Habeas Corpus

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04/07/2015 às 06:59
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III – O HABEAS CORPUS E A COMPETÊNCIA

O artigo 650 do Código de Processo Penal disciplina os casos de competência para conhecer o remédio heroico.

Cabe ao Supremo Tribunal Federal julgar habeas corpus nos casos disciplinados no artigo 102, I, ¨d¨, da Constituição Federal quando o paciente é o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros, o Procurador-Geral da República, os Ministros do Estado, os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica,  os Membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missões diplomáticas, de caráter permanente, bem como o habeas corpus quando o coator for o Tribunal superior ou quando o coator ou paciente for funcionário  cujos atos estejam sujeitos diretamente a jurisdição do Supremo Tribunal Federal, ou se tratando de crime sujeito a mesma jurisdição em uma única instância(artigo 102, I, ¨i, da Constituição Federal).

O Supremo Tribunal Federal editou a Sumula 690 no sentido de que compete originalmente ao Supremo Tribunal Federal o julgamento em habeas corpus contra decisão de turma recursal de juizados especiais criminais. Posteriormente, o Pleno do Pretório Excelso retificou seu entendimento, entendendo que a competência será do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Regional Federal, como se lê do HC 86.834– SP, Relator Ministro Marco Aurélio, DJ de 9 de março de 2007.

Por outro, há entendimento do Supremo Tribunal Federal, na Súmula 691, de que não compete ao Pretório Excelso conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.

A teor do artigo 69, § 2º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, o conhecimento do habeas corpus, assim como do mandado de segurança ou do recurso civil ou criminal, torna preventa a competência do Relator, para todos os recursos posteriores, tanto na ação como na execução, referentes ao mesmo processo mesmo que o relator seja vencido no primeiro julgamento. Se houver uma segunda impetração, a ele será distribuída a ação de impugnação.

O artigo 105, I, ¨c¨, da Constituição Federal disciplina a competência do Superior Tribunal de Justiça para conhecer e julgar habeas corpus, em hipótese de competência originária.

Há impossibilidade de supressão da instância. Assim não pode um Tribunal Superior tomar conhecimento de um habeas corpus impetrado por réu ou condenado, tratando-se de questão não ventilada, expressamente, nem decidida no recurso julgado pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal.[19]

Todavia, não se pode exigir prequestionamento em matéria de habeas corpus,   que a questão tenha sido tratada em sede de decisões anteriores , mas   sim,  que a questão tenha sido posta perante o tribunal coator.[20]

Transforma-se o tribunal em órgão coator se julga recurso do réu, negando provimento quando deveria ter acolhido a pretensão, bem como quando julga recurso da acusação, concedendo ou negando provimento, mas deixando de apreciar matéria fundamental, que comportaria a concessão de habeas corpus de oficio, em favor do acusado, como se lê do artigo 654, § 2º, do Código de Processo Penal.

A competência constitucional do Tribunal Regional Federal é definida pelo artigo 108, I, ¨d¨, da Constituição Federal, para conhecer e julgar habeas corpus.

Por sua vez, a competência do juiz federal para apreciar habeas corpus esta traçada no artigo 109, VII, da Constituição Federal.

A competência dos Tribunais de Justiça para conhecer e julgar habeas corpus é definida no artigo 125, § 1º, da Constituição Federal.

Cabe discutir sobre a competência para julgar habeas corpus quando a autoridade coatora for  Promotor de Justiça ou Procurador da República. No que concerne ao primeiro caso, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 73.078 – SP, Relator Ministro Vicente Cernicchiaro, 25 de março de 1996, que ao Tribunal de Justiça compete em caráter originário julgar habeas corpus quando a coação emana de Promotor de Justiça. Por sua vez, quanto aos atos do Procurador da República cabe o julgamento ao Tribunal Regional Federal da região onde atue, como se lê do RE 418.852 – DF, Relator Ministro Carlos Brito, 6 de dezembro de 2005, Informativo 412. Ali foi dito que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou orientação de que, em regra, a competência para o julgamento de habeas corpus contra ato de autoridade é do tribunal a que couber a apreciação da ação penal contra a autoridade coatora, como se lê do RE 141.209, Relator Ministro Sepúlveda Pertence. Tudo isso em homenagem a garantia do juiz natural, proclamada pelo artigo 5º, LIII, da Constituição Federal.

