Crimes contra a vida: infanticídio

12/03/2015 às 21:01
Leia nesta página:

Crimes Contra a Vida: Infanticídio

Infanticídio

Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após:

Pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

 Na verdade o infanticídio é uma modalidade privilegiada de homicídio, ele deveria ter sido assim tipificado. O infanticídio foi tipificado como um tipo autônomo. Ele é o homicídio praticado pela mãe, quando mata o próprio filho logo depois do parto sob influência do estado puerperal. Ele tem pena de 2 a 6 anos, uma redução de pena, porque nessa situação revela-se uma diminuição na culpabilidade no homicídio, na reprovabilidade desse comportamento. Isso porque a mãe está sob influência do estado puerperal e por se encontrar neste estado ela sofre uma série de transformações que a impede de ter a mesma lucidez que teria no seu estado normal. Logo, devido essa diminuição da capacidade do entendimento da pessoa é que justifica a diminuição da pena nesse crime.

Mas esse crime deve ser praticado pela mulher efetivamente sob a influência do estado puerperal. Quem é que vai dizer se a mulher estava ou não sob influência do estado puerperal? O perito. E se a perícia médica determinar que a mulher estava totalmente transtornada naquele momento, ou seja, ela não tinha a mínima condição de saber o que fazia, por qual crime ela responde? Nenhum, pois vamos usar o art. 26 CP.

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Se ela era totalmente incapaz de saber o que fazia, não responde por nada.

A influência do estado puerperal não tem duração.

Se uma mulher mata o próprio filho sob a influência do estado puerperal depois de 1 mês, ela responde por homicídio ou por infanticídio? Embora o infanticídio seja um homicídio, ele é um tipo autônomo. Ela responde por homicídio c/c  art. 26 do CP. O infanticídio não é só matar o próprio filho sob a influência do estado puerperal, se assim fosse, ele seria possível de se caracterizar 2 anos após o parto. Se só a influência do estado puerperal fosse necessária para haver um infanticídio, nós não teríamos a elementar temporal “logo após”.

O que seria o logo após? A lei não delimita, a doutrina não traz explicação, então isso coube a jurisprudência, que entende que seria um período de 7 dias.

É errado dizer que o infanticídio é enquanto dura o estado puerperal, se assim for, vai ser jogada a elementar temporal “logo após” no lixo.

Mas se a mulher está sofrendo ainda a influencia do estado puerperal comprovado por laudo médico 1 mês após o parto ela vai responder por homicídio? Sim. Mas isso não é injusto? Não.

Pergunta: Ela terá o perdão judicial? Não, só cabe o perdão judicial para homicídio culposo. 

Então qual é a forma, o dispositivo legal que deve ser levantado para não haver uma desproporcionalidade? Qual é a razão pela qual o infanticídio tem uma pena menor que o homicídio? Diminuição do discernimento, da reprovabilidade, da culpabilidade, pois a mulher sofre essa redução em razão do estado puerperal. O que acontece quando uma pessoa tem diminuída a capacidade de discernimento? Art. 26, parágrafo único.

Redução de pena

Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Portanto: se até 7 dias após o parto a mulher sob estado puerperal mata o filho, qual é o crime? Infanticídio, cuja pena varia de 2 a 6 anos. E se 1 mês após o parto a mulher ainda sob estado puerperal mata o filho, qual é o crime? Homicídio, com pena de 6 a 20 com uma diminuição de 2/3. Se pegar a pena mínima de 6 anos e reduzir 2/3, a pena mínima será de 2 anos, ou seja, igual a pena do infanticídio. Se pegar a pena máxima de 20 anos e reduzir 2/3, a pena máxima ficará em torno do prazo máximo da do infanticídio.

Logo, não há injustiça alguma, pois a pena fica praticamente igual. O errado foi colocar o infanticídio como tipo autônomo.

Atenção, o infanticídio é em relação ao nascente ou o recém-nascido e não qualquer outro filho que a própria mulher tenha. Portanto, se sob estado puerperal a mãe mata o filho, não se trata de infanticídio. A mãe vai responder por homicídio com a diminuição do art. 26, p.ú., porque ela estava com diminuição do discernimento. Todavia tem um julgado dizendo que pode ser qualquer outro filho, pois se a lei não fez distinção, não cabe a nós fazermos.

Se a mulher sob estado puerperal mata o filho de outra pessoa pensando ser seu filho? Ela responde também por infanticídio, em razão art. 20, § 3º CP. Ela vai responder pela morte daquele que ela queria matar.

Se uma pessoa mata uma criança pensando ser seu filho, ela responde por homicídio, art. 20, § 3º.

O infanticídio deveria ter sido previsto como uma causa de diminuição de pena do crime de homicídio. Mas não, o infanticídio foi previsto pelo nosso legislador como um tipo autônomo. Assim temos no art. 123 o crime do infanticídio, em que ser mãe e estar em estado puerperal se caracterizam elementares do crime. Por isso temos alguns problemas na solução desse crime.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Porque aquilo que deveria ter sido previsto como uma causa de diminuição somente beneficiaria a mãe em estado puerperal.  Em verdade foi previsto como tipo autônomo, aí o fato de ser mãe e estar em estado puerperal se caracterizam como elementares, o que faz com que se comuniquem, então isso não beneficia só a mãe.  Assim se um terceiro ajuda a mãe a ceifar a vida do filho, ele responde por infanticídio como a mãe. Essa é a única solução possível diante da regra do art. 30.

Circunstâncias incomunicáveis

Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.

Situações possíveis:

1ª - O terceiro participa do crime da mãe, ou seja, a mãe executa e terceiro só ajuda à A mãe responde por infanticídio e o terceiro como partícipe de infanticídio, em razão da regra do art. 30 CP.

2ª - Mãe e terceiro executam o crime à Ex.: A amante do pai se aproveita do estado puerperal e elas executam o assassinato do bebê juntas. As duas respondem por infanticídio. Isso demonstra como o legislador fez besteira ao colocar o infanticídio como tipo autônomo, o que faria com que só a mãe respondesse por infanticídio.

Há quem pense que a mãe deve responder por infanticídio e o 3º por homicídio. Essa corrente vislumbra a injustiça dessa solução dada pelo legislador. Mas como essa posição da doutrina faz para rebater o argumento do art. 30 e fazer com que a mãe e terceiro responda por crimes diferentes? Nelson Hungria fez distinção das circunstâncias pessoais e das circunstâncias personalíssimas. Ser mãe e estar em estado puerperal são circunstâncias personalíssimas, portanto não se comunicam. Desta forma a mãe responderia por infanticídio e o terceiro por homicídio

3ª - O terceiro executa com a ajuda da mãe à Em verdade qual é a conduta principal? A do terceiro. E o que ele praticou? O terceiro cometeu homicídio. E em verdade a mãe é partícipe do homicídio. A mãe estava sob estado puerperal e o terceiro se aproveita disso. Em verdade a mãe é partícipe do crime de homicídio, mas há sentido em ela participar e responder com pena de 6 a 20? A doutrina diz que não, portanto neste caso ela responderia com a pena do infanticídio. Logo, ela participou de um homicídio, mas responderia com a pena do infanticídio.

Essa discussão permanece há 60 anos.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Raphael Lopes Costa Bezerra

Formado no Curso de Graduação em Direito da Escola de Ciências Jurídicas do Centro de Ciências Jurídicas e Políticas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UniRio.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos