A incidência do imposto de importação sobre encomendas do regime de tributação simplificada (RTS): a ilegalidade na prática da receita federal do Brasil

05/05/2015 às 13:12
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Análise da legislação vigente sobre isenção do Imposto de Importação no Regime de Tributação Simplificada e a prática da Receita Federal do Brasil.

 

 RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar a legislação vigente sobre isenção do Imposto de Importação (II) para encomendas que se enquadram no Regime de Tributação Simplificada (RTS) e a prática realizada pela Receita Federal do Brasil (RFB), que interfere economicamente na vida de milhares de brasileiros, concluindo-se pela legalidade ou não. Nosso povo está fascinado pela realização de compras através da Internet, pois buscam, no exterior, novas ofertas com preço inferior e qualidade superior aos produtos vendidos no Brasil. Apesar do imposto de importação ser de grande importância para estimular e manter a ordem no mercado interno e proteger a economia interna, não cabe a RFB a cobrança desse tributo de maneira desarrazoada ou baseada no entendimento exclusivo da instituição. É necessário seguir os ditames legais, nos moldes em que é estabelecido pela Constituição Federal do Brasil (CF/88) e por normas infralegais.

Há muitos processos jurídicos em trâmite acerca do tema, mas ainda não há uma solução final unânime sobre a questão. Ainda não há, portanto, decisão sobre a correta aplicação da lei em consonância com o entendimento da RFB com efeito erga omnes e nem qualquer outra orientação que torne a interpretação sobre o assunto único e legal para aplicação em todos os fatos tributáveis. Apesar da maioria dos julgados, até então, ter decido pela ilegalidade da cobrança do tributo em compras abaixo de US$100,00 (cem dólares norte-americanos), há julgados em sentido contrário prejudicando, assim, alguns pequenos importadores. Essa é uma questão que precisa ser uniformizada, para que todos os contribuintes sejam tratados isonomicamente e paguem apenas os tributos legalmente estabelecidos.

Palavras-chave: imposto, importação, isenção, legalidade, isonomia.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, o volume de importações de encomendas de menor valor, através do Regime de Tributação Simplificada vem aumentando consideravelmente no país. A Receita Federal do Brasil costuma, atualmente, tributar esses itens por amostragem, mas promete mudanças na tributação em 2015. A RFB está implementando novos projetos, em que busca cobrar os impostos devidos, conforme o seu entendimento quanto ao atual ordenamento jurídico, de todos os pacotes decorrente de compra online que entrarem no país. O grande problema está no fato da RFB praticar atos vinculados apenas aos ditames da Instrução Normativa SRF n.096/99 e da Portaria nº156/99, esquecendo o que fora estabelecido pela Carta Magna brasileira e pelas normas infraconstitucionais.

As importações de objetos de pequeno valor aumentaram, segundo dados da própria RFB[1], em quase 50% (cinquenta por cento), só no período entre os anos de 2012 e 2013, crescimento esse que se manteve vertiginoso até os dias atuais. Esse dado fez com que a Receita Federal do Brasil enxergasse, além da necessidade de proteção ao mercado interno, a tributação desses produtos como uma fonte considerável de receitas para o país. No entanto, existe uma significativa contradição entre a Constituição e lei e a Instrução Normativa e Portaria sobre a cobraça de imposto de importação cobrado sobre remessas postais no Regime de Tributação Simplificada.

O grande problema sobre essa questão, então, está justamente no fato da RFB ter restringido o benefício de isenção estabelecido por lei, colocando em prática suas disposições internas sem respeitar o que dispõe o princípio da legalidade. É defeso a autoridade administrativa, através de ato administrativo, extrapolar os limites legais.

Hoje, a prática ilegal da RFB afeta apenas àqueles que, por má sorte, são selecionados na amostragem para pagar o imposto de importação através da emissão da NTS. No entanto, segundo os planos da RFB, já neste ano de 2015, passará atingir economicamente todos os brasileiros que importarem produtos de menor valor decorrentes de compra online. De fato, será arrecadada uma receita vultosa em prol do país, mas de forma ilegal, portanto não deve ser aceita pelos contribuintes. Há alguns julgados recentes questionando a atual forma de arrecadação do imposto de importação pela RFB, e o Poder Judiciário tem se posicionado pela ilegalidade da tributação para remessas postais com valor inferior a cem dólares norte-americanos destinada a pessoa física, conforme regra estabelecida em lei.

1. E-COMMERCE

 

 

A nova Era chegou trazendo uma verdadeira revolução tecnológica. O mundo virtual, criado pelos humanos, é, além de um robusto sistema de informações e de comunicação, o grande impulsionador da evolução moderna e das mudanças sociais. Atualmente, é quase inevitável não se sujeitar a tecnologia e ao mundo virtual. A grande verdade é que a desmaterialização vem seduzindo todos, por conta de suas grandes vantagens e comodidade. A informática e a comunicação, através da rede mundial de computadores, estão presentes no dia a dia de praticamente todas as pessoas.

É fato que, já há alguns anos, os bytes conquistaram o mundo. Na década de 90, a Internet se tornou acessível ao público em geral, chegando até aos economicamente menos favorecidos. O mundo virtual passou a encantar o mundo real. A tecnologia, com toda sua comodidade, trouxe grandes mudanças ao mundo todo, inclusive aos brasileiros. Ainda no fim daquela década, foi possível experimentar o fabuloso e excitante e-commerce, que é o atual meio de concretização das relações consumeristas tão querido por muitos: o comércio eletrônico.  No entanto, é preciso admitir que algumas dificuldades, infelizmente, conquistaram a antipatia de uma minoria. Sem dúvidas, o comércio online é realmente incrível, mas contar com a boa-fé, como elemento básico e essencial nas relações à distância entre desconhecidos, ainda é o grande obstáculo.

