a natureza idêntica do controle de constitucionalidade, quanto às suas finalidades e aos procedimentos comuns dominantes para os modelos difuso e concentrado, não mais parece legitimar a distinção quanto aos efeitos das decisões proferidas no controle direto e no controle incidental.
Na realidade, atualmente, o STF, ao examinar a constitucionalidade de uma lei em recurso extraordinário analisa abstratamente a questão constitucional envolvida, visto que “o recurso extraordinário deixa de ter caráter marcadamente subjetivo ou de defesa de interesse das partes, para assumir, de forma objetiva, a função de defesa da ordem constitucional objetiva” (Min. Gilmar Mendes, Proc. Adm. Nº 318.715/STF).
Há várias manifestações do fenômeno da abstrativização das decisões na legislação e na jurisprudência brasileiras:
{C}a) O procedimento do RE interposto no âmbito dos Juizados Especiais Federais (art. 14, §§ 4º a 9º, da Lei 10.259/01 e §5º do art. 321 do RISTF – Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal), que permite a intervenção de interessados na discussão da tese e a decisão do STF torna-se vinculante para as turmas recursais, podendo ser, ainda, concedida medida cautelar para sobrestar o processamento de outros REs que versem sobre a mesma questão constitucional até que o STF julgue o recurso;
{C}b) O art. 103-A da CF/88 que consagra a súmula vinculante em matéria constitucional, após reiteradas decisões do STF sobre o assunto em sede de controle difuso de constitucionalidade;
{C}c) O art. 475, §3º, do CPC dispensa o reexame necessário quando a sentença se baseia em posicionamento tomado pelo pleno do STF;
{C}d) A possibilidade de intervenção de amicus curie em julgamento de recurso extraordinário (RE 416827/SC);
{C}e) Recursos extraordinários julgados pelo STF em que se aplicou ao controle difuso de constitucionalidade instrumentos do controle concentrado (ex.: caso da fixação do número de vereadores em cada município, em que se conferiu eficácia erga omnes à decisão; e caso da análise da inconstitucionalidade da progressão de regime nos crimes hediondos);
{C}f) Possibilidade de cabimento de reclamação em caso de desobediência a entendimento do STF externado em sede de controle difuso de inconstitucionalidade (ex.: Reclamação 4335);
{C}g) O instituto da repercussão geral previsto no art. 102, §3º, da CF, regulamentado pela Lei 11.418/06, que instituiu o incidente de análise da repercussão geral por amostragem.
É neste contexto que deve ser analisado o papel do Senado Federal nas declarações de inconstitucionalidade.
Soraya Regina Gaspareto Lunardi e Dimitri Dimoulis fazem pertinente crítica ao afirmarem que
Quando a Corte Constitucional cumula as competências do controle concentrado e de atuação como última instância do controle difuso, tal como ocorre no Brasil, surge um problema de coerência. Se o ordenamento jurídico aceita que uma Corte possa eliminar de maneira inapelável e geralmente vinculante uma norma inconstitucional, como admitir que a mesma Corte com a mesma composição, quando aprecia a constitucionalidade da mesma norma como última instância do controle difuso só possa afastar sua aplicação no caso concreto? E como admitir que as instâncias inferiores possam continuar aplicando a norma declarada inconstitucional pela Corte constitucional no controle difuso, devendo essa última se pronunciar novamente e constantemente sobre a constitucionalidade?
Tendo em vista a irracionalidade da manutenção do entendimento segundo o qual o dispositivo declarado inconstitucional pelo STF em controle difuso permanece no ordenamento jurídico, podendo ser livremente aplicado em outros casos que não aquele específico analisado pelo Supremo, defende-se a existência de uma mutação constitucional do art. 52, X, CF.
Segundo Georg Jellinek (1906, p. 3 apud Soraya Reguna Gasparetto Lunardi e Dimitri Dimoulis, 2010, p. 305), mutação constitucional é “aquela modificação que deixa os textos formalmente inalterados e, se provoca por fatos que não devem estar acompanhados da vontade ou da consciência de tal modificação”. Modernamente, a concepção do fenômeno elimina a referência de Jellinek ao elemento psicológico, vontade ou consciência da modificação, para definir a mutação constitucional como sendo o efeito modificativo da Constituição sem revisões formais dos enunciados linguísticos.
A corrente que defende a mutação constitucional, cada vez mais adotada no Brasil, procura aproximar os sistemas de controle difuso e concentrado de constitucionalidade. Assim, o papel do Senado não seria o de suspender a execução da lei declarada inconstitucional, mas o apenas de dar publicidade à decisão do Supremo, que já teria efeito de suspender a lei inconstitucional, como ocorre no controle concentrado de constitucionalidade.
Este é o entendimento de Gilmar Mendes, segundo o qual
É possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação do sistema jurídico e, por conseguinte, da nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X, da Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui uma autêntica reforma da Constituição sem expressa modificação do texto.
Referida interpretação do texto constitucional, ao tempo em que aproxima os sistemas de controle difuso e concentrado de constitucionalidade, confere maior racionalidade e efetividade não só ao Supremo, mas ao Judiciário como um todo, prestigiando a segurança jurídica, ao evitar decisões divergentes daquelas já adotadas pelo STF em controle de constitucionalidade, seja difuso ou concentrado.
Assim, parece legítimo entender que, hodiernamente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de publicidade. Desta forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que este publique a decisão no Diário do Congresso. Tal como assente, não é (mais) a decisão do Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa. Parece evidente ser essa a orientação implícita nas diversas decisões judiciais e legislativas acima referidas. Assim, o Senado não terá a faculdade de publicar ou não a decisão, uma vez que não se cuida de uma decisão substantiva, mas de simples dever de publicação, tal como reconhecido a outros órgãos políticos em sistemas constitucionais (Constituição austríaca, art. 140,5 – publicação a cargo do Chanceler Federal, e Lei Orgânica da Corte Constitucional Alemã, art. 31, (2), Publicação a cargo do Ministro da Justiça). Tais decisões proferidas em processo de controle de normas são publicadas o Diário Oficial e têm força de lei (Gesetzeskraft) [Lei do Bundesverfassybgsgericht, § 31, (2)]. Segundo Klaus Vogel, o § 31, II, da Lei Orgânica da Corte Constitucional alemã faz com que a força de lei alcance também as decisões confirmatórias de constitucionalidade. Essa ampliação somente se aplicaria, porém, ao dever de publicação, porque a lei não pode conferir efeito que a Constituição não prevê.
