SUMÁRIO: 1. Introdução; 1.1. Base legislativa; 1.2. Natureza jurídica. 2. Sujeito passivo: empregador, empresas e entidades equiparadas. 3. Hipótese de incidência; 3.1. Base de cálculo e alíquota; 3.2. Folha de salário; 3.3. Salário-de-contribuição. 4. Remuneração x indenização. 5. Posicionamento dos tribunais e decisões recentes; 5.1. Terço constitucional de férias; 5.2. Auxílio-doença e auxílio-acidente, quinze primeiros dias; 5.3. Aviso prévio indenizado; 5.4. Adicional de Horas-extras; 5.5. Salário maternidade e férias gozadas. 6. Conclusões. 7. Referências Bibliográficas
1. INTRODUÇÃO
O sistema da Seguridade Social abarca a saúde, assistência social e previdência social. Como já ensina o mestre Wagner Balera, “arrumadas em sistema, as três partes que compõem o arcabouço – saúde, previdência social e assistência social - devem proporcionar a todos, assistência social.”[1].
O custeio da Seguridade Social deve ser feito tanto pelos trabalhadores e empregadores, quanto pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Todos têm interesse no bom funcionamento da Seguridade Social: o trabalhador porque contará com a proteção de um sistema de amparo social quando dele necessitar; o empregador porque, ao contribuir, ajuda a custear o sistema que dará amparo a esse trabalhador, proporcionando-lhe tranquilidade e em consequência, maior produtividade; e os entes federativos, porque os cidadãos terão suas necessidades básicas cobertas e estarão promovendo maior segurança social, evitando a marginalização do indivíduo por falta de condições de autossustento econômico.
É a Constituição Federal que determina que a Seguridade Social deve ser custeada, de forma direta e indireta, pelos trabalhadores, pelos empregadores e pelos entes federativos.
O termo “custeio” define melhor a situação do que “financiamento”. Este último tem embutido em si a ideia de lucro, o que não se aplica à Seguridade Social[2], pois aqui o que se busca é a manutenção do segurado quando atingido por algum grau de incapacidade que não lhe permita buscar, por si mesmo, seu sustento e o daqueles que dele dependem.
1.1.Base Legislativa
Do artigo 194 até 204, a Constituição Federal trata da Seguridade Social. O art. 194 elenca os princípios fundamentais, enquanto o artigo 195 determina quais as fontes de custeio. O artigo 195 assim dispõe:
“Art. 195: A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I. do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;.”
Posteriormente, a lei 8212/91 instituiu as alíquotas das contribuições e a base de cálculo:
Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:
I - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.
II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:
a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.
III - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços;
IV - quinze por cento sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, relativamente a serviços que lhe são prestados por cooperados por intermédio de cooperativas de trabalho”.
O art. 214 do Regulamento da Previdência Social (Decreto 20148 de 6 de maio de 1999) define o que é salário-de-contribuição, a efetiva base de cálculo das contribuições, e elenca, de forma exemplificativa, as verbas que estão isentas no seu parágrafo 9º. Entre elas estão os benefícios da previdência social, a ajuda de custo, as férias indenizadas, o abono e respectivo terço constitucional e a participação nos lucros e resultados. Também previa a isenção sobre o aviso prévio indenizado, mas tal disposição foi revogada pelo Decreto 6.727 de 12 de janeiro de 2009, o que levou muitas empresas a contestarem judicialmente a validade da norma.
Da lei constatamos, portanto, que as empresas custeiam a Seguridade Social por três vias distintas: através da folha de salários e demais rendimentos do trabalho, do faturamento e do lucro. Neste trabalho, nos concentraremos na primeira via: as contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho.
1.2.Natureza Jurídica
Muito já se discutiu sobre a natureza jurídica dessas contribuições, mas hoje está pacificado que têm natureza tributária, conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 138.284-8 CE, julgado em 1º/07/1992, DJ de 28/08/1992, Tribunal Pleno, Rel. Ministro Carlos Mario da Silva Velloso:
"Constituem essas contribuições uma espécie própria de tributo ao lado dos impostos e das taxas, na linha, aliás da lição de Rubens Gomes de Souza ('Natureza tributária da contribuição do FGTS', RDA 112/27, RDP 17/35). Quer dizer, as contribuições não são somente as de melhoria. Essas são uma espécie do gênero contribuição; ou uma subespécie da espécie contribuição" in RTJ 143/313.
