A responsabilidade extracontratual do Estado e suas teorias

23/09/2015 às 16:54
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Este artigo tem como objetivo explanar acerca da responsabilidade extracontratual do Estado, tal como apresentar suas três correntes. Para tanto, haverá embasamento em leis, doutrinas e jurisprudências brasileiras.

Resumo

Este artigo tem como objetivo explanar acerca da responsabilidade extracontratual do Estado, tal como apresentar suas três correntes. Para tanto, haverá embasamento em leis, doutrinas e jurisprudências brasileiras.

Palavras Chave: Responsabilidade Extracontratual do Estado; Teoria do Risco Administrativo; Teoria da Culpa Administrativa; Teoria do Risco Integral; Direito Administrativo; Responsabilidade Civil;

Abstract

This article aims to explain about the non-contractual liability of the state, such as presenting its three chains. For this, there will be grounding in laws, doctrines and jurisprudence Brazilian..

Keywords: Non-contractual responsibility of the State; Theory of Administrative risk; Administrative theory of guilt; Integral Risk theory; Administrative law; Civil responsibility;

  1. A Responsabilidade Extracontratual do Estado

A responsabilidade extracontratual do Estado (também chamada de responsabilidade civil da administração) trata do dever do Poder Público em reparar danos causados à terceiros, através de seus agentes públicos. O dano deve ser realizado através de um comportamento unilateral, lícito ou ilícito, comissivo ou omissivo, material ou jurídico e se exaure com o pagamento da indenização.

Tal noção – que obteve grande desenvolvimento teórico através do Direito francês e da construção pretoriana do Conselho do Estado - é fundamental hoje no Direito Público de todos os povos, sendo adotada por todas as legislações mundiais. Os dois últimos países a adotarem tal princípio foram Estados Unidos (1946) e Inglaterra (1947).

Três teses para resolução de casos envolvendo a responsabilidade extracontratual do Estado foram desenvolvidas, sendo a teoria da culpa administrativa, teoria do risco administrativo e a teoria do risco integral, que passaremos a tratar a partir de agora.

  1. Teoria da Culpa Administrativa

Trata-se de responsabilidade subjetiva do Estado, em que os danos são causados por uma ausência de serviço deste. Para tanto, é necessária a comprovação de dolo ou culpa do Estado pela vítima. Conforme explana Celso Antônio Bandeira de Mello:

“ Há responsabilidade subjetiva quando para caracterizá-la é necessário que a conduta geradora de dano revele deliberação na prática do comportamento proibido ou desatendimento indesejado dos padrões de empenho, atenção ou habilidade normais (culpa) legalmente exigíveis, de tal sorte que o direito em uma ou outra hipótese resulta transgredido. Por isso é sempre responsabilidade por comportamento ilícito quanto o Estado, devendo atuar, e de acordo com certos padrões não atua ou atua insuficientemente para deter o evento lesivo”

(Curso de Direito Administrativo, MELLO, Celso Antônio Bandeira de, São Paulo: 2005, Malheiros Editores)

Como exemplo, apresentarei um dano causado à carro de terceiro, após a queda de uma árvore. Tendo em vista que o município possui o dever de conservação das árvores localizadas em via pública, o que não ocorreu neste caso, foi concedido à vítima o direito de ser indenizada:

“EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO - AGRAVO LEGAL EM REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL - ART. 557, § 2º, CPC - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO - TEORIA SUBJETIVA (CULPA ADMINISTRATIVA OU CULPA ANÔNIMA) - QUEDA DE ÁRVORE EM AUTOMÓVEL ESTACIONADO EM VIA PÚBLICA - COMPETÊNCIA DO ENTE MUNICIPAL DE FISCALIZAR E CONSERVAR A VEGETAÇÃO LOCALIZADA EM ESPAÇO PÚBLICO - AUSÊNCIA DE PROVA POR PARTE DO MUNICÍPIO DE QUE AGIU DE FORMA DILIGENTE A FIM DE EVITAR O DANO OU DA EXISTÊNCIA DE ALGUMA DAS CAUSAS DE ROMPIMENTO DO NEXO DE CAUSALIDADE (CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA, FATO DE TERCEIRO, CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR) - DEVER DO MUNICÍPIO DE INDENIZAR -AGRAVO NÃO PROVIDO - DECISÃO UNÂNIME.”

