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A responsabilidade civil do advogado e o código consumerista

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01/03/2003 às 00:00
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5. RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR VÍCIO DO SERVIÇO ADVOCATÍCIO

Uma interpretação de norma jurídica deve guardar correspondência mínima com o texto legal. Mas também, deve-se ater ao bem comum, aos fins sociais que se destina a lei, à vontade da norma, a todo o sistema normativo e, enfim, a questões históricas. Ademais, uma lei ordinária tem de ser promulgada para atender aos reclamos da Constituição, norma diretiva ápice de conduta de toda a nação. Se a aplicação da lei infra-constitucional redunda em escapar dos ditames preconizados pela Constituição, então ela se mostra inconstitucional, ou não recepcionada.

Nessa senda, a exceção do profissional liberal consagrada para a responsabilidade civil objetiva referida no Código do Consumidor é relacionada exclusivamente ao fato do serviço, ou seja, quando o serviço causar dano à pessoa ou ao patrimônio do consumidor. Comprometer-se-ia a defesa do consumidor se, para exercer as alternativas em caso de vício do serviço (reexecução do serviço, restituição da quantia paga ou abatimento proporcional do preço), dependesse de verificação de culpa do profissional (Cf. Paulo Luiz Netto Lôbo, Responsabilidade por vício do produto ou do serviço, Brasília, Ed. Brasília Jurídica, 1996, p. 60).

Contudo, semelhante deslinde não se vê quanto à responsabilidade por vício do serviço (defeito de inadequação, oculto ou aparente) do advogado ou de qualquer profissional liberal. Em casos que tais, ante a ausência expressa da exceção, mostra-se idêntico o tratamento dispensado aos demais fornecedores de serviços. A regra de exceção, prevista no § 4º do artigo 14 do Código do Consumidor, não alcança as hipóteses de vícios do serviço, previstas nos artigos 18 e seguintes, em prejuízo do consumidor. Compreende-se que em se tratando de dano, impõe-se a verificação da culpa. Não porém quanto ao vício.

O vício é a inexecução intrínseca da obrigação. Não se exterioriza, não se reflete. O que vem junto com ele é acessório, podendo ser traduzido em perdas e dano. Este não é conseqüência, mas característica da própria execução defeituosa. A responsabilidade por vício é objetiva, não envolve necessariamente indenização por dano nem verificação de culpa. A pensar desse modo, muitos dos exemplos conhecidos de responsabilidade civil subjetiva do advogado se tornam, pelo comando consumerista, como responsabilidade objetiva.

Frise-se, porém, que essa lacuna da Lei Consumerista não pode ser aplicada com descuidado elastério, pois não se pode olvidar que os profissionais liberais têm uma atividade específica, personalíssima, em regra de obrigação meio. Dessa forma, a aplicação dessa linha de pensamento tem de ser de forma razoável, equânime e cautelosa.


6. CONCLUSÕES

O vínculo jurídico entre advogado e cliente se dá essencialmente através do instrumento de mandato e, junto com ele, do contrato de prestação de serviços, no qual encontram-se as principais disposições da responsabilidade civil do advogado. Pelo contrato, fundado essencialmente na confiança e na pessoalidade, não se tem como exigir que a atividade produzida atinja fim certo e determinado, daí porque em regra não se pode pleitear indenização do advogado por não haver obtido êxito na pretensão, pois tal não é o dever do profissional liberal, que tem, isso sim, dever de diligência e perícia.

Mas, todo e qualquer negócio, parece-nos óbvio, só é constituído à vista da finalidade; o fim almejado e a que se destina a contratação, que nada mais é que o resultado pretendido. Poucos, quase inexistentes, são os que procuram um advogado em razão da excelência dos meios por ele empregados. Deve-se distinguir "resultado provável com o resultado necessariamente favorável". Seguindo essa linha de raciocínio, cumpre exigir-se a prova de que o advogado se enveredou pelo caminho da obtenção do resultado provável, objeto do contrato que celebrou com o cliente, além de ter prestado o seu serviço com toda a diligência que lhe é inerente. E, sendo o advogado contratado para confeccionar algum ato jurídico (parecer, contrato, estatuto de sociedade etc.), tem-se finalidade certa da contratação, não sendo pois obrigação de meio, mas de fim.

Sobre o sistema da culpabilidade e da inversão do ônus da prova, tem-se que somente é possível harmonizar a natureza de responsabilidade subjetiva ou culposa do profissional liberal com o princípio constitucional de defesa do consumidor, se houver aplicação de dois princípios de regência dessas situações, a saber, a presunção da culpa e a conseqüente inversão do ônus da prova. Assim, a par da regulamentação estatutária, o advogado é fornecedor de serviços, sendo que também o Código Consumerista determina que a responsabilidade pessoal do profissional liberal será apurada mediante a verificação de culpa, mas ao advogado, e não ao constituinte, impõe-se o ônus de provar que não agiu com dolo ou com culpa, na realização do serviço que prestou, exonerando-se da responsabilidade pelo dano.