Ademais, impossível não apontar os ganhos práticos/pragmáticos da adoção desta tese, em virtude de abreviar o julgamento de milhares de ações com o mesmo objeto, ou fundamentadas no mesmo dispositivo constitucional, fato que possibilitaria ao Judiciário se debruçar na análise de outras questões também importantes ainda não pacificadas pelo STF.
O aspecto da celeridade processual é de suma importância para o país, visto que em virtude das demandas de massa tem sido uma constante nas discussões sobre reforma do Judiciário e acesso à justiça a necessidade de instrumentos capazes de adequar o Judiciário ao seu tempo, prestando aos jurisdicionados um serviço célere e de qualidade.
Em síntese, a mudança de interpretação quanto à atuação do Senado Federal no que concerne à suspensão da execução da norma declarada inconstitucional em controle concreto mostra-se como uma solução hábil a combater o problema da morosidade processual no âmbito do Supremo, causada pela grande demanda, inclusive de casos semelhantes aos já analisados por aquele Tribunal. Ademais, seria garantida segurança jurídica às decisões proferidas pelo STF, possibilitando, sobretudo, uma prestação jurisdicional coerente e harmônica aos jurisdicionados.
3.3 Abstrativização nos casos concretos
A aproximação dos efeitos do controle concentrado ao controle difuso de constitucionalidade, como abordado no decorrer deste estudo, há algum tempo deixou de ser apenas teoria sem embasamento fático e tornou-se realidade na jurisprudência do STF.
Neste tópico serão analisados dois casos emblemáticos em que a abstrativização foi aplicada e defendida por membros da Corte Máxima, quais sejam, o caso do Município de Mira Estrela e o HC 82.959/SP referente à progressão de regime nos crimes hediondos.
{C}a) Caso Mira Estrela
Mira Estrela é uma pequena cidade situada a Noroeste do Estado de São Paulo e em razão de sua pequena população, foi ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo uma ação civil pública com o fito de alterar o número de vereadores de sua Câmara Municipal sob o argumento de que o art. 6º da Lei Orgânica do Município confrontava-se com o art. 29, IV, “a”, da Constituição Federal, o que acarretaria danos consideráveis ao erário.
Em primeiro grau a pretensão ministerial foi julgada parcialmente procedente, com consequente reconhecimento da inconstitucionalidade da norma municipal e determinação da diminuição do número de vereadores daquele município. Recorrida a decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu pela constitucionalidade do dispositivo, uma vez que o número de onze vereadores é permitido pela norma constitucional teoricamente conflitante.
O Ministério Público, por sua vez, interpôs o recurso extraordinário 197.917/SP, sob o argumento de que “o artigo 6º, parágrafo único, da Lei Orgânica local, em contraste com a proporcionalidade exigida pela Carta Federal, fixou número excessivo de Vereadores, dado que o Município em questão possui somente 2.651 habitantes”.
O Ministério Público Federal apresentou parecer favorável à pretensão do MP estadual, manifestando-se, em síntese, na forma a seguir:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI ORGÂNICA MUNICIPAL. FIXAÇÃO DO NÚMERO DE VEREADORES. AUTONOMIA VINCULADA. CRITÉRIO CONSTITUCIONAL DA PROPORCIONALIDADE (ART. 29, INCISO IV, DA CF/88).
1. Nulidade de norma estabelecida em Lei Orgânica Municipal que fixou o número de vereadores em desconformidade com o art. 29, IV, “a”, da atual Constituição Federal.
2. Clara antijuridicidade de ato normativo que fixa em onze (11) o número de vereadores para município que detém menos de três mil (3.000) habitantes.71
3. Incontroverso dano ao patrimônio público municipal.
4. Autonomia municipal que deve ser exercida com observância dos parâmetros analíticos estabelecidos no texto constitucional vigente.
5. Parecer pelo conhecimento e provimento do recurso. (STF - RE 197.917/SP - Rel. Min. Maurício Corrêa - 24/03/2004).
Em seu voto, o então Ministro e relator Maurício Corrêa manifestou-se pela inconstitucionalidade da norma municipal, tendo entendido ser desproporcional a quantidade de vereadores para a população da cidade de Mira Estrela. Para ele, não haveria sentido na previsão constitucional do art. 29, se deixada a cargo do legislador municipal a delimitação da quantidade de vereadores de suas câmaras, respeitados apenas os limites máximo e mínimo estabelecidos pela Constituição Federal. Eis a ementa do voto vencedor:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MUNICÍPIOS. CÂMARA DE VEREADORES. COMPOSIÇÃO. AUTONOMIA MUNICIPAL. LIMITES CONSTITUCIONAIS. NÚMERO DE VEREADORES PROPORCIONAL À POPULAÇÃO. CF, ARTIGO 29, IV. APLICAÇÃO DE CRITÉRIO ARITMÉTICO RÍGIDO. INVOCAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA RAZOABILIDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A POPULAÇÃO E O NÚMERO DE VEREADORES. INCONSTITUCIONALIDADE, INCIDENTER TANTUM, DA NORMA MUNICIPAL. EFEITOS PARA O FUTURO. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL.
1. O artigo 29, inciso IV da Constituição Federal, exige que o número de Vereadores seja proporcional à população dos Municípios, observados os limites mínimos e máximos fixados pelas alíneas a, b e c.
2. Deixar a critério do legislador municipal o estabelecimento da composição das Câmaras Municipais, com observância apenas dos limites máximos e mínimos do preceito (CF, artigo 29) é tornar sem sentido a previsão constitucional expressa da proporcionalidade.