Os Estados Unidos foram pioneiros nessa verdadeira aventura, mas os brasileiros não demoraram muito para experimentar esses novos caminhos. No Brasil, no entanto, o comércio eletrônico só começou efetivamente a crescer nos anos 2000. A comodidade, a acessibilidade e o bom preço logo conquistaram os consumidores pátrios. O comércio eletrônico se tornou um verdadeiro sucesso, inclusive em âmbito internacional. Comprar até mesmo em outros países passou a ser bem mais fácil, pois o interessado nem precisava sair do conforto de sua casa. Era visível que a tecnologia transformava a forma de viver e de interagir de muitas nações.

Os novos tempos trouxeram muitas inovações, entre elas, a quebra de fronteiras e a aproximação de grandes distâncias físicas. A Internet e a globalização uniram o mundo e tornaram mais simples até mesmo relações de consumo no comércio exterior. Parecia fabuloso para, por exemplo, um brasileiro comprar um brinquedo ou um item de colecionador, na China ou nos Estados Unidos, e receber na porta de sua casa, por um preço até dez vezes mais barato que o item semelhante produzido ou vendido no país, sem nunca ter estado no país do remetente. A verdade é que o e-commerce rompeu barreiras, seduziu o mundo e encantou os pequenos importadores brasileiros. Os limites territoriais, as fronteiras, não mais representam uma barreira para que consumidores adquiram produtos fora do Brasil, beneficiando-se de preços atrativos e de qualidade surpreendente. Pode-se dizer que essa facilidade representou até mesmo um aumento do poder aquisitivo dos pequenos importadores tupiniquins.

Em 2013, o comércio eletrônico envolvendo transações de consumo no comércio exterior passou por uma verdadeira explosão. Com a facilidade de comprar bons produtos, no exterior, por um preço muito baixo, fez com que esse tipo de comércio se popularizasse muito rápido. Talvez, infelizmente, a Receita Federal do Brasil não estivesse preparada para que os tributos fossem regularmente cobrados, então o pagamento do Imposto de Importação, para produtos de menor valor, até hoje, mantém-se feito por amostragem e com emissão de nota de tributação simplificada em valores, muitas vezes, acima do estabelecido por lei. Essa cobrança acima do legalmente permitido deve-se, principalmente, ao fato do remetente estrangeiro não estar obrigado a declarar o valor efetivamente pago pelo destinatário ou valor aduaneiro, dificultando, assim, a tributação correta de remessas postais de pequeno porte.

1.1       DEFINIÇÃO DE E-COMMERCE

A expressão e-commerce vem do inglês e sua tradução quer dizer comércio eletrônico. Essa modalidade de comércio é realizada por meio de dispositivo eletrônico, como computador ou celular, usando a Internet. As relações consumeristas online abrangem diversos tipos de negócios, como compra e venda de bens e serviços ou leilões, que ultrapassam a barreira da distância, mas se prolongam no tempo até a efetiva entrega do objeto ou realização de serviço.

As relações eletrônicas em comento tem origem remota nos sistemas de televendas da década de 80, que já trazia a ideia de desmaterialização, desintermediação e a desumanização do contrato. Relação de consumo mais prática, mais acessível e menos dispendiosa, mas que aumentava o status de hipossuficiência do consumidor.

Existem dois tipos de comercio eletrônico: B2B – Business to Business e o B2C – Business to Consumer. Esse último trata do comércio online direcionado aos consumidores finais e que está em franco crescimento, principalmente, em âmbito internacional, e que pode envolver relações de consumo entre pessoas de diferentes nações.

O e-commerce conquistou muitos consumidores por sua gama de vantagens, como a comodidade, facilidade com a pesquisa comparativa de informações, de preços e de qualidade, acesso a uma variedade enorme de produtos, maior rapidez no comércio com grande distância física e etc. No Brasil, os compradores, em nome de pessoa física, como consumidores finais, diante dessa nova forma de realizar compras, passaram a importar muito mais produtos de pequeno valor. Sem dúvidas, o que mais seduziu esse comércio internacional foi o aumento do poder de compra dos brasileiros.

1.2       DESPACHO ADUANEIRO

Apesar da facilidade existente para comprar produtos estrangeiros situados fora do Brasil, através da Internet, e entregar no território brasileiro, existem diversas regras e um trâmite complexo quanto à entrada deles no país. Além da grande burocracia no procedimento administrativo do despacho aduaneiro, que demanda, atualmente, bastante tempo, há a necessidade do pagamento de tributos, como o imposto de importação.

No despacho aduaneiro, a RFB faz o controle da entrada de mercadorias, ou seja, a fiscalização de tudo aquilo que entra no país em prol da proteção da economia brasileira. Além disso, é verificado se os tributos aduaneiros foram corretamente recolhidos. A função principal desse controle e da arrecadação é a proteção do mercado interno. As regras da atuação da aduana estão disciplinadas no Decreto nº 6.759/2009, conhecido como Regulamento Aduaneiro.

O despacho aduaneiro, em geral, visa verificar as informações declaradas pelo importador, em relação ao produto, mercadoria ou bem que entrará no país, e analisar os dados constantes em documentos com base na legislação vigente. Inicia-se com o registro da declaração de importação e termina com o desembaraço aduaneiro, que é a liberação da encomenda pela alfândega para seguir seu caminho até a efetiva entrega ao destinatário.

 Toda mercadoria, que entra legalmente no país, precisa passar pela análise da RFB. Existem algumas modalidades de despacho aduaneiro que são definidas a partir do regime de tributação adotado, que pode ser regime comum (regime geral, despacho para consumo), regimes especiais e regimes aplicados em áreas especiais. O presente trabalho visa analisar remessa postal internacional que se enquadra no regime de tributação simplificada, que é um regime simplificado do regime comum, em que há um trâmite menos complexo com isenção de alguns tributos. No RTS, o despacho aduaneiro inicia-se com a efetiva entrada da mercadoria no país e encerra com a entrega da remessa ao destinatário.

