A redução da maioridade penal e a eficácia das medidas socioeducativas

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Artigo sobre a redução da maioridade penal.

“Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda quando for velho, não se desviara dele.”

Provérbio de Salomão, capitulo 22, versículo 6 (Bíblia Sagrada).

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................

9

2 HISTÓRICO DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO BRASIL............................................................................................................

11

2.1 AS ORDENAÇÕES....................................................................................

12

2.2 O CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO........................................................

13

2.3 O CÓDIGO PENAL DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL DE 1890.......

14

2.4 O CÓDIGO DE MELLO MATOS (CÓDIGO DE MENORES DE 1927)......

15

2.5 O CÓDIGO PENAL DE 1940.....................................................................

17

2.6 O CÓDIGO DE MENORES DE 1979.........................................................

18

2.7 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE...................................

19

3  A RESPONSABILIZAÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - O ATO INFRACIONAL........................................................................................

22

3.1 O ATO INFRCIONAL.................................................................................

3.2.INIMPUTABILIDADE INFANTOJUVENIL.................................................

22

22

3.3 PROCEDIMENTO DE APURAÇÃO DO ATO INFRACIONAL...................

24

3.2.1 Fase Policial..........................................................................................

24

3.2.2 Fase de Atuação do Ministério Público..............................................

25

3.2.3 Fase Judicial..........................................................................................

26

4 ANÁLISE DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS........................................

28

4.1 DISPOSIÇÕES GERAIS............................................................................

28

4. 2 MEDIDAS NÃO-PRIVATIVAS DE LIBERDADE.......................................

29

4.2.1 Advertência............................................................................................

29

4.2.2 Obrigação de Reparar o Dano.............................................................

30

4.2.3 Prestação de Serviços à Comunidade................................................

30

4.2.4 Liberdade Assistida..............................................................................

31

4.3 MEDIDAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE.................................................

34

4.3.1 Semiliberdade........................................................................................

34

4.3.2 Internação..............................................................................................

36

4.4 A LEI DO SINASE......................................................................................

38

5 A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL.....................................................

41

  1. DIVERGÊNCIA ACERCA DO TEMA..........................................................

41

5.2 A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA PEC 171/93 E A VIOLAÇÃO DE CLÁSULA PÉTREA.........................................................................................

41

5.3 MAIORIDADE PENAL NO DIREITO COMPARADO.................................

45

5.3.1 Maioridade na Europa...........................................................................

47

5.3.2 Maioridade nos Estados Unidos..........................................................

49

5.3.3 Maioridade na Ásia...............................................................................

5.3.4 Maioridade Penal na América Latina...................................................

5.4 QUESTÕES SOCIOLÓGICAS QUE FOMENTAM O ADOLESCENTE A COMETER O ATO INFRACIONAL..................................................................

49

49

50

6 EXPERIÊNCIA DE SUCESSO NO ECA EM MINAS GERAIS....................

53

  1. PROGRAMA DE LIBERDADE ASSISTIDA DA PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE – MG................................................

53

7 CONCLUSÃO...............................................................................................

55

REFERÊNCIAS...............................................................................................

57

 

RESUMO

O presente trabalho acadêmico objetivou abordar um assunto que tem um importante destaque tanto para o mundo acadêmico quanto para o meio social que são as discussões polêmicas existentes em relação às propostas de Emenda à Constituição Federal, as quais tratam da redução da maioridade penal de dezoito para dezesseis anos de idade. Pretendeu-se abordar sobre as legislações passadas e estrangeiras, como forma de obter uma comparação com a legislação do Brasil. Também se almejou demonstrar a eficácia de cada medida aplicada aos adolescentes, as medidas socioeducativas, com o propósito de se ter uma alternativa à referida proposta, juntamente com a questão da inconstitucionalidade ou não da referida Proposta. Devido à repercussão que a mídia dá aos casos da delinquência juvenil associados à proposta de redução da maioridade penal, a população vem pressionando o Estado em busca de uma solução, porém a solução almejada pela proposta pode não ser a melhor opção para resolver o problema da delinqüência juvenil.

Palavras-chave: Maioridade penal. Eficácia. Medidas socioeducativas. Delinquência juvenil. Proposta de Emenda à Constituição.

 

ABSTRACT

This academic study aimed to address an issue that has a major highlight for both the academic world and to the social environment that are existing controversial discussions regarding the proposed Amendment to the Federal Constitution, which relate to the reduction of the legal age of eighteen to sixteen years old. It was intended to address about past and foreign legislation, in order to obtain a comparison with the laws of Brazil. Also craved demonstrate the effectiveness of each measure applied to adolescents, social and educational measures, in order to have an alternative to the proposal, along with the issue of constitutionality or otherwise of the Proposal. Due to the impact that the media gives to cases of juvenile delinquency associated with the proposed reduction of legal age, the population has been pushing the state in search of a solution, but the solution desired by the proposal may not be the best option to solve the problem of juvenile delinquency.

                                             

Keywords: criminal Majority. Effectiveness. Educational measures. Juvenile delinquency. Proposed Amendment to the Constitution.

 

 

 

 

 

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, é perceptível o aumento da violência no Brasil e, consequentemente, o aumento da delinquência infanto-juvenil. O presente trabalho acadêmico consistiu em demonstrar se a redução da maioridade penal é realmente a solução viável e se as medidas socioeducativas aplicadas ao adolescente em conflito com a lei são eficazes.

A expressão maioridade penal se refere à idade-limite que um indivíduo detém para ser considerado imputável, ou seja, a idade que o mesmo possui capacidade para entender o fato como ilícito e agir de acordo com esse discernimento; no Brasil, a pessoa imputável é aquela com mais de 18 anos. O termo “maioridade” surgiu à época do Brasil-Império, como se demonstrou no segundo capítulo do presente trabalho acadêmico, assim como o histórico da legislação brasileira desde à época do descobrimento do país até dos dias atuais.

No terceiro capítulo, abordou-se sobre a inimputabilidade penal, assim como a responsabilização penal do adolescente e o ato infracional praticado e suas fases de apuração. Também se objetivou demonstrar quais são os atos mais praticados pelos adolescentes infratores, levando-se em consideração a gravidade de tais atos.         

As medidas socioeducativas na íntegra foram discorridas no capítulo quatro, assim como uma breve demonstração da eficácia de cada uma delas. Consoantemente, foi disposto o perfil do adolescente em conflito com a lei, assim como as características da maioria das famílias dos mesmos. Fora realizado estudo no, recente inaugurado, Centro Socioeducativo Doutor Zequinha Parente, que tem capacidade para comportar 40 adolescentes.

A redução da maioridade é tema polêmico na atualidade do país e, para tanto, o presente trabalho, no capítulo cinco, consistiu em demonstrar a atual divergência acerca da Proposta de Emenda à Constituição de redução da maioridade penal, a PEC 171/1993 e a sua constitucionalidade.

O objetivo deste trabalho é o de demonstrar que reduzir a maioridade penal, por si só, não resolverá o problema de delinquência juvenil, pois a que idade-limite se chegaria se continuássemos depositando a causa ou fator na idade dos delinquentes? Objetiva-se especificamente demonstrar que o investimento em um sistema socioeducativo rigoroso seria uma boa alternativa para a diminuição de crimes entre os menores, como ficou previsto no capítulo cinco.

A questão é fazer com que oECA seja efetivamente cumprido em locais onde deveria ocorrer a ressocialização dos adolescentes. As penalidades previstas se restringem apenas a adolescentes de 12 a 17 anos. Porém na prática não é assim, os jovens infratores sentem-se em um “à vontade” ao cumprir tais medidas e acabam por voltar a praticar novos ou os mesmos crimes, já que tais medidas não possuem uma maior eficácia.

A metodologia utilizada foi a pesquisa doutrinária, jurisprudencial, em campo e demais trabalhos relacionados ao tema.

Diante o exposto, este trabalho visa buscar medidas efetivas de prevenção e não só à delinquência juvenil, mas, principalmente, de prevenção à violação dos direitos desses jovens. Ao contrário do que se acredita, como exposto no capítulo seis, esses jovens podem ser recuperados e reinseridos na família e na comunidade. Para tanto, são necessários investimentos, não só do Estado, mas da família e da sociedade na recuperação dos mesmos. E não se trata só de investimento financeiro, mas de credibilidade e, também, de oportunidades. É necessário a elaboração de políticas públicas eficazes na prevenção da violação dos direitos desses indivíduos e de valorização da família como base da sociedade. Tem-se que quanto mais investimentos forem feitos na redução de desigualdades sociais, menos problemas a sociedade terá. À vista disso, como o problema da violência é um tanto quanto complexo, as políticas públicas devem buscar solucioná-lo em sua origem e, não, tratá-lo no seu fim.

A idéia da sociedade é de que os adolescentes não são punidos pelos atos ilícitos que praticaram e tal idéia é completamente errônea. O Estatuto da Criança e do Adolescente, promulgado em 1990, prevê o cumprimento das medidas socioeducativas, mas não foi só a partir de tal ano que tais indivíduos começaram a ter punição pelos seus atos, mas desde a época em que o Brasil era colônia de Portugal, como se pôde observar pelo capitulo a seguir.

2 HISTÓRICO DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

O termo “maioridade’’, embasados pelos relatos históricos à época, surgiu quando Dom Pedro I abdicava do trono em favor do filho, o príncipe Pedro Alcântara, devido aos majorados conflitos com a elite e com a oposição liberal. Contudo, o filho do então imperador contava apenas com pouco mais de 05 anos de idade. (SANTANA, 2015, online)

Àquela época, a então Constituição vigente era do ano de 1824 que dispunha que, durante a menoridade do sucessor, o país seria governado por um regente que fosse um parente mais próximo do imperador; entretanto, não havia nenhum parente que se encaixasse nesses requisitos. Diante disso, o mesmo supremo ordenamento previa uma Regência Trina Provisória e depois por uma Regência Trina Permanente, a fim de que o executivo não ficasse acéfalo.

Com a renúncia de Dom Pedro I, instalou-se um caos político no país e a solução seria o então príncipe Pedro Alcântara ocupar o trono vagado pelo pai. Porém, tal processo não seria fácil, visto a crise política instaurada no país. A nossa constituição previa que, para ocupar o trono do Brasil, o almejante a imperador deveria ter no mínimo 18 anos de idade ou, como alternativa, o cargo seria ocupado por um príncipe parente do imperador, com no mínimo 25 anos. Tal dispositivo foi alterado pelo Ato Adicional e a Regência passava de trina à una, com uma única pessoa no poder com mandato de 04 anos.

Com a crise política, sugeriu-se a antecipação da maioridade do herdeiro, visto que para os parlamentares, o caos era devido único e exclusivamente pelas regências em vigor. A partir de 1837,             parlamentares liberais apresentaram projetos de emenda constitucional que instituíam a antecipação da maioridade do imperador e em 1840, com o Golpe da Maioridade, o almejado foi conseguido: Pedro Alcântara, com 15 anos foi coroado e recebeu o título de Dom Pedro II. (VENANCIO, 2010, online)

Para conhecer mais o assunto, abordar-se-á nos próximos tópicos, a história da legislação brasileira, desde o descobrimento do Brasil até os dias atuais.

2.1 AS ORDENAÇÕES

                                                      

No período colonial, o Brasil era regido pelas legislações e ordenações provenientes de Portugal. O país era submetido às Ordenações do Reino, que eram o conjunto de leis vigentes na metrópole, feitas pelos seus monarcas e que constituíam a base do direito vigorante.