3. Situação real e contemporânea em que Municípios menos populosos têm mais Vereadores do que outros com um número de habitantes várias vezes maior. Casos em que a falta de um parâmetro matemático rígido que delimite a ação dos legislativos Municipais implica evidente afronta ao postulado da isonomia.
4. Princípio da razoabilidade. Restrição legislativa. A aprovação de norma municipal que estabelece a composição da Câmara de Vereadores sem observância da relação cogente de proporção com a respectiva população configura excesso do poder de legislar, não encontrando eco no sistema constitucional vigente.
5. Parâmetro aritmético que atende ao comando expresso na Constituição Federal, sem que a proporcionalidade reclamada traduza qualquer afronta aos demais princípios constitucionais e nem resulte formas estranhas e distantes da realidade dos Municípios brasileiros. Atendimento aos postulados da moralidade, impessoalidade e economicidade dos atos administrativos (CF, artigo 37).
6. Fronteiras da autonomia municipal impostas pela própria Carta da República, que admite a proporcionalidade da representação política em face do número de habitantes. Orientação que se confirma e se reitera segundo o modelo de composição da Câmara dos Deputados e das Assembléias Legislativas (CF, artigos 27 e 45, § 1º).
7. Inconstitucionalidade, incidenter tantun, da lei local que fixou em 11 (onze) o número de Vereadores, dado que sua população de pouco mais de 2600 habitantes somente comporta 09 representantes.
8. Efeitos. Princípio da segurança jurídica. Situação excepcional em que a declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente. Prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade. Recurso extraordinário conhecido e em parte provido. (STF - RE 197.917/SP - Rel. Min. Maurício Corrêa - 24/03/2004).
Naquela oportunidade, entendeu o Supremo que a norma do art. 29, IV, “a”, da Constituição Federal não apenas fixava número máximo e mínimo de vereadores por câmara municipal, exigia, ainda, aplicação matemática de seu conteúdo, de maneira que o legislador municipal deveria definir de maneira proporcional à população a quantidade de vereadores da cidade.
No julgamento do recurso extraordinário 197.917/SP, o Supremo aplicou a modulação dos efeitos temporais à decisão proferida em sede de controle incidental, de forma que, contrariando a regra, a sentença operaria apenas para o futuro. Ocorre que tal instituto é próprio do controle direto, conforme a Lei 9.868/99, que regula a ADI e ADC.
Ao manifestar-se pela modulação temporal, bem explicou o ilustre Ministro Gilmar Mendes tratar-se de “um apanágio do controle judicial de constitucionalidade, podendo ser aplicado tanto no controle direto quanto no controle incidental”. Afirmou, ademais, que “a supressão da norma poderá ser mais danosa para o sistema do que a sua preservação temporária”.
Nessa esteira, se conferidos efeitos ex tunc à decisão no caso em análise e reconhecida a nulidade desde o nascedouro da norma, a segurança jurídica do ordenamento municipal seria afetada, considerado o fato de que o voto dos dois vereadores a mais certamente pesou em muitas decisões da casa.
Frise-se que o posicionamento de Gilmar Mendes não é contra a nulidade da norma, sim contra os efeitos que essa nulidade traria caso reconhecida. Para ele, é necessária uma avaliação detida, sendo preferível “a declaração de inconstitucionalidade com efeitos restritos à insegurança jurídica de uma declaração de nulidade, como demonstram os múltiplos exemplos do direito comparado e do nosso direito”. Ainda segundo o Ministro,
tal princípio não poderá ser aplicado nos casos em que se revelar absolutamente inidôneo para a finalidade perseguida (casos de omissão; exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade), bem como nas hipóteses em que a sua aplicação pudesse trazer danos para o próprio sistema jurídico constitucional (grave ameaça à segurança jurídica). Assim, configurado eventual conflito entre o princípio da nulidade e o princípio da segurança jurídica que, entre nós, tem status constitucional, a solução da questão há de ser igualmente, levada a efeito em um processo de complexa ponderação. (STF – RE 197.917/SP - Rel. Min. Maurício Corrêa - 24/03/2004).
Provido o recurso do Ministério Público de São Paulo, destacou, ainda, Gilmar Mendes, que a declaração de inconstitucionalidade da norma não deveria afetar “a composição da atual legislatura da Câmara Municipal, cabendo ao legislativo municipal estabelecer nova disciplina sobre a matéria, em tempo hábil para que se regule o próximo pleito eleitoral”.
Ainda em 2004 foi expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral a Resolução TSE nº 21.702, baseada no conteúdo da sentença proferida no RE 197.917/SP. Em seu artigo primeiro estabeleceu que “nas eleições municipais deste ano [2004], a fixação do número de vereadores a eleger observará os critérios declarados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 197.917, conforme as tabelas anexas”, atribuindo, assim, eficácio erga omnes a uma decisão proferida em sede de controle concreto e sem a participação do Senado Federal, transcendendo os motivos determinantes do caso de Mira Estrela, uma vez que seus fundamentos serviram de base para a referida resolução.
Inconformados ante a resolução, os Partidos Progressista e Democrático Trabalhista ajuizaram ações diretas de inconstitucionalidade sob o argumento de que a resolução TSE nº 21.702/2004 ofendera os princípios da separação dos poderes, da reserva legal, a autonomia municipal e a anterioridade da lei eleitoral. Para eles, também seria impossível a atribuição de eficácia contra todos a uma decisão exarada em controle difuso.
O Supremo, no julgamento das referidas ações diretas de inconstitucionalidade, entendeu pela improcedência da pretensão dos partidos, visto que a resolução expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral objetivou conferir efetividade e concretude à decisão proferida no RE 197.917/SP, a qual deu “interpretação definitiva à cláusula de proporcionalidade inscrita no inciso IV do art. 29 da CF, conferindo efeito transcendente aos fundamentos determinantes que deram suporte ao mencionado julgamento” (STF - RE 197.917/SP - Rel. Min. Maurício Corrêa - 24/03/2004).