Por sua vez, o habeas corpus contra decisão que gere constrangimento ilegal proferida por magistrado, atuando no Juizado Especial Criminal, deve ser conhecida  e julgada pela Turma Recursal.

Se houver prerrogativa de foro, em sede de investigação policial, e do delegado tenha emanado ordem ilegal, cerceando o ir e vir do investigado? Caberia  ao juiz de direito, ou ao juiz federal, julgar o habeas corpus? Se essa ordem foi ratificada pelo órgão do tribunal a que compete instruir e julgar o feito, caberá ao tribunal competente julgar o habeas corpus.

Em síntese, via de regra, a competência para o julgamento do habeas corpus será sempre a autoridade judiciária hierarquicamente superior àquela que determinou o ato impugnado. Assim tem-se:

Contra o ato do Delegado (autoridade coatora) o habeas corpus é impetrado junto ao Juiz de primeira instância.

Contra o ato do Juiz de primeira instância o habeas corpus  é impetrado junto ao Tribunal  estadual, federal,militar, eleitoral etc., ao qual se encontra subordinado o juiz (autoridade coatora).

Contra o ato do Tribunal de segunda instância  o  habeas corpus  é impetrado junto ao Tribunal Superior respectivo (STJ, STM,  ou TSE).

Contra atos dos Tribunais Superiores (STJ, STM, ou TSE)  o  habeas corpus  será impetrado junto ao Supremo Tribunal Federal.


IV  – O HABEAS CORPUS E AS CAUSAS DE NULIDADE.

Diz o artigo 563 do Código de Processo Penal que nenhum ato será declarado nulo se da nulidade não resultar prejuízo para   a acusação ou para a defesa. É o pas de nullité sans grief.

Dir-se-á que a forma prevista em lei para a concretização de um ato processual não é um fim em si mesmo, razão pela qual se a finalidade para a qual se pratica o ato for atingida, inexiste razão para anular o que foi produzido. Tal principio deve ser aplicado, em maior alcance, nas nulidades relativas, uma vez que o prejuízo nas nulidades absolutas é presumido pela lei, inexistindo prova em contrário.

Havendo uma nulidade relativa somente será ela proclamada caso requerida pela parte prejudicada, que tem o ônus de evidenciar o mal sofrido pelo não atendimento a formalidade legal. Tal requerimento é sujeito a preclusão.

Em regra, provoca nulidade absoluta  o desatendimento às normas constitucionais. Isso porque o sistema processual não tem condições para convalidar uma infração a Constituição Federal. É a força normativa da Constituição.

Será o caso de desatendimento aos princípios da ampla defesa, do contraditório, do juiz natural, como exemplo.

Será objeto de nulidade relativa a falta de intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos da intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública. Ainda será de nulidade relativa a não concessão de prazos para a defesa e para a acusação para a manifestação ou produção de algum ato.

A competência absoluta (em razão da matéria ou da função) não admite prorrogação. Logo se infringida a nulidade será absoluta.

A competência relativa, que admite prorrogação leva a nulidade relativa. Não aventada pelas partes, nem proclamada pelo juiz, é incabível a anulação dos atos praticados, uma vez que se considerou prorrogada. A competência, em regra, é territorial, em razão do lugar da infração, teoria do resultado.

Por sua vez, a infringência com relação a regra de prevenção é de nulidade relativa, uma vez vinculada a prevenção a competência territorial(Sumula 706 do Supremo Tribunal Federal).

Pode o réu, por meio da revisão criminal e do habeas corpus, pedir a revisão de julgado sob a alegação de ter havido a incompetência absoluta. Assim ocorrendo, se em favor do acusado, o processo pode ser renovado.

Pergunta-se se a incompetência constitucional é reconhecida para prejudicar o réu. Aqui a resposta é negativa. A sentença absolutória será convalidada sem haver a renovação dos atos processuais embora inexistentes, em nome do princípio maior do favor rei e do favor libertatis.

Não pode o réu ser prejudicado se processado em vara incompetente, se não alegado a tempo pela acusação. A coisa julgada que se formou a favor do réu deve ser respeitada.

Quando houver impedimento por estar o magistrado proibido de exercer, no processo a sua jurisdição, artigo 252 do Código de Processo Penal, é ato inexistente se o fizer. Cabível o ajuizamento do habeas corpus para decretação dessas nulidades.