À época do descobrimento do Brasil, em 1500, passaram a vigorar as Ordenações Afonsinas e, logo em seguida, em 1520, as Ordenações Manuelinas. Com o domínio de Portugal pela Espanha, o então rei Felipe II resolveu reformular as Ordenações Manuelinas, como destaca Fregadolli (online, p.17):

Como é sabido, vigoravam, em matéria criminal, no Brasil as Ordenações Afonsinas, uma compilação publicada em 1446, sob o reinado de D. Afonso V, que D. Manuel I, em 1505 mandou rever, promulgando em definitivo em 1512 o corpo de leis que ficou conhecido como Ordenações Manuelinas.

Passando Portugal ao domínio da Espanha, por uma lei dada em Madri, aos 5 de junho de 1595, Felipe II resolveu reformar as Ordenações Manuelinas e ordenar nova receptação das normas e costumes jurídicos, confiando essa tarefa codificadora a Pedro Barbosa, Paulo Afonso, Jorge de Cabedo e Damião de Aguiar, considerados, na época, ilustres cultores da ciência jurídica.

Logo, as relações jurídicas passaram a ser regidas pelas Ordenações Filipinas, promulgadas em 1603 e vigorando até o Código Criminal de 1830. Tais Ordenações puniam os menores e pôde-se notar que eram punições severas de acordo com o seguinte trecho ressaltado por Janine Soares, promotora de justiça do Rio Grande do Sul (2015, online):

De acordo com as Ordenações Filipinas, a imputabilidade penal iniciava-se aos sete anos, eximindo-se o menor da pena de morte e concedendo-lhe redução da pena. Entre dezessete e vinte e um anos havia um sistema de ‘jovem adulto’, o qual poderia até mesmo ser condenado à morte, ou, dependendo de certas circunstâncias, ter sua pena diminuída. A imputabilidade penal plena ficava para os maiores de vinte e um anos, a quem se cominava, inclusive, a pena de morte para certos delitos.

Antes de 1830, quando foi publicado o primeiro Código Penal do Brasil, as crianças e os jovens eram severamente punidos, sem muita diferenciação quanto aos adultos, a despeito do fato de que a menor idade constituísse um atenuante à pena, desde as origens do direito romano.

Percebe-se, portanto, que o Livro Quinto, o qual discriminava a responsabilização criminal de crianças e adolescentes, era dividido em três etapas: a primeira etapa era designada àqueles com mais de 20 anos, os quais não tinham atenuantes, sendo penalizados como se maiores de idade fossem, com 25 anos; a segunda etapa destinava-se ao jovem com idade entre 17 e 20 anos que cometiam delitos mais graves, sendo vedada a pena de morte, devendo os julgadores escolherem a pena e o tempo da mesma; se fossem delitos menos graves, as penas deveriam ser reduzidas, assim como aduz Tavares (2004, online)

E se for de idade de dezessete anos até vinte, ficará ao arbítrio dos julgadores dar-lhe a pena total, ou diminuir-lha. E neste caso olhará o julgador o modo, com que o delito foi cometido, e as circunstâncias dele, e a pessoa do menor; e se achar em tanta malícia, que lhe pareça que merece pena total, dar-lhe-á, porto que seja de morte natural. E parecendo-lhe que não a merece, poder-lhe-á diminuir, segundo a qualidade, ou simpleza, com que achar, que o delito foi cometido.

Ao final, a terceira etapa do Livro Quinto tratava dos jovens que cometessem delitos sancionados com pena de morte natural, não podendo, entretanto, a mesma ser aplicada e o juiz sancionar com alternativa uma pena mais leve. (BRASIL, 1603, online)

Logo, as Ordenações eram dotadas de uma rigidez penal e não diferenciavam crianças de adolescentes.

2.2 O CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO

Após a Proclamação da Independência do país, em 1822, foi promulgada a nova Constituição brasileira, em 1824, sendo idealizada a primeira codificação em matéria criminal no Brasil, a qual só teria existência em 1830, a qual passou a se chamar de Código Criminal do Império. (MACIEL, 2015, p. 46)

Em tal código, era permitido que o menor de 14 anos fosse punido criminalmente, podendo o mesmo ser recolhido às casas de correção como poderia também até ser condenado à prisão perpétua, senão veja-se a letra da lei:

Art. 10. Tambem não se julgarão criminosos:

1º Os menores de quatorze annos.

 Art. 13. Se se provar que os menores de quatorze annos, que tiverem commettido  crimes, obraram com discernimento, deverão ser recolhidos ás casas de correção, pelo tempo que ao Juiz parecer, com tanto que o recolhimento não exceda á idade de dezasete annos (sic).

Assim, se o menor de 14 anos, como destaca o artigo 13 do dispositivo supracitado, tivesse obrado com discernimento poderia ser recolhido às casas de correção pelo tempo que o juiz entendesse necessário, não ultrapassado a idade de 17 anos.

Pode-se observar que o Código Criminal do Império abordava um sistema biopsicológico para a punição das crianças entre 7 e 14  anos, no qual uma criança de, por exemplo, 8 anos de idade poderia ter discernimento para ser punida e um adolescente de 15 anos de idade poderia ser condenado à prisão perpétua.

2.3 O CÓDIGO PENAL DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL DE 1890

Com a Proclamação da República, em 1889, logo fora promulgado o Código Penal, antes mesmo da promulgação da nova Constituição brasileira em 1891.

Com o marco histórico da Proclamação, as elites começaram a discutir a temática da criança e a mesma adquiriu certa dimensão política, consubstanciada no ideal republicano da época. Ressaltava-se a urgência de intervenção do Estado, educando ou corrigindo os menores para que se transformassem em cidadãos úteis e produtivos para o país, assegurando a organização oral da sociedade (SOARES, 2015, online).

O novo código adotou um modelo divergente daquele anterior, já que tornou inimputáveis os menores de 9  anos completos, ou seja, crianças com tal idade não poderiam ser responsabilizadas criminalmente. Aumentou, portanto, o limite anteriormente fixado. Àqueles com mais de 09 e menos de 15 anos, era estabelecido a mesma análise de discernimento como no código anterior, para responsabilizá-los ou não criminalmente, observado a seguir com o artigo 27 do Código:

Art. 27. Não são criminosos:

§ 1º Os menores de 9 annos completos;

§ 2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento.

É nítido que o critério biopsicológico, ou seja, a análise de discernimento era de suma importância para a aplicação da pena na época, já que aqueles que não obrassem discernimento não poderiam ser punidos.

2.4 O CÓDIGO DE MELLO MATOS (CÓDIGO DE MENORES DE 1927)

Diante do aumento da criminalidade infantil, no contexto das discussões da época a respeito dos direitos da criança, foi estabelecido através do Decreto nº 17943-A, de 12 de outubro de 1927, considerado o atual “dia das crianças”, o primeiro Código de Menores do Brasil ou Código de Mello Matos, em homenagem ao seu idealizador, o jurista José Cândido de Albuquerque Mello Matos.

Tal Código não mais trouxera o critério de discernimento vigente desde o Código Penal de 1890. O Código de Mello Matos inovou e foi mais conciso e objetivo ao afirmar que as crianças e adolescentes até 14 anos eram objeto de medidas punitivas com finalidade educacional. Já os jovens, entre 14 e 18 anos, eram passíveis de punição, mas com responsabilidade atenuada. (MACIEL, 2015, p. 47)

O referido código foi idealizado frente a um elevado aumento no índice de infrações praticadas por menores, que não respeitavam a legislação vigente, surgindo daí a Doutrina da Situação Irregular, descrita por Saraiva (2010, p.23)

A declaração de situação irregular tanto poderia derivar de sua conduta pessoal (caso de infrações por ele praticadas ou de “desvio de conduta”), como da família (maus tratos) ou da própria sociedade (abandono). Haveria uma situação irregular, uma “moléstia social”, sem distinguir, com clareza, situações decorrentes da conduta do jovem ou daqueles que o cercam

Pode-se afirmar que a Doutrina da Situação Irregular traçava uma divisão entre os menores no Brasil, conforme a posição social: um grupo seria o das crianças e adolescentes com os direitos assegurados devidamente, em tese, em situação regular, e aquele grupo de menores tidos como abandonados, mend          igos, os quais eram alvo da lei por estarem em situação irregular. O Código de Mello Matos (BRASIL, 1927, online), mais precisamente, classificou os menores em situação irregular da seguinte forma:

Art. 26 Consideram-se abandonados os menores de 18 annos:

I - que não tenham habitação certa, nem meios de subsistência, por serem seus pais falecidos, desaparecidos ou desconhecidos ou por não terem tutor ou pessoa sob cuja, guarda vivam;

II – que se encontrem eventualmente sem habitação certa [...]

Art. 28 São vadios os menores que:

 a) vivem em casa dos paes ou tutor ou guarda, porém se mostram refractarios a receber instrucção ou entregar-se a trabalho sério e útil, vagando habitualmente pelas ruas e logradouros públicos;

b) tendo deixado sem causa legítima o domicílio do paes, mãe ou tutor ou guarda [...]

Art.29 São mendigos os menores que habitualmente pedem esmolas para si ou para outrem [...]

Art. 30 São libertinos os menores que habitualmente:

  1. na via pública perseguem ou convidam companheiros ou transeuentes para a prática de actos obscenos;
  2. se entregam a prostituição em seu próprio domicílio, ou vivem em casa de prostituta, ou frequentam casa de tolerância, para praticar actos obscenos; [...] (sic)

A doutrina do Código era a de manter a paz social e as crianças e adolescentes abandonados que a deturpassem eram os objetos de tal lei. Em contrapartida, as crianças e adolescentes que tivessem família estavam fora da proteção do Estado. Eram considerados, assim, em situação irregular os menores de 18 anos que eram abandonados ou delinqüentes, o que era completamente injusto. (MACIEL, 2015, p. 47)

Aos menores de 14 anos, o Código de Mello Matos permaneceu com a imputabilidade, menores estes que não poderiam ser alvo de nenhum processo. No caso, passariam apenas por um registro, o qual verificava as condições sociais e de saúde do mesmo e, caso fosse necessário, existiria a intervenção jurídica para que houvesse assistência a ele.

Já aos menores de 18 e maiores de 14 anos, se resguardava a possibilidade de serem sujeitos processuais, sendo estes processos especiais, sendo condecorados com certas assistências, de acordo com cada necessidade.

Por fim, para os delinqüentes com mais de 18 e menos de 21 anos, eram dispostas atenuantes pela idade e também de cumprirem a pena separados dos demais presos adultos, como se pode perceber pelos artigos 76 e 77 do Código de Menores de 1927:

Art. 76. A idade de 18 a 21 annos constitue circumstancia attenuante. (Cod. Penal, art. 42, § 11).

Art. 77. Si, ao perpetrar o crime ou contravenção, o menor tinha mais de 18 annos e menos do 21, o cumprimento da pena será, durante a menoridade do condemnado, completamente separado dos presos maiores. (sic)

Vale ressaltar que no Código de Mello Mattos Justiça e a Assistência passavam a ser vistas como indispensáveis ao processo de recuperação do menor. A conduta delituosa dos menores infratores ficavam sob cargo de um juiz de menores e a este cabia a decisão do destino das crianças e dos adolescentes.

Pode-se afirmar que, pautado na Doutrina da Situação Irregular, o Código de Mello Mattos foi a primeira legislação exclusivamente voltada para a criança e o adolescente.    Tal código possibilitou melhoramentos no tratamento dos menores supracitados, como a criação de uma assistência aos desamparados e a inimputabilidade de forma igualitária para todos os menores de 14 anos, independentemente de seu discernimento. (MACIEL, 2015, p. 48)           

2.5 O CÓDIGO PENAL DE 1940

Através do Decreto-Lei nº 2848, de 7 de dezembro de 1940, passou a vigorar o novo Código Penal, responsável por uma nova questão de inimputabilidade criminal no Direito brasileiro.