Ademais, entendeu o Supremo que a intenção do TSE ao conferir eficácia erga omnes à decisão supracitada era garantir tratamento isonômico no que se refere à fixação da quantidade de vereadores por município.
Afirmou-se que o TSE, dando expansão à interpretação constitucional definitiva assentada pelo Supremo - na sua condição de guardião maior da supremacia e da intangibilidade da Constituição Federal - em relação à citada cláusula de proporcionalidade, submeteu-se, na elaboração do ato impugnado, ao princípio da força normativa da Constituição, objetivando afastar as divergências interpretativas em torno dessa cláusula, de modo a conferir uniformidade de critérios de definição do número de Vereadores, bem como assegurar normalidade às eleições municipais. Vencido o Min. Marco Aurélio que dava pela procedência dos pedidos, ao fundamento de que o TSE extrapolou sua competência para editar resoluções - a qual estaria limitada ao cumprimento do Código Eleitoral (Cód. Eleitoral, art. 23, IX) - ao fixar tabela quanto ao número de vereadores, cuja incumbência, nos termos do inciso IV do seu art. 29 da CF, e desde que observados os limites mínimo e máximo previstos neste último dispositivo, seria de cada Câmara de Vereadores, por meio de Lei Orgânica dos Municípios (Informativo 398 do STF).
Analisado o caso do Município de Mira Estrela, pode-se observar a efetiva abstrativização do controle difuso exercida naquela situação com a modulação dos efeitos temporais da decisão proferida no RE 197.917/SP com a transcendência de seus motivos determinantes, que levaram à atribuição de eficácia erga omnes à sentença. Disso resultou a garantia de tratamento igualitário entre os municípios do país, defendidos de decisões divergentes, além da concretude e proteção à autoridade das decisões proferidas pelo pleno do Supremo Tribunal Federal.
{C}b) Progressão de regime em crimes hediondos
No ano de 2002, o apenado Oseas Campos impetrou, em nome próprio, o habeas corpus 23.920/SP sob a alegação de que o estupro não resultante em morte ou ofensa corporal grave não constituiria crime hediondo. Além disso, pugnou pela inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, o qual vedava a progressão de regime naqueles crimes. Dessa forma, requereu a redução de sua pena e a progressão de seu regime.
O referido HC foi indeferido pelo Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL PENAL HABEAS-CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. INEXISTÊNCIA DE LESÃO CORPORAL GRAVE OU MORTE. VIOLÊNCIA PRESUMIDA. CRIME HEDIONDO. REGIME INTEGRALMENTE FECHADO. ART. 2º, § 1º, LEI 8.072/90. CONSTITUCIONALIDADE. NÃO REVOGAÇÃO PELA LEI 9.455/97.
- A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, nas suas formas qualificadas ou simples, ou seja, mesmo que deles não resulte lesão corporal grave ou morte, e ainda que praticados mediante violência presumida, são considerados hediondos, devendo as suas respectivas penas serem cumpridas em regime integralmente fechado, por aplicação do disposto no artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90.
- E na linha do pensamento predominante no Supremo Tribunal Federal, consolidou, majoritariamente, o entendimento de que a Lei nº 9.455/97, que admitiu a progressão do regime prisional para os crimes de tortura, não revogou o art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90, que prevê o regime fechado integral para os chamados crimes hediondos.
- É firme o posicionamento desta Corte, em consonância com a jurisprudência do STF, no sentido da compatibilidade da norma do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90 com a Constituição Federal.
- Habeas-corpus denegado. (STJ – HC 23.920/SP – Rel. Min. Vicente Leal – 12/12/2002).
Irresignado, o paciente impetrou novo habeas corpus com os mesmos fundamentos, agora no Supremo Tribunal Federal, o qual foi concedido, de maneira que ficava a cargo do juiz singular, quando da análise do caso concreto, a verificação da possibilidade ou não de progressão de regime de cumprimento da pena aplicada.
Em seu voto, entendeu o Ministro Marco Aurélio, relator do HC 82.959/SP, pela inconstitucionalidade do dispositivo atacado, aduzindo que a vedação à progressão de regime configurava-se afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana. Segundo ele, o réu deveria possuir “esperança, ainda que mínima, de passar-se ao cumprimento da pena em regime menos rigoroso”.
Ainda segundo o relator, a impossibilidade de progressão perfazia-se, também, em desrespeito ao princípio da individualização da pena, uma vez que “a progressividade do regime está umbilicalmente ligada à própria pena, no que, acenando ao condenado com dias melhores, incentiva-o à correção de rumo e, portanto, a empreender um comportamento voltado à ordem” (STF – HC 82.959/SP - Rel. Min. Marco Aurélio - 23/02/2006).
Sendo assim, a pena não deveria ser individualizada apenas quando da análise das circunstâncias judiciais, isso também deveria ocorrer no momento da progressão de regime. Do contrário, não haveria motivação para que o réu não cometesse novas infrações quando recolhido ao estabelecimento prisional. Dessa forma, visou o Supremo diminuir a quantidade de crimes praticados no interior dos estabelecimentos prisionais.
O ministro relator observou, ainda, uma incoerência entre as leis 8.072/90 e 9.455/97, visto que a primeira, em seu art. 2º, § 1º,
previa o cumprimento integral da pena em regime fechado, enquanto a segunda estipulava apenas o regime inicial como fechado. A contradição se daria em razão de a Constituição Federal, no art. 5º, XLIII, tratar os crimes hediondos e de tortura de maneira análoga.
Diante disso, não poderia o legislador infraconstitucional agir de maneira diversa. Para o Ministro, não se pode admitir contradições internas no ordenamento jurídico penal, de maneira que, “quando duas leis infra-constitucionais [...] dispõem diferentemente sobre tratamento que a Constituição quer comum e idêntico às situações – infrações penais – que expressa, há de prevalecer a disposição normativa mais favorável ao réu” (STF – HC 82.959/SP - Rel. Min. Marco Aurélio - 23/02/2006).
