Análise crítica sobre a Teoria do Poder Destituinte de Agamben: um estudo comparativo aplicado aos princípios do Direito Internacional

02/09/2015 às 22:04
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Buscaremos correlacionar as informações trazidas pelo filósofo Giorgio Agamben, durante sua palestra pública realizada no dia 16.11.2013 em Atenas com os princípios do Direito Internacional, destacando seus conceitos e peculiaridade.

RESENHA CRÍTICA

“Por uma Teoria do Poder Destituinte” de Giorgio Agamben. Palestra pública em Atenas, 16.11.2013. (Convite e organização pelo instituto Nicos Poulantzas e pela juventude do SYRIZA).

1. CREDENCIAIS DO AUTOR

    Nasceu em Roma, em 1942. Advogado e filósofo. Autor de várias obras, que percorrem temas que vão da estética à política. Seus trabalhos mais conhecidos incluem sua investigação sobre os conceitos de estado de exceção e homo sacer. A sua produção se concentra nas relações entre a filosofia, a literatura, a poesia e, fundamentalmente, a política. Também foi professor visitante em várias universidades americanas, de Berkeley a Northwestern University, em Evanston, e na Universidade Heinrich Heine, de Düsseldorf.

2. BREVE INTRODUÇÃO

    Buscaremos correlacionar as informações trazidas pelo filósofo Giorgio Agamben, durante sua palestra pública realizada no dia 16.11.2013 em Atenas com os princípios do Direito Internacional, destacando seus conceitos e peculiaridade

3. DEFINIÇÃO DE PRINCÍPIOS

    É imprescindível a compreensão da distinção entre os seus elementos formadores. Neste diapasão, sábias são as palavras do Professor Humberto Ávila que apresenta de forma concisa: “…enquanto as regras são normas imediatamente descritivas, na medida em que estabelecem obrigações, permissões e proibições mediante a descrição da conduta a ser adotada, os princípios são normas imediatamente finalísticas, já que estabelecem um estado de coisas para cuja realização é necessária a adoção de determinados comportamentos (normas-do-que-fazer). Os princípios são normas cuja finalidade frontal é, justamente, a determinação da realização de um fim juridicamente relevante (normas-do-que-deve-ser), ao passo que a característica dianteria das regras é a previsão do comportamento.”

4. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO INTERNACIONAL

Doutrinariamente, são diversos os princípios inerentes ao Direito Internacional. Assim, optamos por apresentar os mais importantes, haja vista, que em muitas classificações apresentadas pela Doutrina, os princípios que destacaremos são sempre pontuados. 

De acordo com o Doutrinador Marcelo de Varella, os princípios mais importantes que dão organicidade e lógica ao sistema jurídico do Direito Internacional são: a) igualdade soberana; b) autonomia, ingerência nos assuntos internos dos outros Estados; c) interdição do recurso à força e solução pacífica dos conflitos; d) respeito aos direitos humanos; e e) cooperação internacional.

O princípio da igualdade soberana preceitua que todos os Estados, aqui entendidos como nação, estão em situação de igualdade em face das normas jurídicas, ou seja, do direito. Sem sombra de dúvidas, tal princípio é um desdobramento das bases da comunidade internacional, sendo essa inspirada da comunidade de indivíduos que vivem na máxima que todos são iguais perante a lei. Assim, busca-se a legitimação do respeito mútuo dos Estados, adotando uma postura isonômica, independentemente de caracteres geográficos, culturais e sociais do governo.

A ideia de autonomia é de fácil entendimento. Aurélio conceitua a autonomia como a “faculdade que conserva um país conquistado de se administrar por suas próprias leis.”. Constata-se portanto que o princípio da autonomia está estreitamente ligado ao princípio da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados, que determina a não interferência nos demais Estados. Essa não interferência deve ser entendida como forma garantidora ao Estado de escolher seu próprio destino. Sabe-se que influências econômicas são extremamente visíveis atualmente mas não representam uma afronta ao princípio da autonomia. 