Tal dispositivo passou a adotar o critério biológico de culpabilidade que o os menores de 18 anos de idade seriam penalmente inimputáveis e não poderiam ser enquadrados nas regras do Código Penal, mas sim submetidos à legislação especial.

Assim, como aduz Garcia (2011, online), o Código de 1940 termina de consolidar a idéia de não mais ser possível atribuir penas stricto sensu ao menor que praticasse um ato infracional. Bastava, pois, não ter 18 anos completos para não estar sujeito às disposições presentes no Código Penal. Não havia, diferentemente das legislações pretéritas, a devida preocupação com o discernimento do menor, tutelando-se o indivíduo independentemente da idade psicológica que apresentasse, meramente fundamentado na faixa etária.    

Logo após, em 1943, entrou em vigor o Decreto-Lei n.º 6.026 que discriminou as medidas a serem aplicadas aos menores que cometiam atos infracionais e mudou a legislação infanto-juvenil brasileira e os menores de 14 a 18 anos de idade que estivessem em situação de delinqüência juvenil            deveriam sofrer medidas de acordo com seu nível de periculosidade. Aos menores que não tinham este nível alto, era aplicada a alternativa de ficar sob a vigilância dos pais ou responsáveis e, se necessário, ficar internado em estabelecimento especializado; se fosse perigoso, deveria ser imediatamente internado até que o Ministério Público se manifestasse.

Já aos menores de 14 anos, caberia ao juiz adotar medidas de proteção e assistência de acordo com o que o infrator necessitasse.

2.6 O CÓDIGO DE MENORES DE 1979

No contexto dos acontecimentos históricos à época, em pleno Regime Militar, foi decretado o segundo Código de Menores em 10 de outubro de 1979 pela Lei 6.697.

Na instituição do Regime Militar, devido ao aumento da criminalidade juvenil, foi criada a PNBEM – Política Nacional do Bem-Estar do Menor, e seus frutos Menor e a FEBEM – Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor, órgãos destinados ao controle do crescimento de crianças e adolescentes marginalizados.

Diante das frustradas tentativas dos códigos anteriores de solucionar o problema das crianças e adolescentes em situação de risco, surge o Código de 1979 que consolidou a Doutrina da Situação Irregular.

Houve uma modificação na classificação dos seres que eram tidos em situação irregular, como ficou demonstrado no artigo 2º do Código em análise (BRASIL, 1979, online)

Art. 2º. Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor:

I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de:

a)falta, ação ou omissão dos pais ou responsável;

b)manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las;

II- Vítimas de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsáveis;

III – Em perigo moral [...]

IV- Privado de representação ou assistência legal [...]

V- Com desvio de conduta [...]

VI – Autor de infração penal.

O aludido código protegia os menores de 18 anos que se encontravam em situação irregular e ainda os maiores de 18 e menores de 21, nos casos em que a lei determinasse.

.Também surgiram medidas de penalização e proteção ao menor infrator, como pode ser observado pelo artigo 14 do Código em questão:

Art. 14. São medidas aplicáveis ao menor pela autoridade judiciária:

I - advertência;

II - entrega aos pais ou responsável, ou a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade;

III - colocação em lar substituto;

IV - imposição do regime de liberdade assistida;

V - colocação em casa de semiliberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional, ocupacional, psicopedagógico, hospitalar, psiquiátrico ou outro adequado

Entretanto, internar os delinqüentes era a única solução vista na maioria das vezes. A autoridade judiciária detinha competência para conhecer a infração e aplicar a medida cabível, sem respeitar a ampla defesa, já que o objetivo era unicamente a paz social

Pode-se notar que o referido código não se preocupou com a ressocialização do menor, pois assim como aduz Queiroz (2008, online) ao invés de estruturá-lo psicológica, biológica e socialmente, simplesmente o colocava, em definitivo, numa situação irregular afastada da sociedade.

2.7 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

A promulgação da Constituição de 1988 trouxe significativas mudanças no nosso ordenamento jurídico e uma delas foi o destaque a situação da criança e do adolescente.

A Doutrina da Situação Irregular foi substituída pela Doutrina da Proteção Integral e em paralelo a esta, em 13 de julho de 1990, pela Lei n.8.069, passou a vigorar a nova legislação menorista no Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.

A nova Doutrina estabeleceu que o menor, independentemente de condição pessoal, era sujeito de direitos e deveres criados única e exclusivamente para ele, como ressalta Saraiva (2012, p. 24):

Na Doutrina da Proteção Integral dos Direitos, as crianças passam a ser definidas de maneira afirmativa, como sujeitos plenos de diretos. Já não se trata de “menores”, incapazes, meias-pessoas ou incompletas, senão de pessoas cuja única particularidade é a de estar em desenvolvimento. Por isso lhes reconhecem todos os diretos que têm os adultos mais diretos específicos por reconhecer-se essa circunstância evolutiva.

Com essa nova e atual legislação, todos os menores de 18 anos, independentemente de sua condição social, econômica ou familiar são sujeitos de proteção e garantias estatais antes inexistentes, como também são sujeitos de direitos e deveres.

O juiz, denominado juiz da infância e juventude, diferentemente da legislação anterior em que o podia criar normas nos casos em que houvesse lacunas na lei, e limitado pela lei e deve assegurar os direitos da criança e do adolescente, diante da intervenção e fiscalização do Ministério Publico.

Diante da nova lei, foi acolhida a idéia de que a família tem papel crucial na educação do menor, com apoio psicológico, social e biológico, como demonstra o artigo 227 da nossa Constituição Federal:

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

As punições impostas ao menor infrator passam ser divididas em medidas protetivas e medidas socioeducativas, pois tem caráter educacional e de proteção aos mesmos. Para as crianças de ate 12 anos são destinadas as medidas protetivas, como se pode verificar abaixo pelo artigo 101 do ECA:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:

I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;

II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;

III - matrícula e freqüência obrigatória em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;

V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;

VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

VII - acolhimento institucional;

VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;

IX - colocação em família substituta.

Já aos adolescentes, ou seja, aqueles com mais de 12 e menos de 18 anos, eram destinadas as medidas socioeducativas, como se pode observar pela transcrição do artigo 112 do referido Estatuto:

Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I - advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI

§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.

§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.

§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.

Portanto, percebe-se que o atual Estatuto da de fato as garantias necessárias ao menor, mas que o Estado somente não consegue conter o problema social do menor infrator, verificada a necessidade de auxilio da família como pilar principal para a educação do aludido menor, necessidade da comunidade local, através dos Conselhos Tutelar e Municipal, necessidade do Poder Judiciário como órgão célere e auxiliar e necessidade do Ministério Publico como órgão de defesa dos direitos da criança e do adolescente.

           

 

3 A RESPONSABILIZAÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - O ATO INFRACIONAL

Para compreender o debate do tema em questão na presente monografia, necessário se faz o esclarecimento dos conceitos, os requisitos e os aspectos procedimentais que o norteiam, a começar pelo conceito de inimputabilidade infantojuvenil.

3.1 O ATO INFRACIONAL

O Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado com o intuito de proteger e garantir direitos àqueles com até 18 anos de idade e responsabilizar os adolescentes quando praticarem ato infracional.

A definição de ato infracional equipara-se à conduta descrita como crime no Código Penal. Sposato (2013, p.59) aduz que:

Adotou-se, portanto, técnica de tipificação delegada, pois tudo o que é considerado crime para o adulto também é em igual medida considerado para o adolescente. Ao adolescente, contudo, imputa-se a mesma responsabilidade em face do crime ou da contravenção pena, em que pesem as diferenças entre essas duas espécies de delito.

Assim, não poderá o adolescente ser responsabilizado, senão quando houver previsão legal tipificada como crime no Código Penal, ou seja, deve haver a tipicidade da conduta do adolescente.

Porém, não basta o ato ser típico e antijurídico, deve haver também a culpabilidade do agente para que sua conduta seja considerada um ato infracional.

3.2 INIMPUTABILIDADE INFANTOJUVENIL

A criança e o adolescente são considerados inimputáveis, isto é, não podem ser penalizados como adultos pelo ato infracional que cometeram. Vale ressaltar também que crianças e adolescentes não cometem crime, e sim condutas infracionais.

Necessário se faz o conceito de adolescente para a lei previsto no artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) como: aquele que tem idade entre 12 anos completos e 18 anos incompletos.

Para Osório (1969 apud Silveira), a adolescência é uma etapa distintiva do homem, sendo marcada por diversas mudanças físicas, psicológicas e comportamentais, que é influenciada por fatores sociais e culturais.

No parágrafo único do artigo 104 do ECA, está previsto que são penalmente inimputáveis os menores de 18 anos e que estes estão sujeitos às medidas socioeducativas dispostas na referida lei.

Para se encaixar no artigo supramencionado, o infrator deve se enquadrar no conceito de adolescente, observada para a aplicação de qualquer das medidas previstas, independentemente de a apuração ocorrer depois de atingida a maioridade penal.

O Estatuto excluiu a possibilidade de crianças de até 12 anos incompletos serem alvo das medidas socioeducativas destinadas aos adolescentes. Isto porque o Estado considera a criança como inimputáveis absolutos, ou seja, não cabem a ela medidas coercitivas ou repressivas, mas apenas garantir-lhe a proteção e a efetividade dos direitos reconhecidos constitucionalmente e previstos no referido Estatuto.

Com isso, o ECA dispõe em seu artigo 112 as medidas socioeducativas cabíveis ao adolescente quando praticar algum ato infracional. Veja-se:

Art. 112.Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I – advertência;

II – obrigação de reparar o dano;

III – prestação de serviços à comunidade

IV – liberdade assistida;

V – inserção em regime de semi-liberdade;

VI – internação em estabelecimento educacional;

VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. [...]

Vale salientar que o ECA rege a possibilidade de aplicação das medidas socioeducativas até os 21 anos, ou seja, caso o adolescente em conflito com a lei venha a praticar o ato infracional pouco antes de completar 18 anos, irá cumprir a medida socioeducativa cabível até o prazo da mesma acabar. Para o assunto, Luiz Flávio Gomes (2003 apud Maciel, 2015) dispõe:

Em nossa opinião, todo processo em andamento ou findo deve continuar tramitando normalmente, até que o agente cumpra os 21 anos. Não se deu a perda de objeto da atividade Estatal. O Estado pode e deve fazer cumprir as medidas impostas aos ex-menores (jovens-adultos). Isso é e será feito em nome da prevenção especial (recuperação) e da prevenção geral (confirmação da norma violada; intimidação dos potenciais infratores etc). O fato de o ex-menor ter alcançado a maioridade civil (18 anos) em nada impede que o Estado continue exercendo seu direito de executar as medidas aplicadas. Ao contrário, com maior razão, deve mesmo torná-las efetivas.

Destaque-se que os atos infracionais não podem configurar maus antecedentes após atingida a maioridade. Tema de discussão antigo e atualmente em debate, principalmente como se verá nesta monografia, a idade fixada pelo legislador para a imputabilidade penal é causa de diversas críticas e apontada como insuficiente para dar conta da demanda da sociedade moderna.

3.3 PROCEDIMENTO DE APURAÇÃO DO ATO INFRACIONAL

Para a apuração do ato infracional praticado pelo adolescente, o ECA estabeleceu um rito processual próprio, que é composto de três fases distintas: a primeira referente à atuação policial, a segunda referente à atividade do Ministério Público e a terceira referente à atuação judicial.