1.3       REGIME DE TRIBUTAÇÃO SIMPLIFICADA

O Regime de Tributação Simplificada pode ser utilizado no despacho aduaneiro de bens, produtos ou mercadorias integrantes de remessa postal ou encomenda aérea internacional de até US$3.000,00, destinada a pessoa física ou jurídica, inclusive de compras realizadas pela Internet. Através desse regime, é necessário o pagamento do imposto de importação, ficando isento de IPI, PIS/PASEP-Importação e a COFINS-Importação. Além disso, a encomenda fica sujeita a cobrança de ICMS, que dependerá da regulamentação de cada estado. O RTS não se aplica à importação de bebidas alcoólicas, fumo e  produtos de tabacaria, em virtude do sistema harmonizado adotado pelo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai (Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM).

Quando a remessa é enviada através dos Correios e o valor do bem for menor que US$500,00, destinada a consumo próprio, haverá tributação através da emissão de Nota Simplificada de Tributação (NTS), que deverá ser paga nas agências postais no momento da retirada da mercadoria, dispensando outras formalidades aduaneiras. Quando o valor for maior que US$500,00 e menor que US$3.000,00, o destinatário deverá apresentar Declaração Simplificada de Importação (DSI). Esse trabalho está centrado no procedimento de remessas postais de até US$500,00.

2. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO (II)

O tributo é uma prestação pecuniária compulsória, em que há a formação de uma relação vertical entre Estado e contribuinte. Não há autonomia do particular para escolher pagar ou não, basta que tenha realizado o fato gerador para o nascimento da obrigação. A obrigação tributária é ex lege, ou seja, depende de lei e independe da vontade do sujeito passivo. É importante salientar que tributo, apesar de ser uma imposição, não é penalidade e decorre de ato lícito. Existem cinco espécies de tributos, entre elas está o imposto, que não depende de contraprestação estatal, ou seja, não é vinculado.

A hipótese de incidência tributária é fato hipotético estabelecido em lei, no entanto apenas a prática desse ato é que faz nascer a obrigação tributária. Esse fato jurídico tributável é chamado de fato gerador. Em outras palavras, o fato gerador deflagra o fenômeno da incidência tributária e faz nascer a obrigação tributária, em que há a responsabilidade do sujeito passivo em obrigação tributária patrimonial (pagar tributo) e não-patrimonial (como, por exemplo, apresentar documentos e prestar informações). Toda obrigação faz surgir um crédito, que será constituído através do lançamento (ato administrativo, vinculado à lei e obrigatório).

O crédito tributário representa o direito do sujeito ativo de exigir o cumprimento da obrigação tributária. Não se trata, no entanto, de um direito subjetivo. Os tributos formam a maior parte da receita do Estado, então é irrenunciável. A condição de isenção é restrita, pois a administração necessita da arrecadação.                                                                                                                                                                                                          

O Imposto de Importação sobre produtos estrangeiros está disciplinado no art. 153, I, da Constituição Federal. Esse tributo também é conhecido como tarifa aduaneira, direitos de importação, tarifa das alfândegas e etc. O art.19 do CTN dispõe sobre II estabelecendo que “O imposto, de competência da União, sobre a importação de produtos estrangeiros tem como fato gerador a entrada destes no território nacional.”

O Imposto de Importação é de competência da União Federal, conforme CF/88, pois se trata de um tributo que tem interferência no relacionamento do Brasil com outros países. Ele tem função extrafiscal, que é uma característica de certos tributos por ter aptidão para regular a economia ou mercado de um país. Esses tributos são chamados de regulatórios, pois corrigem anomalias ou externalidades, fornecendo parcial liberdade ao Poder Executivo frente ao Poder Legislativo para atuar nesses casos, sendo, portanto, um instrumento importante de proteção da indústria nacional. A arrecadação de recursos financeiros para o Tesouro Nacional não é, portanto, tarefa precípua desse imposto. Ele é uma ferramenta importante na política econômica. Por ser um tributo de exigência imediata, é uma exceção aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal. Além de se enquadrar em hipótese de mitigação ao princípio da legalidade.

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Segundo o art.69 do Regulamento Aduaneiro (Decreto 6.759/2009), o II incide sobre mercadoria estrangeira, inclusive sobre bagagem de viajante e bens enviados como presente ou amostra. Além disso, explicita em seu art.104 que é contribuinte o importador, o destinatário da Remessa Postal Internacional e o adquirente de mercadoria entreposta.

O fato gerador do imposto de importação é a entrada da mercadoria estrangeira no território aduaneiro nacional. Quanto à mercadoria despachada para consumo, considera-se ocorrido o fato gerador na data do registro da declaração para fins de despacho aduaneiro por uma questão de ordem prática, pois a variação cambial é instável e esse seria o melhor momento para conversão do valor da mercadoria em moeda nacional. No entanto, os objetos que dispensam a declaração de importação por terem emissão de Nota de Tributação Simplificada, o fato gerador é a data de emissão da NTS, ou seja, a data do lançamento (art.73, II, do Regulamento Aduaneiro). É importante salientar que o fato gerador delimita a lei que será aplicada no lançamento do crédito tributário e o quantum debeatur (o valor a pagar, que depende da base de cálculo e da alíquota pré-determinada).

O exímio doutrinador Hugo de Brito Machado apresenta de forma clara e concisa as alíquotas do Imposto de Importação:

Existem duas espécies de alíquotas no imposto de importação. Uma é a chamada alíquota específica, que é expressa por uma quantia determinada, em função da unidade de quantificação dos bens importados[...]. A outra é a ad valorem, indicada em porcentagem a ser calculada sobre o valor do bem.

