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O IPTU, a locação de imóveis e a integração legislativa entre as obrigações tributárias públicas e privadas

Leia nesta página:

1 – Introdução.

Em certos casos a relação jurídica tributária oriunda da propriedade predial territorial urbana (IPTU) tem efeitos característicos quando este bem é objeto de locação, originando complexas conjunções de interesses que envolvem tanto o direito público como o privado. Pretendemos discernir quais relações são especialmente afetadas e quais não o são, estabelecendo critérios. Através de uma teorização voltada para a prática, visitaremos o direito processual, tendo em vista o caráter complementar e indissociável que estabelece com o direito material.

Através do presente, também tentaremos demonstrar que o direito público e o privado excepcionalmente estabelecem relações entre si com reflexos jurídicos interdisciplinares que não se resumem ao mero empréstimo técnico de terminologias, mas a uma legitima flexibilização da dicotomia existente entre estas duas áreas do direito.


2 – A Obrigação Tributária, a Lei do Inquilinato e a Obrigação Privada de Pagamento Tributário.

A Lei do Inquilinato rege relações civis, e, na teoria, não tem condão de alterar as relações públicas que existem entre a Fazenda Pública e o sujeito passivo da relação tributária. Por outro lado, a legislação tributária pretende regulamentar a condição jurídica obrigacional que envolve o Estado e entes privados vinculados de forma especial ao seu poder, em uma esfera de poder totalmente diversa da nascida através das relações privadas. Desta maneira, de um lado vislumbramos a obrigação pública de pagamento tributário, que, no IPTU, tem o seu fato gerador na propriedade, e cujo pólo passivo é instituído por lei, e, do outro, a obrigação privada de pagamento de tributos, de formação contratual, que não se confunde com a primeira, apesar da sua existência depender da materialidade do próprio tributo.

No entanto, na realidade verificamos que estas relações se afetam através de um complexo sistema de causas e conseqüências não jurídicas, que em tese é (ou deveria ser) considerado em termos de política legislativa, gerando maior integração entre os campos do direito e extinguindo antigas classificações. Cegar o direito a visão das conseqüências práticas é provavelmente anular na prática os objetivos sociais estabelecidos pelo legislador, que, em um campo incoerente de regras públicas e privadas, acaba gerando caos e desordem, além de favorecer ilegalidades, distorcendo o funcionamento eficiente do sistema, desestimulando a economia e opondo novos inimigos sociais.

É necessária a ação recíproca das diferentes legislações para a perseguição mais eficiente dos seus fins, considerando, acima de tudo, os casos específicos, as conseqüências prováveis, os instrumentos disponíveis e reformas legislativas que aglomerem tantos campos do direito (e entidades da federação) quanto necessários para se afastar males sociais, assim considerados pelo legislador. Uma aplicação prática deste teorema ocorreria na alteração das formas das relações civis visando coibir delitos penalmente relevantes, como a sonegação fiscal. Outro exemplo hipotético seria a instituição de normas que possibilitassem rondas especiais de fiscais simulando relações comerciais para a detecção de sonegadores, criando legislação especial administrativa que possibilitasse a imposição de multas, nestes casos, ou até mesmo tipificando o ato como crime de mera conduta, a imagem do art. 2º da Lei 8137/90, com a circunstância especial da simulação incluída no tipo, evitando a desclassificação da conduta como crime impossível, já que aqueles pressupõem o pagamento do tributo, o que não pode acontecer em relações fictícias. Em outro caso, seria exigir que as transações econômicas realizadas por empresas com uma certa quantidade de funcionários fossem remetidas instantaneamente a um centro de informações do Ministério da Fazenda, através de sistema de controle eletrônico similar ao dos cheques eletrônicos.

Ao longo do presente, demonstraremos algumas poucas medidas já tomadas no caso do IPTU, assim como algumas propostas possíveis.


3 – A Obrigação Privada e a Obrigação Pública

I) Breve Análise da Obrigação Privada na Lei no Inquilinato

Pela Lei do Inquilinato, a responsabilidade privada originária de pagamento dos tributos é do locatário, em função do art. 22, VIII, no entanto, a disposição não é cogente, pois este mesmo inciso disciplina que "a responsabilidade pelo pagamento de todos os encargos referidos no inciso VIII pode ser repassada ao locatário, por expressa disposição contratual" (1). Desta maneira, percebemos que a obrigação privada de pagamento tributário depende de regras contratuais.

Mesmo assim, o locador não se exime totalmente da responsabilidade, porque se este "não cobra ´oportuno tempore´ do inquilino o valor correspondente ao IPTU previsto em contrato, nem se preocupa de cuidar de serem os carnês respectivos entregues no endereço do imóvel locado, não pode cobrar daquele os encargos impostos pela Municipalidade, em face do pagamento com atraso" (2).

