Após o advento da PEC n. 66/2012 e sua consequente promulgação, em 02 de abril de 2013, a qual, a partir de então, se transformou na Emenda Constitucional (EC) n. 72/2013, apelidada pela mídia de PEC das Domésticas[1], calorosos debates se travaram acerca da (des)necessidade de ampliação dos direitos constitucionais previstos ao trabalhador doméstico.
Inicialmente, convém esclarecer a acepção do termo doméstico, para tanto, devemos nos remeter aos termos do art. 1º da Lei n. 5859/72, ou seja, doméstico é a pessoa física que trabalha de forma pessoal, subordinada, continuada e mediante salário, para outra pessoa física ou família que não explore atividade lucrativa, no âmbito residencial desta.
Portanto, para se aferir o enquadramento legal de determinado trabalhador, isto é, se é CLT, rural, doméstico ou estatutário, deve-se verificar para quem aquela pessoa trabalha, não a atividade exercida, o que significa dizer que se uma trabalhadora executa a função de cozinheira e tal situação é analisada de maneira solitária não a enquadrará em nenhuma das leis mencionadas, pois é imperioso pesquisar quem é o seu empregador. Dessa sorte, sendo seu empregador uma pessoa física, que não desenvolva atividade lucrativa, será doméstica; lado outro, se o seu empregador for um restaurante, um hotel ou uma loja comercial, será urbana.
É preciso atentarmos para o fato de que para ser um trabalhador doméstico, basta a execução da atividade laboral para empregador doméstico, independentemente da atividade exercida, ou seja, tanto faz se o trabalho é manual, intelectual ou especializado. Logo, concluímos, que a função do doméstico pode ser exercida por uma faxineira, cozinheira, motorista, piloto de avião, enfermeiro, médico, professor e etc.
Com base na noção simplória acerca do conceito de doméstico, pode-se dizer que a alcunha recebida e devidamente espetacularizada pelos meios de comunicação não foi a mais adequada, vez que a terminologia PEC das Domésticas nos induz, irrefutavelmente, a crer que a alteração legislativa afetará apenas a escala de trabalhadoras domésticas no sentido literal da palavra.
Basicamente, o propósito da EC 72/2013 foi alterar o parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal, ampliando a gama de direitos reconhecidos aos trabalhadores domésticos.
Antes da referida mudança, os trabalhadores domésticos tinham reconhecidos os direitos dos seguintes incisos, IV, IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, que tratavam, basicamente, de: salário mínimo; irredutibilidade salarial; décimo terceiro; repouso semanal remunerado; gozo de férias anuais; licença-maternidade; licença-paternidade; aviso prévio proporcional e aposentadoria.
A partir da EC 72/2013, os direitos dos trabalhadores domésticos foram ampliados, e, então, passaram a ter reconhecidos aqueles dos seguintes incisos: I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XXI, XXIV, XXV, XXVI, XXVIII, XXX, XXXI e XXXIII. Dentre os referidos incisos, estão a ampliação de direitos como: (II) seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; (III) fundo de garantia do tempo de serviço; (IX) remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; (XIII) duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais e (XVI) remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal.
Apesar de todo alarde em torno da mudança legislativa, nem todos os direitos ampliados estão sendo “desfrutados” pelos trabalhadores, pois alguns, como é o caso do FGTS, dependem de regulamentação infraconstitucional.
Com efeito, o questionamento cinge-se na “concretização” daqueles “direitos” cuja aplicação se deu de maneira imediata, mas sua efetivação inter partes se torna prejudicada, por um motivo ou outro, como é o caso da realização do controle de jornada pelo empregador que passa o dia fora de casa.
Vale destacar que perquirir a isonomia entre os trabalhadores é algo de extrema importância, principalmente, se levarmos em consideração o elevado número de pessoas nessa condição (7 milhões conforme estimativa do Ministério do Trabalho)[2].
Desse modo, os percalços oriundos da aplicação da norma não devem ser utilizados como “desculpas” pela não “ampliação” dos referidos direitos, vez que a inclusão das normas é uma garantia de segurança jurídica às relações de trabalho, não somente para o trabalhador doméstico, como também para os empregadores.
Conclui-se, portanto, que a alteração legislativa é de suma importância para todas as classes trabalhadoras, notoriamente, os domésticos, pois põe fim a uma odiosa discriminação em relação aos demais, tornando-se equânime o tratamento que essa classe obreira merece perante seus legisladores e empregadores.
[1] http://veja.abril.com.br/tema/pec-das-domesticas
[2] http://www3.mte.gov.br/geral/estatisticas.asp