A alíquota incidente sobre bens de remessa postal internacional que se enquadram no Regime de Tributação Simplificada é ad valorem. A Portaria do Ministério da Fazenda nº 156/99 fixa a alíquota de 60% (sessenta por cento) sobre o valor dos bens constante da fatura comercial, acrescido dos custos de transporte e do seguro relativo ao transporte, quando não inclusos no preço do produto ou quando não suportados exclusivamente pelo remetente. Além disso, fixa alíquota zero para medicamentos.

No Regime de Tributação Simplificada para remessas postais menores que US$500,00, a formação do crédito tributário é feito por lançamento através da emissão de nota de tributação simplificada. A base de cálculo será o valor aduaneiro, que levará em consideração o valor declarado pelo remetente ou valor determinado pela autoridade aduaneira, em conformidade com o valor compatível com preços de mercado. O prazo de vencimento da NTS é de 30 (trinta) dias, após o lançamento do tributo. Se não for pago nesse prazo, o imposto e seus acréscimos serão recolhidos por meio de DARF.

Na prática, a RFB vem cometendo arbitrariedades quanto à fixação do valor aduaneiro. Apesar de algumas remessas postais fixarem o valor da encomenda, a autoridade fiscal, muitas vezes, tem descartado essa informação e arbitrado valor consideravelmente maior. No entanto, quando a autoridade estabelece o provável preço de mercado, não está obrigada a explicitar os motivos, então muitas notas de tributação simplificada estão sendo emitidas com valor correspondente ao bem maior que o efetivamente pago ou o valor de mercado do item no comércio exterior, contrariando as regras dispostas no Acordo de Valoração Aduaneira. De fato, muitos contribuintes estão sendo obrigados a recolher tributo aquém do estabelecido em lei.

Existe a possibilidade de recurso administrativo para revisão do valor cobrado a título de imposto de importação na NTS. Cabe ao destinatário da remessa postal preencher formulário, que deve estar disponível na agência dos Correios, e anexar documentos probatórios do valor efetivamente pago. Nesse ponto, há um grande problema: a falta de informação e preparo dos agentes dos Correios quanto a esse procedimento. Já houve casos em que os agentes obstaram o direito de recurso, pelo simples fato de não conhecer o trâmite; casos em que a RFB julgou o pedido de liberação da mercadoria sem pagamento do II procedente, mas a agência se negar a entregar a remessa; e etc.

 

3. PRINCÍPIOS

É importante salientar que a cobrança de qualquer tributo, no Brasil, deve obedecer aos princípios tributários constitucionais, que são limitações constitucionais ao Poder de Tributar. Esse é o poder de retirar uma parcela do patrimônio do contribuinte, através da imposição do pagamento de tributos.

 Para a instituição e cobrança do tributo pela autoridade competente, é necessário a observância de diversos princípios, entre eles o da legalidade e o da isonomia, que merecem destaque diante do tema desenvolvido nesse trabalho.

3.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Com suas raízes datadas da Carta Inglesa de 1215 do Rei João Sem Terra, tem-se o surgimento do princípio da legalidade na imposição de um estatuto ao príncipe João pelo povo para barrar alta atividade tributária. Passou-se a exigir o consentimento prévio do povo para cobrança de tributos, para que o patrimônio da cada um fosse protegido diante a vontade astuta do Chefe do Poder de sugá-lo através da cobrança desmedida de tributos. Para Eduardo Sabbag, “em outros momentos históricos, foi possível observar que o condicionamento do poder tributário serviu para limitar os poderes do Estado, v.g., a Independência do EUA e a própria Revolução Francesa”[2].

O princípio da legalidade é um princípio basilar no Direito Tributário, pois é fundamento da tributação e um importante limite ao poder de tributar. É um princípio dotado de alta carga valorativa, diretamente ligada à segurança jurídica e à justiça. O contribuinte anui que o Estado interfira em seu patrimônio e se aproprie de parte dele.

 O citado princípio está disposto no art.5º, II, e 150, I, da CF:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

Conforme o texto dos citados dispositivos, nenhum tributo será criado ou majorado, a não ser que seja feito através de lei. O ilustríssimo mestre Hugo de Brito Machado leciona, em sua obra, que “sendo a lei a manifestação legítima da vontade do povo, por seus representantes nos Parlamentos, entende-se que o ser instituído em lei significa ser o tributo consentido”[3]. Conclui-se, portanto, que o povo precisa permitir que o Estado invada seu patrimônio em benefício da sociedade, gerando, assim, mais segurança nas relações entre o Fisco e o contribuinte.

É imprescindível salientar que, apesar de estar explicito, na Constituição Federal, apenas “exigir” e “aumentar”, a maioria dos doutrinadores entende que está implícito a necessidade de lei também para extinção e redução, com base no art. 150, §6º, da CF. Nas palavras de Eduardo Sabbag, “a lei tributária deve servir de parâmetro para criar e, em outro giro, para extinguir o tributo; para aumentar e, em outra banda, reduzir a exação.”[4]

É importante ressaltar que, partindo da ideia do povo consentindo tributo, é evidente que a lei, em regra ordinária, ao instituí-lo deve ser clara e precisa, consequentemente, com base no art. 97 do CTN, estabelecerá os elementos obrigatórios: a base de cálculo, a alíquota, a multa, fato gerador do tributo e o sujeito passivo. A obrigação de revelar esses componentes é o que se entende por legalidade estrita, que visa aumentar a segurança do contribuinte evitando que uma dada interpretação ou integração da norma possa vir a prejudicá-lo.

O princípio da legalidade comporta mitigação em relação à alíquota de determinados tributos, entre eles a do imposto de importação, que, conforme art. 153, §1º, CF, pode por ato do Poder Executivo Federal ser alterada. Normalmente, essa alteração se dá por decreto presidencial ou portaria do Ministro da Fazenda.