3.3.1. Fase policial

A fase de atuação policial inicia-se a partir da apreensão em flagrante do adolescente em conflito com a lei que é encaminhado à sede policial especializada, quando houver, para dar início à lavratura do auto. Se não tiver sido flagrante, qualquer cidadão poderá fazer o registro de ocorrência, desde que tenha conhecimento da conduta ilícita. (MACIEL, 2015, p. 1024)

Se o ato infracional foi cometido mediante violência ou grave ameaça à pessoa, como, por exemplo, latrocínio, a autoridade deverá encaminhar o adolescente para entidade de atendimento que mantenha programa de internação provisória. Tal providencia também devera ser tomada caso os pais do infrator não compareçam à delegacia, não existam ou residam em outra comarca.

Já nos casos diversos, o auto de apreensão poderá ser substituído por boletim de ocorrência circunstanciada e o adolescente será entregue a seus pais, mediante termo de compromisso de apresentação ao Promotor de Justiça, o mais rápido possível ou no mesmo dia.

É importante destacar que a apreensão do adolescente deverá ser imediatamente comunicada à autoridade judiciária competente, inclusive nos feriados e fins de semanas, bem como à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada, examinando-se a possibilidade de liberação imediata, mediante termo de compromisso e responsabilidade de apresentação ao representante do Ministério Público. (MACIEL, 2015, p. 1024)

Caso haja a liberação do adolescente ou seja afastada a hipótese de flagrante, mas haja indícios de participação na pratica do ato infracional, a autoridade policial ficará encarregada de encaminhar ao representante do Ministério Público cópia do auto de preensão ou boletim de ocorrência e relatório das demais investigações.

Importante se faz ressaltar também que a autoridade policial deverá manter os cuidados necessários à preservação do adolescente ao ser transportado, sob pena de lhe ser aplicada sanção.

3.3.2 Fase de atuação do Ministério Público

A fase de atuação do Ministério Público é a fase em que serão colhidas as informações do adolescente, acompanhado de seus pais ou responsáveis e apresentado ao Promotor de Justiça.

Com a colheita das informações, será realizado um resumo com todas as declarações e em seguida, o promotor toma as seguintes providencias: a) verifica a legalidade da apreensão e existência dos requisitos da prisão em flagrante; b)           ouve o adolescente e os demais envolvidos; c) lavra o auto de apresentação do adolescente e dependendo do caso, faz o arquivamento dos documentos, concedendo a remissão ou representará o adolescente, iniciando a ação socioeducativa pública.

Promovido o arquivamento, caberá à autoridade judiciária apreciar a possibilidade de sua homologação e, em caso de discordância, fará remessa dos autos ao Procurador-Geral de Justiça. (MACIEL, 2015, p. 1032)

Poderá haver também a remissão concedida pelo promotor como alternativa e, conforme o artigo 114 do ECA, o processo ser excluído após a valoração das circunstancias e conseqüências da infração, do contexto social, bem como da personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional, não importando no reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalecendo para efeito de reincidência, prescindindo, assim, de provas suficientes de autoria, bem como de materialidade.

Caso não haja a concessão da remissão, o Promotor de Justiça oferecera representação à autoridade judiciária e proporá instauração de procedimento para a aplicação de medida socioeducativa cabível. É importante registrar que, uma vez iniciada a ação socioeducativa, não poderá o promotor dela desistir.

3.3.3 Fase Judicial

Após o encaminhamento pelo Ministério Público da peça referente a uma das medidas socioeducativas, inaugura-se a fase de atuação da autoridade judiciária. (MACIEL, 2015, p. 1039)

Oferecida a representação pelo Ministério Público, a autoridade judiciária designará audiência de apresentação do adolescente e decidirá sobre a internação provisória, que se decretada antes da sentença, terá um prazo máximo de 45 dias. A conclusão do procedimento também obedece ao mesmo prazo, como demonstra o artigo 183 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Após recebida a representação, o juiz decidirá a respeito da internação provisória, caso seja requerida pelo Ministério Público, e designará audiência de representação, sendo citado do teor da representação, bem como seus pais ou responsáveis serão cientificados ou notificados a comparecer à audiência, acompanhados de advogado. Caso não sejam encontrados os pais ou responsáveis, deverá ser nomeado curador especial para acompanhar o adolescente que, se estiver internado, deverá ser requisitado. (Artigo 184, § § 1º e 2º, c/c o artigo 142, parágrafo único, do ECA)

Nos casos de remissão e arquivamento, assim como aduz Maciel (2015, p.1040), cabe ao juiz da infância e juventude apreciar a possibilidade de homologação e, em não concordando com o pleito ministerial, encaminhará os autos ao Procurador-Geral de Justiça, na forma do art. 181 e seus parágrafos

Na audiência de apresentação, após o breve dialogo com o representado, o Juiz poderá manter a remissão ou manter internação, levando em consideração a personalidade do adolescente, sua relação familiar e social, bem como a extensão e gravidade do ato praticado. Caso o Juiz conceda a remissão, necessariamente aplicar uma das medidas socioeducativas; caso não seja concedida a remissão, o adolescente receberá uma medida de semiliberdade ou internação, que deverá ser cumprida em unidade específica. (MACIEL, 2015, p. 1041)

 

4 ANÁLISE DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS: CONCEITO E EFICÁCIA

4.1 DISPOSIÇÕES GERAIS

Conforme já supramencionado, as medidas socioeducativas são destinadas aos jovens infratores com idade entre 12 e 18 anos incompletos, já que para os menores de 12 anos se aplicam as medidas de proteção.

As medidas socioeducativas estão previstas no artigo 112 do ECA e são elas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional. Há outro dispositivo, o artigo 101, incisos I a VI, que, por força do inciso VII do artigo 112 do dispositivo acima mencionado, pode também ser aplicado ao adolescente em conflito com a lei.

A Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) elenca os objetivos das medidas socioeducativas no §2º do artigo 1º, dando ênfase à responsabilização do adolescente, sua integração social e à desaprovação da conduta social. (BRASIL, 2012, online)

Conforme cita Maciel, além do caráter pedagógico que visa à reintegração do jovem em conflito com a lei na vida social, as medidas socioeducativas possuem outro, o sancionatório, em resposta à sociedade pela lesão decorrente da conduta típica praticada. Destarte, fica evidente a sua natureza híbrida, vez que composta de dois elementos que se conjugam para alcançar os propósitos de reeducação e de adimplência social do jovem. (MACIEL, 2015, p. 1049)

Portanto, a natureza das medidas socioeducativas tem caráter dúplice, com o fim de alcançar dois objetivos: a reeducação e reinserção na sociedade do adolescente em conflito com a lei.

Segundo Liberati (2012, p. 1073):

A medida socioeducativa é a manifestação do Estado, em resposta ao ato infracional, praticado por menores de 18 anos, de natureza jurídica impositiva, sancionatória e retributiva, cuja aplicação objetiva inibir a reincidência, desenvolvida com finalidade pedagógico-educativa.

Logo, o julgador não deve considerar somente a gravidade do fato praticado, mas também a capacidade de as medidas elencadas a seguir serem efetivamente cumprida pelo jovem em conflito com a lei.

  1. MEDIDAS NÃO-PRIVATIVAS DE LIBERDADE

4.2.1 Advertência

A medida socioeducativa da advertência, conforme o artigo 115 do ECA, consiste numa admoestação verbal reduzida a termo e assinada, aplicada pelo Juiz da Infância e Juventude e direcionada ao adolescente em conflito com a lei, com o fim de alertá-lo e alertar também os pais ou responsáveis do risco do cometimento do ato infracional com o fito de prevenir novos atos infracionais.

Tal medida poderá ser aplicada sempre que houver       prova da materialidade da infração e indícios suficientes de autoria. (Artigo 114, § único).

Na prática, tem ficado restrita aos atos infracionais de natureza leve, sem violência ou grave ameaça à pessoa e às hipóteses de primeira passagem do adolescente pelo juízo da infância e juventude, por ato infracional. (MACIEL, 2015, p. 1061)

Segundo Afonso Armando Konzen apud Maciel (2015, p. 1061):

A medida de advertência, muitas vezes banalizada por sua aparente simplicidade e singeleza, certamente porque confundida com as praticas disciplinares no âmbito familiar ou escolar, produz efeitos jurídicos na vida do infrator, porque passará a constar do registro de antecedentes e poderá significar fator decisivo para a eleição da medida na hipótese da prática de nova infração. Não está, no entanto, nos efeitos objetivos a compreensão da natureza dessa medida, mas no seu real sentido valorativo para o destinatário, sujeito passivo da palavra de determinada autoridade pública. A sensação do sujeito certamente não será outra do que a de se recolher à meditação, e, constrangido, aceitar a palavra da autoridade como promessa de não reiterar na conduta. Será provavelmente um instante de intensa aflição.

Logo, percebe-se que a Advertência, por mais que pareça uma medida dotada de simplicidade, conjuga importância para o adolescente em conflito com a lei que reincidir na prática do ato infracional.

  1. Obrigação De Reparar O Dano

O artigo 116 do Estatuto da Criança e do Adolescente elenca a medida da obrigação de reparar o dano com reflexos patrimoniais, causado por ato infracional. A lei é transparente ao afirmar que tal medida só será aplicada caso o adolescente tenha causado prejuízo material à vítima, podendo ser determinados a restituição da coisa, o ressarcimento do dano ou a compensação do prejuízo.

Vale ressaltar que, se o adolescente não disponibilizar de recursos para arcar com a despesa, a medida será substituída por outra adequada, conforme aduz o parágrafo único do dispositivo supracitado.

  1. Prestação De Serviços À Comunidade

De grande valia tem se apresentado a efetiva utilização desta medida que, se por um lado preenche, com algo útil, o costumeiramente ocioso tempo dos adolescentes em conflito com a lei, por um outro traz nítida sensação à coletividade de resposta social pela conduta infracional praticada. (MACIEL, 2015, p. 1062).

A mesma autora ainda aduz que em especial, nos municípios interioranos, onde os adolescentes geralmente são encaminhados ao Ministério Público tão logo começam a apresentar comportamento ilícito, a aplicação desta medida tem se mostrado muito eficaz, inclusive quando utilizada em sede de remissão pré-processual. (2015, p. 1062).

Tal medida dá a oportunidade de o adolescente participar solidariamente das instituições, contribuindo para sua formação de valores e fomentando atitudes construtivas. De acordo com o artigo 117 do Estatuto da Criança e do Adolescente, tal medida consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou .governamentais.

Essa medida tem apresentado grande valia, porque, por um lado preenche o tempo de ócio do adolescente e, por outro, garante uma resposta à sociedade pela lesão sofrida.

De acordo com Maciel (2015, p.1062), tem se observado que o índice de reincidência dos jovens que cumprem prestação de serviços comunitários é baixíssimo, o que só comprova a importância de sua implementação. Operacionalizando-se o cumprimento de tal medida, evita-se não só a desnecessária aplicação de outra mais gravosa, mas também o deslocamento do adolescente e de sua família para outras localidades, em violação ao disposto no artigo 88, I, do ECA.

  1. Liberdade Assistida

A liberdade assistida está disciplinada nos artigos 118 e 119 do Estatuto da Criança e do Adolescente e deve ser aplicada pelo prazo mínimo de 6 meses, sempre que for observada a necessidade de o adolescente receber acompanhamento, auxilio e orientação, por parte da pessoa designada pela autoridade judicial e apta ao atendimento. (MACIEL, 2015, p. 1063).

