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As prerrogativas da Administração nos contratos administrativos.

As chamadas cláusulas exorbitantes

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Resumo:


  • A Administração Pública brasileira, ao contratar com terceiros, possui prerrogativas decorrentes do regime jurídico-administrativo, justificadas pelo interesse público, que não colocam as partes em igualdade, conhecidas como "cláusulas exorbitantes".

  • Essas prerrogativas incluem a possibilidade de modificação ou rescisão unilateral dos contratos, fiscalização da execução e aplicação de sanções administrativas, entre outras, e são fundamentadas nos princípios da supremacia do interesse público e da indisponibilidade do interesse público pela Administração.

  • O Anteprojeto de Lei-Geral de Contratações da Administração Pública, que visava substituir a Lei nº 8.666/93, propôs mudanças que, após críticas, foram parcialmente descartadas, mantendo-se as disposições relativas aos contratos administrativos sem alterações significativas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4 CONCLUSÕES

a) O regime jurídico-administrativo é um conjunto de princípios do Direito Administrativo, e este se constrói sobre dois princípios básicos, quais sejam, o da supremacia do interesse público sobre o particular e a indisponibilidade do interesse público pela Administração, e sob o binômio "prerrogativas da Administração – direito dos administrados". É ainda regido por outros princípios de suma importância, como os princípios da legalidade, da finalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade, da motivação, da continuidade do serviço público, da isonomia, da impessoalidade, da publicidade e da moralidade.

b) O princípio da supremacia se traduz na superioridade do interesse da coletividade em relação ao interesse do particular, enquanto que do princípio da indisponibilidade dos interesses públicos pela Administração significa que tem o administrador o dever de resguardar o interesse público, não podendo dispor do mesmo. O agente público funciona como instrumento para o alcance e manutenção do interesse público.

c) Pode-se dizer que as prerrogativas da Administração Pública nos contratos administrativos também chamadas de "cláusulas exorbitantes", são reflexo da imposição do Regime Jurídico Administrativo, por traduzir a necessidade que a Administração tem na função de gerir bens e interesses da coletividade, de estar numa posição de superioridade em relação ao particular e de não poder dispor e nem deixar que seus agentes disponham daquilo que não são donos. Outrossim, ao mesmo tempo que existem prerrogativas da Administração Pública que a deixa em posição privilegiada em relação ao particular em função do interesse da coletividade, as restrições a que ela deve se submeter limitam suas atividades a sua finalidade e aos seus princípios que, em não sendo observados, caracterizam o desvio de poder ou de finalidade e geram a nulidade dos atos praticados pela Administração.

d) Verificava-se equivocado o texto inicial do anteprojeto da nova lei de licitações e contratos quando remetia para o próprio contrato a ser firmado pela Administração a previsão de prerrogativas do Poder Público, excluindo a existência dessas prerrogativas pela própria previsão legal. Caso o texto inicial do anteprojeto fosse aprovado, haveria comprometimento do que rege o princípio da indisponibilidade do interesse público, já que caso a Administração deixasse de prever, no instrumento contratual, determinada prerrogativa, e mais adiante essa prerrogativa se mostrasse necessária para o alcance do interesse público, não existiria a possibilidade de prevê-la. Com a Lei nº 8.666/93, e a manutenção das disposições relacionadas aos contratos administrativos no anteprojeto da nova Lei de Licitações, a existência das prerrogativas é a regra, uma vez que a própria Lei já define esta existência. Todavia, caso o texto inicial do anteprojeto fosse aprovado, haveria necessidade de previsão contratual para que as prerrogativas existissem. O regime jurídico-administrativo universal dos contratos administrativos estaria extinto, uma vez que o regime (com as prerrogativas da Administração) existiria apenas se amparado contratualmente.

