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O crime na era da inform@ção

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01/01/2003 às 00:00
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4PERSPECTIVAS FUTURAS

            É melhor prevenir os crimes do que ter de puni-los

            Cesare Beccaria

            Tendo em vista a importância das mudanças que se estão produzindo e que provavelmente se intensificarão nos próximos anos, quando a sociedade informática alcançar a maioridade, podemos compreender a enorme responsabilidade - política e moral – que cerca o dever de introduzir nas mentes humanas a consciência da ação necessária (27).

            Se queremos uma sociedade mais justa, devemos rever nossos valores éticos e políticos com base na democratização da informação de modo responsável e comprometido com as próximas gerações.

            A sociedade, como um todo, deve se organizar coletivamente em busca de novas propostas, fazendo com que a Internet se torne um instrumento capaz de expandir o poder de criação e comunicação da humanidade, evitando, assim, que ela se transforme numa arma perigosa nas mãos daqueles que têm predisposição de cercear a paz dos cidadãos.

            4.1Formas de prevenção e repressão

            A prevenção consiste em evitar que o crime ocorra, realizando ações tendentes a interpor obstáculos no caminho da delinqüência.

            A sociedade organizada e, sobretudo, os órgãos públicos de investigação, como a polícia (28), tem um papel muito importante na vigilância dos crimes na Internet.

            Um dos aspectos importantes na prevenção dos crimes na Internet consiste na identificação dos hackers (29), pois eles são responsáveis em grande parte pela destruição e pirataria dos sistemas virtuais. Além disso existem as proteções por sistemas de criptografia (30), usando dados cifrados. Para romper um sistema criptografado é tão trabalhoso que, em princípio, não compensa para um criminoso.

            Outro cuidado que o internauta deve ter é a exposição de senhas pessoais, isso representa uma das formas mais eficazes de se prevenir o crime através da Internet.

            O Crime às vezes é induzido por pessoas com acentuada tendência a se converter em vítimas (31) que não tomam as devidas precauções quando dispõe dos recursos tecnológicos nas mãos.

            Mendes (32) adverte dizendo que da mesma maneira que algumas pessoas têm grande probabilidade de cometer um crime, assim existem outras que têm predisposição para serem vitimatizadas. Esta conclusão é de capital interesse no campo da prevenção, pois a identificação destes indivíduos e sua educação, assim como outras medidas preventivas costumeiramente adotadas pela ciência criminológica, pode salvá-los do processo vitimizador. E não é outro o pensamento de Pires (33), quando diz que sem a ocasião não há o crime.

            Outra proposta que poderia ser pensada era a criação de uma base de dados on line (via Internet) de intercâmbio e divulgação de informações sobre prevenção do crime, o que de certo modo já foi delineado pelo Programa das Nações Unidas de Prevenção e de Justiça Penal.

            A repressão vale como forma de impedir a continuidade de um determinado comportamento delituoso e, para além disso, serve como advertência aos tendentes ao crime, traduzida no incutimento do medo, posicionando um contramotivo ao impulso criminoso. Como repressão a pena deve situar-se, também, na perspectiva pedagógica de reinserção social, tendo em vista que a pena de prisão cria muitos problemas, não somente no indivíduo mas em relação à sua família e à sociedade. O meio mais seguro, mas ao mesmo tempo mais difícil de tornar os homens menos inclinados a praticar o mal, é aperfeiçoar a educação (34).

            Não é com a pena de morte, com a prisão celular, com o maior rigor repressivo que se conseguirá vencer o problema. A vitória contra a criminalidade se conseguirá com a prevenção, evitando o aparecimento de novos criminosos.

            Situa-se também numa perspectiva social, com uma melhor saúde pública, desde o pré-natal; melhor educação moral e cívica; melhor formação do caráter; melhor distribuição da renda nacional, para evitar as conseqüências da fome e da miséria; melhor solução para tirar os menores abandonados das vias públicas etc.

            A justiça social constitui um meio de prevenir a criminalidade (35), devendo ser projetada através de um programa de governo e não em simples repressão policial ou judiciária, pois como sabemos, é incoerente a sociedade que permite, com o seu desleixo, o aparecimento do criminoso, exigindo, depois, o seu castigo, inclusive com o linchamento.

            A Internet não tem fronteiras o que tem causado grandes discussões acerca da punição dos crimes nela praticados. Em razão disso, um delito pode ser cometido num lugar, mas seus efeitos só se produzem em outro. Para os que alcançam fronteiras de países diversos o limite é a soberania de cada nação, o que se deve pensar é na cooperação judiciária das nações para prender o delinqüente e fazer produzir os respectivos efeitos da pena.

