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A defesa do consumidor no Estado Democrático de Direito

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13/09/2015 às 23:44
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2 - Princípios gerais da ordem econômica

A Carta Constitucional de 1988 fixa o rumo que deve ser seguido no tocante ao desenvolvimento da economia nacional.

O tema entrou tardiamente[59] no debate brasileiro com a Carta Constitucional de 1934, que previa como objetivo a organização de um Estado democrático que assegurasse liberdade, justiça, bem-estar social e econômico.

Levando em conta que a Constituição de 1934 teve uma duração efêmera, em virtude da decretação da Carta de 1937, que implantava o famigerado Estado Novo, o tema foi tratado de forma diversa, que rendeu ao Estado a responsabilidade única de interferir constantemente na economia. É o que diz o brasilianista Thomas Skidmore: “os objetivos de bem-estar social e nacionalismo econômico, muito debatidos, no come;co histórico daquela década (1930), iriam ser agora perseguidos sob tutela autoritária.”[60]

O fim do Estado Novo traz consigo o manto do desenvolvimento. A restauração da democracia cria a possibilidade de retomar a temática com possibilidade da valorização do trabalho humano (vide art. 145 da Constituição de 1946).

Promulga-se em 1967 uma nova ordem constitucional. Carla Marshal afirma que “em termos econômicos, houve uma certa repetição do modelo anterior, trazendo apenas a novidade de destacar a reforma agrária, que, na verdade, não correspondeu ao destaque que lhe foi atribuído. Limitou a produção de bens supérfluos, como se estivéssemos em estado de guerra.”[61]

É em 1988 que o assunto ganha uma dinâmica adequada. A Constituição Federal, com forte inclinação social, fixou normas e limites à ordem econômica, com objetivo maior de salvaguardar o Homem, na sua plenitude de existência digna, através da primazia do trabalho e da livre iniciativa, levando em conta os ditames da justiça social, conforme alguns princípios, dentre os quais a defesa do consumidor.

A importância de uma tutela específica para os consumidores exigiu do legislador uma postura de vanguarda, que estivesse adequada à nova ordem constitucional vigente.

A importância de se organizar um modelo econômico diz respeito à própria estruturação da democracia. Nesse diapasão, Manoel Gonçalves Ferreira Filho diz que, “para o estabelecimento da democracia política urge, portanto, que se organize um regime econômico onde se satisfaçam todas as exigências fundamentais do indivíduo, onde se abram para todos oportunidades relativamente iguais.”[62]

E é pautado nessas premissas que o legislador estabeleceu uma ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo como objetivo assegurar a todos existência digna – em conformidade com os ditames da justiça social.

Neste sentido dizem Celso Antônio Pacheco Fiorillo e Thais Leonel que “o modelo intervencionista do Estado, portanto, busca o efetivo cumprimento de uma economia fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, que assegure a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil uma existência digna, o que não constitui mero enunciado descritivo e sim uma norma condicionadora que estabelece os alicerces, os fundamentos da ordem econômica brasileira”.[63]

Hoje a estrutura econômica está totalmente atrelada aos preceitos fundamentais do Estado Democrático, havendo um limite para que essa economia se desenvolva. O limite, por óbvio, está contido no artigo 1.º, III, da CF/88: a dignidade da pessoa humana.

O reconhecimento da importância da tutela do consumidor resulta, em 1990, a edição da Lei n.º 8.078, que gera uma nova forma de interpretar a própria economia até então organizada.


Notas

[1] Neste sentido, Carlos A. Sabino, na obra Introdición a La metodologia de La investigación, p. 67 diz que “a ideia diretriz tem por finalidade dar a investigação um sistema coerente de conceitos e propósitos que faz seus o investigador, e que permitem abordar o problema de uma determinada maneira entre várias possíveis”. (tradução livre do autor)

[2] p. 01.

[3]  Jorge Miranda, em sua festejada obra Manual de direito constitucional, diz que “a ação imediata dos princípios consiste, em primeiro lugar, em funcionarem como critério de interpretação e de integração, pois são eles que dão coerência geral ao sistema”,  tomo II, p. 199.

[4] Curso de direito positivo, p. 123.

[5] O direito posto e o direito pressuposto, p. 22.

