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Direito como Ciência

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O direito é um objeto pluridimensional que pode ser abordado de várias perspectivas. Como Ciência, valoriza e qualifica comportamentos em função da utilidade social.

Observemos a pluridimensionalidade do objeto que chamamos "direito" , o que permite diversos ângulos de abordagem, ora separados, ora ligados por nexos meramente lógicos ou didáticos, ora interligados em formas sintéticas.

A palavra direito provém do latim directu, que suplantou a expressão jus, do latim clássico, por ser mais expressiva. Em Roma havia o jus e o faz. O jus é o conjunto de normas formuladas pelos homens, destinadas a dar ordem à vida em sociedade; faz é o conjunto de normas de origem divina, religiosa, que regeriam as relações entre os homens e as divindades.

No mundo moderno, direito em seu sentido objetivo, seria um conjunto de regras dotadas de sanções que regem as relações dos homens que vivem em sociedade, ou seja, o jus romano. Já no sentido didático, poderíamos entender o direito, como sendo a ciência das regras obrigatórias que presidem às relações dos homens em sociedade.

Para Limongi França, o direito pode ser entendido sobre quatro aspectos: o primeiro, o direito como o justo; o segundo como regra de direito; o terceiro como poder de direito e o quarto como sanção de direito.

  • O direito como que é justo. Os jurisconsultos romanos já ensinavam que - jus est a justitia appellatum , isto é, que o direito provém da justiça. A criação do direito não tem e não pode ter outro objetivo senão a realização da justiça.

  • Como regra de direito, é a ordem social obrigatória estabelecida para regular a questão do meu e do seu. (Direito Objetivo)

  • Como poder de direito, é o conjunto de faculdades que as pessoas têm, conferido pela regra de direito. (Direito Subjetivo).

  • E, por fim, como sanção de direito, onde se discute o fato de existir ou não direito sem sanção, isto é, sem a força do poder público ou dos grupos sociais que o torna obrigatório.

Entretanto, para Miguel Reale apenas as três primeiras perspectivas para a compreensão da palavra direito, exprimem mais a realidade, uma vez que ao entendermos estes três conceitos, teríamos aí a verdadeira concepção tridimensional da experiência jurídica. Mais uma vez o direito num plano tridimensional, ou seja, o elemento valor como intuição primordial; o elemento norma como medida de concreção da conduta social; e, finalmente, o elemento fato, como condição da conduta.

Já que definimos a palavra "direito", vejamos agora o significado da palavra "ciência".

Ciência, segundo alguns estudiosos do direito, é a busca permanente e constante pela verdade, e que pelo fato dela não ser unívoca, não há como se designar um tipo específico de conhecimento, não existindo um critério único que determine sua extensão, natureza ou caracteres, devido ao fato de vários critérios têm fundamentos filosóficos que extravasam a prática científica. Mais uma vez, nos deparamos com uma pluridimiensionalidede deste outro objeto que chamamos "ciência".

A questão aqui não é a conceituação ou a interpretação literal das palavras, mais sim, a nossa visão do direito como ciência, que para nós nada mais é que a valoração de um fato (de cunho natural ou social) que por força de sua interpretação, gera uma norma jurídica aplicável.

O direito como ciência, valoriza, qualifica, atribui conseqüências a um comportamento. Não em função de critérios filosóficos, religiosos ou subjetivos, mas em função da utilidade social. Para o direito, a conduta é o momento de uma relação entre pessoas, e não o momento da relação entre pessoas e divindade e entre pessoa e sua consciência, ou seja, o direito não se limita apenas na verificação simples dos atos ou dos acontecimentos, muito pelo contrário, eles são analisados pelas conseqüências que produzem.

Portanto, o direito como ciência se preocupa antes e principalmente com a ordem e a segurança da sociedade. São as necessidades sociais e a vontade do homem que atuam na interpretação dessas necessidades e transformam as regras que essas necessidades impõem naquilo que se denomina direito positivo.


NORMA JURÍDICA (proceptum juris)

"É o preceito de direito transformado em lei".

"Lei é uma norma de direito tornada obrigatória pela força coercitiva do Estado".

Pela própria acepção da palavra, norma quer dizer regra, regra de direito, e como toda regra é imperativa, impondo dever e fixando a conduta dos homens em sociedade.

Também é a norma, autorizante, onde, segundo Maria Helena Dinis, "só a norma jurídica é autorizante, porque só ela autoriza o lesado pela sua violação a exigir seu cumprimento ou a reparação do mal sofrido, de modo que é a autorização a sua diferença específica", e, por fim a norma advém no confronto dos fatos com os valores, feitos pelo seu elaborador.

Diversos autores, estudiosos do direito, abordam o tema sobre vários aspectos e/ou segmentos, há aqueles que entendem a norma jurídica como a única constituidora da própria expressão formal da norma do direito; outros, de que ela é bilateral, imperativa e coercitiva, ou seja, em seu mecanismo, alguém dispõe, os demais obedecem, cuja inobservância acarretará a aplicação da sanção pelos órgãos do poder público. É imperativa porque prescreve as condutas devidas e os comportamentos proibidos. A relação entre norma e conduta é de subordinação, não de causalidade.

A essência da norma jurídica se constitui simplesmente imperativo autorizante.

De uma certa forma, estamos diante da teoria tridimensional, ou seja, a norma prevê, de forma geral e abstrato, hipóteses de fato, devidamente classificadas por tipo, a que imprime valoração jurídica. Sobre essa valoração, o Prof. Reis Friede, assim se manifesta:

"(...) a valoração implícita da norma jurídica repousa sempre na própria idéia que a inspira, indiretamente manifesta, por seu turno, na verdadeira estrutura orgânica que a mesma obrigatoriamente apresenta - sem qualquer exceção -, dentro do contexto específico de sua inerente complexidade".