Gilmar Mendes, por sua vez, manifestou-se pela modulação dos efeitos temporais da decisão, pois, assim como no caso do Município de Mira Estrela, a atribuição de efeitos retroativos abalaria a segurança jurídica e traria conseqüências negativas a todo o ordenamento jurídico.
Na concepção de Morais (2008, p. 5),
A aplicação do art. 27 da Lei nº 9868/99, na hipótese em questão, para conferir eficácia ex nunc ao julgado em questão foi necessária para evitar que a declaração de inconstitucionalidade do dispositivo pela Corte Constitucional, com os regulares efeitos pretéritos, invalidasse todas as vedações a progressões de regime em crimes hediondos, permitindo-se ao juiz de execução penal individualizar a questão da inconstitucionalidade na vedação da progressão pela natureza do crime. Ou seja, se o preso estivesse impedido de progredir de regime por outros óbices de natureza legal, a declaração de inconstitucionalidade da vedação pela natureza do crime, com efeitos ex nunc, não impediria ao juiz da execução penal em mantê-lo preso em regime mais grave por outras determinações legais que não o art. 2º, § 1º da Lei 8.072/90.
Observa-se, assim como no RE 197.917/SP, a modulação temporal de uma decisão em controle concreto, no sentido de atribuir-lhe efeito ex nunc, como previsto pela Lei 9.868/99 para o controle abstrato.
O Supremo, por seis votos a cinco, declarou a inconstitucionalidade da vedação à progressão de regime nos crimes hediondos, conforme ementa a seguir:
PENA – REGIME DE CUMPRIMENTO – PROGRESSÃO – RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semiaberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social. PENA - CRIMES HEDIONDOS – REGIME DE CUMPRIMENTO –78 PROGRESSÃO – ÓBICE – ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90 – INCONSTITUCIONALIDADE – EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena – artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal – a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90.
[...]
O Tribunal, por votação unânime, explicitou que a declaração incidental de inconstitucionalidade do preceito legal em questão não gerará conseqüências jurídicas com relação às penas já extintas nesta data, pois esta decisão plenária envolve, unicamente, o afastamento do óbice representado pela norma ora declarada inconstitucional, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da possibilidade de progressão. (STF – HC 82.959/SP - Rel. Min. Marco Aurélio - 23/02/2006, sic).
Por concentrar todas as condições de abstrativização, o habeas corpus ora analisado é considerado um caso paradigmático na visão de Luiz Flávio Gomes (2006, p. 4). Para ele, além de a decisão ter sido proferida pelo Plenário do Supremo e contra lei em tese, houve, por parte do STF, a preocupação de se definir a extensão dos efeitos da decisão, para disciplinar relações jurídicas pertinentes ‘a todos’ (não exclusivamente ao caso concreto)”.
Assevera o referido doutrinador que “o julgamento de inconstitucionalidade de um texto legal, pelo STF, na prática, mesmo quando se dá num caso concreto, no que diz respeito à sua ‘validade’, acaba produzindo efeitos ‘contra todos’ e possui eficácia vinculante”.
Nas palavras do Ministro Marco Aurélio,
a declaração incidental de inconstitucionalidade do preceito legal em questão não gerará conseqüências jurídicas com relação às penas já extintas nesta data, pois esta decisão plenária envolve, unicamente, o afastamento do óbice representado pela norma ora declarada inconstitucional, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da possibilidade de progressão. (STF – HC 82.959/SP - Rel. Min. Marco Aurélio - 23/02/2006).
Diante disso, entendeu Jonatas Vieira de Lima (2008, p. 4) não ser outra a intenção do Supremo senão conferir efeito “ultra partes” à decisão proferida no HC 82.959/SP, pois se ocupou da “repercussão em outros casos similares, abandonando a ideia de que a decisão, por ter se dado no controle difuso, teria eficácia apenas entre as partes”.
No mesmo sentido Marcus Vinícius Lopes Montez (2007) segundo o qual, apesar de ter sido uma decisão proferida diante de um caso concreto, “o Supremo Tribunal Federal afirmou expressamente que a progressão de regime deveria, a partir daquele momento, ser apreciada casuisticamente pelos magistrados” (MONTEZ, Marcus Vinícius Lopes. Abstrativização do controle difuso. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.14253>. Acesso em: 25 de fev. 2013).
Muito embora o Supremo Tribunal Federal tenha atribuído efeitos contra todos à decisão, não foi o que ocorreu em Rio Branco, Acre, quando o juiz da Vara de Execuções Penais da comarca negou progressão de regime a dez apenados. Disso resultou a reclamação constitucional 4.335/AC, na qual o defensor público do estadual Valdir Perazzo Leite alegou ofensa à decisão proferida pelo Pleno do STF.
Em seu voto, Gilmar Mendes afirmou que “a jurisprudência do STF evoluiu relativamente à utilização da reclamação em sede de controle concentrado de normas, tendo concluído pelo cabimento da reclamação para todos os que comprovarem prejuízo resultante de decisões contrárias às suas teses [...]”. O ministro, então, deferiu a liminar para afastamento da proibição de progressão de regime aos apenados por crime hediondo até julgamento final da reclamação.
Além disso, segundo o nobre ministro e doutrinador, a exigência de resolução do Senado Federal para suspensão de norma declarada inconstitucional pelo Supremo em sede de controle difuso baseia-se em entendimento ultrapassado quanto à separação dos poderes. Para ele,
atualmente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado há de ter simples efeito de publicidade, ou seja, se o STF, em sede de controle incidental, declarar, definitivamente, que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação àquela Casa legislativa para que publique a decisão no Diário do Congresso. Concluiu, assim, que as decisões proferidas pelo juízo reclamado desrespeitaram a eficácia erga omnes que deve ser atribuída à decisão do STF no HC 82959/SP. (Informativo 454 do STF, 2007).