            Outra forma de prevenção são as campanhas na mídia, nas escolas e até mesmo na Internet contra o abuso na exposição de informações ou invasões a sistemas.

            Denunciar sites de pornografia infantil, escrever textos a respeito, incentivar o uso de campanhas nas home page, são ações necessárias, tendo em vista que na Internet deve prevalecer a liberdade de expressão com responsabilidade.

            Promover estudos sobre a inclusão do ensino da ética nos currículos escolares e rever os códigos de ética profissional para neles inserir regras de conduta específicas ao domínio da informática, já que atinge todas as profissões hoje existentes.

            Estabelecimento de normas de incentivo para que os sites da Internet possuam classificação, passando a responsabilidade das mãos dos órgãos oficiais para as mãos dos pais ou responsáveis pela educação das crianças.

            Criação de softwares que permitam a seleção do material disponível na rede, a fim de que crianças tenham acesso a sites interessantes, bloqueando aqueles impróprios, onde se estaria protegendo tanto as crianças quanto o direito de expressão dos adultos.

            Os provedores também têm uma grande responsabilidade, pois são intermediadores e fornecedores de acesso, colocando o usuário em contato com a rede. Para fins penais esses servidores de acesso são perfeitamente identificáveis.

            O provedor que não quer ser cúmplice de um crime tem que tomar precauções, perguntando ao usuário o que pretende fazer com seu espaço na Internet, catalogando seus dados a fim de que a investigação chegue à autoria do delito.

            4.2Organismos envolvidos

            O Comitê Gestor da Internet no Brasil http://www.cg.org.br é uma associação não governamental universal que iniciou as suas atividades nos Estados Unidos da América (EUA).

            Foi criado a partir da necessidade de uma organização para coordenar e integrar todas as iniciativas de serviços Internet no país, objetivando assegurar qualidade e eficiência dos serviços ofertados, assegurar justa e livre competição entre provedores, além de garantir a manutenção de adequados padrões de conduta de usuários e provedores.

            Suas principais atribuições são: recomendar padrões e procedimentos técnicos e operacionais para a Internet no Brasil e coordenar a atribuição de endereços Internet, o registro de nomes de domínios, e a interconexão de espinhas dorsais.

            Sugere, ainda, a adoção de certas normas da Internet chamadas de regras de etiquetas que impedem as pessoas de praticar atos que impliquem na violação dos direitos dos internautas.

            O vantajoso dessa filosofia, é que há uma afirmação democrática muito grande e não há nada melhor do que a Internet para dizer o ideal para cada um.

            Outro organismo de grande importância na busca de soluções para os crimes é Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) http://www.mj.gov.br, órgão subordinado ao Ministério da Justiça que tem como competência a fixação de diretrizes de política criminal e penitenciária para todo o País.

            Atualmente, vem traçando várias diretrizes básicas de política criminal e penitenciária para o Brasil a partir de periódicas avaliações do sistema criminal, criminológico e penitenciário, bem como a execução de planos nacionais de desenvolvimento quanto às metas e prioridades da política a ser executada.

            Como instituto dinâmico no acompanhamento das novas formas delituosas, tem como política atentar para as modernas manifestações de criminalidade como uso criminoso da informática (36).

            Já o Comitê para a Democratização da Internet (CDI) http://www.cdi.org.br é uma organização não governamental, sem fins lucrativos, que promove programas educacionais e profissionalizantes (Escolas de Informática e Cidadania), com objetivo de reintegrar os membros de comunidades pobres, principalmente crianças e jovens, diminuindo os níveis de exclusão social a que são submetidos no Brasil e em todo o mundo. Além desse trabalho promove, ainda, a cidadania, direitos humanos e não-violência, através da tecnologia de informação.

            Ressalte-se, porém, que a cooperação dos provedores de acesso à Internet é de vital importância para identificar os elementos necessários à comprovação da materialidade delitiva e bons indícios de autoria, pois é através dos equipamentos pertencentes a esses prestadores de serviços que o usuário divulga sua comunicação ilícita junto à comunidade virtual.

            4.3A Regulamentação do espaço virtual

            Nos últimos anos com a massificação do uso da Internet, a regulamentação passou a ser discutida, pois o espaço virtual, desregulamentado, reproduzia as situações fáticas do mundo real (37) e essa repercussão no campo do Direito foi e está sendo muito grande.

            A Internet não está regulamentada, e nem poderia estar, pois tem como filosofia a liberdade de informação e não se pode impor limites àquilo que é ilimitado (38).

