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Advogado deve ou não cobrar consulta jurídica?

17/08/2015 às 17:08
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Por que a sociedade parece não aceitar que consultas jurídicas sejam pagas?

Essa semana me deparei com um cidadão super indignado por ter sido cobrado por um advogado, “...só para ter uma orientação!”. Perguntei então àquele transeunte quanto tempo levou para ter sua indagação respondida ou questão solucionada? – “Ora! Umas meia hora ou mais um pouco!”, respondeu-me já com certo ar pensativo. Insisti mais um pouco, indagando se ele gostou da forma que foi atendido e se o profissional demonstrou conhecimento da questão. Foi o momento em que aquele senhor assentiu com um aceno de aprovação, mas reclamou do valor cobrado (R$100,00). Foi quando, aproveitando a sua acessibilidade, indaguei se ele tinha noção de quanto pagaria para ser atendido em outro consultório profissional, tipo médico, odontólogo, oftalmologista, pelo mesmo tempo que ficou no advogado. Foi então que aquele senhor maduro e bem vivido se calou e somente me agradeceu e se despediu. Não manifestando qualquer reação.

Sabe-se que o mercado atual, altamente competitivo, está dividindo os profissionais do Direito acerca da cobrança de honorários e da consulta jurídica preliminar. Muitos advogados preferem não cobrar por tal serviço por temor que isso pareça uma ofensa e possa perder o cliente mesmo antes de ele adentrar no escritório.

O intrigante é que, se vamos a um consultório médico, odontológico, oftalmológico ou psicológico, primeiramente pagamos pela consulta, ali mesmo na recepção, para, somente depois, auferir um diagnóstico e proceder algum tratamento, o qual pode gerar mais custos.

Infelizmente, essa situação no ramo do Direito está se tornando esdrúxula e vexatória. Inclusive vejo isso como mais um fator de desmerecimento e desmoralização da profissão. Fazendo com que a sociedade veja os advogados como simples conselheiros de banca de feira (o qual acredito também cobra por seu conselho).

A nova tabela da OAB/MG, elaborada através da Resolução nº CP/01/12, nas páginas 23 e 24, trata especificamente do assunto, no tópico XI, Advocacia Extrajudicial. Lá, temos valores fixados para a consulta verbal em horário normal (R$190,00) e para consulta fora do expediente ou no domicílio do cliente (R$570,00), sendo esta mais onerosa do que a primeira. Percebendo que o causídico que atendera o ancião raivoso ainda cobrou valor bem abaixo do recomendado por sua própria instituição reguladora.

Além do mais, a mesma Resolução fixa um parâmetro monetário para o tempo gasto pelo advogado, quando da cobrança de honorários por hora despendida, inclusive com acréscimo de 25% em caso de serviço realizado fora do escritório, após as 20:00 horas ou em dias não úteis.

O mais desnorteador disso tudo é que a própria Ordem dos Advogados do Brasil faz por desmerecer o respeito do cidadão comum e do seus profissionais integrantes. Isso porque, na parte geral da Resolução citada, no seu artigo 8º preconiza que: “é aconselhável que o advogado cobre sempre o valor da consulta, quando alguma matéria jurídica ou ligada à profissão lhe for apresentada. Se, em função da consulta, sobrevier a prestação de serviços, a critério das partes, o valor da consulta poderá, ou não, ser abatido dos honorários a serem contratados”.

Isso só demonstra o quão prejudicada está a Advocacia particular. Pois, aquele profissional que se empenha em atender aos anseios daqueles que o procuram, tendo passado pelas mesmas sabatinas, gastos e anos de dedicação na sua formação, da mesma forma que as outras áreas humanas, nas quais “o cliente não passa pela recepção se não pagar previamente pela consulta”, também merecia esse mesmo tratamento e imposição não só pela sociedade, mas também pelos seus órgãos reguladores.

Ainda mais sabendo que, em muitos casos, o possível cliente marca horário, toma o tempo do advogado, realiza a consulta, e este não recebe nada em troca, apesar daquelas orientações terem levado a uma resolução extrajudicial amigável, sem qualquer participação ou supervisão daquele profissional.  

Da mesma maneira, não se pode ignorar o Código de Ética, seja pela consulta fora dos parâmetros normais, seja pela cobrança de valores excessivos. Inclusive, o Tribunal de Ética e Disciplina da OAB de São Paulo veda a atividade advocatícia virtual, estando os sites restritos somente a informações gerais, mas nunca passíveis de consultas online. O que não está sendo respeitado por aquele site jurídico JUSBRASIL, que, já no primeiro momento do acesso, indaga ao internauta: “quer falar com um advogado?”.

Assim como já vemos muitos sites em forma de captação irregular de clientes. Além de ser comum encontrar anúncios na internet oferecendo consultas virtuais, gratuitas ou não, com expedição de boleto para pagamento ou depósito em conta corrente do escritório, numa clara afronta ao Código de Ética da OAB e ao Provimento 94/00, que trata da publicidade permitida ao advogado.

Desta feita, acreditamos que a classe jurídica deve, o mais breve possível, ser conscientizada sobre a importância de apresentar um trabalho austero, honesto e de excelente qualidade, justamente para resgatar o respeito da sociedade. O que deveria começar pelas normativas reguladoras da profissão nos próprios concelhos da Ordem e nas entidades fiscalizadoras, efetivando que a CONSULTA seja efetivamente caracterizada como uma obrigação no exercício do profissional, inclusive promovendo campanhas nacionais de esclarecimento e incentivos aos desinformados ou desleixados. Deveriam, também ser demonstradas as benesses da consulta regular ao advogado para que a sociedade tenha isso como um fator de alívio e não de martírio, como muitos pensam por aí.

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Para fechar esse tema com chave de ouro, vale transcrever os dizeres de um cartaz que anotei pendurado em num escritório jurídico que não abre mão do valor da consulta. Cabe, inclusive, atrever-me a indicar o referido texto para que integre a campanha que sugeri no parágrafo anterior:

<<Prezado Cliente,

O valor cobrado pela CONSULTA está de acordo com os parâmetros apresentados pelo poder aquisitivo de nossa região.

Lembre-se: A consulta com o advogado é o primeiro passo para resolução de muitos litígios que assolam a sua paz!!  E esse valor sempre retorna ao usuário na forma de melhorias empregadas para atendê-lo cada vez melhor.

Muito embora pareça inconveniente a cobrança da CONSULTA, há de se convir que, enquanto o advogado presta a consulta, ele:

- deixa de acompanhar outros processos;

- dispõe seu tempo, que é precioso (pois existem processos que não esperam e poderão extrapolar os prazos);

- disponibiliza ao cliente todo o seu conhecimento jurídico sobre a causa (adquirido às duras cargas, junto a uma faculdade, a qual lhe gerou despesas e empenhos inimagináveis);

- utiliza-se de todo o seu acervo de livros (que não são baratos);

- oferece toda uma estrutura física (gabinetes, móveis, computadores etc), que geraram despesas;

- mantém funcionários e outras despesas mensais de expediente (que não são poucas e nem baratas).

Então, pense muito bem antes de se negar a pagar essa ínfima taxa!

Você pode estar deixando de recorrer a um profissional que realmente está atualizado e preparado para resolver a sua questão, por puro capricho e desinformação!!!

A direção agradece sua compreensão>>

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Sobre o autor
CESANIO ROCHA BEZERRA

Advogado desde 2005, ex-presidente da 13ª Subseção OAB/PA, ex-Serventuário da Justiça (1996-2005), atualmente Advogado especificado em Direito Civil, Comercial e Industrial, Publico e Administrativo, Penal, Agrário, Registral e Sucessões.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BEZERRA, CESANIO ROCHA BEZERRA. Advogado deve ou não cobrar consulta jurídica?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4429, 17 ago. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/41765. Acesso em: 28 mar. 2024.

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