As contribuições sociais por parte dos empregadores são as que incidem sobre o lucro – CSLL - sobre o faturamento – COFINS e sobre a folha de salários: a contribuição patronal, o SAT e as contribuições a terceiros. Neste trabalho nos interessa a forma de contribuição dos empregadores sobre a remuneração paga.
2. SUJEITO PASSIVO: EMPREGADOR, EMPRESAS E ENTIDADES EQUIPARADAS
A sujeição passiva às contribuições incidentes sobre a remuneração paga, faturamento e lucro tem que abarcar, necessariamente, os entes que exploram uma atividade econômica, com ou sem finalidade de lucro, com ou sem personalidade jurídica.
O conceito de empregador dado pela CLT é plasmado no art. 2º:
Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
Sob a luz do direito previdenciário, empresa é a firma individual ou sociedade que assume o risco de atividade econômica urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, bem como os órgãos e entidades da administração pública direta, indireta e fundacional, sendo a ela equiparados: o contribuinte individual em relação a segurado que lhe presta serviço, bem como a cooperativa, a associação ou entidade de qualquer natureza ou finalidade, a missão diplomática e a repartição consular de carreira estrangeiras (art. 15 da lei 8212/91).
Os entes federativos também podem ser contribuintes do regime geral da previdência social, se não exercerem a prerrogativa a eles conferida pelo parágrafo 1º do art. 149 da Constituição Federal para o estabelecimento de um regime próprio de custeio de seus servidores.
A Emenda Constitucional 20/98 ampliou o conceito de empregador para fins da seguridade social ao dar nova redação ao inciso I do art. 195 da CF, afirmando que a Seguridade Social seria financiada, entre outros, por recursos provenientes de contribuições sociais “do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei”. Anteriormente havia muita discussão sobre quem seria o sujeito passivo, pois a lei se referia apenas a empregador; nesse caso, as empresas que não tinham trabalhadores pleiteavam não ter a obrigação de efetuar os recolhimentos das contribuições previdenciárias. A discussão encerrou-se com o advento da EC 20. Assim, os sujeitos passivos das contribuições de que tratam os incisos I e II do art. 195 da CF e o inciso I do art. 22 da lei 8212/91 são o empregador, a empresa e a entidade a ela equiparada na forma da lei.
Algumas empresas podem ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão de obra, do seu porte ou da condição estrutural do mercado de trabalho. Exemplo disso são os bancos e instituições financeiras, que tem um acréscimo de 2,5% na alíquota de sua contribuição.
3. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA
A hipótese de incidência das contribuições previdenciárias que tratamos neste artigo (contribuição patronal, SAT e contribuições a terceiros) é a remuneração devida por serviços prestados ao empregador, enquanto o fato gerador[3] é a efetivação do pagamento, a qualquer título, da remuneração devida.
3.1 Base de cálculo e alíquota
A Lei 8212/91, no seu art. 22, I, estabelece a alíquota de 20% e base de cálculo o total da remuneração percebida, a qualquer título.
3.2 Folha de salários
A folha de salários significa a soma da remuneração paga ao empregado, em determinado período; deste modo, em principio o critério material do fato gerador desta contribuição social consiste na realização de despesa com salários, provenientes de uma relação de trabalho.
Porém, o avulso e o autônomo não estão incluídos na folha de salário, o que durante muito tempo gerou discussões sobre a constitucionalidade da cobrança da contribuição previdenciária sobre a remuneração paga a eles, bem como sobre aquela paga aos sócios e administradores. O STF, então, decidiu pela inconstitucionalidade da cobrança sobre a remuneração paga a estes, bem como aos empresários e administradores, todas previstas em lei ordinária. Com isso, foi promulgada a Lei Complementar nº 84, de 18/01/96 que institui novas fontes de custeio com base no parágrafo 4º do art. 195 da Constituição Federal, encerrando a celeuma.
Por esse motivo, não é correto tecnicamente afirmar que a contribuição é sobre a folha de salários; a contribuição é sobre o total das remunerações pagas a assalariados ou não, isto é, com ou sem vínculo empregatício com a empresa.
3.3 Salário de contribuição
O salário de contribuição é a efetiva base de cálculo para as contribuições previdenciárias. Não se confunde com o salário em si, pois várias parcelas que o integram não integram o salário-de-contribuição, como por exemplo, as parcelas indenizatórias ou ressarcitórias, já que estas não reverterão em beneficio futuro ao segurado.
