O Contrato de Compra e Venda.
Importante instrumento de transferência de riqueza na sociedade.
Conceito: contrato onde uma das partes se obriga a transferir a propriedade (vendedor) de um bem à outra, recebendo de alguém (comprador), em contraprestação, determinado valor (art. 1122 CC / art. 481 NCC).
Tem por objeto coisas ou direitos. No caso de venda de direitos, recebe geralmente a denominação de cessão. O objetivo deste contrato é a transmissão da propriedade mediante pagamento de um preço.
Nos ordenamentos jurídicos há três posicionamentos diversos no que diz respeito a aquisição da propriedade através do contrato de compra e venda:
- Compra e venda é contrato real que por si só transmite a propriedade, com efeitos reais, sem que mais nada seja necessário.
- É contrato obrigacional, criando apenas a obrigação de transferir propriedade da coisa. Neste caso, o contrato é apenas o título hábil a justificar a aquisição da propriedade, que só acontece através de uma das formas previstas em lei. Tal sistema segue a orientação romana, diferenciando o título de aquisição (“títulus adquirendi”) do modo de aquisição (“modus adquirendi”), e isto porque a propriedade é direito oponível “erga omnes”, que, por isso, requer não somente o título, mas a aquisição da dela através de uma das formas previstas em lei. Este é o sistema brasileiro (art. 1126 c/c 620 e 530,I CC / art. 482 c/c 1267 e 1245, caput).
- Em outros sistemas, é necessário a realização de outro ato de vontade para transmissão da propriedade, sendo a compra e venda mero contrato de “prestar uma coisa”.
Características:
Contrato bilateral, consensual (não é necessária a entrega da coisa para reputar-se perfeito o contrato. Do contrato deriva a obrigação de entregar art. 1.126 CC / 482 NCC), oneroso, comutativo ou aleatório, execução imediata ou diferida.
Em caso de imóvel acima de certo valor, deve ser realizada mediante escritura pública, tornando-se contrato solene (art. 134,II CC / art. 108 NCC). Nos demais casos não requer forma especial (art. 129 CC / art. 107 NCC).
Difere da dação em pagamento, porque neste contrato não há obrigação anterior que o origine. Difere da troca porque a contraprestação é dinheiro e não outro bem.
Capacidade para contratar:
O contrato pressupõe que o vendedor seja capaz de alienar e que o comprador seja capaz de obrigar-se.
Em alguns casos surge a capacidade específica ou legitimação especial, que deverá ser observada, afastando algumas partes de poderem praticar o negócio.
Assim, não podem vender: I. o ascendente ao descendente (salvo se os demais descendentes anuírem. Art. 1132 CC / art. 496 caput do NCC); II- o falido (art. 40 Dec. Lei nº 7661/45) ; III – o cônjuge, sem outorga do outro, na venda de imóveis (art. 235, I CC / 1647, I NCC); IV – o condômino de coisa indivisível (não pode vender sua parte sem dar preferência ao outro condômino que queira comprá-la em igualdade de condições no negócio – art. 1139 CC / art. 504 NCC)
Não podem comprar em hasta pública as pessoas elencadas no art. 1133 CC / art. 497 NCC).
No NCC, art. 499, é válida a compra e venda entre cônjuge quando o bem alienado estiver excluído da comunhão.
No mais, funciona a regra da capacidade genérica para os negócios jurídicos.
Elementos essenciais do contrato de Compra e Venda: Coisa, Preço, Consentimento.
Reafirma-se aqui a natureza obrigacional do negócio, no sentido de que, realizado o acordo, o contrato está formado e não é possível o arrependimento. Por isso, com relação ao consentimento, vale a regra geral dos negócios jurídicos, havendo exceção tão somente no art. 134, II / 108 NCC.
Coisa: a princípio pode ser qualquer bem não excluído do comércio (corpóreo ou incorpóreo [caso em que ocorrerá a chamada cessão], presente ou futuro [contratos aleatórios – emptio rei ou emptio rei speratae. Há vedação quanto à herança de pessoa viva.], próprios e alheios [parece absurdo mas não é. O contrato é obrigacional. Se no tempo hábil conseguir adquirir a propriedade para transferi-la, o negócio se cumprirá da forma avençada. Caso contrário, resolver-se-á em perdas e danos. Venda de coisa alheia não é nula nem anulável, mas ineficaz, salvo no caso do condômino que vende a coisa comum).