[6] O positivismo jurídico, p. 29

[7] Ibid., p. 28

[8] O direito de antena em face do direito ambiental no Brasil, p.17

[9] Ibid.

[10] Teoria do Estado, p. 190

[11] Apud Pablo Lucas Verdú, A luta pelo estado de direito, p. 13.

[12] Curso de direito constitucional, p. 101

[13] Manoel Gonçalves Filho explana sobre a democracia de índole liberal e a democracia de índole marxixta, afirmando que entre uma e outra cria-se o modelo da democracia brasileira, p. 101 e seguintes.

[14] Celso Antonio Pacheco Fiorillo, Princípios do direito processual ambiental, p. 4.

[15] O direito de antena em face do direito ambiental brasileiro, p. 36

[16] Pimenta Bueno, apud Luiz Pinto Ferreira, Curso de direito constitucional, p. 166.

[17] Curso de direito constitucional, p. 173

[18] Flavia Lages de Castro quando trata da entrada do sistema eleitoral no Brasil, diz que “as eleições, de qualquer nível, era, feitas de maneira a facilitar a fraude. O candidato não precisava estar cadastrado, não precisava pertencer a nenhum partido, as cédulas eleitorais não eram oficiais (muitas vezes eram utilizadas as cédulas dadas pelos cabos eleitorais ou recortadas de jornais) e, principalmente, o voto não era secreto., História do direito – geral e Brasil, p. 424.

[19] Kildare Gonçalves Carvalho, em obra de fôlego intitulada Direito Constitucional, descreve que “os precursores dos partidos políticos no mundo moderno foram os tories (conservadores) e os whigs (liberais), na Inglaterra, entre os séculos XVII e XIX.”, sendo que os conservadores defendiam a aristocracia e a tradição e os liberais perseguiam uma monarquia constitucional. p. 841.

[20] Curso de direito constitucional, p. 106

[21] Direito constitucional e teoria da constituição, p. 94

[22] Goffredo Telles Junior, Iniciação na ciência do direito, p. 223.

[23] Ibid.

[24] Introdução ao pensamento jurídico e à teoria geral do direito privado, p. 171

[25] Iniciação na ciência do direito, p. 225.

[26] Compêndio de introdução à ciência do direito, p. 255.

[27] Introdução ao estudo do direito, p. 105.

[28] Formações sociais e interesses coletivos diante da justiça civil, 5-7.

[29] Curso de Direito Ambiental Brasileiro, p. 3

[30] Ação civil pública e termo de ajustamento de conduta, p. 35.

[31] Hugro Nigro Mazzilli, acerca da questão terminológica, se transindividuais, ou metaindividuais, diz que “embora, em rigor de formação gramatical, seja preferível utilizarmo-nos da primeira expressão, porque é neologismo formado com prefixo e radical latinos (a valer-nos da segunda, que soma de prefixo grego a radical latino), a verdade é que a doutrina e jurisprudência têm usado indistintamente ambas as expressões para referir-se a interesses de grupos, ou a interesses coletivos, em sentido lato”, A Defesa dos interesses difusos          em juízo, p. 46.

[32] Exponenciada por José Carlos Barbosa Moreira, Nelson Nery Junior, Ada Pelegrini Grinover, dentre outros.

[33] O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em seu art. 48 diz que “O Congresso Nacional, dentro de 120 dias (cento e vinte dias) da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor”.

[34] Paulo Sergio Feuz, Direito do consumidor nos contratos de turismo, p. 23

[35] Manual de introdução ao estudo do direito,  7ª edição, p. 181, São Paulo, Editora Saraiva, 2007

[36] Ibid, p.182.

[37] Curso de direito administrativo, 4ª edição, p. 545, São Paulo, Editora Malheiros, 1994.

[38] Direito constitucional – teoria do estado e da constituição – direito constitucional positivo, 14ª edição, p. 651.

[39] Vide Bruno Yepes Pereira, Soberania interna e a integração no cone sul, São Paulo, Cultural Paulista, 2002,        p. 21.

[40] Bruno Yepes Pereira, Soberania interna e a integração no cone sul, São Paulo, Cultural Paulista, 2002, p. 21.

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[41] Princípios do processo constitucional, p. 7.

[42] Ibid p. 8.