O posicionamento pró abstrativização de Gilmar Mendes foi acompanhado pelo Ministro Eros Grau. Já os ministros Sepúlveda Pertence e Joaquim Barbosa, manifestaram-se pela improcedência da reclamação. Para o primeiro, o papel do Senado Federal, previsto constitucionalmente desde a Constituição de 1934, não poderia ser reduzido à mera publicação. Ainda acompanhado por Joaquim Barbosa, Pertence opôs-se à ideia de mutação constitucional, aduzindo que a questão poderia ser solucionada por meio de uma súmula vinculante, que atribuiria à decisão eficácia erga omnes. Ricardo Lewandowski pedira vista dos autos, os quais se encontram até hoje pendentes de julgamento.
Com a edição da Lei 11.464 no ano de 2007, a reclamação 4.335/AC perdeu seu objeto, uma vez que a referida lei permitiu a progressão de regime em crimes hediondos. Em que pese o assunto tenha sido tratado em lei específica, o julgamento final da reclamação é de extrema importância para o direito brasileiro, não mais pelo tema objeto da reclamação, sim pelo posicionamento do Supremo quanto à abstrativização do controle difuso de constitucionalidade.
3.4 Condições de abstrativização
Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da celeridade processual, este afetado diretamente pela demanda nos tribunais, o que não é diferente no âmbito do Supremo Tribunal Federal, a abstrativização proposta neste estudo desempenha papel de salutar importância, visto que a atribuição de efeitos erga omnes evitaria o ajuizamento de novas ações visando reconhecimento de inconstitucionalidade já declarada pelo STF.
Na visão de Dalton Santos Morais (2008), a objetivação do controle difuso de constitucionalidade é uma forma dar efetividade às decisões do STF, assegurando a razoável duração do processo e a segurança jurídica, princípios constitucionalmente previstos.
Para Guilherme Germanda (2008, p. 1), soa lógica a aproximação dos efeitos das decisões em controle difuso às do controle abstrato, tendo em vista serem ambas proferidas pelo mesmo pleno do mesmo órgão:
por que as decisões referentes à constitucionalidade ou inconstitucionalidade de determinada norma, proferidas em julgamentos de determinados recursos extraordinários pelo Supremo, teriam efeitos diversos daquelas proferidas em sede de controle concentrado, uma vez que estas também são analisadas pelo mesmo Plenário julgador?
A adoção da abstrativização como rotina no julgamento de casos concretos no Supremo não feriria a separação dos poderes no que se refere à participação do Senado, considerando tratarem-se de poderes concorrentes e colegitimados à definição da abrangência e efeitos da declaração de inconstitucionalidade.
Segundo Oswaldo Luiz Palu (1999, p. 130), em 1934 havia a intenção de tornar o Senado Federal uma Corte Constitucional, por este motivo foi criada a disposição do art. 52, X, da Constituição Federal. Com o passar do tempo, no entanto, a ideia foi abandonada, mas o dispositivo não foi suprimido.
Ante os casos apresentados neste estudo, pode-se notar que a teoria da abstrativização sustenta-se por si só. No entanto, para estabelecer um procedimento a ser adotado, o quorum exigido para aprovação da objetivação poderia ser de maioria absoluta. Isto porque, possuindo, agora, efeitos semelhantes não há sentido em exigir quorum diferenciado para prolação das sentenças, da mesma maneira que não há extrema lógica em decisões emanadas do mesmo Plenário não possuírem mesma abrangência.
Nessa senda, poderia haver a crítica referente a possível prejuízo ao instituto da súmula vinculante. Vejamos, a súmula vinculante nada mais é que uma forma menos eficiente de conferir eficácia erga omnes e efeitos vinculantes às decisões proferidas em última instância pelo Supremo Tribunal Federal. Sendo assim, em razão da evolução da teoria da abstrativização, seu uso tornar-se-ia desnecessário, visto que não mais seriam exigidas inúmeras decisões sobre casos semelhantes para que tais efeitos fossem, finalmente, reconhecidos.
Apesar de a tese aqui defendida ter embasamento suficiente para sustentar-se sozinha, importante a existência de embasamento legal que a legitime, como forma de conferir-lhe concretude, segurança jurídica. Isso poderia ocorrer por meio de uma proposta de emenda constitucional ratificadora de tal entendimento.
Sendo assim, haveria expressa previsão constitucional quanto à possibilidade, quando o Supremo entendesse necessário, de atribuição de efeito vinculante e eficácia erga omnes, mediante maioria absoluta, às decisões proferidas pela Corte Máxima em sede de controle difuso se constitucionalidade, assim como ocorre no controle abstrato.
Diante das soluções aqui apresentadas, não mais seria necessária a reiteração de decisões no mesmo sentido, podendo a abstrativização ser aplicada logo no primeiro contato, a critério do Supremo. Somada a isso, a existência de emenda constitucional baniria o argumento de inexistência de previsão legal, passando a abstrativização a fazer parte da própria Constituição Federal.
Adotadas tais medidas, conferir-se-ia maior proteção, autoridade e prestígio às decisões do Supremo, principalmente às proferidas em sede de controle concreto, uma vez que, independente do controle por meio do qual a sentença é proferida, o Supremo Tribunal Federal permanece o mesmo, mesmo pleno e mesmos ministros, sendo em todos os casos o guardião maior da Constituição.
4 CONCLUSÃO
No curso desta pesquisa foi defendida a teoria da abstrativização do controle difuso de constitucionalidade, o que nada mais é do que a aproximação de efeitos entre os controles difuso e concentrado. Segundo ela, é possível conferir às decisões em controle concreto efeitos próprios do controle abstrato como modulação dos efeitos temporais, eficácia erga omnes e efeitos vinculantes.
A abstrativização mostrou-se um instrumento hábil ao desafogamento processual no âmbito do Supremo, uma vez que tornaria desnecessária a reapreciação de caso semelhante já analisado e declarado inconstitucional pela Corte. Assim, atendidas determinadas condições, questões já analisadas em controle difuso não mais seriam suscitadas e apreciadas, reduzindo em muito a demanda processual no Supremo.
