Desaposentação: breves considerações

14/01/2015 às 14:25
Leia nesta página:

O Instituto da Desaposentação teve, nos últimos 3 anos, uma mudança de entendimento, compreendendo ser possível a renúncia a aposentadoria.

1. Introdução

A desaposentação é um instituto defendido pelos juristas que privam pelos direitos de todos os trabalhadores aposentados vinculados ao Regime Geral da Previdência Social, mais conhecido como Instituto de Previdência Social – INSS.

O que se busca é compensar o segurado aposentado que volta a exercer atividade remunerada e contributiva, a aproveitar essa contribuição a mais auferida ao sistema previdenciário, em seu benefício, tornando o mais vantajoso.

A tese da desaposentação vem ganhando força nos anos que se seguem, principalmente pelo entendimento dos doutrinadores e o posicionamento dos Tribunais. A princípio os Magistrados se mostraram resistentes a visão dos juristas quanto ao direito do trabalhador aposentado, tendo em vista que não há uma contrapartida concreta decorrente das contribuições recolhidas posteriores a aposentadoria do segurado.

Desta forma, podemos dizer que a busca pelo exercício do direito e a preservação das garantias constitucionais dos trabalhadores aposentados impulsionaram a onda de processos que apontam para a normatização do direito a obter uma contrapartida do sistema previdenciário decorrente do aproveitamento de todo o tempo contributivo do trabalhador.


2. O que vem a ser a desaposentação?

A expressão não é exatamente o que se imagina. Geralmente causa espanto, pois vulgarmente dá a entender que a pessoa que esta aposentada deixa de ser aposentado. Não é este o conceito.

A desaposentação foi a medida encontrada pelos juristas para compensar dois pontos relevantes de perda do trabalhador aposentado. Primeiro ponto com relação a extinção do pecúlio, que ocorreu com a promulgação das Leis nº 8.870/94 e 9032/95, e em segundo ponto, devido a obrigatoriedade na contribuição previdenciária dos trabalhadores, independente se são ou não aposentados.

Assim surge o questionamento: se já esta aposentado, tendo cumprido o tempo de contribuição para a almejada aposentadoria, porque então continuar a contribuir sem nenhum retorno viável?

Através desse questionamento é que surge a tese da desaposentação, em que o aposentado que continuou laborando e contribuindo para a previdência após a aposentadoria, pudesse beneficiar-se com a somatória do tempo de contribuição anterior e posterior a aposentadoria.

Em meio as situações reais alcançadas, surge uma divisão com a classificação de três tipos de desaposentação: 1) A renúncia em que não se aproveita o tempo de contribuição utilizado na concessão da aposentadoria, assim como seus proventos. 2) A desaposentação pura, em que se aproveita todo o tempo contributivo, antes e depois da aposentadoria. 3) A desaposentação legal, em que o segurado recebe benefício concedido administrativamente,  e concomitante é concedido outro benefício em processo judicial, podendo assim escolher pelo benefício mais vantajoso.

Desta forma o aposentado teria o direito a renunciar o beneficio recebido e simultaneamente solicitar nova aposentadoria com o computo do tempo de contribuição anterior e posterior a primeira aposentadoria, resultando novo cálculo da renda mensal inicial.

Em suma, a desaposentação visa unificar todo o tempo contributivo em uma nova aposentadoria. A renúncia do beneficio concedido para que o tempo de contribuição vinculado a este ato de concessão possa ser liberado, permitindo seu computo em novo beneficio mais vantajoso.


3. O INSS em relação a desaposentação.

O INSS disciplina através da Instrução Normativa nº 45 e a Lei nº 8213/91, que a aposentadoria é irrenunciável, só sendo extinta com a morte do beneficiário, pois entende-se que o direito a aposentadoria é um ato jurídico perfeito e acabado. Somente no caso de erro ou fraude na concessão do beneficio poderia ser desfeito via administrativo ou judicial.

O INSS reconhece via administrativa apenas três possibilidades de modificação de benefício concedido. O primeiro é o caso de desistência da aposentadoria por ato volitivo do segurado, desde que antes da data início do pagamento, onde o segurado declara que não quer receber o benefício e desta forma não saque os valores liberados. A segunda hipótese é o caso de transformação de um beneficio em outro beneficio, por exemplo os casos de segurados que recebem auxílio-doença e este é convertido em aposentadoria por invalidez. E a terceira hipótese é o caso de renúncia de um dos benefícios, no caso de pensão por morte, em que a segurada pensionista, ao obter o direito de outra pensão por morte, opta pelo benefício mais vantajoso. Salvo estes exemplos o INSS não reconhece via administrativa a possibilidade da desaposentação.


4. O entendimento do Poder Judiciário.

O tema vem ganhando força no decorrer dos anos, haja vista que os Tribunais já apontam para o reconhecimento do direito a desaposentação.

Nos últimos anos os Tribunais têm decidido pelo direito a renuncia, com a possibilidade de utilizar o tempo de contribuição para nova aposentadoria sem que o segurado seja obrigado a devolver os valores anteriormente recebidos.