Dando sequência lógica conforme dito preliminarmente, reconhecendo essa autonomia do Estado deve-se em caso de litígio, aplicar o princípio da solução pacífica dos conflitos. O uso da força apenas é autorizado em caso de legítima defesa ou de segurança coletiva, conforme preceitua a própria Carta da Organização das Nações Unidas. O Estado que busca solucionar os conflitos de forma pacífica deve também respeitar os Direitos Humanos, hoje, considerado um valor comum a todos os sistemas de direito. 

Por fim, o princípio da cooperação internacional é entendido como um comando que determina aos Estados atuação em conjunto visando colaborar para a busca de objetivos comuns. Tal princípio é importantíssimo, haja vista, que atuando em harmonia, os Estados evitam conflitos e buscam soluções compartilhadas para os problemas comuns. 

5. RESUMO DA PALESTRA

O Filósofo Giorgio Agamben durante sua palestra pública realizada no dia 16.11.2013 em Atenas tece duras críticas ao modelo de democracia e política hoje existente. É possível, concluir que segundo a visão de Giorgio, a atual conjuntura está proporcionando o fim da democracia. 

    Segundo o autor, desde 2001, o conceito de segurança vem substituindo a noção de política. Com isso, algumas condutas anti-democráticas do Estado acabam sendo legitimadas pela justificativa de segurança nacional. Esta postura é cada vez mais visível em nossa sociedade, bastando citar o comportamento dos Estados Unidos da América que alegando “segurança nacional” invadiu um País Soberano, o Iraque, destituiu seu governo e assumiu o controle daquele País sob a alegação de que o Iraque possuía armas de destruição em massa.

Giorgio ainda aborda no texto a ideia de Crise. Para ele, o Governo - aqui entendido como grupo político no poder - sem nenhum estado de emergência, toma diversas medidas que afetam diretamente a população, tudo isso com o embasamento de estar agindo para conter uma “crise”, só existente na visão aqueles que ocupam o poder. Para exemplificar, o Filósofo cita a Itália e a Grécia, pois para ele, os governos desses países realizam uma série de pequenos golpes de Estado. 

Criticando a invasão do Estado na vida privada das pessoas, Giorgio pontua que existem sistemas de segurança que foram criados para reconhecer delinquentes, cita inclusive as tecnologias biométricas e comenta que esses sistemas acabaram sendo impostas a toda a população, sendo utilizados de forma indistinta, proporcionando na visão do Filósofo a perda do direito de privacidade da população. Com essa crítica, Agamben faz alguns questionamentos: a sociedade em que vivemos ainda é democrática? Esta sociedade pode ser considerada política? O próprio autor responde afirmando que “este fator politico fundamental entrou num processo irrevogável que podemos apenas definir enquanto um processo de despolitização crescente. O que era no início um modo de vida, uma condição ativa essencial e irredutível, tornou-se agora um estatuto jurídico exclusivamente passivo, no qual a ação e a inação, o privado e o publico, são progressivamente obscurecidos e se tornam indistinguíveis.” 

Para finalizar, Giorgio Agamben defende que o Poder Constituinte Derivado já não é suficiente para organizar o sistema legal, sendo necessário a presença do Poder Destituinte para depor de uma vez por todas as leis, não para reformar mas sim refazer todo o sistema jurídico.

6. PALESTRA DE GIORGIO E OS PRINCÍPIOS DO DIREITO INTERNACIONAL

É visível que o Filósofo Giorgio faz uso dos princípios do Direito Internacional em seu posicionamento. De forma bem clara, destacamos a presença de fortes críticas aos Países que utilizam a justificativa de agir sob a égide da “segurança nacional” para atacar princípios importantes, a exemplo, a não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados. Entendo que neste ponto, Giorgio mesmo que implicitamente faz menção ao ataque terrorista ocorrido nos Estados Unidos, utilizado como “pretexto” para a invasão Norte Americana no Iraque, demonstrando um claro desrespeito ao Princípio da Não Intervenção. 