Nesse sentido, dispõe o art. 201, parágrafo 11 da CF que apenas as parcelas incorporáveis ao salário – ganhos habituais - do trabalhador para fins de obtenção de benefícios previdenciários sofrem a incidência da contribuição previdenciária: “os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei”.
4. REMUNERAÇÃO X INDENIZAÇÃO
Conforme ensina Sergio Pinto Martins, “remuneração é o conjunto de retribuições habitualmente recebidas pelo empregado pela prestação de serviços, seja em dinheiro ou em utilidades, proveniente do empregador ou de terceiros, mas decorrentes do contrato de trabalho, de modo a satisfazer suas necessidades vitais básicas e de sua família”[4].
À lição do ilustre professor, cabe a expansão do conceito de empregado para prestador de serviços pessoa física em geral e de contrato de trabalho para prestação de serviços com ou sem vínculo empregatícios para adaptação à Emenda Constitucional nº 20/98.
Não se incluiriam, portanto, no conceito de remuneração, aquelas verbas pagas de forma eventual e não habitual, tais como prêmios ou gratificações especificas, nem aquelas de caráter indenizatório ou ressarcitório. Nesse sentido, temos a opinião de Marco Antonio Behrndt: “Não consistiria, pois, remuneração qualquer valor pago pelo empregador e, por conseguinte, evento ensejador da contribuição patronal. Assim, pode-se dizer que os benefícios pagos de forma eventual e liberal pelo empregador, que claramente não decorram de qualquer contraprestação de serviços efetuados pelos segurados empregados ou trabalhadores avulsos, não se caracterizam como remuneração e, consequentemente, não podem ser considerados elementos ensejadores de incidência da contribuição social”[5].
Sendo assim, não integram a remuneração, e, portanto, a contraprestação pelo trabalho realizado, as indenizações nem os ressarcimentos, sendo pagamentos atípicos, pois têm como finalidade a reparação de danos ou o ressarcimento de gastos do empregado, gerando um reforço financeiro eventual, não tendo natureza remuneratória do trabalho.
Essas verbas tampouco integram o salário-de-contribuição, não se somando, portanto, aos benefícios previdenciários futuros aos quais o trabalhador faria jus.
Nesse sentido, a posição de nossos Tribunais:
“Da mesma forma que só se obtém o direito a um benefício previdenciário mediante a prévia contribuição, a contribuição também só se justifica ante a perspectiva da sua retribuição futura em forma de benefício”. (ADI-MC 2.010, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
A diferenciação é de vital importância, pois as verbas remuneratórias geram reflexos em outros pagamentos laborais, tais como 13º salário, FGTS, adicionais, etc., o que não ocorre com as verbas de natureza indenizatória, em regra pagas uma única vez.
Pode-se definir indenização como o conjunto de pagamentos acrescidos ao salário pela obrigação de ressarcimento aos empregados por danos sofridos ou riscos de danos a que se expõe na execução do serviço em condições pessoalmente desfavoráveis, e ressarcimento como o reembolso de despesas realizadas para prestação do trabalho.
5. POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS E DECISÕES RECENTES
A jurisprudência vem se inclinando, já há algum tempo, no sentido de afastar completamente a incidência das contribuições previdenciárias sobre as verbas indenizatórias ou ressarcitórias pagas pela empresa àqueles que lhe prestam serviços, não aceitando a interpretação extensiva que busca inclui-las no conceito de remuneração.
O próprio art. 110 do Código Tributário Nacional veda a interpretação extensiva, ao dispor que “a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados expressa ou implicitamente pela constituição federal, pelas constituições dos estados ou pelas leis orgânicas do distrito federal ou dos municípios, para definir ou limitar competências tributárias”.
O Supremo Tribunal Federal já se posicionou, através do voto do Ministro Marco Aurélio no RE nº 166.772-9 RS, a respeito da manutenção exclusiva dos conceitos previstos na legislação, afastando a interpretação ampliada:
“INTERPRETAÇÃO - CARGA CONSTRUTIVA - EXTENSÃO. Se é certo que toda interpretação traz em si carga construtiva, não menos correta exsurge a vinculação à ordem jurídico-constitucional. O fenômeno ocorre a partir das normas em vigor, variando de acordo com a formação profissional e humanística do intérprete. No exercício gratificante da arte de interpretar, descabe “inserir na regra de direito o próprio juízo - por mais sensato que seja - sobre a finalidade que “conviria” fosse por ela “perseguida” - Celso Antônio Bandeira de Mello - em parecer inédito. Sendo o Direito uma ciência, o meio justifica o fim, mas não este àquele”.