(TJ-PE - AGV: 2648957 PE , Relator: Jorge Américo Pereira de Lira, Data de Julgamento: 14/05/2013, 1ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 27/05/2013)

  1. Teoria do Risco Administrativo

Segundo a Teoria do Risco Administrativo, há o dever de indenizar terceiro quando há simplesmente a relação causal entre a ação realizada pelo Estado e o dano causado à vítima. Não é necessário que esta comprove se houve culpa ou dolo por parte da Administração ou de seus agentes.

O nome é autoexplicativo: Esta teoria é baseada no risco que o Estado toma para si ao prestar determinados serviços, devendo indenizar em caso de danos causados à terceiros. O risco e a solidariedade social são pilares e conduzem à justiça distributiva, razão pela qual o direito brasileiro a adotou em seu artigo 37, §6º, da Constituição Federal de 1988:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

A vítima fica dispensada de comprovação de dolo ou culpa, todavia, o Estado poderá diminuir o valor indenizatório, ou até mesmo eliminar este direito se comprovar força maior, atos de terceiros e culpa da vítima (sendo, portanto, excludentes de responsabilidade).

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O Estado, após condenação, poderá realizar ação de regresso contra o agente que causou o dano. Neste caso, terá de comprovar dolo ou culpa deste.

Como exemplo, trago o caso de um dano permanente causado à terceiro, após tratamento médico inadequado realizado em hospital público. Foi concedida a indenização após comprovação de todos os pressupostos, conforme abaixo:

“RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER PÚBLICO – ELEMENTOS ESTRUTURAIS – PRESSUPOSTOS LEGITIMADORES DA INCIDÊNCIA DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO – FATO DANOSO (INCAPACIDADE PERMANENTE) RESULTANTE DE TRATAMENTO MÉDICO INADEQUADO EM HOSPITAL PÚBLICO (OU MANTIDO PELO PODER PÚBLICO) DANOS MORAIS – RESSARCIBILIDADE – DOUTRINA – JURISPRUDÊNCIA – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO . Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o “eventus damni” e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público que tenha, nessa específica condição, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. Precedentes. A ação ou a omissão do Poder Público, quando lesiva aos direitos de qualquer pessoa, induz à responsabilidade civil objetiva do Estado, desde que presentes os pressupostos primários que lhe determinam a obrigação de indenizar os prejuízos que os seus agentes, nessa condição, hajam causado a terceiros. Doutrina. Precedentes . - Configuração de todos os pressupostos primários determinadores do reconhecimento da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, o que faz emergir o dever de indenização pelo dano moral e/ou patrimonial sofrido.”

(STF, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 02/12/2014, Segunda Turma)

Um fato interessante é que em casos de mortes de detentos, várias decisões tem sido no sentido de que, apesar de ocorrer a omissão do Estado, por ter uma missão de zelar pela integridade do preso, a aplicabilidade será de responsabilidade objetiva ao invés de subjetiva:

“APELAÇÃO CÍVEL, COM REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - MORTE DE DETENTO PROVOCADA POR OUTROS DETENTOS EM UNIDADE PRISIONAL - AGRAVO RETIDO CONHECIDO E DESPROVIDO - INÉPCIA DA INICIAL - INOCORRÊNCIA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO - OMISSÃO ESPECÍFICA - FALHA NO DEVER DE GUARDA E PROTEÇÃO DOS CUSTODIADOS - GARANTIA DE HIGIDEZ FÍSICA E MORAL PREVISTA NO ART. 5º, INCISO XLIV, E ART. 40 DA LEP (LEI DE EXECUÇÃO PENAL) - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO RECONHECIDA - IRRELEVÂNCIA DO FATO DE TERCEIRO - NEXO CAUSAL EVIDENCIADO - DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO - DANO MATERIAL - PENSIONAMENTO - CAPACIDADE ECONÔMICA PRESUMIDA - FAMÍLIA DE BAIXA RENDA - PRECEDENTES - VALOR DEVIDO NA PROPORÇÃO DE 2/3 DO SALÁRIO MÍNIMO, FRACIONADOS EM IGUAL PARTE PARA CADA AUTOR, DESDE O EVENTO DANOSO (MORTE) - DANO MORAL PRESUMIDO - PERDA PREMATURA DO PAI - QUANTUM ARBITRADO EM ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA, DE OFÍCIO, NO TOCANTE AOS JUROS DE MORA E À CORREÇÃO MONETÁRIA (TERMO INICIAL, TAXA E ÍNDICE), INCIDENTES SOBRE OS DANOS MORAIS E MATERIAIS - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - POSSIBILIDADE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS REDUZIDOS EM APRECIAÇÃO EQUITATIVA E EM OBSERVÂNCIA AOS PARÂMETROS DO ART. 20, §§3º E 4º, DO CPC - REEXAME NECESSÁRIO - RESSALVA SOBRE A CONCESSÃO DO PERÍODO DE GRAÇA CONSTITUCIONAL E DISTRIBUIÇÃO DO PENSIONAMENTO - APELO PARCIALMENTE PROVIDO.”

(TJPR - 1ª C.Cível - ACR - 1196080-2 - Paranavaí -  Rel.: Renato Braga Bettega - Unânime -  - J. 27.01.2015)  

  1. Teoria do Risco Integral

Por fim, segundo a Teoria do Risco Integral, o Estado fica obrigado a reparar todo dano causado à terceiro, mesmo que com dolo ou culpa da vítima comprovada. Por ser extremista, é pouco utilizada no Brasil, conforme nos explica Hely Lopes Meirelles:

“A teoria do risco integral é a modalidade extremada da doutrina do risco administrativo, abandonada na prática, por conduzir ao abuso e à iniquidade social. Por essa fórmula radical, a Administração ficaria obrigada à indenizar todo e qualquer dano suportado por terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo da vítima”

(Direito Administrativo Brasileiro, MEIRELLES, Hely Lopes, São Paulo: 2011 – Malheiros Editores)

 No Direito Ambiental, é utilizado com mais frequência, com jurisprudência consolidada junto ao Superior Tribunal de Justiça. Todavia, no âmbito administrativo (que é o foco deste artigo), a teoria do risco integral somente se aplica em casos de acidentes nucleares, indo de encontro ao artigo 21, XXIII, d, da Constituição Federal:

“Art. 21. Compete à União:

(...)

XXIII - explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições:

(...)

d) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa;”

  1. Conclusão

A responsabilidade extracontratual do Estado é utilizada no Brasil com base na teoria do risco administrativo, que consta de forma expressa em nossa Constituição Federal, conforme art. 37, §6º. Em caso de danos à terceiros, estes podem solicitar indenização, mas o Estado, caso comprove que o dano ocorreu por força maior, atos de terceiros ou culpa da vítima, podem se eximir da indenização ou diminuir seu valor.

Referências

BELTRANO, S. Título do livro. Curitiba: Editora, 2007.

MELLO, Celso A. B. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2005.

MEIRELLES, Hely L. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2011.

BARRETO, Caroline M. O STJ e a teoria do risco integral na responsabilidade civil por dano ambiental. In: Conteúdo Jurídico, 2014. (http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-stj-e-a-teoria-do-risco-integral-na-responsabilidade-civil-por-dano-ambiental,51705.html)

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Sobre a autora
Brenda Liz de Melo Follador

Acadêmica de Direito; Universidade Positivo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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