3.2 PRINCÍPIO DA ISONOMIA

Ao tratar do princípio da isonomia, a Constituição Federal trouxe um dispositivo genérico, no art. 5º, caput, e um dispositivo específico tributário, art.150, II, demonstrando a grande importância e relevância desse princípio. Pela imposição da norma constitucional em caráter geral, não seria necessária a repetição em dispositivo posterior, mas essa repetição exprimiu o caráter enfático, central e relevante da regra.

Segundo esse princípio, os iguais devem ser tratados igualmente, e os desiguais devem ser tratados desigualmente na medida de suas desigualdades. É proibido, portanto, tratamento desigual a contribuintes que estão em situação de equivalência. Esse princípio atua em favor da proibição dos chamados privilégios odiosos. Demonstrando, assim, a repugnação ao favorecimento desmedido de alguns em desfavor de outros.

A grande incógnita desse princípio é saber como diferenciar o diferente para estabelecer a igualdade entre eles. Esse impasse é solucionado com o auxílio de outro princípio, corolário da isonomia, que é o da capacidade contributiva, capaz de detectar o discrímen de pessoas e situações diferentes. A aplicabilidade desse princípio depende de meios de exteriorização, como progressividade, seletividade e etc., assim poderá permitir o rito gradualístico de alíquotas, gerando contribuições diferentes para contribuintes com status diferentes, para que se alcance a justiça fiscal, conforme a isonomia.

No Regime de Tributação Simplificada, para àqueles que tem emissão de NTS, os iguais podem ser constatados pela simples realização do fato gerador. São pessoas, importando remessas postais com valor menor que US$500,00, que entram, no território brasileiro, constituindo o fato gerador e a obrigação de pagar tributo. A capacidade tributária é plena, então não há interferência da incapacidade civil, irregularidade na constituição formal da pessoa jurídica e etc (art. 126, I, II e III do CTN).

Conclui-se, portanto, que é defeso tratamento desigual a contribuintes que se encontrem em situação de igualdade. 

4. ISENÇÃO

A isenção é um instituto central nessa dissertação e deve ser bem compreendida. Ela é a dispensa legal do pagamento de tributos, enquadrando-se como uma opção pelo não exercício da competência tributária. A isenção depende de lei (art. 150, § 6 da CF), que deve ser publicada antes do fato gerador, pois fará com que não haja a constituição do crédito tributário, e consequentemente não existirá a cobrança de tributo. Na isenção, há o fato gerador do tributo, mas a lei determina que o contribuinte não arcará com a obrigação tributária.

A isenção difere da imunidade, da não-incidência e da alíquota zero. A imunidade é uma delimitação negativa do poder de tributar, vedando a tributação de determinados casos, e está disciplinada na Constituição Federal. A não-incidência ocorre quando a situação  não se subsume ao tipo previsto na lei. Quanto a alíquota zero, há incidência da norma, mas o percentual da alíquota, para ser aplicada a base de cálculo, é zero, portanto há fato gerador, mas não há efetiva tributação.

É importante ressaltar que a arrecadação de tributos é uma obrigação para quem detém a competência, não se trata de um direito subjetivo, mas sim de um dever. A condição de isenção é restrita, portanto a dispensa do crédito tributário deve estar delimitada em lei (art.150, §6º da CF/88). Conforme o art.111 do CTN, esse benefício fiscal deve ser interpretado literalmente, em lei específica que trate exclusivamente do benefício ou do tributo.

4.2 DISCUSSÃO SOBRE AS REGRAS DE ISENÇÃO DE IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO PARA REMESSA POSTAL COM VALOR ABAIXO DE US$100,00 NO REGIME DE TRIBUTAÇÃO SIMPLICADA (RTS)

Em setembro de 1980, o Decreto-Lei nº 1804 passou a disciplinar sobre tributação simplificada das remessas postais internacionais. Inicialmente, é importante salientar que o decreto-lei não está mais disciplinado na nossa atual Constituição Federal. A CF/88, no entanto, recepcionou esse decreto emanado pelo Poder Executivo com o status lei ordinária. É importante nos ater ao status dessa norma para análise posterior sobre hierarquia entre normas.

O DL 1.804/80, com objetivo de facilitar e simplificar as importações, trouxe apenas quatro artigos, mas essenciais para disciplinar sobre o assunto. Entre eles, podemos ressaltar o art. 2º.

Art. 2º O Ministério da Fazenda, relativamente ao regime de que trata o art. 1º deste Decreto-Lei, estabelecerá a classificação genérica e fixará as alíquotas especiais a que se refere o § 2º do artigo 1º, bem como poderá:

II - dispor sobre a isenção do imposto de importação dos bens contidos em remessas de valor até cem dólares norte-americanos, ou o equivalente em outras moedas, quando destinados a pessoas físicas. (Redação dada pela Lei nº 8.383, de 1991)

O mencionado dispositivo é explícito ao declarar a isenção do Imposto de Importação para remessas postais no valor de até US$ 100.00 (cem dólares norte americanos). Com a expressão “dispor sobre a isenção”, entende-se que o Ministério da Fazenda poderá estabelecer apenas a aspectos instrumentais ou procedimentais da isenção, jamais alterar o quantum, já que esse elemento essencial cabe apenas à lei, conforme art.150, §6º da CF/88. É importante salientar a necessidade do respeito ao princípio da legalidade e do da legalidade estrita.