[43] Curso de direito constitucional positivo, p. 104

[44] Celso Antonio Pacheco Fiorillo, em visão contemporânea e lúcida dos fundamentos do sistema positivo, aponta que a pessoa humana é a verdadeira razão de ser de todo este sistema. Vide Princípios do processo constitucional, p. 13.

[45] Neste sentido, Thais Leonel, Fundamentos constitucionais do processo ambiental – a ação popular na defesa do meio ambiente, in Revista Brasileira de Direito Ambiental, p. 245-258, que discorre sobre a desnecessidade de prova de cidadania (juntada de titulo de eleitor) em Ações Populares Ambientais.  

[46] Constituição da república portuguesa anotada, apud Celso Antonio Pacheco Fiorillo, Princípios do processo constitucional, p.9.

[47] Direito Ambiental Brasileiro, p. 126

[48] Diz Miguel Reale que “O homem não é uma simples entidade psicofísica ou biológica, redutível a um conjunto de fatos explicáveis pela psicologia, pela física, pela anatomia, pela biologia. No homem exixte algo que representa uma possibilidade de inovação e de superamento. A natureza sempre se repete, segundo a Formula de todos conhecida, segundo a qual tudo se transforma e nada se cria. Mas o homem representa algo que é um acréscimo à natureza, a sua capacidade de síntese, tanto no ato instaurador de novos objetos do conhecimento, como no ato constitutivo de novas formas de vida. O que denominamos poder nomotético do espírito consiste em sua faculdade de outorgar sentido aos atos e às coisas, faculdade essa de natureza simbolizante, a começar pela instauração radical da linguagem”, in Filosofia do Direito, p. 211, 20ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2002.

[49] Neste sentido, Lei Fundamental da República Federal da Alemanha, Constituição da República Portuguesa, dentre outras.

[50] O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 45.

[51] A dignidade da pessoa humana como pressuposto para a efetivação da justiça, in Revista dignidade, Programa de pós-graduação em direito Unimes, ano 1, vol. 01, páginas 41-52, São Paulo, Editora Método, 2002

[52] Curso de direito ambiental brasileiro, p.13

[53] Neste sentido diz P. Boissonnade que “o sistema feudal, em última análise, repousava sobre uma organização que, em troca de proteção, freqüentemente ilusória, deixava as casses trabalhadoras à mercê das classes parasitárias, e concedia a terra não a quem a cultivava, mas aos capazes de dela se apoderarem”, apud Leo Hubeman, História da riqueza do homem, p. 24.

[54]  O direito de antena em face do direito ambiental no Brasil, Coleção Clássicos do Direito Ambiental Brasileiro, p. 41.

[55] Ibid, p. 41

[56] A ordem econômica na constituição, p. 220

[57] Ibid., p. 235.

[58] José Afonso da Silva, em seu Curso de direito constitucional positivo, diz que partido político “é uma forma de agremiação de um grupo social que se propõe a organizar , coordenar e instrumentalizar a vontade popular com o fim de assumir o poder para realizar seu programa de governo” , p. 394.

[59] As primeiras Constituições que referenciaram o tema foram a Mexicana (1917) e a Alemã (1919).

[60] Brasil – de Getúlio a Castelo, p. 62

[61] Direito constitucional – aspectos constitucionais do direito econômico, p. 143

[62] Curso de Direito Constitucional, p. 347.

[63] Desenvolvimento sustentável: a ordem econômica do capitalismo e a questão do meio ambiente na Constituição Federal de 1988 – art. 170, VI, in Sustentabilidade e temas fundamentais de direito ambiental, José Roberto Marques (org.), p. 49-70

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Sobre o autor
Paulo Sérgio Feuz

Doutor, Mestre e Especialista em Direito pela PUC-SP. Coordenador e Professor do Curso de Direito das Faculdades Integradas Rio Branco da Fundação de Rotarianos de São Paulo. Professor da Graduação e Pós Graduação da da Faculdade de Direito da PUC-SP. Coordenador do Núcleo de Direito Desportivo da Pós Graduação em Direito da PUC-SP. Advogado em São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FEUZ, Paulo Sérgio. A defesa do consumidor no Estado Democrático de Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4456, 13 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42756. Acesso em: 18 nov. 2024.

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