A questão da devolução dos valores recebidos na primeira aposentadoria foi margem para uma importante decisão no Tribunal Superior de Justiça em que reconhece o direito do aposentado a obter nova aposentadoria com o computo do tempo de contribuição posterior a primeira aposentadoria sem a necessidade de devolver o que já recebeu, tendo em vista o caráter alimentar, ato jurídico perfeito e o direito adquirido.

Neste sentido, é o entendimento da 1ª e 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.350.975/SC e 1.347.051/RS: “previdenciário. recurso especial.  Possibilidade de renúncia da aposentadoria a fim de se aproveitar o tempo de contribuição no cálculo de nova aposentadoria em regime previdenciário diverso. Desnecessidade de restituição aos cofres públicos do numerário despendido pela administração com o pagamento do benefício objeto da renúncia. Agravo do INSS desprovido. Recurso especial da segurada provido”. 

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O posicionamento do Superior Tribunal de Justiça tem se firmado no sentido de que é possível a renúncia à aposentadoria, para que outra, com renda mensal maior, seja concedida, levando-se em conta a contagem de período de labor exercido após a outorga da inativação, tendo em vista que a natureza patrimonial do benefício previdenciário não obsta a renúncia a este, porquanto disponível o direito do segurado, não importando em devolução dos valores percebidos. (AgRg no REsp 1304593/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 11/05/2012).

O posicionamento da Corte fortaleceu a tese da desaposentação influenciando outros Tribunais. O Tribunal de Contas da União - extremamente rígido no controle dos atos administrativos - sustenta “o direito de um segurado renunciar a uma aposentadoria para, depois, novamente se aposentar, ou seja, a pessoa se desaposentar”[1].

O que se espera é que o Supremo Tribunal Federal siga a mesma linha de entendimento sobre o assunto, mantendo as decisões pela possibilidade da desaposentação.


5. A questão do equilíbrio financeiro e atuarial.

Fazendo uma pequena análise na vida contributiva de um segurado, vejamos a questão no ponto de vista matemático.

O trabalhador exerce atividade remunerada e desta forma contribui para o sistema durante 35 anos, conforme determina a lei vigente. Após completar o tempo de contribuição necessário é concedido o beneficio de aposentadoria por tempo de contribuição calculado em conformidade as regras vigentes.

Este segurado, mesmo estando aposentado, decide não gozar na plenitude sua aposentadoria e retorna ao mercado de trabalho, passando a exercer novamente atividade renumerada e consequentemente, volta a contribuir para o sistema previdenciário.

Nesse ponto temos a seguinte indagação?

Se este segurado contribuiu durante 35 anos na expectativa de obter na melhor idade a almejada aposentadoria, e se as contribuições anteriormente auferidas cumpriram sua finalidade, as novas contribuições não foram previstas, sendo assim porque não podem ser utilizadas em favor do próprio contribuinte? 

Antes da extinção do pecúlio, havia a possibilidade de ser resgatar as contribuições pagas ao sistema, mas atualmente, o segurado aposentado não detém nenhuma segurança concreta ou retorno viável decorrente das contribuições recolhidas posteriores a aposentadoria, o que gera um sentimento de lesão ao direito do trabalhador aposentado contribuinte.


6. Considerações finais

O presente estudo versou sobre o Instituto da desaposentação, com abordagem do conceito e origem atribuída a essa tese jurídica.

Em suma podemos conceituar a desaposentação como o ato de renúncia/ substituição do beneficio de aposentadoria concedido, visando a possibilidade de se aproveitar o tempo de serviço/contribuição computado na primeira aposentadoria com a inclusão da soma do novo tempo de contribuição posterior a aposentadoria.

Busca-se somatória de todo o tempo de contribuição do segurado em novo cálculo da renda mensal inicial, desta forma gerando uma nova aposentadoria mais vantajosa.

O INSS administrativamente não reconhece essa possibilidade, e mantem-se resistente ao Instituto da desaposentação por entender que o direito a aposentadoria é irrenunciável, salvo nas hipóteses estabelecidas pela lei de benefícios.

Assim, diante da negativa de um direito pleiteado é que se socorre ao poder judiciário para contemplar o direito do trabalhador aposentado, lesado em seu amparo e proteção constitucional. 


7. Referências

ALENCAR, Hermes Arrais. Desaposentação e o Instituto da Transformação de Benefícios Previdenciários do Regime Geral de Previdência Social. São Paulo: Conceito, 2011.

BRASIL, Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. Senado. 1988.

BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 – dispõe sobre os planos de benefícios da previdência social e dá outras providencias. Disponível em acesso em 19/12/2014.

IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 16. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011.

MARTINEZ, Wladmir Novaes. Curso de direito previdenciário. Tomo II: previdência social. 2 ed. São Paulo: LTr, 2003.

_______. Desaposentação. 3. ed. São Paulo: LTr, 2010)


Nota

[1] MARTINEZ, Wladmir Novaes. Curso de direito previdenciário.

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Sobre a autora
Angélica Piovesan da Costa

Advogada pós graduada em direito previdenciário do escritório Piovesan Advocacia. Graduada em Direito pela Universidade do Vale Paraíba – Univap – 2011.

Informações sobre o texto

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