De outro modo, conhecido pela parte que houve suborno do juiz e ele praticou ato no processo em razão disso, cabe a ela invocar a nulidade desse ato. Se o réu, no entanto, for absolvido, com trânsito em julgado, como não há revisão pro societate, nada se poderia fazer para reabrir o feito. O juiz responderá criminalmente e administrativamente.

Se a ação é pública incondicionada e o Ministério Público não é parte não  há como convalidar o ato. O habeas corpus deve ser ajuizado para rescindir o feito em favor do réu.

Se a ação penal é pública incondicionada e o juiz, sem que nada se fale na denúncia, condena o réu por crime onde a ação penal é privada, cabe habeas corpus para anular essa parte da decisão.

Uma denúncia ou queixa ineptas podem ser objeto de rescisão do feito através do habeas corpus. Isso porque formuladas em infringência ao disposto no artigo 41 do Código Penal, sendo caso de nulidade do feito se com base nelas houver condenação isso porque impossibilitou a defesa do réu.

Deve ser decretada a nulidade do processo, sendo para isso esgrimado habeas corpus, se o crime deixa vestígios, e não se realiza o exame de corpo de delito que é instrumento fundamental para a instrução processual, como se lê do artigo 159, § 1º, do Código de Processo Penal.

A defesa do réu é imprescindível. Se impossibilitada no feito, o caminho é ajuizamento de habeas corpus.

A não nomeação de defensor ad hoc leva a nulidade absoluta, a ser objeto de discussão em habeas corpus. Se o defensor constituído ou dativo não comparece ao feito, é indispensável que o juiz nomeie defensor para o ato. Se o ato processual ocorre, sem que haja defesa, há nulidade absoluta, podendo ser aferida em habeas corpus. [21]

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Assim não tendo sido nomeado defensor ao réu, caso esse não possua advogado constituído, gera-se nulidade absoluta, uma vez presumido o prejuízo, afrontando-se o princípio da ampla defesa.

A deficiência de prova não é causa obrigatória de nulidade, devendo o réu evidenciar o prejuízo que teria sofrido na sua defesa, nulidade relativa.

A isso deve ser lido o teor da Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal.

Se a deficiência for grosseira, é caso de ajuizar habeas corpus por considerar-se que o réu ficou sem defesa.[22]

Se o réu não é intimado para participar do feito, em prejuízo de sua defesa, o caso é de nulidade absoluta. Porém, se é intimado, não comparece, mas comparece seu advogado, é caso de nulidade relativa a depender de alegação e demonstração do prejuízo.

Por outro lado, se  há defesas antagônicas, produzidas por advogado que patrocina todos os réus, isso poderá trazer prejuízo para a defesa dos réus. Se trouxer o caso é de nulidade   absoluta do processo, pois não exercida a ampla defesa.

Se a defesa é patrocinada por falso advogado, o caso é de nulidade absoluta do processo, pois o réu ficou sem defesa técnica. Isso independente do fato de que são nulos os atos privativos do advogado praticados por pessoa não inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, como se lê do artigo 4º do Estatuto da Ordem.

Se há prejuízo do réu que leve a sua condenação, pois patrocinado por alguém que não era advogado, o caminho é pedir a nulidade absoluta, por habeas corpus, do feito.[23]

O réu não pode ficar sem defensor. Assim é nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir o outro, como se lê na Súmula 708 do Supremo Tribunal Federal. É, pois necessária a intimação do réu para constituir outro defensor  antes do julgamento.

A ausência de citação do réu leva a nulidade absoluta, determinando-se a nulidade do feito a partir da ocorrência do feito. Tal nulidade pode ser declarada por habeas corpus.

Diria mais, à luz do que lecionou Alvim Pinto[24], que a sentença proferida em processo a que faltou a citação do réu, mesmo em caso de não se tratar de um único réu, MS de um dos corréus, não passa em julgado.

Isso, porém, não porque de nulidade absoluta seja caso, mas porque a sentença é, mais do que isto, inexistente, em virtude de ser fruto de processo que, juridicamente não se formou.

Realmente admitir opinião diversa, significa permitir a existência de conceito diverso de  processo, que repousa sobre a conhecida ideia de autor, réu, e juiz.