Tal medida é a que detém o caráter mais pedagógico dentre as outras medidas, pois nela, o adolescente poderá desfrutar dos momentos com a família e com a comunidade e, concomitantemente, ser acompanhado pelo orientador.

O artigo 118 do aduzido Estatuto dispõe:

Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.

§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.

§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.

Pode-se notar que a característica mais relevante dessa medida é o acompanhamento feito pelo orientador e os relatórios por ele emitidos, destinados à autoridade judiciária.

Necessária se faz a transcrição do artigo 119 do Estatuto para conhecer as incumbências do orientador:

Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:

I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social;

II - supervisionar a freqüência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula;

III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho;

IV - apresentar relatório do caso.

Como aduzido no artigo transcorrido, o orientador encaminhará o adolescente para os programas sociais oferecidos pelo Estado, como, por exemplo, o Pró-Jovem, que é um programa desenvolvido pela parceria e Estado e Município para preparar o adolescente para o mercado de trabalho ou para ocupações geradoras de renda, como menor aprendiz, desde que já possua 16 anos. Deve, ainda, igualmente, supervisionar a freqüência e aproveitamento escolar do socioeducando e ao término, apresentar o relatório de cada caso.              

Maciel (2015, p. 1063) ainda ressalta a importância do orientador para a efetivação da medida de liberdade assistida:

De relevante importância é o papel do orientador, já que a este cabe a condução da medida, que engloba uma gama de compromissos que envolvem não só o adolescente, mas também sua família, devendo diligenciar para que seja obtido êxito pelo menos nos segmentos elencados no artigo 119, I a III, do ECA – cujo rol não é exaustivo – como, por exemplo, na freqüência escolar e na profissionalização.

Ana Maria Gonçalves Freitas (2002 apud Maciel, 2015) também contribui:

Enquanto perdurar a execução da medida, a liberdade pessoal do adolescente estará sofrendo restrição legal diante da atividade do orientador, cuja participação deverá ser ativa e não meramente formal ou apenas burocrática [...] Partindo-se do pressuposto da adequação da medida ao caso específico, vez que a mesma não se revela própria em muitos casos, ao orientador caberá desempenhar atividades que levem o orientando a modificar seu modo de proceder, tornando-o socialmente aceito sem perder a própria individualidade. O que interessa é o atingimento da finalidade da medida, ao ponto que evolua e supere as dificuldades da fase da vida, aprendendo a exercitar seus direitos de cidadão e mover-se no processo de escolhas e decisões múltiplas que a vida apresenta [...] Razoável supor a indispensabilidade da criação de vinculo entre o técnico, adolescente e familiares, para criar condições de desenvolvimento de uma relação honesta e produtiva. Deve o plano de trabalho ser proposto e debatido.

     

Assim, a liberdade assistida, se bem executada, é a medida mais viável aplicada ao adolescente em conflito com a lei, pois é aquela que alcança os resultados positivos almejados mais rapidamente. Veja-se o posicionamento de Murilo e Ildeara Digiácomo (2013, p. 173 - 174):

A liberdade assistida é a medida que melhor traduz o espírito e o sentido do sistema socioeducativo estabelecido pela Lei nº 8.069/1990 e, desde que corretamente executada, é sem dúvida a que apresenta melhores condições de surtir os resultados positivos almejados, não apenas em benefício do adolescente, mas também de sua família e, acima de tudo, da sociedade. Não se trata de uma mera “liberdade vigiada”, na qual o adolescente estaria em uma espécie de “período de prova”, mas sim importa em uma intervenção efetiva e positiva na vida do adolescente e, se necessário, em sua dinâmica familiar, por intermédio de uma pessoa capacitada para acompanhar a execução da medida, chamada de “orientador”, que tem a incumbência de desenvolver uma série de tarefas, expressamente previstas no art. 119, do ECA. Embora a liberdade assistida importe em muito mais que a simples “vigilância” do adolescente, é admissível, por analogia, a aplicação das disposições da Lei nº 12.258/2010, de 15/06/2010, de modo que adolescentes vinculados a este tipo de medida, a depender das peculiaridades do caso, sejam submetidos a monitoramento eletrônico, nos mesmos moldes do que passou a ser previsto em relação a adultos (servindo assim de alternativa à aplicação de medidas privativas de liberdade) .

A liberdade assistida proporciona uma oportunidade de abrir portas para o mercado de trabalho, o que muitas vezes os adolescentes não encontram ou até mesmo não as procuram. Assim, o adolescente envolvido nestes programas oferecidos, estará afastado das influencias negativas e uma conseqüente reincidência de infrações.

Portanto, pode-se afirmar que a liberdade assistida vem sendo a medida mais eficaz, ao tempo que não priva o adolescente de sua liberdade, retirando-o do convívio familiar e do convívio com a comunidade.

  1.  MEDIDAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

4.3.1 Semiliberdade

A medida de semiliberdade está prevista no artigo 120 do Estatuto da Criança e do Adolescente e é uma medida restritiva de liberdade que tem a característica de inserir o menor infrator em uma unidade específica, onde fica afastado, por no máximo 3 anos, da família e da comunidade.

Dispõe o artigo 120 do Estatuto:

Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial.

§ 1º. É obrigatória a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade.

§ 2º. A medida não comporta prazo determinado, as disposições, aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação.

Aplicam-se à semiliberdade, no que couber, as disposições relativas à internação, não podendo ser imposta por prazo determinado e devendo sua manutenção ser reavaliada pela autoridade judicial, após ouvido o Ministério Público e a defesa, no máximo a cada seis meses. (MACIEL, 2015, p. 1064). Neste caso, o julgador pode aplicar a regressão para o regime de internação caso haja o descumprimento por parte do socioeducando.

Entretanto, tal fato não significa que o adolescente que recebeu como medida originalmente a internação, passe pela semiliberdade antes de ir para as medidas de meio aberto.

Na medida de semiliberdade, o socioeducando é liberado aos finais de semana para realizar atividades externas e desfrutar de momentos com a família e a comunidade, fato que estimula sua ressocialização e reeducação comunitária, sem necessitar de prévia autorização judicial. Neste sentido, entendeu o STF:

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE SEMILIBERDADE. LIMITE MÁXIMO DE DURAÇÃO. RESTRIÇÃO À REALIZAÇÃO DE ATIVIDADES EXTERNAS E IMPOSIÇÃO DE CONDIÇÕES RELATIVAS AO BOM COMPORTAMENTO DO PACIENTE PARA VISITAÇÃO À FAMÍLIA.

IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 227 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. Ressalvadas as hipóteses arroladas nos artigos 121, § 3º e 122, § 1º, o Estatuto da Criança e do Adolescente não estipula limite máximo de duração da medida socioeducativa de semiliberdade. Resulta daí que, por remissão à aplicação do dispositivo concernente à internação, o limite temporal da semiliberdade coincide com a data em que o menor infrator completar vinte e um anos (art. 120, § 2º). 2. O artigo 120 da Lei nº 8.069/90 garante a realização de atividades externas independentemente de autorização judicial. 3. O Estado tem o dever de assegurar à criança e ao adolescente o direito à convivência familiar (artigo 227, caput, da Constituição do Brasil). O objetivo maior da Lei n. 8.069/90 é a proteção integral à criança e ao adolescente, aí compreendida a participação na vida familiar e comunitária. 4. Restrições a essas garantias somente são possíveis em situações extremas, decretadas com cautela em decisões fundamentadas, o que no caso não se dá. Ordem parcialmente concedida para permitir ao paciente a realização de atividades externas e visitas à família sem a imposição de qualquer condição pelo Juízo da Vara da Infância e Juventude. (STF. 2ª T. HC nº 98518/RJ. Rel. Min. Eros Grau. J. em 25/05/2010).

A realização de atividades externas, como freqüentar a escola, praticar esportes etc., é uma característica da forma pedagógica dessa medida, pois alem de punitiva, ela também tem o condão de estimular o adolescente à ressocialização.

Da mesma forma, conclui Liberati (2006 apud Maciel, 2015, p. 1065):

Como o próprio nome indica, a semiliberdade é executada em meio aberto, implicando, necessariamente, a possibilidade de realização de atividade externas, como a freqüência à escola, às relações de emprego etc. Se não houver esse tipo de atividade, a medida socioeducativa perde sua finalidade.

Nada impede que a semiliberdade seja aplicada provisoriamente, já que até a internação, medida mais grave, pode ser aplicada em sede provisória.

A medida de semiliberdade vem se mostrando como uma das menos eficazes, pois o que acontece na maior parte dos casos é que os adolescentes, ao serem liberados nos finais de semana, acabam não voltando para o centro de cumprimento da medida, às vezes, até por estimulo da própria família, que acha que nada acontecerá. Porem, como visto mais acima, o julgador, caso perceba o constante descumprimento do socioeducando, poderá levá-lo ao regime de internação, a mais grave das medidas.

4.3.2 Internação

A medida de internação está prevista no artigo 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente que assim dispõe:

Art. 121. A internação constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

§ 1º. Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.

§2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses.

§ 3º. Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.

§ 4º. Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida. § 5º. A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade. § 6º. Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público.                   

§ 5º. A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.

§ 6º. Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público.

A internação é medida que deve atender aos princípios da brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Isso quer dizer que, pelo princípio da brevidade, o adolescente em conflito com a lei deve ficar o menor tempo possível privado de sua liberdade. Por conta de tal principio é que a medida tem o prazo máximo de 3 anos, com avaliação a cada 6 meses.  Pelo princípio da excepcionalidade, tal medida deve ser utilizada em último caso (Art. 122 §2º do ECA), quando a reeducação do adolescente se mostrar frustrada por meio de outras medidas e a possibilidade de reincidência ser grande. Neste sentido, veja-se o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, em acórdão que teve como Relator o doutrinador Des. Yussef Cahali: “A internação somente deve ser admitida em casos excepcionais, quando baldados todos os esforços à reeducação do adolescente mediante outras medidas sócio-educativas.” (TJSP – C. Esp. – Ap. 22.716-0 – j. 02.03.1995).

O último princípio, o do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, está previsto no artigo 125 do Estatuto que estabelece: “É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e segurança.” Tal princípio leva em consideração o estado de desenvolvimento e transformação física e psíquica que um adolescente passa e que exige atenção redobrada das entidades de atendimento.

A internação é a medida mais severa dentre as outras, o que explica por que deverá ser aplicada em último recurso, nas hipóteses previstas pelo rol taxativo do artigo 122 do Estatuto de ato infracional cometido mediante violência ou grave ameaça, de reincidência em infrações graves e de descumprimento injustificável de outra medida (máximo de 3 meses). Ao atingir 21 anos, a liberdade do adolescente será compulsória, ou seja, obrigatória, podendo ser colocado em regime de liberdade assistida ou em regime de semiliberdade.

De acordo com Digiácomo (2013, p. 178):

Mesmo tendo decretada sua internação, o adolescente pode, a princípio, realizar atividades fora da unidade socioeducativa, de acordo com a proposta pedagógica do programa em execução e a critério da equipe técnica respectiva, independentemente de autorização judicial. Para que tais atividades externas sejam proibidas a determinado adolescente em particular, deverá a autoridade judiciária competente (Juízo da sentença ou da execução, a depender da organização judiciária local), assim o determinar expressamente, mediante decisão fundamentada (CF. art. 93, inciso IX, da CF). Desnecessário dizer que, mesmo que a sentença restrinja, num primeiro momento, a realização de atividades externas, estas poderão ser autorizadas, por decisão judicial posterior, ao longo da execução da medida, inclusive como forma de preparação para progressão de regime ou para o desligamento, valendo neste sentido observar o disposto nos itens 79 e 80, das “Regras Mínimas das Nações Unidas

A internação não se mostra ser a medida socioeducativa mais adequada e eficaz para alcançar o objetivo de reeducar o adolescente para a vida social, posto que é uma forma de repressão e confinamento que não o recupera e o encaminha para a reincidência.

