A Lei 11.079 de 2005 que institui normas gerais para licitação e contratação de Parceria público-privada no âmbito da administração pública, conceitua PPP na modalidade administrativa em seu artigo 2º, §2º. Vejamos[1]:
Art. 2º Parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa.
§ 2º Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens.
Para Di Pietro, concessão administrativa é[2]:
“A concessão administrativa constitui-se em um misto de empreitada (por que o serviço, mesmo que prestado a terceiros, é remunerado pela própria Administração, como se deduz do artigo 2º, §3º) e de concessão de serviço público (por que o serviço prestado ou não a terceiros – os usuários – está sujeito a algumas normas da Lei nº8.987, sejam as relativas aos encargos e prerrogativas do poder concedente, sejam as relativas aos encargos do concessionário).
Temos, portanto, que o contrato de parceria público-privada, é um contrato administrativo, e como tal, deve obedecer as normas e princípios que regem a administração pública.
Passando à análise do projeto da BR 232, estabelece a Lei 11.079/2005 em seu artigo 10, inciso IV que[3]:
Art. 10. A contratação de parceria público-privada será precedida de licitação na modalidade de concorrência, estando a abertura do processo licitatório condicionada a:
VI - submissão da minuta de edital e de contrato à consulta pública, mediante publicação na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, que deverá informar a justificativa para a contratação, a identificação do objeto, o prazo de duração do contrato, seu valor estimado, fixando-se prazo mínimo de 30 (trinta) dias para recebimento de sugestões, cujo termo dar-se-á pelo menos 7 (sete) dias antes da data prevista para a publicação do edital; (grifos meus).
Com base no texto legal acima, seria necessário à submissão da minuta do edital e de contrato à consulta pública, ocorre que, a consulta foi marcada, mas não aconteceu, havendo assim desrespeito à norma especificada acima.
Ainda que assim não fosse, e aso tivesse havido a consulta, o prazo estabelecido seria de 07/10 a 05/11, ou seja, menos de trinta dias, havendo mais uma vez desrespeito a norma que regula a matéria.
Preceitua o inciso II do artigo 10 da Lei 11.079 de 2005 que:
II - elaboração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada;
O contrato analisado estabeleceu um valor de R$ 495 milhões a serem pagos a empresa concessionária a título de contraprestação, e mensalidades de 9,6 milhões de reais mensais pelos 23 anos subsequentes, contudo, a Administração esqueceu de avaliar o impacto que tais “mensalidades” causaria no orçamento financeiro dos exercícios seguintes, pois o valor final estimado, seria de R$ 2,456 bilhões reais de impacto nos cofres públicos.
Agindo de tal maneira, desrespeitou a norma supramencionada e logo o princípio da legalidade.
Hely Lopes Meirelles[4], em sua obra Direito Administrativo Brasileiro, conceitua legalidade:
“A legalidade, como principio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.”
O principio da Legalidade legitima a atuação da Administração Pública àquilo que é permitido por lei, de acordo com os meios e formas que por ela estabelecidos e segundo os interesses públicos, pois na administração não cabe total autonomia de vontades, o Estado deve agir em conformidade com a lei, a fim de conferir garantia e segurança jurídica.
Como se não bastasse, quando houve o desrespeito à norma quanto à necessidade da submissão da minuta de edital e de contrato à consulta pública, houve também o desrespeito ao princípio da transparência e da publicidade.
Conforme assevera Schiefler:
“A consulta pública é um instrumento de transparência e de participação que aponta para a democratização da administração pública. O problema, no entanto, é que quando o acesso ao projeto de PPP se dá só na consulta pública a possibilidade de participação e eventual remodelagem do projeto é muito menor, pois o projeto já está acabado e não em fase de formação. Assim, com o projeto pronto para ser lançado, se houver alguma alteração, será pequena. A questão é que a ampla publicidade e possibilidade de participação antes do fechamento de um projeto torna a PPP mais legítima sob o aspecto democrático, o que, inclusive, repercute positivamente para a segurança jurídica do contrato”[5]
Consoante o disposto verifica-se que consultar a população, ouvir aqueles que estão interessados é fundamental para uma proposta publica transparente.
Ainda segundo Schiefler[6], o Estado brasileiro adota a transparência como regra e o sigilo como exceção, ou seja, a publicidade é um princípio constitucional. A Constituição assegura ao cidadão o direito de acesso à informação pública e ao recebimento das informações.
Assim, a ausência de transparência e de ampla publicidade, ressalte-se, resulta em linhas gerais em licitações menos competitivas, podendo ocasionar prejuízos de grande monta para a administração pública, pois há enormes possibilidades de não haver escolha da proposta mais vantajosa ao poder público.
Portanto, é possível concluir que o projeto de implantação, recuperação, readequação, manutenção e operação da BR-232 apresenta sem dúvidas alguns pontos críticos, quais sejam vícios no elemento forma, desrespeitando os procedimentos e normas estabelecidas à matéria, bem como ferindo princípios basilares como legalidade e publicidade.
REFERÊNCIAS
COLETÂNIA DE LEGISLAÇÃO ADMINISTRATIVA, Constituição Federal/Organização Odete Medauar; obra coletiva de autoria da Editora Revista dos Tribunais. -13. Ed.rev.,ampl. e atual. São Paulo. RT, 2003.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008
MIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris.
SCHIEFLER, Gustavo Falta transparência nas PPPs de Pernambuco. Disponível em http: <//m.jc.ne10.uol.com.br/canal/e conomia /pernambuco/noticia/2013/10/05/falta-transparencia-nas-ppps-de-pernambuco-100133.php>. Acesso em 27 de maio de 2015.
[1] Coletânia de Legislação Administrativa, Constituição Federal/Organização Odete Medauar;obra coletiva de autoria da Editora Revista dos Tribunais. -13. Ed.rev.,ampl. e atual. São Paulo. RT, 2003. p. 1210.
[2] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. P 296.
[3] Coletânia de Legislação Administrativa, Constituição Federal/Organização Odete Medauar;obra coletiva de autoria da Editora Revista dos Tribunais. -13. Ed.rev.,ampl. e atual. São Paulo. RT, 2003. p. 1210.
[4] MIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
[5] Falta transparência nas PPPs de Pernambuco. Disponível em http: <//m.jc.ne10.uol.com.br/canal/e conomia /pernambuco/noticia/2013/10/05/falta-transparencia-nas-ppps-de-pernambuco-100133.php>. Acesso em 27 de maio de 2015.
[6] SCHIEFLER, Gustavo Falta transparência nas PPPs de Pernambuco. Disponível em http: <//m.jc.ne10.uol.com.br/canal/economia/pernambuco/noticia/2013/10/05/falta-transparencia-nas-ppps-de-pernambuco-100133.php>. Acesso em 27 de maio de 2015.