Capa da publicação Terceiro setor: comunidade fortalece políticas públicas
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A importância do terceiro setor no Brasil

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Como a Constituição de 1988 fortaleceu o terceiro setor nas políticas públicas? O texto analisa incentivos legais e a atuação das entidades sociais no interesse coletivo.

Palavras-chave: terceiro setor; constituição; cooperação; políticas públicas; integração; democracia; participação; garantias individuais; interesse social; Estado.


Introdução

Este trabalho tem por objetivo abordar a presença do terceiro setor nas relações sociais atuais, em análise às previsões constitucionais que instrumentalizam a execução de projetos sociais por meio de incentivos fiscais do Estado.

As entidades sociais, protegidas pela Constituição Federal Brasileira de 1988, crescem cada vez mais e desenvolvem funções primordiais de caráter social.

Se, antes, tínhamos um cenário jurídico favorável à centralização da promoção social pelo Estado, hoje podemos perceber a abertura constitucional para a execução de políticas públicas pelas entidades sociais.

As associações, as OSCIPs e os institutos passam a ter um papel importante na sociedade, no sentido de levar os projetos sociais para as comunidades, estando próximos a elas e entendendo suas necessidades locais.

Sendo assim, veremos as previsões da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que possibilitam a emergência do terceiro setor e a importância dessa progressão para a efetivação de políticas públicas e, consequentemente, dos direitos fundamentais.


A importância do terceiro setor no Brasil

Os saberes esculpidos em toda a Carta Magna pelo poder constituinte brasileiro de 1988 tornaram-se públicos e disseminados por todo o ordenamento jurídico, aos gritos e clamores de uma sociedade que protestava por democracia, direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.

Após muitos traumas sociais deixados pela “Era da Ditadura Militar”, a promulgação da Constituição da República foi um marco disciplinar no cenário do Direito brasileiro.

Surge uma nova ordem mundial em que o Estado de Bem-Estar Social de Direito, marco teórico falido, começa a demonstrar suas insuficiências em executar e regular os serviços para a população, dando lugar a um novo setor, composto pelas entidades e pela sociedade civil, chamado terceiro setor.

Os progressos históricos e sociais elevaram a consciência da sociedade não apenas como polo de direitos e garantias, mas também como principal agente responsável pela manutenção da democracia.

O Estado máximo se reduz, e a comunidade ganha oportunidades, na Carta Constitucional, para a execução de ações comunitárias e o surgimento de novas instituições que atuem em prol do interesse social.

As ações comunitárias, desenvolvidas muitas vezes pelos próprios moradores das regiões atendidas, submetem projetos de desenvolvimento aos ministérios, os quais são financiados por meio de incentivos fiscais assegurados constitucionalmente.

Para isso, o terceiro setor é organizado por entidades sociais que definem projetos estruturais e, por meio deles, executam ações que visam suprir a ausência do Estado, efetivando, por exemplo, direitos como a educação, o esporte, o lazer e a saúde.

Segundo Fernandes (1994, p. 21) e Fischer, o conceito de terceiro setor deve ser entendido como:

...um conjunto de organizações e iniciativas privadas que visam à produção de bens e serviços públicos. Este é o sentido positivo da expressão. “Bens e serviços públicos”, nesse caso implicam uma dupla qualificação: não geram lucros e respondem a necessidades coletivas.

“Organizações privadas, sem fins lucrativos, cuja atuação é dirigida a finalidades coletivas ou públicas”. Fischer, R.M (2002)

As entidades do terceiro setor vêm suprir as carências que o Estado não supre ou para as quais não é suficiente.

Nesse sentido, o Estado apoia e estimula o desenvolvimento do terceiro setor com base em sua previsão como incentivador e fomentador das atividades de cooperação:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

O parágrafo segundo prevê o dever de o Estado apoiar o cooperativismo e as formas de associativismo:

§ 2º - A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.

O texto da CF/88 incentiva o desenvolvimento e a expansão de entidades públicas sem fins lucrativos, com a finalidade de aproximar a sociedade civil das próprias necessidades de políticas públicas.

Observa-se a previsão do fomento à prática esportiva e da destinação de recursos a entidades e associações esportivas como dever do Estado:

Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:

I - a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento;

II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento.

Com fulcro nessa previsão constitucional, a Lei de Incentivo ao Esporte (Lei nº 11.438) dispõe sobre incentivos e benefícios para fomentar as atividades de caráter desportivo.

Consoante o previsto na referida norma:

Art. 1º (...) poderão ser deduzidos do imposto de renda devido, apurado na Declaração de Ajuste Anual pelas pessoas físicas ou em cada período de apuração, trimestral ou anual, pela pessoa jurídica tributada com base no lucro real os valores despendidos a título de patrocínio ou doação, no apoio direto a projetos desportivos e paradesportivos previamente aprovados pelo Ministério do Esporte. (Grifos nosso)

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Assim, as ONGs, OSCIPs e associações elaboram projetos que são submetidos ao Ministério do Esporte, órgão responsável por regularizar suas inscrições.