Saraiva (2010, p. 172) afirma:

A privação de liberdade é um mal. Mal que até poderá ser necessário diante da incapacidade humana de desenvolver outra alternativa. Mas sempre um mal, cabendo aqui revisitar Foucault. A opção pela privação da liberdade resulta muito mais da inexistência de outra alternativa do que da indicação de ser esta a melhor dentre as alternativas disponíveis. Somente se justifica enquanto mecanismo de defesa social, pois não há nada mais falacioso do que o imaginário de que a privação de liberdade poderá representar em si mesma um bem para o adolescente a que se atribui a prática de uma ação delituosa.

A internação durará o tempo necessário para efetivar a reeducação, limitando-se mediante três circunstâncias: 1) quando o interno completar 21 anos de idade, sendo liberado imediatamente, vedada a permanência do mesmo na instituição de internação; 2) quando a internação atingir 3 anos, computado o período de internação provisória; 3) quando a medida não for mais justificada pedagogicamente.

Para que se alcance a eficácia da internação, é necessário que ela seja cumprida em estabelecimentos adequados, com profissionais adequados para reavaliar o adolescente, por meio de decisão fundamentada, a cada 6 meses, nas áreas psicológica, pedagógica e desassistência social. Neste caso, observa-se o principio do contraditório e ampla defesa.

Antigamente, os locais de cumprimento de medidas socioeducativas, inclusive de internação eram chamados de Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (FEBEM) e atualmente são denominadas de Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA).

 4.4 A LEI DO SINA SE – LEI 12.594/2012 E A EXECUÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

A Lei 12.594 de 18 de janeiro de 2012 instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), o qual regulamentou o sistema de execução das medidas socioeducativas destinadas ao adolescente que praticou o ato infracional.

De acordo com o artigo 1º, §1º da referida lei:

Entende-se por Sinase o conjunto ordenado de princípios, regras e critérios que envolvem a execução de medidas socioeducativas, incluindo-se nele, por adesão, os sistemas estaduais, distrital e municipais, bem como todos os planos, políticas e programas específicos de atendimento a adolescente em conflito com a lei.

A lei também instituiu os princípios norteadores que a regem, passando procedimentos de suspensão, manutenção ou extinção das medidas, além dos direitos inerentes ao adolescente, do regime disciplinar, da extinção da medida,       e, por fim, determinou a obrigatoriedade do Plano Individual de Atendimento para as medidas de prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação, com elementos mínimos que garantem a medida.

Vale ressaltar que a lei do supramencionada lei limita-se à fase de execução das medidas e concentra a sua característica sob esse aspecto procedimental. Também é importante salientar que à fase executória se aplicam todas as garantias processuais asseguradas nos artigos 110 e 111 do ECA c/c o §1º da Lei do Sinase, senão veja-se:

Art. 110. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido processo legal.

Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, as seguintes garantias:

I - pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante citação ou meio equivalente;

II - igualdade na relação processual, podendo confrontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as provas necessárias à sua defesa;

III - defesa técnica por advogado;

IV - assistência judiciária gratuita e integral aos necessitados, na forma da lei;

V - direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente;

VI - direito de solicitar a presença de seus pais ou responsável em qualquer fase do procedimento.

Art. 49. São direitos do adolescente submetido ao cumprimento de medida socioeducativa, sem prejuízo de outros previstos em lei:

§ 1º. As garantias processuais destinadas a adolescente autor de ato infracional previstas na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), aplicam-se integralmente na execução das medidas socioeducativas,inclusive no âmbito administrativo

Conforme Maciel (2015, p. 1093-1094), O Estatuto da Criança e do Adolescente foi bastante econômico no que se refere à disciplina da fase executória das medidas e que a apreciação do procedimento de execução socioeducativa deve se revestir de um manto de especificidade em decorrência dos princípios que norteiam este sistema.

Tais princípios estão dispostos no artigo 35 da Lei do Sinase que dispõe:

Art.35 A execução das medidas socioeducativas reger-se-á pelos seguintes princípios:

I - legalidade, não podendo o adolescente receber tratamento mais gravoso do que o conferido ao adulto;

II - excepcionalidade da intervenção judicial e da imposição de medidas, favorecendo-se meios de autocomposição de conflitos;

III - prioridade a práticas ou medidas que sejam restaurativas e, sempre que possível, atendam às necessidades das vítimas;

IV - proporcionalidade em relação à ofensa cometida;

V - brevidade da medida em resposta ao ato cometido, em especial o respeito ao que dispõe o art. 122 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);

VI - individualização, considerando-se a idade, capacidades e circunstâncias pessoais do adolescente;

VII - mínima intervenção, restrita ao necessário para a realização dos objetivos da medida;

VIII - não discriminação do adolescente, notadamente em razão de etnia, gênero, nacionalidade, classe social, orientação religiosa, política ou sexual, ou associação ou pertencimento a qualquer minoria ou status; e

IX - fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo.

Assim, os princípios são: 1) legalidade, que é fundamental não só para a criação de leis, como também para sua aplicação; 2) excepcionalidade da intervenção judicial que prega que na fase executória o Estado não mais deverá intervir, a não ser de forma excepcional, no cotidiano do socioeducando; 3) proporcionalidade que leva em consideração que a medida só poderá ser aplicada de acordo com a capacidade de o adolescente cumpri-la; 4) brevidade que propõe que as medidas seja breves, considerando que as mesmas são penas e não castigos; 6) mínima intervenção, considerando que a intervenção do Estado na vida de qualquer pessoa deve ser a menor possível; 7) igualdade, não admitindo forma de discriminação do adolescente; 8) convivencialidade, que propõe a convivência com a família e com a comunidade.

 

5 REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

5.1 DIVERGÊNCIA ACERCA DO TEMA

Atualmente, verifica-se que o número de atos infracionais tem crescido impetuosamente. Para o tema aduzido, a análise da eficácia das medidas socioeducativas tem se mostrado uma verdadeira aliada quando a discussão é reduzir a idade-limite de imputabilidade penal.

A internação, como medida socioeducativa que mais se aproxima da detenção, por privar o adolescente quase que completamente de sua liberdade, não tem sido a maneira e a medida mais eficaz, da forma que vem sendo executada, de alcançar o objetivo final que uma medida socioeducativa pretende, ou seja, o de ressocializar o adolescente em conflito com a lei. Em visitas ao Centro Socioeducativo Doutor Zequinha Parente, recém inaugurado em Sobral-CE, a pesquisa feita para o presente trabalho revelou que 50% dos adolescentes ali internados são reincidentes, ou seja, já cumpriram alguma outra medida devido a outro ato infracional cometido.

As pessoas que são a favor da redução da maioridade penal são aquelas que acham que prisões e encarceramentos vão diminuir a criminalidade infanto-juvenil. Equivocadamente, elas imaginam um imediato aumento na segurança pública. Entretanto, esquecem que a maior forma de reinserção social está na educação do adolescente.

Para quem não é a favor da redução da maioridade, acredita-se que o ECA pode sim se efetivado de uma maneira melhor, para que os adolescentes sintam a rigidez do Estatuto e não achem que sempre vão sair impunes da pratica de qualquer delito.

5.2 A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA PEC 171/1993 E A VIOLAÇÃO DE CLÁSULA PÉTREA

A PEC 171/1993 tem como objetivo alterar a redação do artigo 228 da Constituição Federal, para fixar a responsabilidade penal aos 16 anos. Desde então, já foram apresentadas várias outras PEC’s com o objetivo de derrubar essa a idade-limite de 18 anos.

Na Constituição Federal brasileira, estão previstas as limitações materiais do Poder Constituinte Reformador, o que compõem as clausulas pétreas. Estas estão dispostas no artigo 60, §2º da nossa Constituição, o qual aduz:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

Neste contexto, o direito à infância e à adolescência é um direito social, previsto no artigo 6º da Carta Magna, que especifica as garantias às crianças e aos adolescentes.   A Constituição Federal prescreveu que a criança e o adolescente são objeto de especial defesa da ordem jurídica, e para que ela se torne efetiva, várias previsões foram feitas, entre elas a do artigo 228, que determina que são inimputáveis os menores de 18 anos. Em razão de a proteção à infância ser um direito social, cabe ao Estado agir de forma a garantir que às crianças e aos adolescentes sejam assegurados seus direitos (que vêm especificados nos artigos 227, 228 e 229, todos da CF) (IBCCRIM, 2015, online).

De acordo com Sales (2014, online) para uma melhor análise da questão da redução da maioridade penal proposta no início destes escritos é preciso observar primeiramente  a  previsão  legislativa  da  norma,  que  é mencionada no art. 27 do Código Penal Brasileiro nos seguintes termos: “Os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.”  A partir desta previsão  se torna claro que a lei geral não se aplicará ao sujeito considerado menor, uma vez que este, como dito, terá tratamento em lei especial. Essa lei especial a que se refere o mencionado artigo do Código  Penal  Brasileiro  é  a  lei  8.069  de  13  de  julho  de 1990  que  instituiu  o  Estatuto  da Criança e do Adolescente.

O artigo 228 da Lei Maior aduz o seguinte: “São penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial.”

Com a Proposta de Emenda à Constituição número 171 de 1993, surgiu o almejo à possível alteração da idade penal. O problema é que a imputabilidade não está prevista apenas na legislação especial, ela também está disposta na Constituição Federal, o que a faz ter um status privilegiado, senão vejamos o posicionamento de Sales (2014, online):

Assim sendo, pelo fato da maioridade penal constar no texto constitucional isso acarreta uma série  de  implicações  de  ordem  jurídica,  pois,  no  momento  em  que  o  legislador  constituinte  inseriu o  mencionado  dispositivo  no  rol  de  normas  da  constituição  ele  o elevou  a  um status  privilegiado dentro  do  ordenamento  jurídico,  ou  seja,  ao  patamar  de  suprema cia  que  tem  a  Constituição  da República Federativa do Brasil. Esta que é uma constituição de características formal e rígida, portanto, é  principalmente  a  rigidez  constitucional  que  escalona  o  ordenamento  jurídico  ou  o  conjunto  ou complexo de normas jurídicas de um estado como se refere Norberto Bobbio (1999, p. 19).

De maneira que, é em razão da rigidez que esse apanhado de to das as normas de um determinado estado  nacional  se  coloca  de  maneira  hierarquizada, pois,  rigidez    é    técnica  que  tem  como  intuito privilegiar as normas constantes no texto da constituição em face das outras normas que compõem o ordenamento jurídico.

Para os que defendem a PEC 171/1993, ou seja, concordam com a redução da maioridade penal, as garantias individuais mencionadas no artigo 60 da Constituição e dispostas no artigo 5º da mesma lei, não configura cláusula pétrea, considerando o rol taxativo e a possibilidade de redução. Sobre tal assunto, Saraiva (2010, p. 47) asseverou:

De tempos em tempos, retoma com força no País, em alguns setores da sociedade, a idéia de redução da responsabilidade penal para fazer imputáveis os jovens a partir dos 16 anos (há quem defenda menos).

