Palavras-Chave: Direito de propriedade. Contratos Administrativos. Responsabilidades. Supremacia. Interesse público.
Sumário: 1. O Direito de Propriedade – 2. Os Contratos Administrativos – 2.1. Responsabilidades Contratuais e Extracontratuais – 3. Considerações Finais – 4. Referências Bibliográficas.
1. O Direito de Propriedade
O Código Napoleônico foi o código civil francês outorgado em 1804 que, apesar de não ter sido o primeiro a ser criado, influenciou enormemente os sistemas legais de vários países, inclusive o Brasil, através de Clóvis Beviláqua, civilista brasileiro, que o utilizou como parâmetro para desenvolver o nosso código. O Código de Napoleão, dentre outros assuntos, dava grande ênfase ao direito de propriedade colocando-o com um direito absoluto.
Segundo Xavier (2011), o artigo 544 do referido código assim definia, em francês, o conceito de propriedade :
“La propriété est le droit de jouir et de disposer des choses de la manière la plus absolue, pourvu qu'on n'en fasse pas un usage prohibé par les lois ou par les règlements.”
Tradução para o português :
A propriedade é o direito de gozar e de dispor das coisas da maneira mais absoluta, desde que não se faça uso proibido pelas leis ou pelos regulamentos.
Nota-se um aspecto de contradição, pois ao mesmo tempo que se pode dispor da propriedade de forma absoluta, ela é limitada pelas leis e regulamentos. Mas apesar de algumas limitações, o código representou um grande avanço para a época quando então se começou a discutir mais profundamente acerca do direito à propriedade.
Entretanto, com o passar do tempo, essa concepção individualista da propriedade foi evoluindo gradativamente até se chegar ao que se chama hoje, no Brasil, de função social da propriedade.
A Constituição de 1988 garante o direito de propriedade no art. 5º, inciso XXII “é garantido o direito de propriedade”, e a seguir confirma o princípio da função social em duas oportunidades : art. 5º, inciso XXIII, “a propriedade atenderá a sua função social” e, nos termos do art. 170, inciso III, ao tratar da ordem econômica, com base na justiça social, mantem como um de seus princípios a “função social da propriedade”.
Os tipos de propriedade, e não somente a territorial, são também especificados na Constituição de 1988 através dos arts. 5º, XXIV a XXX, 170, II e III, 176, 177, 178, 182, 183, 184, 186, 191 e 222. A constituição brasileira consagra e garante o direito de propriedade, mas somente se atender o princípio da função social, pois caso contrário dará suporte à intervenção do Estado na propriedade.
O Estado exerce os poderes de soberania sobre praticamente tudo que se encontra em seu território. Alguns são de propriedade do próprio Estado, outros são inapropriáveis (não pertencem a ninguém - a exemplo dos rios - mas são controlados pelo Estado) e, por fim, existem os bens que pertencem a particulares, mas que também ficam sujeitos às limitações administrativas compulsoriamente impostas pelo Estado. Este conjunto de bens que pertencem ou que se sujeitam ao Estado constitui o que se chama de domínio público. Em razão desse “domínio” é que são estabelecidos os limites ao uso da propriedade privada que devem estar previstos no texto constitucional, como as servidões administrativas, as desapropriações, as requisições, dentre outros.
A atuação do Estado, portanto, limita o exercício da propriedade fundamentado na supremacia do direito coletivo sobre o direito individual, sempre que o interesse público assim o exigir. Essa supremacia é um dos princípios regentes da atividade administrativa estatal, segundo a qual há uma desigualdade jurídica entre a Administração e o particular, com vistas a prevalecer o interesse da coletividade como um todo.
2. Os Contratos Administrativos
Os contratos administrativos e as licitações são regulamentados pela Lei 8.666/93 e atualizada posteriormente pela Lei 8.883/94, que conferem à Administração Pública uma série de vantagens que seriam consideradas ilícitas caso fossem feitas entre particulares, pois têm privilégios que a beneficiam unilateralmente, gerando uma posição de superioridade em relação à outra parte. Tem-se as chamadas “cláusulas exorbitantes” que estão previstas de maneira geral no artigo 58 da Lei 8.666/93, que saem da esfera do Direito Privado para enquadrarem-se como cláusulas tipicamente de Direito Administrativo, estando presentes explícita ou implicitamente nos contratos administrativos.
Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:
I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;
II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei;
III - fiscalizar-lhes a execução;
IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;
V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo.
§ 1o As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado.
§ 2o Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual (Art. 58, da 8.666/93).
Á Administração Pública, portanto, são conferidas diversas prerrogativas, como a alteração ou rescisão unilateral do contrato, a fiscalização, a aplicação de penalidades, dentre outras, que mostram a intenção do legislador em garantir que os interesses públicos sejam respeitados.
2.1. Responsabilidades contratuais e extracontratuais
Em qualquer tipo de contrato, seja público ou privado, existem características básicas como o acordo voluntário de vontades e a produção de efeitos jurídicos para as partes, ou seja, criação de direitos e obrigações entre os contratantes, dentre outros. Existem regras pré-determinadas - sejam através das leis existentes, das cláusulas acordadas ou mesmo de um preceito geral do Direito - que protegem tanto a Administração (contratante) quanto o contratado, estando ambos sujeitos ao que foi previamente pactuado entre as partes. Logo, se há descumprimento de qualquer obrigação contratual a parte prejudicada pode requerer algum tipo de reparação. É o que se chama de Responsabilidade Contratual.
Existe ainda um outro tipo de responsabilidade civil conhecida como Responsabilidade Extracontratual que ocorre quando há uma lesão a um direito subjetivo sem que haja qualquer vínculo contratual ou relação jurídica entre a vítima e o autor do dano.
Para melhor entendimento desse assunto, nada melhor do que se mencionar os principais ordenamentos jurídicos existentes a respeito que são, respectivamente, a Constituição Federal, a Lei de licitações e contratos da Administração e o Código Civil :
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa (Art. 37, §6º da C.F/88).
O contratado é responsável pelos danos causados diretamente à Administração ou a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo na execução do contrato, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a fiscalização ou o acompanhamento pelo órgão interessado (Art. 70, da Lei 8.666/93).
As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo (Art. 43, da Lei 10.406/02).
Independentemente do tipo de responsabilidade civil, seja ela Contratual ou Extracontratual, o que se busca é a reparação da parte prejudicada em relação ao dano sofrido, conscientizando o cidadão e o Estado de que devemos respeitar os direitos uns dos outros, sabendo que qualquer lesão ao direito alheio deverá sempre ser reparado, ficando em segundo plano as questões de interesse público ou privado, nesse caso específico. Nada mais justo.
3. Considerações Finais
Diante do exposto, nota-se que o interesse público deve prevalecer sobre o individual na eterna busca da realização das demandas coletivas. A Administração Pública não pode se dispor livremente desse interesse, pois não há opção de escolha, ou seja, ela tem o dever de agir em prol da maioria. Entretanto, a simples aplicação do interesse público não é absoluta, uma vez que a Constituição Federal está repleta de direitos e garantias individuais. É necessário que haja bom senso e prudência por parte dos gestores públicos para agir com responsabilidade segundo os princípios de razoabilidade e proporcionalidade de modo que todo ato administrativo seja devidamente justificado para que fique bem claro o motivo que levou um direito fundamental individual a ser suprimido ou prejudicado em favor do interesse coletivo. É o que se espera de um verdadeiro Estado Democrático de Direito onde interesses públicos e privados convivam harmoniosamente e sejam respeitados.
4. Referências Bibliográficas
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 26 jan. 2015.
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8666cons.htm> Acesso em 28 jan. 2015.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm> Acesso em 28 jan. 2015.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2010.
XAVIER, Luciana Pedroso. As teorias do patrimônio e o patrimônio de afetação na incorporação imobiliária - UFPR - 2011. Disponível em: <http://dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/handle/1884/29214/R%20-%20D%20-%20LUCIANA%20PEDROSO%20XAVIER.pdf?sequence=1> Acesso em 20 jan. 2015.