Sendo assim, não se pode estender a interpretação da expressão “rendimento do trabalho” para além da contraprestação pela atividade laboral desenvolvida pelo empregado ou prestador de serviços, a fim de abarcar aqueles pagamentos que possuam natureza indenizatória ou ressarcitória.
Temos vários exemplos de verbas de natureza indenizatória cuja incidência de contribuição previdenciária já foi afasta pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, tais como o terço adicional de férias, aviso prévio indenizado, auxílio-creche, os primeiros 15 dias de auxílio doença e auxílio acidente, e adicionais noturnos, de periculosidade e de insalubridade quando pagos sem habitualidade, adicional de hora-extra e, mais recentemente, sobre o salário maternidade e férias gozadas.
Vejamos cada um deles:
5.1 Terço constitucional de férias:
Consoante o disposto no art. 201, parágrafo 11 da CF, a contribuição previdenciária não incide sobre o terço constitucional de férias, em razão de sua natureza indenizatória e que não se incorpora à remuneração do trabalhador para fins de aposentadoria e outros benefícios. Nesse sentido:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO (SÚMULAS 282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL). IMPOSSIBILIDADE DA INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. A matéria constitucional contida no recurso extraordinário não foi objeto de debate e exame prévios no Tribunal a quo. Tampouco foram opostos embargos de declaração, o que não viabiliza o extraordinário por ausência do necessário prequestionamento. 2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que somente as parcelas que podem ser incorporadas à remuneração do servidor para fins de aposentadoria podem sofrer a incidência da contribuição previdenciária. (AI 710361 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 07/04/2009, DJe-084 DIVULG 07-05-2009 PUBLIC 08-05-2009 EMENT VOL-02359-14 PP-02930)
5.2 Auxílio-doença e auxílio-acidente, quinze primeiros dias
Não é cabível a incidência da contribuição previdenciária sobre os primeiros 15 (quinze) dias do auxílio-doença e auxílio-acidente pagos pelo empregador ao empregado, uma vez que as citadas verbas tem caráter claramente indenizatório, ou seja, não salarial, já que não constitui contraprestação laboral. Nesse sentido:
EMENTA. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇAO PREVIDENCIÁRIA. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS E AUXÍLIO-DOENÇA. NAO INCIDÊNCIA. A contribuição previdenciária não incide sobre parcela paga a título de terço de férias e de auxílio-doença nos primeiros 15 dias do afastamento. Agravo regimental desprovido. Resp Nº 1.292.797 - CE (2011/0270120-4)
5.3 Aviso prévio indenizado
Muito embora tenha tudo sua não-incidência revogada pelo Decreto 6.727/09, é inegável o caráter indenizatório do aviso prévio não trabalhado, motivo pelo qual a jurisprudência se firma no sentido da não incidência da contribuição sobre essa parcela:
EMENTA. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. SAT. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. AUXÍLIO-DOENÇA. QUINZE PRIMEIROS DIAS DE AFASTAMENTO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SALÁRIO-MATERNIDADE. ADICIONAIS DE HORA-EXTRA, TRABALHO NOTURNO, INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. PRECEDENTES. 1. Recursos especiais interpostos pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e por Cremer S/A e outro, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, segundo o qual: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE REMUNERAÇÃO. PRESCRIÇÃO. LC. Nº 118 /2005. NATUREZA DA VERBA. SALARIAL. INCIDÊNCIA. SALÁRIO-MATERNIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. AUXÍLIO-ACIDENTE. AVISO-PRÉVIO INDENIZADO. ADICIONAIS NOTURNO. INSALUBRIDADE. PERICULOSIDADE. NATUREZA INDENIZATÓRIA AUXÍLIO-DOENÇA NOS PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AFASTAMENTO. AVISO-PRÉVIO INDENIZADO, AUXÍLIO-CRECHE. ABONO DE FÉRIAS. TERÇO DE FÉRIAS INDENIZADAS. O disposto no artigo 3º da LC nº 118 /2005 se aplica tão-somente às ações ajuizadas a partir de 09 de junho de 2005, já que não pode ser considerado interpretativo, mas, ao contrário, vai de encontro à construção jurisprudencial pacífica sobre o tema da prescrição havida até a publicação desse normativo. As verbas de natureza salarial pagas ao empregado a título de auxílio-doença, salário-maternidade, adicionais noturno, de insalubridade, de periculosidade e horas-extras estão sujeitas à incidência de contribuição previdenciária. Já os valores pagos relativos ao auxílio-acidente, ao aviso-prévio indenizado, ao auxílio-creche, ao abono de férias e ao terço de férias indenizadas não se sujeitam à incidência da exação, tendo em conta o seu caráter indenizatório. O inciso II do artigo 22 da Lei nº 8.212 /1991, na redação dada pela Lei nº 9.528 /1997, fixou com precisão a hipótese de incidência (fato gerador), a base de cálculo, a alíquota e os contribuintes do Seguro de Acidentes do Trabalho - SAT , satisfazendo ao princípio da reserva legal.