Uma vez aprovados os projetos, as entidades iniciam a captação de recursos junto às empresas do segundo setor, aportando os valores reservados nos impostos.

Quanto à cultura, o artigo 215, § 2º da CF/88 prevê a concessão de incentivos à cultura por meio de lei específica.

§ 3º - A lei estabelecerá incentivos para a produção e o conhecimento de bens e valores culturais.

Ainda a CF/88 protege:

Art. 216-A. O Sistema Nacional de Cultura, organizado em regime de colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui um processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais.

A Lei nº 8.313, chamada de Lei Rouanet, instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) e, no artigo quarto, prevê o Fundo Nacional de Cultura para a captação de recursos destinados à execução de projetos sociais.

Art. 4° Fica ratificado o Fundo de Promoção Cultural, criado pela Lei n° 7.505, de 2 de julho de 1986, que passará a denominar-se Fundo Nacional da Cultura (FNC), com o objetivo de captar e destinar recursos para projetos culturais compatíveis com as finalidades do Pronac. (Grifos nosso)

Esses dois exemplos de incentivo do Estado ao terceiro setor demonstram como o texto constitucional é inovador. Abre-se um grande leque entre as entidades para a promoção de novos projetos sociais, possibilitando-lhes a captação de recursos em parceria com o governo, por meio dos Ministérios da Saúde e do Esporte.

O fato é que, hoje, o terceiro setor já representa 5% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, gerando uma receita de R$ 20 bilhões e 1,5 milhão de oportunidades de trabalho.

Ressalta-se o predomínio da ação comunitária sobre a ação estatal no cenário social brasileiro, o que oportuniza a efetivação de muitos direitos fundamentais, tais como o lazer, a saúde, o esporte, a cultura, o trabalho, dentre outros.

As associações, as OSCIPs e os institutos, a partir da Constituição Federal de 1988, ganham espaço no cenário nacional por meio das previsões que lhes possibilitam a captação de recursos do próprio Estado, sendo possível perceber a ascensão desse novo setor na economia.

Além disso, passam a ter um papel importante na sociedade, no sentido de atender às carências de oportunidades esportivas e culturais nas comunidades de baixa renda.

Sendo assim, resta claro que a tendência do cenário nacional é que o terceiro setor cresça e ganhe mais credibilidade no país, pois as atividades desenvolvidas pelas entidades já são reconhecidas pela sociedade civil.

A cada dia, nascem novas instituições capacitadas para a formalização de convênios e captação de recursos junto aos governos federal, estaduais e municipais.

Espera-se que, em um futuro bem próximo, ocorra, efetivamente, a substituição do predomínio do Estado pela hegemonia do interesse social, por meio da ação comunitária e da execução de políticas públicas pelo terceiro setor.


Referências bibliográficas

FM Fischer, LR Teixeira, FN da Silva Borges- Cad. Saúde. 2002 - SciELO Brasil

MATOS, Hélio de Carvalho. Instituto Brasileiro de Terceiro Setor – IBTS - Brasília – DF - Site: www.ibts.kit.net.

PILLER, Fernando. O terceiro setor e o futuro das cidades. Disponível em: https://www.rumosustentavel.com.br/o-terceiro-setor-e-o-futuro-das-cidades/

TACHIZAWA, Takeshy. Organizações não governamentais e terceiro setor: “Criação de Ong’s e estratégias de atuação” – 5ª edição – São Paulo: Atlas, 2012.

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Sobre as autoras
Daniela Moreira de Souza

Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, foi pesquisadora e bolsista FAPEMIG (2011), monitora de Direito Constitucional II (Julho de 2011 a novembro de 2012), coordenadora do Núcleo de Pesquisa Acadêmico da Puc Minas (NAP), diretora do IICCP (Instituto de Investigação Cientifica em Constituição e Processo) e extensionista na APAC - Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (março de 2012 a julho de 2013). OAB em Direito Penal, OAB/MG 148.192. Cursando o mestrado em Direito Penal/ PUC Minas

Leila Moreira de Souza

Analista jurídica do Ministério Público de Minas Gerais. Formada pela Universidade Federal de Minas Gerais

Isabella Fonseca Alves

Mestranda em Direito Processual pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Bacharel em Direito pela Faculdade Mineira de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas- núcleo Praça da Liberdade), monitora de Direito Processual Civil III (março de 2012 a novembro de 2012), pesquisadora do Instituto de Investigação Científica Constituição e Processo, extensionista na APAC - Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (março de 2012 a julho de 2013). <br>

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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