Introdução
O presente trabalho busca resumir o que é a Ação Penal 470, mais conhecida como “mensalão”. Procura relacionar assuntos tratados em sala de aula como foro por prerrogativa de função e princípio do Juiz Natural com o mensalão e busca entender como se dá a lógica formal utilizada pelo acusador público no esquema de compra de votos de parlamentares.
Mensalão
No dia 6 de junho de 2005, o ex-deputado federal Roberto Jeferson, em entrevista à “Folha de S. Paulo”, denunciou o esquema de pagamento de mesada feito pela cúpula do PT para congressistas aliados votarem a favor dos projetos do governo.
Em 16 de abril de 2006, foi apresentada denúncia pelo Ministério Público ao Supremo Tribunal Federal contra as pessoas envolvidas no mensalão e em 22 de agosto de 2007, o STF iniciou o julgamento.
A CPI dos Correios, A Procuradoria Geral da República e o STF concordaram que o mensalão existiu. O processo tem quarenta denunciados, entre eles José Dirceu, Luiz Gushiken, Anderson Adauto, Roberto Jeferson, Duda Mendonça, Delúbio Soares, José Genuino e Silvio Pereira.
A Procuradoria-Geral da República descreveu o “Mensalão” como um esquema clandestino de financiamento político organizado pelo PT para garantir apoio ao governo Lula no Congresso em 2003 e 2004, logo após a chegada dos petistas ao poder.
Em junho de 2011 Joaquim Barbosa, relator do mensalão no STF, encerrou a fase de reunião de provas e o processo chegou à fase final. Em dezembro do mesmo ano Joaquim Barbosa conclui o relatório do mensalão e liberou o processo para revisão do ministro Ricardo Lewandowski. Em junho de 2012 o processo foi liberado para julgamento e em agosto teve início o julgamento do mensalão que se encontra agora na reta final em que 25 dos acusados já foram condenados.
A CPI dos Correios concluiu que o mensalão custou pelo menos dez milhões de reais em dinheiro público.
Havia três grupos organizados dentro do esquema do mensalão sendo estes:
- Núcleo Político: chefiado pelo então ministro da Casa Civil, José Dirceu, e integrado por outros três dirigentes partidários que integravam a cúpula do PT no início do governo Lula.
- Núcleo Operacional: comandado pelo empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, dono de agências de publicidade que tinham contratos com o governo federal.
- Núcleo Financeiro: financiado pelo Banco Rural que deu suporte ao mensalão, alimentando o esquema com empréstimos fraudulentos.
A denúncia oferecida pelo Procurador Geral da República ao Excelentíssimo Senhor Ministro Joaquim Barbosa, acusa os quarenta denunciados pela prática dos crimes de: lavagem de dinheiro (esconder a origem ilícita de bens e dinheiro), formação de quadrilha (quatro ou mais agentes conspirando algum delito), corrupção passiva (aceitar beneficiar alguém de forma ilícita por dinheiro), corrupção ativa (oferecer de forma ilícita dinheiro em troca de benefícios), peculato (ato praticado por funcionário público que se apropria de bens ou dinheiro - público ou particular - do qual disponha em razão do cargo ou desviá-lo para proveito próprio), evasão de divisas (to de enviar dinheiro para o exterior sem declarar ou pagar impostos) e gestão fraudulenta (administrar uma instituição cometendo atos ilegais).
Em suma, o que foi constatado até o presente momento é que: "ele existiu", " 25 réus foram considerados culpados", "José Dirceu foi o chefe so esquema", "deputados venderam votos", "PT articulou pagamentos", "o banco rural fraudou empréstimos", "o mensalão usou o dinheiro público", "réus lavaram dinheiro público", "Duda Mendonça é inocente" e que "houve formação de quadrilha".
Foro por Prerrogativa de Função
De início, analisa-se o significado do Foro por prerrogativa de função. Tal fenômeno, previsto pela Constituição de 88, prevê o julgamento de pessoas que ocupam importantes cargos públicos de modo diferente daquele que um cidadão comum passa. Foi criado por uma ideia de independência, pois as atitudes daquele que exerce o cargo público terá a voz do Supremo sob qualquer decisão tomada. No art. 102 da CF, trata-se das infrações penais e a quem compete seu julgamento. Não se trata de um privilégio concedido à pessoa que exerce tal cargo público, mas sim de uma prerrogativa que decorre da relevância e importância do cargo ou da função que a pessoa ocupa. O foro privilegiado extrai mais uma possibilidade de decisão, ocorrendo o risco de não ter o caso reanalisado. Por isso não se trata de um privilégio. O professor Tourinho Filho afirma:
“há pessoas que exercem cargos de especial relevância no Estado e, em atenção a esses cargos ou funções que exercem no cenário político-jurídico da nossa Pátria, gozam elas de foro especial, isto é, não serão processadas e julgadas como qualquer do povo, pelos órgãos comuns, mas, pelos órgãos superiores, de instância mais elevada”
Dentro da esfera do julgamento da Ação Penal 470, popularmente conhecida como “Mensalão”, muito se discute sobre tal matéria. De forma notória, foi tomado conhecimento da mídia a afirmação do ex-ministro da justiça Marcio Thomaz Bastos, que defende o ex-executivo do Banco Rural José Roberto Salgado sobre o fato de que o executivo não teria prerrogativa de foro para ser julgado de imediato pelo Supremo, por não se tratar de uma pessoa que exerce cargo público, refletindo no pedido de desmembramento do processo. É defendido o fato de que a prerrogativa de função em tal caso fere os princípios constitucionais do juiz natural e do duplo grau de jurisdição. O Supremo nunca fixou jurisprudência sobre a extensão da prerrogativa de foro por função. Em alguns casos, admite o desmembramento da ação. Um dos mais recentes foi a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, que determinou o desmembramento das investigações em relação ao grupo do empresário de jogos ilegais Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
A jurisprudência ainda não é definitiva em relação aos co-réus dos foros privilegiados de função. A competência por conexão é decidida pelo art. 76 do Código de Processo Penal, onde é enumerada os casos em que ocorre o concurso e a conexão.