e) O texto antigo do anteprojeto da nova Lei de Licitações e Contratos dividia em duas espécies de contratos a serem firmados pela Administração, os contratos administrativos propriamente ditos e os contratos privados da Administração, tentando, assim, acabar com as discussões doutrinárias sobre a nomenclatura a ser adotada para esses contratos. Contudo, entende-se que todo o contrato firmado pela Administração é administrativo, devendo ser aplicado a todos eles o regime jurídico-administrativo. Outro entendimento a acrescentar é que existem os contratos administrativos em sentido estrito (contratos administrativos propriamente ditos) e os contratados administrativos em sentido amplo (que alguns autores chamam de contratos privados da Administração), sendo que estes últimos são aqueles que sofrem maior influência do direito privado.

f) Entre as prerrogativas da Administração nos contratos administrativos, o Poder Público poderá alterar unilateralmente os contratos administrativos, quantitativa ou qualitativamente; rescindir unilateralmente o contrato administrativo; fiscalizar a execução do contratado, por um representante especialmente designado; aplicar sanções administrativas aos contratados (advertência, multas moratórias e compensatórias, suspensão temporária e declaração de inidoneidade; entre outras).


Notas

1 O texto integral do anteprojeto pode ser adquirido no site <http:www.comprasnet.gov.br>.

2 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 63.

3 Obra citada , p. 64.

4 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 61.

5 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 28.

6 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p. 34.

7 Conforme nos ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, essa distinção entre interesse primário e secundário é feita pela doutrina italiana (op. cit., p. 32-33).

8 Op. cit., p. 70.

9 Op. cit., p. 35.

10 CAETANO, Marcello. Manual de direito administrativo. 10. ed., Coimbra: Almedina, 1997, p. 577.

11 Obra citada.

12 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo. 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 507.

13 Op. cit., p. 199-200.

14 No dizer de Toshio Mukai, "contrato administrativo é o ajuste pelo qual o particular (ou outra entidade administrativa) é chamado a participar direta ou indiretamente do funcionamento de um serviço público" (Contratos públicos: as prerrogativas da administração e os direitos das empresas contratadas. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995, p. 08).

15 CAMMAROSANO, Márcio. Contratos celebrados por empresas estatais - regime jurídico. Informativo de Licitações e Contratos (ILC) nº 15, maio/95.

16 Jessé Torres Pereira Junior, citando Raúl Enrique Granillo Ocampo, aduz: "Não fossem as prerrogativas que enunciam os incisos, e a Administração contratante quedar-se-ia em posição de rigorosa igualdade subjetiva em relação ao contratado (todo contrato deve garantir a igualdade objetiva entre as partes), o que não distinguiria o regime jurídico dos contratos públicos do regime dos demais contratos. Assim, Estados, Municípios, Distrito Federal e entidades da Administração indireta não poderão expedir normas derrogadoras dessas prerrogativas; admitir que pudessem fazê-lo equivaleria a autorizá-lo a restaurar nos contratos públicos, contra a lei e o sistema de direito público, o regime jurídico dos contratos de direito privado, destruindo a especialização que aqueles destaca e de molde a ignorar a superioridade do interesse público, ontologicamente necessária" (Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 600).

17 Op. cit., p. 40.

18 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, et al. Temas polêmicos sobre licitações e contratos. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 229.

19 Op. cit., p. 467.

20 SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 199-203.

21 PLATE, Luis Enrique Chase. Los contratos de derecho publico. Disponível em: <http:/www.bidding.com.br> Acesso em: 27.08.2001. Nossa tradução. Texto original: "La tendencia predominante de la legislación, se inclina a estabelecer un régimen jurídico próprio de los Contratos Administrativos. En este sentido, los contratos que celebre la Administración pueden tener carácter administrativo o carácter privado".

22 Obra citada. Nossa tradução. Texto original: "La doctrina francesa sustenta la tesis de la existencia de dos categorías de contratos; dentro del género de los Contratos de la Administración: la especie denominada ‘contrato administrativo’, diferente de los ‘contratos del derecho común’".