Inicialmente, para possibilitar uma compreensão mais profunda do assunto, no primeiro capítulo abordou-se a Constituição, seus conceitos, formas, evolução. Foram analisados, também, os diferentes tipos de inconstitucionalidade, além dos modelos estrangeiros de controle.
Uma vez que com a abstrativização seriam conferidos ao controle concreto efeitos próprios do controle abstrato, o segundo capítulo deste estudo monográfico dedicou-se a analisar os referidos tipos de controle, sendo dividido em duas partes: a primeira foi dedicada ao controle difuso-concreto, enquanto a segunda ao controle concentrado-abstrato.
O terceiro capítulo, por sua vez, abordou de maneira mais objetiva a abstrativização em si, trazendo à baila casos concretos em que fora aplicada, caso Mira Estrela e progressão de regime nos crimes hediondos, comprovando não apenas uma tendência, mas uma realidade na jurisprudência do Supremo.
Como solução à controversa questão, foi elencou-se possibilidades à sua aplicabilidade plena. Assim, a abstrativização seria possível se respeitado o quorum de maioria absoluta dos ministros do Supremo Tribunal Federal, o mesmo exigido no controle abstrato. Ademais, a exigência de maioria absoluta daria celeridade e praticidade aos processos em que o STF atua como última instância, à medida que não seria necessário aguardar reiteradas decisões no mesmo sentido, como na súmula vinculante.
Sugeriu-se, ainda, para garantir a segurança jurídica à objetivação, uma proposta de emenda constitucional regulamentadora da matéria. Ademais, demonstrou-se a possibilidade de convivência harmônica entre a abstrativização e o disposto no art. 52, X, da Constituição Federal, de maneira que, decidida a abstrativização pelo Supremo, caberia ao Senado dar-lhe publicidade.
Observou-se, também, que, apesar da existência de dois modelos de controle de constitucionalidade, ambos são realizados pela mesma Corte, sendo que os ministros que decidem questões por meio de ação direta são os mesmos que julgam casos concretos em última instância. Assim, poderia o Supremo, quando entender necessário, equiparar os efeitos de ambos.
Apesar de a abstrativização ou objetivação ser fato na realidade jurídica do país, a exigência de maioria absoluta e a existência de uma emenda constitucional, lhe garantiriam segurança, precisão e estabilidade.
REFERÊNCIAS
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO Vicente. Direito Constitucional Descomplicado. 2 ed. Niterói: Impetus, 2008.
ALMEIDA, Vânia Hack de. Controle de Constitucionalidade. 3ª ed., São Paulo: Verbo Jurídico, 2010.
ALVES, Alda Judith. A "revisão da bibliografia" em teses e dissertações: meus tipos inesquecíveis. Cad. Pesqui. [online]. 1992, n.81, pp. 53-60. ISSN 0100-1574.
ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
______. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002.
BEÇAK, Rubens. As alterações do controle difuso de constitucionalidade e sua aproximação com o modelo concentrado. [S.l.: s. n.], 2007. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/campos/rubens_becak.pdf>. Acesso em 04 de março de 2013.
BITAR, Orlando. Jornal Themis. Belém, ano 1, n. 1, março, 1965. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
______. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1980. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. Contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra: Coimbra, 1994.
______. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
______. Decreto 2.346/97. Consolida normas de procedimentos a serem observadas pela Administração Pública Federal em razão de decisões judiciais, regulamenta os dispositivos legais que menciona, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto/D2346.htm> Acesso em: 23 de nov. 2012.
_____. Lei 5.869. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm>. Acesso em: 05 de out. 2012.
______. Lei n. 8.072/90. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/LEIS/L8072.htm> Acesso em: 18 de mar. 2013.
______. Lei n. 9.868/99. Dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal. < http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L9868.htm> Acesso em: 18 de mar. 2013.
______. Lei n. 9.882/99. Dispõe sobre o processo e julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do § 1o do art. 102 da Constituição Federal. <http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L9882.htm> Acesso em: 10 de jan. 2013.
______. Lei n. 11.464/07. Dá nova redação ao art. 2o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal. <http://www.planalto.gov.br/ccivil/_Ato2007-2010/2007/Lei/L11464.htm> Acesso em: 18 de mar. 2013.
______. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n. 23.920/SP. Relator: Ministro Vicente Leal. Brasília, 12 dez. 2002.
______. Supremo Tribunal Federal. Agravo de Instrumento n. 375.011/RS. Relator: Ministra Ellen Gracie. Brasília, 05 out. 2004.
______. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 82.959/SP. Relator: Ministro Marco Aurélio - 23/02/2006. Brasília, 23 fev. 2006.
______. Supremo Tribunal Federal. Informativo n. 398. Brasília, 22 a 26 ago. 2005.
______. Supremo Tribunal Federal. Informativo n. 402. Brasília, 19 a 23 set. 2005.
______. Supremo Tribunal Federal. Informativo n. 454. Brasília, 01 e 02 fev. 2007.
______. Supremo Tribunal Federal. Processo Administrativo n. 318.715. Brasília, 17 dez. 2003.
______. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 197.917/SP. Relator: Ministro Maurício Correa. Brasília, 24 mar. 2004.
______. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 298.694/SP. Relator: Ministro Carlos Britto. Brasília, 06 ago. 2003.
______. Tribunal Superior Eleitoral. Resolução n. 21.702. Brasília, 02 abr. 2004.
BROSSARD, Paulo. O Senado e as leis inconstitucionais. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 13, n. 50, p. 55-64, abr./jun. 1976.
CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. 2. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1992.
CLEVE, Clèmerson Merlin. A Fiscalização Abstrata da Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 2. ed. São Paulo: RT, 2000.
CRETELA JÚNIOR, José. Elementos de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: RT, 2000.
DALLARI, Dalmo de Abreu. O contrôle de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal. São Paulo: LTR, 1971.