            O homem não se dava conta que a Internet cresceria tanto e que ela pudesse vir a ser um meio para a consumação de um delito virtual. Mas como todos os crimes, primeiro eles acontecem naturalmente, depois que perturbam a ordem social, o próprio homem trata de estabelecer algumas regras de conduta.

            Justamente para evitar injustiças é que o Direito, como ciência responsável pela regulação da sadia convivência entre os homens, é chamado para impor regras que resultem em harmonia e paz social (39), devendo evoluir de acordo com a sociedade, implementando normas de proteção aos que utilizam a rede mundial.

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            Leis são criadas para proporcionar o bem-estar social das pessoas. Por isso é importante ressaltar a necessidade de se ter muito cuidado na elaboração de qualquer projeto com vistas a regulamentação da Internet, para não se tornar letra de difícil aplicação prática.

            Convencionou-se criar uma norma específica para qualquer fato novo que surge, mas isso tem repercutido mal, pois se tem muita lei e pouca praticidade. A Internet é um instrumento diferente, mas os crimes que são praticados por meio dela podem ser resolvidos através do cabedal forense que dispomos.

            A vantagem da Internet é que ela se auto regula e isso, até certo ponto, a faz funcionar bem. Se um site está abusando muito, por exemplo, cometendo várias irregularidades, o caso é objeto de aviso por parte do Comitê Gestor da Internet que avisa o provedor. Se o provedor não tomar providência, ele retira a conexão e não consegue mais circular na rede.

            As soluções duradouras para a criminalidade virtual, não passam necessariamente por uma provável reforma na legislação penal, mesmo estando, para alguns, já obsoleta. Consistem na necessidade de uma ampla reforma social e educacional, com nova mentalidade, diretriz e assistência, e ainda com o melhor treinamento e reaparelhamento da polícia judiciária, com campanhas educativas freqüentes junto às novas gerações.

            Nosso País sofre uma verdadeira fúria legiferante. Faz-se lei para tudo e para todos. Se há um problema, lá vem uma lei e tudo acaba no papel. Porque não aplicar, quando possíveis, as normas jurídicas do mundo real nos casos de infração no mundo virtual.

            Ocorre, entretanto, que as leis ficam no papel. Há um divórcio, um abismo, entre a lei, a realidade e seu cumprimento e aplicação. O Direito Penal deve se restringir ao essencialmente necessário. Essa mínima intervenção deve assoalhar uma política criminal para nosso país (40).

            Devemos procurar estabelecer normas capazes de melhor regular os delitos, impondo penas e adequados modos para a sua execução, no sentido da recuperação, da ressocialização do condenado. Antes de tudo é importante que o indivíduo passe por um processo de socialização com garantia dos seus direitos enquanto cidadão nacional.

            Um dos grandes problemas para regular esse espaço cibernético, no campo do direito penal, é a dificuldade de se encontrar prova para incriminar alguém. A prova na informática é uma das questões mais polêmicas. As Convenções sobre o tema tendem a multiplicar-se no mundo inteiro, e é necessário, chegar-se a um consenso internacional sobre as regras relativas à sua admissão. É preciso abandonar o princípio rígido da prova por escrito e abrir espaço para os avanços tecnológicos (41).

            As leis penais que vigem no País são estranhas à cultura anárquica da Internet. Lá a ética é a disseminação do conhecimento e qualquer coisa que se encontra no espaço cibernético é nosso. Estabeleceu-se o socialismo digital para o qual a lei não tem defesas (42). Além disso, a Internet é um veículo de alcance mundial, não podendo ser censurada pelas leis de um só país (43). O problema maior é que os delinqüentes cibernéticos estão ignorando as noções tradicionais de direito, liberdade, privacidade, propriedade e limites de liberdade da palavra. E essas ações praticadas na rede podem comprometer a difusão do conhecimento e colocar em jogo a segurança da sociedade da informação.

            Talvez a regulamentação pode ser, aos poucos, substituída pelas campanhas, tais como: zelar pela privacidade e intimidade dos outros; honrar o dever de confidencialidade; evitar a publicação de informações que deneguem o sentimento e os bons costumes da sociedade; respeitar os direitos dos terceiros etc. Assim, o resultado dessa auto-regulamentação será a formação de uma cultura que, pouco a pouco, tomará corpo.

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Sobre o autor
Lucivaldo Vasconcelos Barros

analista de documentação da Procuradoria da República no Estado do Pará

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Lucivaldo Vasconcelos. O crime na era da inform@ção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 61, 1 jan. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3675. Acesso em: 22 nov. 2024.

Mais informações

Trabalho enviado ao IV Concurso Nacional de Monografias do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária versão 1999. Tema: Crime e Internet: prevenção e repressão.

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