A não concessão de prazos à acusação e a defesa, durante a instrução,  é causa de nulidade relativa, devendo-se comprovar o prejuízo.

Impõe-se a sanção de nulidade absoluta do processo se realizado sem que se dê ao réu a oportunidade de se submeter ao interrogatório. Haveria no caso manifestação de violação da ampla defesa, no que se refere a manifestação da autodefesa. Essa a melhor lição de Oliveira.[25]

Data vênia, não concordo com tese já apresentada de que seria tese de nulidade relativa, sujeita a preclusão. É  o que se disse em julgamento do HC 82.933 – 3/SP, Relatora Ministra Ellen Gracie, em 27 de março de 2003, na mesma linha do julgamento do HC 68.490/DF, Relator Ministro Celso de Mello. Ora, o réu tem direito a ser ouvido. Se não intimado, não ouvido, é caso de nulidade absoluta. Digo isso, inclusive, á luz do artigo 8º, I, do Pacto de São José da Costa Rica. Se intimado não comparecer, o problema é outro: não há de se falar em nulidade absoluta. Só haverá nulidade se for apresentada   prova de prejuízo.

Ainda haverá nulidade absoluta, se, no interrogatório, não puder ser dada oportunidade de orientações ao réu, por seu advogado.

O sorteio para constituir conselho de sentença fora do número legal, é causa de nulidade absoluta.

No Tribunal do Júri, são causas de nulidade, a não incomunicabilidade dos jurados e ainda a inexistência de quesitos obrigatórios  e suas respostas, como se lê da Sumula 156 do Supremo Tribunal Federal.

A falta de intimação para razões finais é causa de nulidade absoluta, que pode ser aferível por habeas corpus.

Necessário, pois, distinguir as hipóteses em que não  há concessão de prazo para a produção das alegações finais e os casos em que, apesar de ter sido regular a abertura do prazo, a parte se omite em oferecê-las; nas primeiras, por certo, como já salientado, a nulidade é absoluta como já determinava o antigo artigo 564, III, ¨e¨, parte final,  do Código de Processo Penal.

Para Grinover e outros[26], a ausência de alegações finais do representante do Ministério Público, melhor seria dizer presentante, além de implicar violação do dever funcional, sujeita a sanções disciplinares, caracteriza nulidade prevista no artigo 564, III, ¨d¨, considerada sua natureza relativa, artigo 572 do Código de Processo Penal.

A intimação do defensor, caso as alegações sejam feitas, por escrita, é indispensável, como já se manifestou, no passado.[27]

O princípio da causalidade poderá determinar a anulação do processo desde a sua origem. É o caso de incompetência absoluta ou ainda relativa do juízo.

As nulidades atinentes aos requisitos de validade do processo, envolvendo os pressupostos processuais de validade(citação válida, juízo competente, juiz não impedido, por exemplo), somam-se as condições de ação, que se não respeitadas, terão, por consequência, a nulidade absoluta do processo que poderá levar a relaxamento da prisão do acusado, se, porventura, por realizada por juízo incompetente. É certo que tem-se entendido que o juízo competente pode convalidar os atos processuais realizados inclusive a prisão decretada antes por juízo incompetente.

Discute-se se ainda a nova sistemática da tomada de depoimentos prevista na Lei 11.719/08 e Lei 11.690/08. Ouvido o ofendido, devem as partes diretamente, a teor do artigo 212 do Código de Processo Penal, inquirir as testemunhas, cabendo ao Juiz complementar o ato, ao final. No interrogatório do réu, que deve ser feito ao final do procedimento,   seria  ele iniciado com o Juiz, podendo as partes intervir no final, devendo se dar tratamento unitário, podendo  as partes iniciar as inquirições, falando nesse último ato, em primeiro lugar, a que acusa. Ao final, o Juiz facultará às partes as razões orais, devendo todos os atos ser realizados em audiência, em razão do princípio da oralidade.

Tudo é dito sob o pálio do sistema acusatório, que é o adotado pela Constituição de 1988.