Diante dessa complexidade, encontramos a norma inserida dentro de três diferentes planos. O primeiro, o normativo, onde a norma é elaborada pelo poder competente; o segundo, o ontológico, que corresponde a realidade social e, por fim, o político, que corresponde às tendências políticas dominantes.

De uma certa forma, a norma jurídica não é uma arbitrariedade, apenas corresponde a necessidades de ordem, de equilíbrio, de harmonia, de justiça, cujas raízes se afundam numa determinada realidade social, logo não pode ser criação arbitrária da imaginação humana ou da fantasia do Poder de que emana.

Em síntese, a norma jurídica é um produto humano que tende realizar certos valores, tais como: ordem, segurança, justiça. É também, norma de conduta posta pelo governo, com o intuito de regular seu comportamento social, com o objetivo de se chegar à justiça.


INTERPRETAÇÃO DA NORMA JURÍDICA

Interpretar, em seu conceito fundamental, é explicar, esclarecer; dar o significado de vocábulo, atitude ou gesto; reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado; mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão; extrair, de frase, sentença ou norma, tudo o que na mesma se contém. (grifo nosso).

Cabe ao interprete, extrair o real conteúdo da norma jurídica expressa no texto da lei que a vincula. Examinar o texto em si, o seu sentido, o significado de cada vocábulo, fazendo depois, uma comparação com outros dispositivos da mesma lei, e com os de leis diversas.

Existem vários métodos de interpretação; quanto aos órgão de que emana, pode ser: autêntica, judicial e doutrinal.

  • Autêntica, é aquela que emana do próprio poder que fez o ato cujo sentido e alcance ela declara, ou seja, a que procede do próprio legislador, sob forma de outra lei e, portanto, com caráter obrigatório.

  • Judicial, a que deriva dos órgão judiciários (juizes e tribunais). Não tem caráter obrigatório senão para o caso em concreto, mas serve de diretriz para a solução dos casos similares (as chamadas jurisprudências).

  • Doutrinal, a que é feita pelos escritores do direito, nos seus comentários às leis escritas. Não é jamais obrigatória, mas dispõe também ela, de relevante prestígio.

Para o mestre Carlos Maximiliano, só a doutrinal merece o nome de interpretação, no sentido técnico do vocábulo; porque esta deve ser, na essência, um ato livre do intelecto humano.

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Quanto à maneira de realizar-se, a interpretação pode ser: gramatical, lógica, histórica, científica e sistemática.

  • Gramatical, literal ou "ad litterem", aquela que atende ao texto da lei, à sua redação, à significação exata das palavras.

  • Lógica, a que, pela análise meticulosa do texto da lei, procura penetrar em seu espírito e identificar-se com o pensamento do legislador na ocasião em que a elaborou. Segundo Ihering, a interpretação lógica, consiste em procurar o pensamento da lei na alma do seu autor, passando por cima das palavras.

  • Histórica, a que se apoia no estuda da evolução do direito através dos tempos, para se chegar a uma justa aplicabilidade da norma legal.

  • Científica, que se confunde com a lógica, a que no dizer de Paula Batista, "presta as premissas e dados para, por meio de legítimas conseqüências não só atingir o sentido moral e sem defeitos, como também, adotar entre os sentidos possíveis, aquele que exprimir com a maior seqüência possível a vontade do legislador.

  • Sistemática, consiste em comparar o dispositivo sujeito a exegese, com outros do mesmo repositório ou leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto, ou seja, consiste, ainda, "em resolver eventuais conflitos de normas jurídicas, examinando-as sob a ótica de sua localização junto ao direito que tutela".

Quanto ao resultado, uma corrente doutrinária (adeptos a escola tradicionalista ou clássica), classifica a interpretação como sendo declarativa, extensiva e restritiva. Entretanto, outra corrente, não mais admite essa divisão, pois é conceito firmado que toda interpretação é declarativa do conteúdo da lei e não pode ampliar nem restringir esta.

Diante dessas diversas formas de se chegar a uma interpretação de um texto legal, cabe ao intérprete, não só traduzir em linguagem clara o que o autor disse, mais esforçar-se para entender mais e melhor do que aquilo que se acha expresso, buscar o que inconscientemente o autor quis na realidade dizer.

O que se busca é definir, de modo preciso, o caráter especial da norma e a matéria de que é objeto, porque, como nós vimos, existem diverso modos de interpretação, bem como, existem diversos ramos do direito, variando desta forma o critério de interpretação, conforme a espécie jurídica de que se trata.

Verba cum effectu, sunt accipienda: "Não se presumem, na lei, palavras inúteis". Literalmente: "Devem-se compreender as palavras como tendo alguma eficácia".


BIBLIOGRAFIA

ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Enciclopédico de Direito, 1992

DINIZ, Maria Helena. Conceito de Norma Jurídica como Problema de Essência, 1985

FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Teoria da Norma Jurídica, 1986

FRANÇA, R. Limongi. Instituições de Direito Civil, 1994

FRIEDE, Reis. Ciência do Direito, Norma, Interpretação e Hermenêutica Jurídica, 1997

LIMA, Hermes. Introdução à Ciência do Direito, 1980

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 1981

NÁUFEL, José. Novo Dicionário Jurídico Brasileiro, 1997

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Sobre a autora
Maria de Fátima Alcântara de Oliveira

advogada em Sergipe, chefe da Assessoria Jurídica da Companhia de Desenvolvimento Industrial e de Recursos Minerais do Estado de Sergipe (CODISE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Maria Fátima Alcântara. Direito como Ciência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. -1765, 1 set. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4. Acesso em: 19 abr. 2024.

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