5.4 Adicional de Horas-extras
O Supremo Tribunal Federal considerou que a prestação de horas extras pagas ao trabalhador se reveste de natureza indenizatória pelo tempo que ele ficou cerceado do direito ao descanso e da limitação que teve em relação à convivência familiar e social, razão pela qual também não deve incidir a contribuição previdenciária.
EMENTA. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRESCRIÇÃO. LC 118/2005. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. LEI 9.783/99. NÃO-INCIDÊNCIA SOBRE AS PARCELAS QUE NÃO SE INCORPORAM AOS PROVENTOS DO SERVIDOR. VERBAS INDENIZATÓRIAS. TERÇO DE FÉRIAS. HORAS-EXTRAS. GRATIFICAÇÃO NATALINA. INCIDÊNCIA.
4. O STJ pacificou o entendimento que, na interpretação da Lei 9.783/99, a contribuição previdenciária não incide sobre as vantagens não incorporáveis aos proventos do servidor, no momento de sua aposentadoria, nem sobre as parcelas de cunho indenizatório. 5. Dessa forma, não incide a contribuição previdenciária sobre o adicional de férias (terço constitucional) e as horas-extras.
5.5 Salário maternidade e férias gozadas
O salário-maternidade é o único benefício previdenciário que, por lei, sofre a incidência das contribuições previdenciárias, por fazer parte do salário-de-contribuição, tal e como dispõe o art. 28, § 9º, “a”, da lei 8.121/91:
Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
...
§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
a) os benefícios da previdência social, nos termos e limites legais, salvo o salário-maternidade;
Por esse motivo, até recentemente o posicionamento dos Tribunais era no sentido de manter a incidência da contribuição sobre o pagamento de salário-maternidade. Também alcançava o pagamento das férias gozadas, mesmo que o trabalhador não estivesse efetivamente trabalhando quando da percepção dessas verbas. No entanto, houve uma mudança no posicionamento tradicional do STJ e em 08 de março de 2013 restou decidido de forma contrária ao posicionamento dominante.
O STJ entendeu que o “salário-maternidade é um pagamento realizado no período em que a segurada encontra-se afastada do trabalho para a fruição de licença maternidade, possuindo clara natureza de benefício, a cargo e ônus da Previdência Social (arts. 71 e 72 da Lei 8.213/91), não se enquadrando, portanto, no conceito de remuneração de que trata o art. 22 da Lei 8.212/91”.
A manutenção da incidência, de acordo com o Tribunal, “seria um estímulo à combatida prática discriminatória, uma vez que a opção pela contratação de um Trabalhador masculino será sobremaneira mais barata do que a de uma Trabalhadora mulher. A questão deve ser vista dentro da singularidade do trabalho feminino e da proteção da maternidade e do recém-nascido; assim, no caso, a relevância do benefício, na verdade, deve reforçar ainda mais a necessidade de sua exclusão da base de cálculo da Contribuição Previdenciária, não havendo razoabilidade para a exceção estabelecida no art. 28, § 9o., a da Lei 8.212/91”.
No que tange às férias gozadas, a posição do Tribunal é no sentido de respeitar o já citado art. 110 do CTN, não ampliando indevidamente o alcance de uma normal ao afirmar que “o preceito normativo não pode transmudar a natureza jurídica de uma verba. Tanto no salário-maternidade quanto nas férias usufruídas, independentemente do título que lhes é conferido legalmente, não há efetiva prestação de serviço pelo Trabalhador, razão pela qual, não há como entender que o pagamento de tais parcelas possuem caráter retributivo. Consequentemente, também não é devida a Contribuição Previdenciária sobre férias usufruídas”.