Essa tese se faz inconstitucional, haja vista que o direito esculpido no artigo 228 da Constituição (que fixa em 18 anos a idade de responsabilidade penal) se constitui em cláusula pétrea, pois é inegável seu conteúdo de ‘’direito e garantia individual’’, referido no artigo 60, §4º, IV da CF como insuscetível de emenda.

A referida PEC viola o direito às garantias constitucionais inerentes ao artigo 5º da nossa Lei Maior, que constitui cláusula pétrea. Neste sentido, o IBCCRIM (2015, online) aduziu:

Por essas razões, a fixação do limite etário de responsabilização penal é uma garantia constitucional que impede o Estado de submeter crianças e adolescentes ao regime penal comum e, portanto, não pode ser suprimido ou ter o seu patamar alterado, encerrando verdadeira cláusula pétrea.

De acordo com o mesmo tema, Marcelo Novelino (2013, p.      69) apud Sales (2014, online) afirma: Os direitos individuais são aqueles conferidos ao indivíduo para protegê-lo contra o arbítrio do Estado ou de outros particulares (direitos de defesa ou direitos de resistência).”

Portanto, nota-se que alterar a idade-limite de inimputabilidade penal pode configurar, a depender do caso, um exercício arbitrário do Estado. (Sales, 2014, online).

Entretanto, considerando-se que os adolescentes e crianças de algumas décadas atrás, quando foi promulgada a nossa Carta Magna, não se enquadram no mesmo critério biopsicológico do passado, a maioridade poderia, sim, como afirma Sales (2014, online) ser reduzida, desde que respeitados os critérios de proporcionalidade e razoabilidade da constituição de uma proteção aos menores que realmente merecem um tratamento diferenciado por se enquadrarem no termo biopsicológico do século XXI e não nos do milênio passado.

Sabe-se que a maioria da população, equivocadamente, preza pela redução da maioridade penal para 16 e até 14 anos por acharem que os mesmos não respondem penalmente por seus atos. Porém, não é bem assim. Os adolescentes menores de 18 anos respondem por cada ato cometido, sendo inclusive privados de sua liberdade por até 3 anos, como já visto anteriormente. O grande problema é a efetividade e eficácia da lei especial que os protegem, o ECA. Os adolescentes em conflito com a lei não temem uma repressão que possam os conter e sempre acham que vão sair impunes, o que, na prática, acaba por acontecer.

Entretanto, reduzir a maioridade penal não seria a forma mais eficaz, nem muito menos inteligente de conter o crescimento da violência entre adolescentes. Segundo dados do Conselho Nacional de Crianças e Adolescentes (CONANDA), a redução da maioridade penal poderá aumentar em até 3 vezes a chance de reincidência, pois as taxas de reincidência do sistema socioeducativo em 2007 eram de 20%, enquanto que a do sistema penitenciário era de 60%. Sobre o tema, Bittar (2015, online) dispõe:

Assim, o que ocorrerá na prática, no caso de modificação da maioridade penal, é o aumento da - já excessivamente excedida - população carcerária, aumentando o colapso do sistema, o que obrigará os magistrados a (como já está ocorrendo) lançar mão da prisão domiciliar, ou libertar os presos por falta de vagas, justamente o que não é o desejo dos defensores da redução da maioridade que, iludidos, apóiam iniciativas como a PEC 171/93. Modificações no ECA, aliadas a uma política séria de estruturação das entidades responsáveis, certamente, além de menos onerosas aos cofres públicos (o custo da construção e manutenção de penitenciárias é alto) podem propiciar o desejo de todos, ou seja, a diminuição dos altos índices de violência do país que, como demonstrado, tende a aumentar com uma simples redução da imputabilidade penal.

Assim, reduzir a maioridade penal não irá aumentar a segurança publica imediatamente. O que irá ocorrer são conseqüências drásticas como a superlotação carcerária e a alta no índice de reincidência.

5.3 MAIORIDADE NO DIREITO COMPARADO                 

A grande maioria dos países do mundo adotam, assim como o Brasil, a idade de 18 anos para responsabilização penal adulta.

Diferentemente do que a mídia expõe, dados da Unicef comprovam que o Brasil faz sim parte dos quase 80% do mundo que adotam a maioridade penal para adultos a partir dos 18 anos. (BELONI, 2013, online).

Sobre a responsabilidade, a autora supracitada também aduz:

           

A responsabilidade judicial (penal) existe para adolescentes, que são punidos pelos seus atos infratores das leis, sendo aplicadas a eles medidas socioeducativas. A grande questão é que as pessoas confundem responsabilização com o fato de esses adolescentes serem inimputáveis perante o nosso Código Penal. Eles não são impunes, eles respondem ao ECA.

O grande problema é que as pessoas criam confusamente a idéia de que só existe responsabilização penal para o maior de 18 anos e tal idéia é completamente equivocada. Os menores de 18 anos e maiores de 12 anos são sim responsabilizados penalmente de acordo com os crimes previstos no Código Penal, como visto mais acima no tópico anterior.

De acordo com Beloni (2013, online), a responsabilidade judicial (penal) existe para adolescentes, que são punidos pelos seus atos infratores das leis, sendo aplicadas a eles medidas socioeducativas e a grande questão é que as pessoas confundem responsabilização com o fato de esses adolescentes serem inimputáveis perante o nosso Código Penal. Eles não são impunes, eles respondem ao ECA.

A diferença entre a maioria dos países está justamente nessa idade de responsabilização juvenil, como exemplo, pode-se citar o que Sposato (2013) mencionou da Alemanha e Espanha, nos quais as idades em que os menores infratores responderão penalmente são de 14 e 12 anos respectivamente. Nesse mesmo sentido, Sposato (2013, p. 219) afirma:

A diferença e que no Direito Brasileiro, nem a Constituição Federal, nem o ECA mencionam a expressão penal para designar responsabilidade que se atribui aos adolescentes a partir de 12 anos de idade. Apesar disso, as seis modalidades de sanções jurídico-penais possuem, tal qual as penas dos adultos, finalidades de reprovação social. A não utilização da expressão penal em nosso sistema não altera a natureza das medidas aplicadas, que, como visto, e inegavelmente penal.

Segundo Sposato (2013, p. 60), das informações coletadas de 53 países, fora o Brasil, é predominante o inicio da responsabilidade juvenil entre 13 e 14 anos de idade, o que se verifica em 25 países, representando um percentual de 47%.

      No entanto, há países que a idade de responsabilização penal chega a acontecer com menos de 12 anos. É o caso da Escócia, Líbia, Quênia e Indonésia, que começa aos 08 anos de idade. Nos Estados Unidos, a maioridade penal varia de acordo com a legislação de cada estado, em que alguns estados fixaram uma idade mínima legal que varia entre 6 e 12 anos; os demais seguem o chamado “direito consuetudinário”, que não é escrito, mas baseado nos costumes. (SOARES, online).

Diante de toda essa variedade de idades mínimas para a responsabilização penal, segundo Sposato (2013), o Comitê da Criança, em 2007, recomendou que os Estados-parte adotem idade entre 14 ou 16 anos de idade.   

5.3.1 Maioridade na Europa

Para começar a comparação da responsabilização penal internacional, começar-se-á pela maioridade penal em alguns países europeus.

Na Alemanha, o adolescente começa a ser responsabilizado aos 14 anos. O sistema de responsabilização juvenil vai dos 14 aos 18 anos. Dos 18 aos 21 anos, o adolescente se enquadra no sistema de jovens adultos. Após atingidos os 21 anos, a competência é exclusiva da jurisdição plena tradicional.

Em 1990, a legislação alemã sofreu uma mudança e adotou medidas socioeducativas parecidas com aquelas previstas na legislação brasileira, no Estatuto da Criança e do Adolescente: para os menores de 14 anos,  igualmente aos menores de 12 anos no Brasil, se aplicam um conjunto de medidas de proteção quando cometem algum ato infracional. (CAOPCAE, 2015, online)

Na Inglaterra, a privação da liberdade é permitida a partir dos 15 anos, apesar de a responsabilização penal começar aos 10 anos. Isto se deve ao fato de que há duas categorias para classificar o menor infrator: a Child, aqueles entre 10 e 14 anos incompletos e a Young Person, para aqueles entre 14 e 18 anos, para as quais há presunção de plena capacidade e penas diferentes daquelas aplicadas aos adultos. Entre 18 e 21 anos, as penas também são diferentes e atenuadas, apesar de a imputabilidade penal começar aos 18 anos. (CAOPCAE, 2015, onlie).

Já na Espanha, foi ampliada, em 1995, a imputabilidade penal dos 16 para os 18 anos. Assim como a Alemanha, a legislação espanhola adota um Sistema de Jovens Adultos, podendo ser aplicada a legislação penal especial àqueles com idade entre 18 e 21 anos, em vez de aplicar as penas comuns. A legislação estabeleceu que os menores de 18 anos não serão responsabilizados criminalmente de acordo com as normas do código, mas de acordo com a lei que regula a responsabilidade penal do menor. Assim como na legislação do nosso país, a espanhola consagra o Princípio da Doutrina da Proteção Integral do Menor, porém, na legislação brasileira, o adolescente só pode ficar internado até no máximo 3 anos, e na Espanha pode alcançar os 8 anos de internação. (CAOPCAE, 2015, online)

A França fixou a imputabilidade penal aos 18 anos e um sistema de responsabilização juvenil a partir dos 13 anos. Entre 13 e 18 anos, os adolescentes gozam de uma presunção relativa de irresponsabilidade penal e quando há a comprovação do discernimento na faixa etária de 13 a 16 anos, é fixada pena com redução obrigatória; já aos adolescentes entre 16 e 18 anos, a redução fica a cargo do juiz. (CAOPCAE, 2015, online)

Na Itália, adolescentes entre 14 e 18 anos são considerados imputáveis, desde que comprovado o discernimento de saber o que é ilícito, porém, ainda assim, terão redução de pena pelo Tribunal dos Menores. Na faixa etária de 14 a 18 anos, é aplicada a legislação comum. Há também o Sistema de Jovens Adultos de idade entre 18 a 21 anos, assim como a Espanha e a Alemanha.

Em Portugal, a imputabilidade penal do indivíduo se inicia aos 16 anos, sendo submetido à legislação comum. Entretanto, entre 16 e 21 anos, o adolescente fica submetido ao Sistema de Jovens adultos, tendo redução de pena.

Na Irlanda, a imputabilidade é fixada aos 18 anos, sendo o início de responsabilização penal aos 18 anos, podendo-se iniciar a privação de liberdade aos 15 anos. (CAOPCAE, 2015, online)

Na Bélgica, segundo a tabela da CAOPCAE (2015, online), há o Sistema Tutelar que não permite que adolescentes menores de 18 anos sejam responsabilizados penalmente. Entretanto, admite-se a revisão da irresponsabilidade penal para algum tipo de delito, como por exemplo, no transito, em que o mesmo poderá ser submetido a um regime de penas.

A Grécia adota um Sistema de Jovens Adultos nos mesmos moldes do sistema alemão, de 18 a 21 anos. A responsabilidade penal, de acordo com a tabela da CAOPCAE (2015, online) começa aos 13 anos e a imputabilidade aos 18 anos.

Portanto, apenas um dentre os países acima citados, Portugal, adota a imputabilidade penal ao menor de 16 anos. Outra característica que chama a atenção é o fato de que muitos dos países adotam atenuantes para aqueles com idade entre 18 e 21 anos, estando o Brasil com sistema semelhante com a maioria dos países europeus.