Pontua o autor, “…gostaria de começar com um conceito que, desde setembro de 2001, parece ter substituído qualquer outra noção política: segurança. Como sabem, a fórmula “por razões de segurança” opera hoje em todos os domínios, da vida quotidiana aos conflitos internacionais, enquanto palavra-chave de imposição de medidas que as pessoas não teriam motivos para aceitar.”. Há também a presença de ataque ao princípio da autonomia, já que, a invasão de outro Estado impede que o conflitante busque de forma autônoma a solução pacífica dos seus conflitos internos. 

Percebe-se também que a política da segurança adotada por muitos países, utilizada como pressuposto de governabilidade ataco o princípio de respeito aos Direitos Humanos. Nesse cenário, sobreleva-se a relativização dos direitos humanos pela política norte-americana no pós-11 de setembro. A suspensão da ordem vigente tornada possível pela luta contra o Terror escancara o vazio instaurado pela exceção, na suspensão dos direitos humanos.

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7. CRÍTICA DO RESENHISTA

Ficou percebido que para Agamben o poder exercido sem peias é ditatorial, não importando se a técnica formal que o empossou é perfeita. Para ele a democracia para ser exercida legitimamente, exige agentes capazes e em condições simétricas, onde a assimetria de informações de um lado existe, e sem ela a legitimidade da decisão fica inquinada.

O autor em certa ordem deixa evidenciada uma contradição, vez que acusa o poder estatal de promover a anarquia, mas, ao mesmo tempo, propõe a implementação de um poder que chama de destituinte, destinado, segundo o próprio filósofo, a extinguir não apenas o estado, mas também a lei: "Enquanto um poder constituinte destrói a lei apenas para a recrear [sic] sob uma nova forma, o poder destituinte, na medida em que depõe de uma vez por todas a lei, pode realmente abrir uma nova época histórica." 

Numa hermenêutica restritiva isto para muitos não seria apenas pregar a anarquia, mas propor a construção do caos. A derrogação do instituto legal significaria o aniquilamento do Estado Democrático de Direito, e sua substituição pelo Império da Força. Para eles, uma vez abolida a Lei e o Estado Constitucional, prevalecerá apenas à vontade dos mais fortes, ou seja: os interesses do grande capital.

Portanto, apesar de Agamben ser apupado como filosofo do pensamento de esquerda, a veiculação desta teoria do poder destituinte serviria aos interesses avessos ao progresso social. Sugerir o fim da democracia seria a antítese do discurso verdadeiramente progressista. Seria a apologia do caos.

Agamben com excelência desenvolve com clareza e inteligência um tema árduo, também porque, nos afeta diretamente e expõe de maneira insofismável nossas fraquezas e limitações como cidadãos do Século XXI.

A percepção popular é clara nisto, quando vemos que para muitos o congresso eleito democraticamente só defende o corporativismo e temas de interesses pessoais de parlamentares, mas que este desvio se dá na implantação do fascismo de fato, via um Estado Policialesco e amparado em privilégios e exceções acobertados por uma declaração ditatorial de segurança e defesa nacional, porém, não são todos que percebem.

8. INDICAÇÃO DO RESENHISTA

A palestra pretende-se oferecer aos Professores e Estudantes de Direito, material de estudo como apoio à disciplina de Direito Internacional.

9. REFERÊNCIAS:

AGAMBEN, Giorgio. Por uma teoria do Poder Destituinte. Disponível em: http://www.jurisciencia.com/artigos/por-uma-teoria-do-poder-destituinte-de-giorgio- agamben/2325/. Acesso em setembro de 2015.

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Sobre o autor
Afonso Mendes Santos

Advogado, Bacharel em Direito pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB); Consultor Legislativo com extensão em Processo Legislativo Municipal, Lei Orgânica Municipal e Orçamento Público Avançado pelo Instituto Brasileiro Legislativo (ILB).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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