Já há entendimento firmado de que “o terço constitucional de férias tem natureza indenizatória. O terço constitucional constitui verba acessória à remuneração de férias e também não se questiona que a prestação acessória segue a sorte das respectivas prestações principais. Assim, não se pode entender que seja ilegítima a cobrança de Contribuição Previdenciária sobre o terço constitucional, de caráter acessório, e legítima sobre a remuneração de férias, prestação principal, pervertendo a regra áurea acima apontada”.
Vejamos:
EMENTA. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. SALÁRIO-MATERNIDADE E FÉRIAS USUFRUÍDAS. AUSÊNCIA DE EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PELO EMPREGADO. NATUREZA JURÍDICA DA VERBA QUE NÃO PODE SER ALTERADA POR PRECEITO NORMATIVO. AUSÊNCIA DE CARÁTER RETRIBUTIVO. AUSÊNCIA DE INCORPORAÇÃO AO SALÁRIO DO TRABALHADOR. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PARECER DO MPF PELO PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARA AFASTAR A INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O SALÁRIO-MATERNIDADE E AS FÉRIAS USUFRUÍDAS.
9. Recurso Especial provido para afastar a incidência de Contribuição Previdenciária sobre o salário-maternidade e as férias usufruídas.
6. CONCLUSÕES
De todo o exposto, afere-se que a distinção entre verbas de natureza remuneratória e indenizatória é de vital importância para definir a incidência da contribuição previdenciária.
Considera-se ilegítima pelos nossos Tribunais superiores a incidência de contribuição previdenciária sobre verbas indenizatórias ou que não se incorporem à remuneração do trabalhador, pois estas não revertem futuramente em beneficio do mesmo ao não serem incorporadas à aposentadoria, razão fundamental pela qual não deve haver o recolhimento no momento presente.
Não obstante, a Administração Pública continua exigindo o recolhimento sobre as verbas citadas neste trabalho, obrigando às empresas buscarem individualmente, a tutela jurisdicional que dê suporte à sua pretensão.
Para sorte do contribuinte, a maior parte das verbas aqui citadas já tem entendimento pacificado no sentido da não-incidência, o que lhes dá segurança jurídica suficiente para pleitear a compensação das verbas recolhidas até o presente e a cessação da obrigação de recolhê-las em adiante.
Resta por definir, todavia, o posicionamento definitivo no que tange ao salário-maternidade e férias gozadas.
7. Referências Bibliográficas
BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 6ª Ed. São Paulo. LTr. 2012.
BALERA, Wagner. E outros. Previdência Social Comentada. 1ª Ed. São Paulo. Quartier Latin. 2008.
BELMONTE, Ronaldo. Obrigações das Empresas junto à Previdência Social. 1ª Ed. São Paulo. LTr. 1996.
PIERDONÁ, Zélia Luiza. Contribuições para a Seguridade Social. 1ª Ed. São Paulo. LTr. 2003.
CUTAIT NETO, Michel; BALERA, Wagner; e outros. Contribuições Sociais em Debate. 1ª Ed. Leme/SP. JH Mizuno. 2003.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 31ª Ed. São Paulo. Atlas. 2011.
CHAMON, Omar. Introdução ao Direito Previdenciário. 1ª Ed. São Paulo. Manole. 2005.
ARAGONÉS VIANNA, José Ernesto. Limitações constitucionais a instituição de contribuições sobre a seguridade social. 1ª Ed. São Paulo. LTr. 2005.
[1] Balera, Wagner. “Sistema de Seguridade Social”, 6ª edição, 2012, São Paulo. LTR, pág. 13.
[2] Martins, Sérgio Pinto. “Direito da Seguridade Social”. 31ª Ed. São Paulo. Atlas. 2011, pág 166: “O termo mais correto a ser empregado não é financiamento, mas custeio.Financiamento tem acepção mais ampla que custear, compreendendo a ideia de lucro. O pai custeia os estudos do filho, mas não os financia. As contribuições para o custeio não incidem apenas sobre o lucro, ma sobre o faturamento, folha de salários, etc.”
[3] Art. 114 do Código Tributário Nacional: Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
[4] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social, pág. 169.
[5] BALERA, Wagner. E outros. Previdência Social Comentada. 1ª Ed. São Paulo. Quartier Latin. 2008, pág. 115.