23 Obra citada.

24 ENTERRIA, Eduardo Garcia de & FERNANDEZ, Tomas-Ramon. Curso de derecho administrativo. Madrid: Civitas, v. I, 1997, p. 676.

25 Definição do anteprojeto, suprimida após as sugestões e críticas: "Art. 130 Os contratos administrativos caracterizam-se pelo regime jurídico de prerrogativas conferidas à Administração, conforme definido nesta Lei. Parágrafo único. As normas de direito privado aplicam-se subsidiariamente aos contratos administrativos".

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26 Definição do anteprojeto, suprimida após as sugestões e críticas: "Art. 131 Os contratos privados da Administração regem-se por normas de direito privado, sujeitando-se aos mecanismos de controle e fiscalização inerentes à atividade da Administração e às disposições gerais presentes neste Capítulo".

27 Em 09.06.2002, no VIII Encontro Nacional de Comissões de Licitação, Curitiba/PR.

28 Outro exemplo utilizado pelo autor é o caso do Nescau, da Nestlé, que não é vendido para a Administração Pública Brasileira por recusa da própria Nestlé, por causa do risco, já que essa empresa tem um grande mercado entre os particulares brasileiros.

29 Em outro exemplo, o doutrinador questiona o motivo relevante para o interesse público no caso de compra de lápis, de a Administração poder modificar unilateralmente para acrescer ou suprimir o objeto em 25% do valor inicial. Informa que se a Administração vai licitar 10 milhões de lápis, mas pode ficar apenas com 8 milhões, o fornecedor, verificando essa hipótese, vai aumentar seu preço, o que ele não faria se soubesse que iria contratar 10 milhões e fosse entregar 10 milhões de lápis.

30 Op. cit., p. 549.

31 Obra citada. Nossa tradução. Texto original: "tengan por efecto conferir a las partes derechos o imponerles obligaciones extrañas por su naturaleza a las que son susceptibles de libre consentimiento entre dichas partes dentro del marco das leyes civiles y comerciales".

32 Op. cit., p. 46.

33 Op. cit., p. 65-66.

34 CRETELLA JÚNIOR, José. Dos contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 37.

35 Op. cit., p. 201.

36 RIVERO, Jean. Direito administrativo. Coimbra: Livraria Almedina, 1981, p. 136.

37 ARAÚJO, Edmir Netto de. Contrato administrativo. São Paulo: RT, 1987, p. 73.

38 "Art. 58 O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:

I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;

II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei;

III - fiscalizar-lhes a execução;

IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;

V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo." (Grifamos.)

39 BAZILLI, Roberto Ribeiro. Contratos administrativos. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 23.

40 Op. cit., p. 41-43.

41 Op. cit., p. 137-138.

42 Mesmo autor e obra, p.138.

43 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 7. ed. São Paulo: Dialética, 2000, p. 505.

44 É mister lembrar que somente o Chefe do Executivo tem o condão de declarar um imóvel, para fins de expropriação, como de utilidade pública, necessidade pública ou de interesse social (art. 6º do DL nº 3.365, de 21.06.41).

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Sobre os autores
Tarso Cabral Violin

advogado, assessor jurídico da Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social do Paraná (SETP), professor de Direito Administrativo do Centro Universitário Positivo (UnicenP), ex-integrante da Consultoria Zênite, pós-graduado no Curso de Especialização em Direito Administrativo pelo Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos (IBEJ), mestrando em Direito do Estado na UFPR

Mônica Oldani Taborda

membro da Câmara de Mediação e Arbitragem (ARBITAC) da Associação Comercial do Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIOLIN, Tarso Cabral ; TABORDA, Mônica Oldani. As prerrogativas da Administração nos contratos administrativos.: As chamadas cláusulas exorbitantes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 62, 1 fev. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3699. Acesso em: 23 dez. 2024.

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