Há coisas que por razões legais ou naturais estão excluídas do comércio e não podem ser vendidas.
Preço:
“sine pretio nulla venditio”
(Ulpiano)
Deve consubstanciar-se em uma soma em dinheiro. Qualquer outro bem desnatura o contrato, transformando-o em troca. Admite-se contudo que uma parte do pagamento possa ser feita com outro bem, desde que a maior importância seja paga em dinheiro.
O preço pode ser pago de uma vez ou parceladamente, mas deve ser sério e verdadeiro. Se for fictício, não há venda, mas outro contrato. Por isso, o vendedor também deve ter a intenção de exigi-lo.
Alguns sistemas legais permitem a rescisão da compra e venda quando o preço não for justo, por entenderem haver aí caso de lesão. A maioria dos sistemas, entretanto, não exige tal coisa.
O preço deve ser certo, devendo constar no contrato, mas podendo ser indeterminado no momento de sua formação. A determinação do preço pode ser feita pelas partes, por árbitro (que é na verdade terceiro, art. 1123 CC / art. 485 NCC) ou cotação do dia (art. 1124 CC / art. 486 NCC).
O preço deve ser fixado em moeda do país e não pode ser imposto por uma das partes (art. 1125 CC / art. 489 NCC).
Obrigações do Vendedor e do Comprador:
Vendedor:
- Entregar a coisa, transferindo a propriedade.
- Garantir a efetividade dos direitos sobre a coisa.
O contrato apenas obriga a transferência do domínio, e tal transferência ocorre com a tradição, que significa aqui a entrega com ânimo de transferir a propriedade, imitindo o comprador na posse. A entrega da coisa é a execução do contrato. Ver, por exemplo, art. 1130 CC / art. 491 NCC.
A entrega pode ser efetiva ou simbólica (como por exemplo a entrega “das chaves” de um imóvel.
Despesas para a tradição e os riscos da coisa correm por conta do devedor (art. 1127 e 1129 CC / art. 492, caput, e art. 490, NCC ), respondendo este, após a entrega, pelos vícios redibitórios e evicção, garantindo as qualidades da coisa.
Comprador:
A obrigação principal é de pagar o preço (art. 1122 c/c 1127 CC / 481 c/c 492 NCC), o que pode ocorrer antes ou após a entrega da coisa. Se pagar antes e não receber a coisa, por óbvio tem direito à restituição do valor pago.
Tem a obrigação de receber a coisa e se não recebe está em mora, respondendo por ela, pelas despesas com a conservação da coisa e ainda pelos riscos da coisa (art. 1127, § 2º CC / art. 492, § 2º NCC).
Riscos:
Quanto a coisa são do vendedor. Quanto ao preço do comprador.
Regra: “res perit domino” = a coisa se perde para o seu dono.
Até a tradição o dono é o vendedor, que arca com os riscos. Portanto, se a coisa perecer, perde o direito de exigir o preço, e, se já o recebeu, deve restituí-lo. Atenção: a regra é diferente em caso de mora do comprador no recebimento da coisa.
Mas se há tradição, com a colocação da coisa ao dispor do comprador, os riscos são por ele suportados. Assim também ocorre se a coisa é remetida por transportadora (art. 1127 e 1128 CC / art. 492 e 494 NCC).
Atenção: lei que define riscos é supletiva, podendo as partes dispor de forma diversa.
Quanto ao comprador, diz-se impropriamente que assume o risco do preço. Na verdade, não há risco já que o preço é dinheiro, coisa genérica que não se extingue. (art. 1131 CC / art. 495 NCC)
Com relação as coisas vendidas em conjunto, o defeito de uma não autoriza a rejeição de todas (art. 1138 CC / art. 503 NCC).
Modalidades especiais de venda:
Art. 1135 CC / art. 484, caput, NCC – venda a vista de amostra.
Art. 1136 CC / art. 500 NCC – venda de imóveis “ad mensuram” ou “ad corpus”. (no primeiro caso o preço é fixado em função da área que é elemento essencial para sua determinação – ação ex empto para redução do valor ou resolução do contrato. Mas esta ação não se confunde com a redibitória ou “quantis minoris”)(no segundo caso a medida não influi já que o imóvel é coisa certa, sem outra determinação.)
Venda pode ser condicional:
Condição suspensiva: só transfere a propriedade com o implemento da condição.
Condição resolutiva: vendedor readquire a propriedade da coisa e fica obrigado a restituir o preço pago pelo comprador.