Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 3.273 e os problemas da Nova Lei do Petróleo

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Questiona a possibilidade de empresas privadas, mediante autorização da ANP, realizarem a exportação ou importação de hidrocarbonetos. Discutindo também a inconstitucionalidade de conceder a propriedade do petróleo ou gás natural a particular.

RESUMO

O presente artigo trata sobre a ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.273) e questiona a possibilidade de empresas privadas, mediante autorização da ANP, realizarem a exportação ou importação de hidrocarbonetos. Discutindo principalmente sobre a inconstitucionalidade de conceder a propriedade do petróleo ou gás natural a particular.

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 3.273 e os problemas da Nova Lei do Petróleo

A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 3.273 foi levada a julgamento, em setembro de 2004, perante o plenário do Supremo Tribunal Federal. A ação, proposta pelo governador do estado do Paraná a época, pretendia a suspensão de dispositivos da Lei nº 9.478 de 6 de agosto de 1997, também conhecida como nova lei do petróleo sancionada pelo então presidente da república Fernando Henrique Cardoso. Tal lei revoga a antiga legislação que dispunha sobre a política nacional petrolífera, a de nº 2004 de 1953 de Getúlio Vargas.  A nova lei nº 9.478 passa a permitir que, além da Petrobrás, outras empresas constituídas sob as leis brasileiras e com sede no Brasil passem a atuar em todos os elos da cadeia do petróleo - from well to wheel, ou seja,  do poço ao posto - em regime de concessão ou mediante autorização do poder concedente - a União. Até o advento desta lei, outras empresas só podiam atuar no downstream isto é, apenas na venda dos derivados do petróleo. Com o advento da nova legislação a Petrobras perdeu o monopólio da exploração e do refino de petróleo no Brasil. Resumidamente, podemos afirmar que denominada “Lei do Petróleo”, que tinha por objetivo instituir uma nova política energética nacional, acabou por afrouxar e flexibilizar o monopólio estatal sobre o petróleo. Criou-se, também a partir dela, o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional de Petróleo – A ANP.

A ADIN questiona, portanto, a possibilidade de empresas privadas, mediante autorização da Agência Nacional do Petróleo, realizarem a exportação e/ou importação desses hidrocarbonetos, além disso, argue-se, sinteticamente falando, que a previsão contida no caput do artigo 26, dentre outros da referida lei, é inconstitucional por conceder a propriedade do petróleo ou gás natural ao particular que na condição de concessionário tivesse realizado a extração por sua conta e risco.

Partindo de tal premissa, estaria a Constituição Federal sendo contrariada nos referidos aspectos:

1. soberania, como princípio do fundamental da República brasileira (Art. 1º, I);

2.   divisão tripartite do poder estatal (Art. 2);

3. independência nacional enquanto princípio a ser resguardado nas relações com os demais países (Art. 4º, I); (iv) previsão de recursos naturais, inclusos os minerais, como bens da União (Art. 20, V e IX); (v) os princípios da ordem econômica (Art. 170); e

4. monopólio da União quanto às lavras de petróleo, gás natural e demais hidrocarbonetos, assim como sua importação e exportação.

Para tanto, fechando o contexto geral em que se pautou tão relevante discussão judicial, defendendo a validade da Lei nº 9.478/1997, o Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso argumentou que diante da alteração trazida pela Emenda Constitucional nº 9/1995, a qual retira a vedação a cessão ou concessão de participação na exploração petrolífera, não haveria fundamento à demanda em apreço.

Dirigidos pelo voto do ex-ministro Eros Grau, ao tempo do julgamento, a maioria do Pretório Excelso entendeu ser improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade e, por consequência, constitucional a possibilidade de empresas particulares tornarem-se proprietárias das reservas de petróleo que extraíssem. O entendimento os julgadores dessa corrente deu-se baseado nos seguintes argumentos:

  1. Existência de uma distinção entre atividade e propriedade, de forma a permitir que o domínio privado do produto da lavra de petróleo e gás natural não ofenda o monopólio trazido pela Constituição.

 

  1. A transferência da propriedade do produto da lavra ao concessionário teria sido autorizada pela Emenda Constitucional nº 9/1995.