5.3.2 Maioridade penal nos Estados Unidos

Nos Estados Unidos, a responsabilização penal varia de acordo com a legislação de cada Estado. Na maioria destes, os adolescentes a partir de 12 anos podem ser submetidos às mesmas penas que os adultos, até mesmo a pena de morte e a prisão perpétua. Com 10 anos, a criança pode ser responsabilizada nos casos de delitos graves. O país não ratificou a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. 

5.3.3 Maioridade penal na Ásia

A China adotou a idade de 14 anos para responsabilização penal para os casos de crimes graves e violentos, como, por exemplo, o estupro e o homicídio. Para os crimes sem violência à pessoa, a idade foi fixada em 16 anos, sendo responsabilizado aos 18 anos de acordo com a legislação comum.

A legislação do Japão é bem parecida com a da China, porém, o adolescente só poderá ser submetido à legislação comum apenas com 21 anos. (CAOPCAE, 2015, online)

5.3.4 Maioridade penal na América Latina

No Chile, pela Lei de Responsabilidade Penal dos Adolescentes, foi definido um sistema de responsabilidade dos 14 aos 18 anos de idade, mas em geral, são responsabilizados a partir dos 16 anos. Caso um adolescente de 14 anos venha a cometer uma infração, a competência será dos Tribunais de Família.

No México, há legislações diferentes em cada Estado. Porém, a maioria adota, pelo sistema tutelar, a idade de 11 anos para o inicio da responsabilização penal, sendo que a imputabilidade é a partir dos 18 anos.

Na Argentina, a responsabilidade juvenil começa aos 16 anos, podendo haver a privação de liberdade quando praticados delitos. O sistema da Argentina também é tutelar e a imputabilidade se inicia aos 18 anos.

Na Venezuela, a idade de responsabilização penal começa aos 12 anos. Entretanto, há uma lei no país que estabelece uma diferença de tratamento para os adolescentes com idade entre 12 e 14 anos e para os com idade entre 14 e 18 anos. Para os primeiros, a liberdade só poderá ser privada por no máximo 2 anos. Já para os outros, a privação de liberdade não poderá exceder 5 anos, sendo o adolescente imputável ao completar 18 anos. (CAOPCAE, 2015, online)

No Peru, igualmente no Equador, na Costa Rica, em El Salvador e no Brasil, a responsabilidade penal começa aos 12 anos e a imputabilidade aos 18 anos.

O Uruguai estabeleceu a idade de 13 anos para responsabilidade penal e de 18 anos para imputabilidade (CAOPCAE, 2015, online)

Ao analisar a maioridade nos países acima caracterizados, verificamos que a tendência é a fixação da idade penal em 18 anos de idade, a não ser nos Estados Unidos, que detém uma rígida legislação e não aceitou a Convenção sobre os Direitos da Criança, para que pudesse aplicar pena de morte a esses.

5.4 QUESTÕES SOCIOLÓGICAS QUE FOMENTAM O ADOLESCENTE A COMETER O ATO INFRACIONAL

Atualmente, as famílias estão cada vez mais deixando para trás o diálogo entre si, seja entre pais e filhos ou entre membros de uma mesma família. O artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que é dever dos pais educar e sustentar seus filhos menores. Aqueles tem a responsabilidade de dar apoio material, como vestuário e moradia e apoio afetivo, para que as crianças cresçam equilibradas emocionalmente.

O que acontece é que os pais precisam se ausentar para trabalhar, ficando cada vez mais distantes dos filhos, o que tem como conseqüência a falta de atenção para com o mesmo. Tal fato acaba por gerar uma incapacidade de a família contribuir com todo o apoio que uma criança ou um adolescente necessitam. A inobservância das más influências ao redor da criança/adolescente, as frustrações sejam emocionais, sejam materiais, todos esses fatores contribuem para que tal indivíduo entre no mundo do crime.

Embora as crianças e adolescentes que convivam com a criminalidade e o uso de drogas ao seu redor estejam mais propensas às mesmas condutas, elas não podem ser retiradas da comunidade em que estão ou do seio familiar.

O que deve ocorrer, é a efetivação do dever da família para com esta criança/adolescente de preocupar-se com a educação do mesmo, a fim de evitar o mundo das violências e das drogas.

É necessário que haja mecanismos e políticas publicas de apoio às famílias que se encontram vulneráveis, pois a violação dos direitos da criança e do adolescente podem causar danos irreversíveis no desenvolvimento psicológico destes.

Outro fator de contribuição para a alta no índice de adolescentes em conflito com a lei é a falta de preocupação do Governo para com a evasão escolar. Como já citado, o direito à educação é um direito social consagrado no artigo 6º da nossa Lei Maior. E, ainda, o artigo 205 da mesma lei dispõe que a educação é direito de todos, devendo ser ofertada pelo Estado e pela família com a colaboração da sociedade para que haja o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para enfrentar o mercado de trabalho.

Além disso, o artigo 54, I do ECA estabelece que é dever do Estado garantir a educação básica obrigatória e gratuita às pessoas com idade entre 4 e 17 anos, assegurada, ainda a oportunidade para aquelas que não tiveram acesso à escola na idade própria.

A escola é um local de extrema importância para a formação social e psicológica do indivíduo, pois é lá que mesmo aprende regras de convívio social, cria vínculos e aprende a respeitar o próximo.

Os pais ou responsável tem a obrigação de matricular seus filhos em uma escola e o descumprimento de tal fator pode ensejar aplicação de medida protetiva. Caso os pais ou responsável não matriculem o respectivo filho/pupilo em uma escola, ficam sujeitos à pena de multa.

O grande problema é que os pais acabam por influenciar ou muitas vezes exigir que os filhos ingressem cedo no mercado de trabalho para que possam ajudar no sustento familiar, aumentando o índice de evasão escolar e propiciando o conhecimento da violência e do crime.

O Brasil necessita de escolas mais bem preparadas para que o adolescente consiga ingressar em uma universidade pública e só depois adentrar no mercado de trabalho.

Portanto, é inegável que o Poder Público necessita auxiliar na instrução da sociedade infanto-juvenil, para que assim, haja uma baixa no índice de criminalidade por crianças e adolescentes.

Outro grande fator problemático é o envolvimento rotineiro com drogas, seja a criança/adolescente usuário ou traficante.

Por mais incrível que se pareça, o primeiro contato com as drogas, geralmente, acontece no próprio âmbito familiar ou nas escolas ou por influencia de amigos. O que acontece é que os pais devem ficar atentos à qualquer mudança de comportamento dos filhos, impondo limites e dando o próprio exemplo como estimulo.

Faz-se necessária a luta pela erradicação da pobreza, o estimulo à freqüência escolar e o oferecimento de melhores condições aos jovens de hoje.

 

6. EXPERIÊNCIA DE SUCESSO NO ECA EM MINAS GERAIS

6.1 PROGRAMA DE LIBERDADE ASSISTIDA DA PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE - MG

 A liberdade assistida, conforme demonstrado neste trabalho, é a medida socioeducativa comprovadamente mais eficaz para que haja a reeducação social do adolescente, pois, ao mesmo tempo que o socioeducando está em cumprimento de tal medida, ele também tem o direito à convivência familiar e com a comunidade.

Infelizmente, esta é a medida que vem sendo menos aplicada no Brasil, conforme a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, em Minas Gerais.

Entretanto, nessa mesma cidade é que vem sendo mobilizado a luta pela erradicação da criminalidade infanto-juvenil. A Prefeitura de Belo Horizonte implantou o Projeto de Liberdade Assistida, em parceria com o Juizado da Infância e Juventude e a Pastoral do Menor.

A idéia do programa é encaminhar os adolescentes para que, após aplicada a medida, compareça semanalmente à sua “regional” para realizar o acompanhamento, que é realizado por orientadores sociais voluntários, responsáveis por mediar a relação do jovem com a sociedade, e feito de forma descentralizada e flexibilizada, uma vez que o jovem em cumprimento de medida de liberdade assistida permanece no ambiente familiar e comunitário. (Sposato, 2015, online).

A mesma autora ainda afirma:

Atualmente o Programa atende cerca de 600 adolescentes e suas respectivas famílias em 9 regionais de Belo Horizonte. Cada regional possui de 2 a 4 técnicos especializados, em psicologia, psicanálise ou assistência social, e um número variado de orientadores voluntários. O que caracteriza o grande mérito do Programa: a criação de fortes vínculos entre a Sociedade Civil e o Poder Público para a efetiva implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente. O Programa gerou significativa mobilização nas lideranças e organizações não governamentais através da articulação de profissionais da área, orientadores voluntários, associações de bairro, redes de serviços comunitários, escolas, igrejas, associações culturais e etc. Essa disseminação viabilizou a inserção do jovem na comunidade desmistificando uma visão negativa do adolescente em conflito com a lei. Aproximadamente 2.300 jovens já passaram pelo programa e 72% dos jovens que cumpriram a medida não reincidiram.

Vê-se, portanto, que a simplicidade de cumprir tal medida é a peça-chave para a reeducação e reinserção social do adolescente em conflito com a lei, visto que é uma medida não-privativa de liberdade, ou seja, o adolescente fica à vontade, convive com a família e a comunidade e cumpre os objetivos almejados pela devida medida.

 

CONCLUSÃO

A legislação brasileira já sofreu diversas alterações, desde a época das Ordenações no Brasil-Colônia até os dias atuais com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Tais alterações serviram para que o nosso Ordenamento Jurídico passasse por um processo de amadurecimento e seletividade.

Processo esse que tornou as crianças e adolescentes sujeitos de direitos e garantias individuais, figurando como protagonista e não como mero coadjuvante, assim como era antigamente.

Com a imputabilidade penal, não foi diferente, a Constituição de 1988 fixou a idade-limite aos 18 anos de idade e consignou o ato infracional como sendo o ato praticado por menor de 18 e maior que 12 anos, equivalente a crime no Código Penal. Para a apreensão do adolescente em conflito em lei, o Estatuto previu as três fases de apuração do ato infracional, que vai desde a fase policial, passando pela fase de audição do Ministério Publico até a fase judicial.

Aos adolescentes em conflito com a lei, aplicam-se as medidas socioeducativas, estas, sendo umas mais eficazes demonstrativamente que as outras, como por exemplo, a de maior eficácia, a liberdade assistida.

Tal medida foi a que se mostrou mais benevolente, tanto para o aplicador, quanto para o socioeducando, visto que o mesmo tem contato familiar e comunitário, sem deixar de cumprir as orientações que recebe para que possa se ressocializar.

A redução da maioridade é tema polêmico, entretanto, o objetivo deste trabalho não foi o de condecorar com a PEC 171/93, mas sim de mostrar as desvantagens que existirão, caso a mesma for levada adiante que, como citado, o maior fator, seria o efeito inverso, ou seja, a reincidência.

Como pôde ser observado, o Brasil está de acordo com os vários países que adotam a idade de responsabilização penal aos 18 anos e não com aqueles raros que adotam uma idade menor.

É certo que as crianças e adolescentes de hoje não são as mesmas de antigamente. É diante de tal fator que a redução da maioridade, caso aceita, teria que respeitar os critérios de razoabilidade da Constituição, mantendo o tratamento diferenciado à população infanto-juvenil.

Entretanto, é sabido que esta não seria a melhor opção, diante de todos os fatores apresentados, e como uma das principais, a reincidência é o motivo pelo qual reduzir a maioridade penal não seria a forma mais adequada de controle da criminalidade juvenil.   

O objeto necessário seria a efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente, uma maior rigidez em seu cumprimento, como forma de o socioeducando perceber que não sairá impune pelos crimes que cometeu.

 

REFERÊNCIAS

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