Recentemente li com preocupação um acordão da 5º Turma do Superior Tribunal de Justiça, através do RHC 45.589-MT, Rel Min. Gurgel de Faria, julgado em 24/02/2015. Resumindo a decisão torna válida uma forma de depoimento de vítima (criança ou adolescente) geralmente um psicólogo através de perguntas indiretas, essas vítimas são em sua grande maioria violentadas sexualmente e sobre o fundamento de se extrair a verdade e não lhe causar constrangimento através de um depoimento formal se faz em sala separa, a qual o Juiz, as Partes e defensor podem acompanhar instantaneamente através de videoconferência. Essa prática, embora seja uma saída inteligente, não possui previsão em Lei, e acredito que fere mortalmente o direito de defesa e contraditório do acusado. Explico:
“Nadem Coll, uma americana que iniciou seu tratamento para depressão utilizando de psicotrópicos e hipnose. Foi diagnosticada com Transtorno de Personalidades Múltiplas, sendo estabelecido que possuía 126 personalidades, dentre elas as de uma viciada em heroína, de noiva de Satã e, até mesmo, de um pato. Seu psiquiatra também afirmou que tinha sido sexualmente violentada na infância e participada de rituais satânicos com assassinatos de bebês, e canibalismo, nos quais seu pai era líder do culto (...) A paciente processou o terapeuta e conseguiu um acordo de 2,4 milhões de dólares num julgamento em que várias ex-pacientes do psiquiatra testemunharam, referindo que suas histórias tinham bastante similaridade com o drama de Nadean”. (TRINTADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica para operadores do Direito. 7. Ed. ver. Atual. E ampl. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Edtora, 2014, pág. 216).
O fato acima retrata a Síndrome das Falsas Memórias, a qual foram fabricadas ou manipuladas, na mente da pessoa, a qual noticiam fatos que são inverídicos.
O caso é extremamente complexo! Pois a Síndrome das Falsas Memórias não possui catálogo no (DSM-5), muito menos a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), os quais são utilizados como parâmetro em questões ligadas a doenças mentais.
Acredito, que para que o Depoimento sem Dano seja válido no Curso do Processo deve-se assegurar o réu o direito de contratação de assistente técnico, que atuará em conformidade com a previsão do art. 159, § 4º do Código de Processo Penal, caso contrário, seria uma prova estritamente inquisitiva na fase processual, o que não é aceitável.
Além disso, majoritariamente, se entende que o assistente técnico é permitida sua atuação somente na fase processual, entretanto, neste caso de violência sexual de menores, que não deixam vestígios e sem outras testemunhas, deve-se dar uma interpretação extensiva à norma alhures e estender para a fase do Inquérito Policial, para que se evite o que chamo de “indiciamento social” como o que ocorreu com o conhecido caso “Escola Base”, a qual os donos da escola foram acusados injustamente de terem abusado sexualmente de várias crianças, a escola fechou, foi depredada, a mídia divulgou amplamente o caso, ao final ficou provado que as crianças inventaram a estória e, portanto que o fato não era verídico.
Acredito, que o Legislador Ordinário, desta vez, cumpriu bem seu mister ao etiquetar como Crime Hediondo o Estupro de Vulnerável, art. 217-A do Código Penal, fazendo valer o Hipermandamento Constitucional de Criminalização prevista no art. 227, § 4º da Constituição Federal.
Agora, cabe aos operadores do direito agirem com cautela, primeiramente em não expor a possível, vitima vulnerável, em segundo lugar deve-se assegurar ao investigado a possibilidade de acompanhar o Depoimento sem Dano, com o fito de evitar que perguntas sugestivas sejam realizadas ao vulnerável lhe induzindo a uma manifestação que não seja a verdadeira.
Infelizmente, esse crime é sorrateiro, praticado na maioria das vezes sem testemunhas, e quando não deixam vestígios e nem testemunhas, deve-se realizar uma investigação pregressa na vida do investigado ou acusado, embora tais fatos não sejam suficientes para um decreto condenatório.
Para ser sincero, prefiro, com pesar, ver um delinquente desta estirpe não condenado, do que colocar na masmorra um inocente.