O sistema acusatório implica o estabelecimento de uma verdadeira relação processual, estando em pé de igualdade o autor e o réu, sobrepondo-se a eles, como órgão imparcial de aplicação da lei, o Juiz. São traços que o marcam: a) o contraditório, como garantia político-jurídica do cidadão; b) as partes acusadora e acusada, em decorrência do contraditório, encontram-se no mesmo pé de igualdade; c) o processo é público, fiscalizável pelo povo, sendo que excepcionalmente se permite uma publicidade restrita a bem de certos valores; d) as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a pessoas distintas; e) não é dado ao juiz iniciar o processo; f) a iniciativa do processo cabe a parte acusadora que poderá ser o ofendido ou seu representante legal.

Com a entrada em vigor da Lei 11.690, de 9 de junho de 2008, foi alterada a forma de inquisição das testemunhas, estabelecendo o artigo 212 do Código de Processo Penal que as perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, cabendo ao Juiz apenas complementar a inquirição sobre os pontos não esclarecidos, bem como exercer o controle sobre a pertinência das indagações e das respostas.

A parte que arrolou a testemunha formula as perguntas antes da outra parte, perguntando o juiz por último.

Correto o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1259482/RS, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe de 27 de outubro de 2011, que a inversão da ordem de inquirição, na hipótese em que o Juiz – apenas o Juiz, não a outra parte -, formule pergunta à testemunha antes da parte que a arrolou, somente poderia ensejar nulidade relativa, a depender de protesto da parte contrária, sob pena de preclusão, bem como a comprovação, de forma inequívoca, de efetivo prejuízo com a indagação formulada fora da ordem sugerida na norma processual.

É cediço que no terreno das nulidades no âmbito do processo penal vige o sistema da instrumentalidade das formas, no qual se protege o ato praticado em desacordo com o modelo legal caso tenha atingido a sua finalidade, cuja invalidação é condicionada à demonstração do prejuízo causado à parte, ficando a cargo do magistrado o exercício do juízo de conveniência acerca da retirada da sua eficácia, de acordo com as peculiaridades verificadas no caso concreto, como se vê do julgamento no HC 163428/DF, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe de 1 de agosto de 2011, onde o Superior Tribunal de Justiça se posicionou pela aplicação do princípio da instrumentalidade das formas.

Mas leve-se em conta: a bem do sistema penal acusatório, a inquirição pelo Juiz deve-se se dar de modo complementar, não principal, não podendo substituir o órgão incumbido pela acusação.

Entenda-se que a Lei 11.690, de 9 de junho de 2008, alterando a redação do artigo 212 do Código de Processo Penal, passou a adotar o procedimento do Direito Norte-Americano, chamado cross-examination, no qual as testemunhas são questionadas diretamente pela parte que as arrolou, facultando à parte contrária, a seguir, sua inquirição(exame direto e cruzado) e ao Juiz os esclarecimentos remanescentes e o poder de fiscalização. A reforma do Processo Penal de 2008 suprimiu o sistema presidencialista na oitiva das testemunhas em juízo, adotando-se o sistema acusatório.

Em decisão que sintetiza o que foi abordado, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 133654/DF, Relator Ministro Celso Limongi(Desembargador Convocado do TJ/SP), DJe de 20 de setembro de 2010, entendeu que a inversão da ordem de inquirição direta das testemunhas previsto no artigo 212 do Código de Processo Penal , na redação dada pela Lei 11.690/08, não altera o sistema acusatório. Sem a oportuna alegação e a devida demonstração de efetivo prejuízo, não há falar em nulidade, muito menos em absoluta.

Lembro que as nulidades relativas devem ser arguidas pela parte interessada ou na oportunidade que lhes for imediatamente posterior, em que se manifestar nos autos, ou no prazo que a lei estabelecer, sob pena de preclusão. Isso porque nas nulidades relativas há o interesse prevalente das partes, seja no que concerne à identificação da existência, seja no que concerne as consequências do prejuízo.

As nulidades absolutas não precluem para o Juiz. Para as partes ocorre preclusão, não temporal, mas consumativa.

Se há vício com relação aos pressupostos processuais ou as condições de ação, há nulidade absoluta ou ainda em circunstâncias não assimiláveis nos itens mencionados.

Tem-se outrossim  os atos inexistentes que não produzem efeito algum: os atos judiciais praticados por aquele que não é órgão do Poder Judiciário, por exemplo. A inexistência tem estrita relação com os pressupostos de existência da relação processual enquanto a nulidade tem respeito aos pressupostos de validade da relação processual.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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