Conforme o art. 1º, o regime de tributação simplificada foi instituído para simplificar o processo administrativo para a cobrança do imposto de importação, agilizando até mesmo a liberação de mercadoria, mas apenas incidente sobre bens contidos em remessas postais internacionais. Conforme art.21 da CF/88, remessa postal é o serviço postal de monopólio dos Correios. Conforme atribuição o parágrafo único do art. 2º do DL 1.804/80, o Ministério da Fazenda estendeu a aplicação do RTS a encomenda aérea ou serviço de courier, mas restringiu a regra de isenção a remessa postal internacional.

Em 2009, o Decreto nº 6.759 estabeleceu a regulamentação da administração das atividades aduaneiras e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior. Em seu art. 154, trouxe o seguinte texto:

Art. 154.  A isenção para remessas postais internacionais destinadas a pessoa física aplica-se aos bens nelas contidos, cujo valor não exceda o limite estabelecido pelo Ministro de Estado da Fazenda, desde que não se prestem à utilização com fins lucrativos

§1º O limite a que se refere o caput não poderá ser superior a U$ 100,00 (cem dólares dos Estados Unidos da América), ou o equivalente em outra moeda.

§2º A isenção para encomendas aéreas internacionais, nas condições referidas no caput, será aplicada em conformidade com a regulamentação editada pelo Ministério da Fazenda.

A expressão “cujo valor não exceda o limite estabelecido pelo Ministro da Fazenda”, no caput do citado artigo, é uma flagrante inconstitucionalidade, pois, conforme CF/88, cabe à lei disciplinar sobre os elementos obrigatórios e delinear os limites essenciais da isenção. Portanto, o valor máximo para benefício da isenção deverá constar em lei. A regra em comento restringe a isenção apenas àqueles que importem objetos de pequeno valor sem fim lucrativo. No §1º, há uma norma de acordo com os ditames constitucionais, pois afirma que a isenção não poderá ser maior que US$100.00 (cem dólares norte-americanos), respeitando o limite imposto no DL 1.804/80. Já o §2º deve ser entendido com a ideia de que a regulamentação editada pelo Ministro da Fazenda apenas poderá tratar de aspectos instrumentais ou procedimentais quanto à isenção, como já analisado.

Em junho de1999, o Ministro da Fazenda publicou a Portaria nº156/99 para estabelecer as condições para a aplicação do Regime de Tributação Simplificada – RTS, conforme havia sido estabelecido pelo DL 1.804/80, mas trouxe uma regra conflitante com o princípio da legalidade, logo em seu art.1º.

Art.1º O regime de tributação simplificada - RTS, instituído pelo Decreto-Lei nº 1.804, de 3 de setembro de 1980, poderá ser utilizado no despacho aduaneiro  de   importação  de bens integrantes de remessa postal [...]  mediante  o  pagamento  do  Imposto  de   Importação  calculado  com a aplicação  da  alíquota   de  60%  (sessenta  por  cento),  independentemente   da classificação tarifária dos bens que compõem a remessa ou encomenda.

§2º Os bens que integrem remessa postal internacional no valor de até US$ 50.00 (cinqüenta dólares dos Estados Unidos da América) ou o equivalente em outra moeda, serão desembaraçados com isenção do Imposto de Importação, desde que o remetente e o destinatário sejam pessoas físicas.

Através de uma portaria, norma hierarquicamente inferior à lei, conforme pirâmide de Hans Kelsen, o valor de remessa postal beneficiária da isenção imposto de importação sofreu diminuição de US$100.00 (cem dólares norte-americanos) para US$50.00 (cinquenta dólares norte-americanos). Além disso, exigiu que o remetente e o destinatário das remessas postais sejam pessoas físicas, limitando ainda mais a regra isentiva disposta em lei.

Ainda em 1999, em agosto, a Secretaria da Receita Federal publicou a Instrução Normativa nº 096/99 que dispõe sobre a aplicação do regime de tributação simplificada - RTS. Nesse documento, no art. 2º, repetiu-se a regra já constante na portaria citada anteriormente.

Art. 2º O RTS consiste no pagamento do Imposto de Importação calculado à alíquota de sessenta por cento.

§ 2º Os bens que integrem remessa postal internacional de valor não superior a US$50.00 (cinqüenta dólares dos Estados Unidos da América) serão desembaraçados com isenção do Imposto de Importação, desde que o remetente e o destinatário sejam pessoas físicas.

Como o DL 1.804/80, diploma recepcionado com status de lei ordinária, estabeleceu a isenção para valores de até US$100.00 (cem dólares norte-americanos), a alteração para US$50.00 (cinquenta dólares norte-americanos) por norma infralegal (instrução normativa e portaria) é ilegal. A isenção é matéria reservada à lei, conforme art.150, §6º, da CF, portanto só pode ser alterada ou revogada por nova lei. Trata-se claramente de uma questão elementar de hierarquia, que pode ser observada na pirâmide e teoria de Hans Kelsen. Na pirâmide hierárquica de Kelsen, a Constituição Federal ocupa seu ápice, servindo de validade para todo o ordenamento jurídico. A CF estabeleceu que a isenção é matéria reservada à lei, então deve ser respeitada por todo o ordenamento. A lei ocupa espaço inferior a CF/88, mas superior à instrução normativa ou à portaria, então é importante observar que esse últimos não podem inovar ou contrariar em matéria de isenção.

É importante salientar que, segundo a maioria dos doutrinadores, não há hierarquia entre as leis infraconstitucionais (leis ordinárias e complementares). A lei e o decreto estão em patamar inferior ao constitucional, devendo obediência a Carta Magna, conforme pirâmide de Hans Kelsen. Outro ponto importante é observar que o decreto-lei e o decreto regulamentar, apesar de emanarem do Poder Executivo, têm características diferentes dentro do ordenamento. O DL 1.804/80 foi recepcionado pela CF/88 com status de lei ordinária. Já o Decreto nº 6.759, que é decreto regulamentar, então visa regular a lei, não podendo ser contrária a ela. Conclui-se, portanto, que na hierarquia dos atos normativos, a lei está acima do decreto, cabendo a este último respeitar os ditames do primeiro. A CF/88 estabeleceu que a isenção é matéria reservada à lei e só por ela pode ser modificada. Por meio de decreto, não se pode criar ou alterar os critérios de isenção estabelecidos por lei. Conforme art. 84, inciso IV, o decreto regulamentar deve ser expedido em prol da fiel execução das leis, o que não foi respeitado pelo Decreto nº 6.759.