 

  1. A propriedade discutida não seria plena, pois submetida às disposições do Conselho Nacional de Política Energética e Agência Nacional do Petróleo.

 

Foi vencida, então, a posição do relator, Ministro Carlos Ayres Britto, segundo o qual, apesar das tentativas de flexibilizar o monopólio estatal quanto ao petróleo (dentre outros hidrocarbonetos), o núcleo duro, trazido pelo Constituinte em 1988 restava inalterado. Esta posição sintetiza-se na seguinte frase do Relator: “Todo o complexo do setor petrolífero está monopolizado a partir das jazidas, depósitos, lato sensu, de minérios”.

 

Entendemos que a decisão pela improcedência da ADIn em análise trouxe aspectos negativos à soberania e à ordem econômica ao entender que o produto da exploração fosse mantido nas mãos do agente que o extraísse, no caso, o setor privado. Contudo, isto debilitaria a fiscalização e controle do excedente pelo poder estatal, de modo que a concessionária poderia servir-se de um modo de extração economicamente vantajoso, mas, simultaneamente, poderia ela utilizar um método de extração imprudente, fazendo com que as jazidas chegassem drasticamente à escassez.

 

Ou seja, ao contrário do que manifestou o Ministro Eros Grau em seu voto, e considerando que a Constituição de 1988 agregou uma sucessão de conflitos sociais, o entendimento no sentido de que a propriedade do produto extraído das jazidas pertence àquele que o extrai não mereceria ser mantido, pois se encontra em completa discrepância com as ambições impressas na Constituição Federal, tendo em vista que poderia resultar, eventualmente na mercantilização desatinada de um setor estratégico de enorme magnitude à população e cujo elemento é finito. Ou seja, o petróleo é um bem cuja exploração deve atender ao interesse da população e não se tornar produto de exportação como qualquer outra commoditie.

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Igualmente, sobre a interpretação conferida aos dispositivos analisadas na Adin em questão, menciona-se o artigo escrito pelo Prof. Dr. Gilberto Bercovici e Luiz Fernando Massonetto, o qual destaca que “A constituição financeira passou a ser interpretada e aplicada como se fosse ‘neutra’, meramente processual, com diretrizes e lógica próprias, separada totalmente da ordem econômicas e social, esterilizando, assim, a capacidade de intervenção do Estado na economia.”.

 

Pelo que se extrai da perpetuação do referido entendimento, quando a propriedade do produto extraído escapa à propriedade e ao controle estatal, dificilmente o usufruto do excedente desta riqueza se converterá em prol do desenvolvimento do país e da construção de um Estado do Bem-Estar Social.

 

Neste mesmo contexto, cita-se o texto do Prof. Dr. Alessandro Octaviani[1] e a ênfase deste para a necessidade de endogeneização do progresso técnico e eliminação das assimetrias sociais como forma de superação do subdesenvolvimento. Contextualizando com a discussão trazida pela Adin 3.273, a transferência ao particular do procedimento de extração e, por conseguinte, da titularidade do produto extraído, confronta com a assertiva de que é necessário incorporar o progresso técnico e mitigar as desigualdades sociais.  

 

Isto porque ao deslocar a extração ao hipotético parceiro privado, abre-se mão pelo Estado do desenvolvimento de tecnologias próprias atinentes ao setor, já que este se encontra sob operação de empresas do setor privado.

 

Entendemos que o julgamento de improcedência da Adin em questão refletiu negativamente em aspectos negativos com relação à soberania e manter utilizar a riqueza do petróleo voltada para o desenvolvimento nacional.  a fim de mais adequado considerando.

 

No tocante às desigualdades sociais, conforme dito, a sistemática adotada permite com que o Estado permaneça vulnerável com relação à exploração de um bem que lhe pertence e que é considerado de interesse público, portanto, as quais pertencem à União mercantilização de um setor estratégico.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

OCTAVIANI, Alessandro in “A Benção de Hamilton na Semiperiferia: Ordem Econômico-Social e os Juros da Dívida Pública Interna”.

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Sobre o autor
Álvaro Henrique S Camões Vieito Padilha

Estudante de Direito da Universidade Mackenzie de São Paulo.

Informações sobre o texto

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