Contudo, a maioria dos ministros rejeitou o pedido de desmembramento e todos os 38 acusados serão julgados pelo Superior Tribunal Federal. O Supremo entende que a competência da prerrogativa deve se estender àqueles fatos ou pessoas que estiverem conexos ao caso. Fato este que concretizou o foro de prerrogativa de função.
Princípio do Juiz Natural
O princípio do Juiz Natural é a imparcialidade do judiciário e a segurança do povo contra o arbítrio estatal, os quais estão nos incisos XXXVII e LIII do art. 5º da Constituição Federal. O juiz natural está integrado no Poder Judiciário e somente os juízes, tribunais e órgãos jurisdicionais que estão na Constituição que se identificam e esse princípio se estende ao poder de julgar também em outros órgãos, como o Senado (nos casos em que houver impedimento de agentes do Poder Executivo).
Este deve ser interpretado de forma que não proíba- se criação de tribunais, também deve exigir respeito absoluto às regras objetivas de determinação de competência, para que assim não afete- se a imparcialidade do órgão julgador.
Enfim, o direito a um juiz imparcial está presente a garantia fundamental na administração da Justiça num Estado de Direito e deve servir de substrato para previsão de presunções de impedimento e suspeição do órgão julgador.
Consiste no Princípio Constitucional, previsto no art. 5º, LIII, que estabelece que deve haver regras objetivas de competência jurisdicional, ou seja, prevê o direito fundamental de que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, em outras palavras, todas as pessoas têm o direito de ser processado e julgado por pessoa devidamente investida no cargo, tendo sua competência previamente estipulada pela Constituição Federal ou por lei. Tal princípio garante a independência e a imparcialidade do órgão julgado e está intimamente ligado à vedação dos Tribunais de exceção, visto que nestes não há prévia competência constitucional. O direito a um juiz imparcial está presente a garantia fundamental na administração da Justiça num Estado de Direito e deve servir de substrato para previsão de presunções de impedimento e suspeição do órgão julgador. No caso do mensalão, juiz natural é o Supremo Tribunal Federal, dada a prerrogativa de foro de alguns réus.
Lógica Formal Utilizada Pelo Acusador Público
A natureza dos crimes do ca – como a quadrilha – impõe que haja, por questão de coerência lógica e Justiça, um julgamento único do fato. Se pessoas comuns cometem crimes com autoridades com foro privilegiado – e tais autoridades, quando do cometimento do crime, revelam-se úteis e mesmo fundamentais para o êxito da quadrilha -, é justo que tais pessoas vejam-se julgar no mesmo foro especial que seus comparsas. Quem desejar cometer crimes e quiser ser julgado por um juiz de Direito, que cometa os crimes sem a co-autoria de autoridades públicas com foro privilegiado.
Conclusão
Ao longo da elaboração do presente trabalho e das discussões do gurpo acerca do mensalão, o caso mais importante do STF desde a redemocratização, pudemos rever e observar a aplicação de conceitos vistos em sala de aula como "foro por prerrogativa de função", "princípio do juiz natural" e o da "lógica formal utilizado pelo acusador público", além de aprofundar nossos conhecimentos sobre este caso tão importante, envolvendo as mais altas instâncias políticas do Brasil num caso histórico de corrupção.
Critérios definidos pelo STF no julgamento do caso foram esclarecidos, como por exemplo, a demora do caso, que ao londo do trabalho, concluímos que se deve ao fato de que ao longo do processo, os advogados de defesa tentaram várias vezes bloquear o julgamento ou desmembrá-lo, alegando que parte dos réus deveria ser julgada em cortes mais baixas. Segundo a legislação brasileira, somente altas autoridades devem ser julgadas pelo STF. Os pedidos foram negados, já que a corte avaliou que a denúncia se refere a um único esquema. Outro motivo foi a quantidade de testemunhas, cerca de 600 pessoas foram ouvidas.
Bibliografia
- Código de Processo Penal 2012;
- BONFIM, EDILSON MOUGENOT, CODIGO DE PROCESSO PENAL ANOTADO, SARAIVA EDITORA, 3° edição, 2010;
- MOSSIN, HERACLITO ANTONIO, COMENTARIOS AO CODIGO DE PROCESSO PENAL, 2° edição, 2011;
- http://g1.globo.com/politica/mensalao/infografico/platb/reus;
- http://g1.globo.com/politica/mensalao/infografico/platb/diaadia.