Diante do tema proposto nesta dissertação, uma norma infralegal não poderia ter reduzido o valor da isenção disposta em lei. No entanto, na prática, a Receita Federal do Brasil, atualmente, segue a orientação que está na Portaria 156/99 e na Instrução Normativa nº 096/99, esquecendo o DL 1.804/80. A RFB entende, quanto ao Regime de Tributação Simplificada, que pode recolher imposto de importação de praticamente todos os produtos importados, excetuando apenas produtos com remessa postal menor que US$50.00 (cinquenta dólares norte-americanos), em que remetentes e destinatários sejam pessoas físicas, sem fins lucrativos e que não se trate de compra online, além de medicamentos, livros, jornais e revistas.

A equiparação de pessoa física adquirente de mercadoria proveniente de compras através da rede mundial de computadores à pessoa jurídica pela Secretaria da Receita Federal é uma inovação sem qualquer base legal. Esse entendimento é aplicado para reduzir ainda mais o benefício da isenção estabelecido em lei.

As compras online cresceram muito nos últimos anos, então o imposto de importação incidente nesse tipo de operação, que antes não tinha arrecadação significativa pela existência de poucas transações, passou ser um recolhimento importante para os cofres públicos. Atualmente, é prática bastante comum entre os brasileiros comprar, no exterior, produtos com valores menores que os vendidos no Brasil e receber no conforto de sua casa. É óbvio que essa prática torna-se uma concorrência desleal com o mercado interno. No entanto, não é cobrando ilegalmente impostos, para proteger o mercado interno ou para recolher mais valores aos cofres públicos, que irá sanar o problema. Além de proteger sua economia, o país precisa manter sua ordem e respeitar as regras vigentes. Os ditames de nossa Carta Magna precisam ser respeitados por todos.

Atualmente, a cobrança do imposto de importação pela RFB é feito por amostragem. Nem todas as remessas que entram no país são tributadas. No entanto, os pacotes que tem Nota de Tributação Simplificada emitidas são tributados de acordo com o atual entendimento da Receita Federal, sem observar a ordem estabelecida pelo DL 1.804/80. Isso gera grande insegurança ao contribuinte.

Outro problema grave é que algumas pessoas que compram o mesmo prdouto do mesmo remetente, têm seus pacotes tributados, mas outras não. Diante desse tratamento desigual para situação de equivalência, temos uma grave ofensa ao princípio da isonomia. Para piorar essa situação, alguns contribuintes estão clamando a Justiça para que seus direitos de isenção para remessas postais de até US$100 (cem dólares norte-americanos) sejam reconhecidos, entretanto alguns estão obtendo procedência de seus pedidos e outros não. Não há jurisprudência uníssona sobre o tema. Diante da relevante arrecadação que se tornou o imposto de importação, no Regime de Tributação Simplificada, é muito importante que esse impasse seja solucionado, seja pela publicação de uma lei nova que estabeleça os critérios como entendidos pela RFB[5], óbvio que sem efeitos retroativos, ou que o Poder Judiciário imponha a RFB respeito às normas vigentes.

A arrecadação do imposto de importação, sem dúvidas, tornou-se expressiva e importante aos cofres públicos, além de ser necessária para proteger nosso mercado interno. No entanto, como a cobrança de qualquer outro tributo, precisa ser legal.

4.3 POSICIONAMENTO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL

Em fevereiro de 2014, a RFB publicou uma nota[6] sobre o limite de isenção para remessas de pequeno valor. Neste texto, o órgão esclarece o seu posicionamento é continuar colocando em prática o que está estabelecido na IN nº 096/99 e na Portaria MF nº 156/99, pois entende que a diminuição da isenção para US$50.00 (cinquenta dólares norte-americanos) seria legal e feita dentro do âmbito de atribuição do Ministro da Fazenda delegada pelo Decreto 1.804/80. No entanto, não comentou sobre o fato da isenção ser matéria exclusiva de lei e, para que o dispositivo seja considerado constitucional, essa delegação só deve ser feita apenas quanto aos aspectos procedimentais ou instrumentais da isenção. Conforme a Constituição Federal, não poderia ser delegado ao Ministro da Fazenda um elemento obrigatório e essencial para delimitar a isenção, como o quantum da remessa postal.

A RFB, ainda na nota técnica, esclarece que o valor de US$50.00 (cinquenta dólares norte-americanos) foi estabelecido com base em diversos fatores, como o impacto ocasionado na economia interna diante do aumento de importação de pequenos volumes, o fato da renúncia do imposto já ser expressiva e o custo da fiscalização ser alto. Apesar de ser uma medida contra a concorrência desleal com o mercado interno, esse fato não permite que a RFB tome atitudes contrárias à normatização pátria.

Atualmente, o sistema de tributação ainda é feito por amostragem. A RFB explica essa situação pela falta de efetivo e o alto custo para fiscalizar e tributar. No entanto, promete que há um novo sistema sendo implementado para que haja o pagamento de imposto de importação para todas as remessas postais provenientes de compras online que entrarem no país. Alguns importadores acreditam que a cobrança desse tributo será feita no ato da compra, para diminuir a necessidade de efetivo e o custo da operação. Isso tornará a questão cerne deste trabalho ainda mais impactante, pois todos serão tributados conforme o atual entendimento da Receita Federal e não conforme o DL 1.804/80.