DIMOULIS, Dimitri; LUNARDI, Soraya Regina Gasparetto. Efeito Transcendente e Transformação do Controle Difuso na Jurisprudência (autocriativa) do Supremo Tribunal Federal. In NOVELINO, Marcelo (Org.) Leituras Complementares de Direito Constitucional: Controle de Constitucionalidade. 3. ed. revista, ampliada e atualizada. Bahia: Juspodivm, 2010.
GERMANO, Guilherme de Freitas. Todas as decisões do STF deveriam ter efeito vinculante. Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2008-out25/todas_decisoes_stf_deveriam_efeito_v
_vinculante?pagina=2>. Acesso em: 22 de fev. 2013.
GOMES, Luiz Flávio. Progressão de regime nos crimes hediondos – Efeitos do controle de constitucionalidade difuso abstrativizado. Revista Jurídica Consulex. Brasília, Ano X, n. 221, p. 44 a 48, 31/03/2006.
HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e 'procedimental' da constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1997.
HESSE, Konrad. A força normativa da constituição (die normative Kraft der Verfassung). Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1991.
JUCÁ, Sabrina Silva de Souza. Abstrativização dos efeitos do controle concreto de constitucionalidade. [S.l.: s. n.], 2008. Disponível em <http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080926164818735&mode=print>. Acesso em: 14 de jan. 2013.
JÚNIOR, Dirley da Cunha. Controle de Constitucionalidade – Teoria e Prática. 5. ed. Bahia: Juspodium, 2011.
JÚNIOR, Fredie Didier. O Recurso Extraordinário e a Transformação do Controle Difuso de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. In NOVELINO, Marcelo (Org.) Leituras Complementares de Direito Constitucional: Controle de Constitucionalidade. 3. ed. revista, ampliada e atualizada. Bahia: Juspodivm, 2010.
KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
______. Teoria Pura do Direito. Tradução de João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.
______. Que é uma constituição? 2. Ed. São Paulo: Minelli, 2005.
LEITE, Glauco Salomão. Súmula Vinculante e Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 11. ed. São Paulo: Método, 2007.
LIMA, Jonatas Vieira de. A tendência de abstração do controle difuso de constitucionalidade no direito brasileiro. [S.l.: s. n.], 2008. Disponível em <http://jus.com.br/revista/texto/9485/a-tendencia-de-abstracao-do-controle-difuso-de-constitucionalidade-no-direito-brasileiro>. Acesso em: 18 de fev. 2013.
MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira. Controle concentrado de constitucionalidade: comentários à Lei 9.868, de 10.11.1999. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
MENDES, Gilmar; COELHO, Inocêncio; BRANCO, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.
MENDES, Gilmar Ferreira. A Reclamação Constitucional no Supremo Tribunal Federal. In NOVELINO, Marcelo (Org.). Leituras Complementares de Direito Constitucional: Controle de Constitucionalidade. 3. ed. revista, ampliada e atualizada. Bahia: Juspodivm, 2010.
______. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade: Estudos de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Celso Bastos, 1999.
______. Jurisdição Constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
MONTEZ, Marcus Vinícius Lopes. Abstrativização do controle difuso. [S.l. : s. n.], 2007. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.14253>. Acesso em: 25 de fev. 2013.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
______. Jurisdição Constitucional e Tribunais Constitucionais. Garantia Suprema da Constituição. São Paulo: Atlas, 2000.
______. Jurisdição constitucional: breves notas comparativas sobre a estrutura do Supremo Tribunal Federal e a Corte Suprema norte-americana. In: Lições de Direito Constitucional em Homenagem ao Jurista Celso Bastos. [TAVARES, André Ramos et. al. (Coord)]. São Paulo: Saraiva, 2005.
______. Legitimidade da Justiça Constitucional. In: As vertentes do Direito Constitucional Contemporâneo. Martins, Ives Gandra da Silva (coordenador). Estudos em homenagem a Manoel Gonçalves Ferreira Filho. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002.
MORAIS, Dalton Santos. Abstrativização do controle difuso de constitucionalidade no Brasil e a participação do amicus curiae em seu processo. [S.l. : s. n.], 2008. Disponível em <http://www.escola.agu.gov.br/revista/2008/Ano_VIII_junho_2008/Abstrativiza%C3%A7%
C3%A3o%20do%20controle%20-%20Dalton.pdf >. Acesso em: 15 de jan. 2013.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 1974.
MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da; SANTOS, William Douglas Resinente dos. Direito constitucional. 10. ed. Niterói: Impetus, 2002.
NEVES, Marcelo. Teoria da inconstitucionalidade das leis. São Paulo: Saraiva, 1988.
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Método, 2008.
PALU, Oswaldo Luiz. Controle de Constitucionalidade. São Paulo: RT, 1999. PRADO, João Carlos Navarro de Almeida. Sincretismo no Controle de Constitucionalidade. Parte II – Abstrativização do controle difuso de constitucionalidade. Revista Jurídica Consulex. Ano XI, nº 242, 15/02/2007.
SANTOS, Andrea Alves dos. Abstrativização do controle concreto de constitucionalidade. [S.l.: s. n.], 2008. Disponível em <http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20081007095721632&mode=print>. Acesso em 09 de jan. de 2013.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25° ed., (revista e atualizada). São Paulo: Malheiros, 2005.
STRECK, Lênio Luiz. O efeito vinculante das súmulas e o mito da efetividade: uma crítica hermenêutica. In: Constituição e democracia. Estudos em homenagem ao Professor J.J. Canotilho. [BONAVIDES, Paulo. et. al. (Coord.)] São Paulo: Malheiros, 2006.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constiucional. 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2007.
TOCQUEVILLE, Aléxis de. A Democracia na América. 2. ed. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP. 1977.
VAZ, Deivid Sarmento. A abstrativização do controle concreto de constitucionalidade e o papel do Senado Federal. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2051, 11 fev. 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/12318/a-abstrativizacao-do-controle-concreto-de-constitucionalidade-e-o-papel-do-senado-federal/4>. Acesso em: 25 jan. 2013.
VELOSO, Zeno. Controle Jurisdicional de Constitucionalidade. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.