E, não sendo pessoal, mas sim vinculada à pessoa jurídica, será objetiva a responsabilidade do empreendimento, posto despida a contratação do caráter "intuito personae", ocasião em que bastará a apuração da ocorrência do dano, o defeito do serviço e o nexo de causalidade.

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Numa demanda entre um cliente lesado e um escritório de advocacia de porte empresarial, ressoando latente a hipossuficiência do lesado, cabe a inversão do ônus da prova, pois do contrário ficaria muito difícil para o lesado provar que a culpa foi do grande e estruturado escritório de advocacia. Cabe ao consumidor de serviço, do profissional liberal, provar a existência do serviço, ou seja, a relação de consumo entre ambos, e a existência do defeito de execução, que lhe causou danos, sendo suficiente a verossimilhança da imputabilidade. Cabe ao profissional liberal provar, além das hipóteses comuns de exclusão de responsabilidade dos demais fornecedores de serviços, que não agiu com culpa.

Afora isso, não se pode olvidar que se o dano foi causado pelo seu quadro de funcionários, composto de advogados, estagiários, contadores, engenheiros, peritos de toda sorte, quem deve ser responsabilizado civil e objetivamente é o ente jurídico, verdadeira empresa prestadora de serviços profissionais.

Responde o advogado, ainda, pelos erros de fato e erros de direito. Erro de fato haverá toda vez que o acontecimento, que a realidade, for compreendida e interpretada incorretamente. Independente da gravidade do erro de fato, não se escusará o advogado da responsabilidade civil, acaso danos ocorram em virtude de sua desatenção. Erro de direito já é mais complexo e exige culpa grave: se o advogado causou danos por desconhecer a real extensão da lei, por aplicar fórmula e conclusão equívoca de hermenêutica, ou ainda que por simplesmente desconhecer a revogação do texto legal, é ele responsável por erro de direito.

A par do artigo 17, do Código de Processo Civil, definir os contornos da litigância de má-fé que justificam a aplicação da multa, pressupondo o dolo da parte no entravamento do trâmite processual, manifestado por conduta intencionalmente maliciosa e temerária, inobservado o dever de proceder com lealdade, há ainda a responsabilidade civil por lide temerária. Em se configurando lide temerária, já a Lei n. 8.906/94, no P. único do seu artigo 32, tratou da obrigação legal solidária pela responsabilidade dos danos causados, desde que esteja o advogado coligado com seu cliente para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria. Assim, sobrevindo conduta temerária capaz de tornar lesivo o exercício do direito processual da parte ex-adversa, há responsabilidade civil pelos danos causados.

Enfim, o sistema da responsabilidade objetiva consagrado no Código do Consumidor relaciona-se exclusivamente ao fato do serviço, ou seja, quando o serviço causar dano à pessoa ou ao patrimônio do consumidor. De outra banda há o vício, elemento intrínseco, repousando no âmago do serviço prestado. As perdas e danos, que se podem reclamar, nada têm a ver com o fato do serviço (exteriorização ou acidente de consumo), porquanto tratam de meros acessórios da vício. Nessa senda a exceção à regra geral, prevista no § 4º do artigo 14 do Código do Consumidor, não alcança as hipóteses de vícios do serviço, previstas nos artigos 18 e seguintes, em prejuízo do consumidor. Portanto, quando se estiver diante de vício do serviço, mantém-se o advogado junto ao sistema geral da responsabilidade civil objetiva.


7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CORREIA, Jadson Dias. Responsabilidade civil do advogado. Monografia apresentada em abril de 1999 à

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DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1960

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 1995

GRINOVER, Ada Pelegrini. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do

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TEIXEIRA, Elza Spanó. Código de processo civil – comentários e jurisprudência. São Paulo: LTr, 1998

VENOSA, Silvio. Direito civil – teoria geral. 5ª ed., São Paulo: Atlas, 1999,

WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro. 13ª ed., São Paulo: RT.vol. II, 1998

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Sobre o autor
Alex Sandro Ribeiro

advogado, escritor e consultor, pós-graduado em Direito Civil pelo UniFMU, membro do 4º Tribunal de Ética da OAB/SP, consultor especializado em microempresas e empresas de pequeno porte

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Alex Sandro. A responsabilidade civil do advogado e o código consumerista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 63, 1 mar. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3834. Acesso em: 22 nov. 2024.

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