Hoje, muitos brasileiros se sentem injustiçados por terem seus direitos feridos pela atual forma de tributação da RFB, quanto o Regime de Tributação Simplifica. No entanto, se a Receita Federal passasse a respeitar as disposições do DL 1.804/80, gerando segurança jurídica para os contribuintes, recolheria os impostos de forma devida sem gerar mal-estar por cobrar tributo mediante prática ilegal.

 

5. PRECEDENTES JUDICIAIS

Em 2010, tem-se a publicação de uma das primeiras decisões sobre a prática ilegal mantida de pela RFB quanto à isenção de tributo no RTS. Nessa época, as compras internacionais online já estavam se popularizando, e a RFB já começava a tributar uma quantidade bem maior de remessas postais. No caso de DOUGLAS PICCININI[7], o Desembargador Federal ÁLVARO concluiu que a cobrança do Imposto de Importação de acordo com a Instrução Normativa nº 096/99 e a Portaria MF 156/99 estaria extrapolando os limites da lei e ferindo o princípio da legalidade.

A maioria das decisões, em primeira instância, durante os últimos anos, seguiram a mesma linha de pensamento do Desembargador Federal ÁLVARO. Alguns juízes ainda asseguraram até mesmo o direito à isenção de futuras remessas postais de até US$100.00 (cem dólares norte-americanos), enquanto as leis atualmente vigentes não forem revogadas. No entanto, já houve decisões em sentido oposto, como o caso de Ernei Antonio Vieira[8], prolatada em novembro de 2014, em que o Juiz Federal Tiago do Carmo julgou improcedente o pedido de restituição dos valores pagos a título de imposto de importação nas remessas postais abaixo de US$100.00 (cem dólares norte-americanos), por considerar a IN nº 096/99 e a Portaria MF 156/99 dentro dos ditames legais.

Essas decisões contrapostas são flagrante exemplo da insegurança jurídica causada pela prática da RFB. De fato, têm-se contribuintes iguais sendo tratados desigualmente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Decreto-lei 1.804/90 estabelece que remessas postais, com valor menor que US$100 (dólares norte-americanos), ao entrarem no país, serão isentas do Imposto de Importação. O dispositivo estabelece ainda que caberá ao Ministério da Fazenda regulamentar essa isenção. Entende-se que essa regulamentação só cabe em seu aspecto procedimental e/ou instrumental, pois não é permitido aos atos normativos infralegais alterarem matérias reservadas à lei, conforme princípio da legalidade e legalidade estrita. No entanto, ao regulamentar a isenção em comento, a Receita Federal do Brasil reduziu o valor das encomendas beneficiárias da isenção para US$50.00 (dólares norte-americanos) e passou a exigir mais requisitos: que o destinatário também fosse pessoa física e sem fins lucrativos, através da Portaria MF n.156/99 e da Instrução Normativa SRF n.096/99. Além disso, a RFB ainda equipara à pessoa jurídica o destinatário que adquiriu o item por meio de comércio eletrônico no comércio exterior, sem base legal, restringindo ainda mais a isenção estabelecida no Decreto-lei 1.804/90. Essa forma de tributação, em que a RFB restringe a isenção por ato normativo expedido por autoridade administrativa, contrariando o princípio da legalidade, é ilegal. Além disso, está feriando o princípio da isonomia e gerando insegurança aos contribuintes, através da tributação feita por amostragem. A isenção prevista no Decreto-lei 1.804/90, que tem status de lei ordinária, então só por lei nova pode ser alterada. Uma norma infralegal não pode revogar, restringir ou modificar uma isenção legal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília,

DF, Senado, 1988.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2013.

FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Direito do Comércio Eletrônico.Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.

JUSBRASIL. Disponível em:< www.jusbrasil.com.br>.

JUS NAVIGANDI. Disponível em:< http://jus.com.br/>.

LIMA, Eduardo Weiss Martins de. Proteção do Consumidor Brasileiro no Comércio Eletrônico Internacional. São Paulo: Atlas, 2006.

LUZ, Rodrigo. Comércio internacional e Legislação Aduaneira. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2013.

NOVELINO, Marcelo. Constituição Federal para concursos. Salvador: JusPODIVM. 2011.

PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Metodo, 2012.

POGGETTI, Donata. A Pirâmide de Kelsen. Disponível em:< http://www.equilibrecursos.net/a-piramide-de-kelsen>

Receita Federal do Brasil. Disponível em: www.receita.fazenda.gov.br

SABBAG, Eduardo.  Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011.

TRF4. Tribunal Regional Federal. Disponível em: <www.trf4.gov.br>

STF. Supremo Tribunal Federal. Disponível em:< http://www.stf.jus.br/>.

[1] http://www.receita.fazenda.gov.br/publico/destinacaoMercadorias/MercadoriasApreendidas/RelatorioAduaneiro2013.pdf

[2] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário, 3. ed., 2ª tiragem, p.62

[3] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 34.ed.,p.32.

[4] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário, 3. ed., 2ª tiragem, p.63.

[5] Nota técnica: Limite de isenção em remessas de pequeno valor <http://www.receita.fazenda.gov.br/AutomaticoSRFsinot/2014/02/12/2014_02_12_17_44_54_330806488.html>

[6] Nota técnica: Limite de isenção em remessas de pequeno valor <http://www.receita.fazenda.gov.br/AutomaticoSRFsinot/2014/02/12/2014_02_12_17_44_54_330806488.html>

[7] APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2005.71.00.006870-8/RS. Disponível em: <http://www2.trf4.gov.br/trf4/processos/visualizar_documento_gedpro.php?local=trf4&documento=3341930&hash=f457a6968617696bbec69104ccbe169f>

[8] JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5010585-93.2014.404.7208

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