  1. Lei de Execuções Fiscais e Sujeito Passivo Tributário

Muito embora o locatário possa ser responsabilizado pela obrigação tributária através de disposição contratual, a legislação tributária não reconhece a esta obrigação privada relevância jurídica para fins de direito público, e, mesmo nos casos em que a locação afeta a responsabilidade passiva, esta não se forma em função das disposições escolhidas pelas partes envolvidas na locação, mas pela existência do contrato, seja qual for, que os aproxima pelo interesse econômico.

E, para fins fiscais, a atribuição da sujeição passiva depende dos arts. 34 e 121 do C.T.N., assim como da legislação municipal, que, na maioria dos municípios, não responsabiliza o locatário, o que resulta na jurisprudência dominante, que não reconhece ao locatário a passividade na relação tributária.

Também cabe explicar que, neste capítulo, relegaremos o direito processual ao segundo plano, tendo em vista que embates processuais não dirimem os aspectos concernentes a responsabilidade tributária, justamente porque o art. 4º da Lei de Execuções Fiscais (6.830/80), apresenta rol que, apesar de ser taxativo, é bastante amplo, trazendo a lume sujeitos cujas definições são esclarecidas apenas pelo direito material.

III) A figura do Contribuinte e do Responsável Fiscal

Dividimos os seguintes tópicos segundo a orientação do art. 121 do C.T.N., que descreve dois tipos de sujeitos passivos tributários: o contribuinte e o responsável, que também podem ser chamados de sujeito passivo direto e indireto, respectivamente.

a) O Contribuinte Tributário

A disposição do art. 34 do C.T.N., que regula mais especificamente o IPTU, em enunciado que é geralmente repetido pelas legislações complementares municipais, apresenta locução que poderia induzir confusão ao fazer crer que o locatário assume a condição de contribuinte por se tratar de um "possuidor a qualquer título", em razão da posse direta que tem sobre o terreno. Porém, parece claro no artigo mencionado que este só deve ser posto em relevo se não o for o proprietário ou o titular do imóvel, na respectiva ordem de chamada alternativa. Portanto se o proprietário ou o titular é tido como contribuinte legítimo, por exercer o seu direito regular de propriedade, não se deve invocar o possuidor:

"TRIBUTÁRIO. IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO. CONTRIBUINTE. LOCATÁRIO. Há um só contribuinte do imposto predial e territorial urbano, que pode ser o proprietário do imóvel, o titular do domínio útil ou o possuidor, nesta ordem; embora possuidor, o locatário é estranho à relação jurídico-tributária, se o Município identificou o proprietário como contribuinte do imposto, e não tem, por isso, legitimidade para litigar a respeito. Recurso especial não conhecido (STJ, RESP 172522 / SP ; RECURSO ESPECIAL 1998/0030625-0, Min. Ari Pargendler, DJ Data: 04/09/2000)".

Este é o caso da locação, tendo em vista que este negócio jurídico é apenas como o proprietário exerce o seu direito de fruição, ou seja, é um dos seus usos econômicos possíveis, que não se confunde com a obrigação de contribuição para com o Estado. Assim, para efeitos fiscais, o contribuinte é sempre o titular do imóvel. Aliás, atribuir ao locatário obrigação de pagamento tributário na situação de contribuinte vai contra o próprio conceito de IPTU, sendo talvez até inconstitucional, já que este é o imposto sobre a propriedade do bem, e não sobre o seu fim econômico-social, sendo legítimo o enquadramento do proprietário como contribuinte, mas nunca do seu titular econômico derivado, mesmo porque a locação em si já é tributada pelo Imposto de Renda, sobre alíquota especialmente designada para este fim.

De encontro com os princípios do direito público, a legislação privada também adota disposição parecida quando estabelece como regra a responsabilização civil do locador, através da a Lei do Inquilinato, tornando a exceção contratual, muito embora a regra na prática seja outra. Neste contrato, o pagamento dos impostos se resume a uma obrigação de pagamento privado, que é somado ao quantitativo monetário estabelecido a título de aluguel, cuja diferença, em termos formais, se resume à forma como o locatário deve realizar a despesa, que deve ser entregue ao Estado, e, em termos materiais, a modificação do valor a ser pago, que pode ser em função da valorização do terreno ou de novo percentual da alíquota, enquanto o aluguel em si é geralmente corrigido monetariamente.

Como uma disposição contratual privada, o contrato de locação não pode ser oposto a terceiros sem condições específicas, tão pouco contra relações de caráter público, que se efetuam entre o proprietário do imóvel e a Fazenda, que é estranha a relação civil locatícia, tendo em vista que os vínculos que a unem ao proprietário são exclusivamente tributários. Destarte, contratos civis não têm influência determinante sobre áreas do direito que pretendem regular relações regidas por princípios completamente diversos, quer dizer, entre sujeitos sem paridade formal, sem que o próprio direito público reconhecesse o contrato como fato relevante para fins tributários.

b) O Responsável Tributário

Os "responsáveis tributários, em sentido estrito, são todos aqueles quem por disposição legal, são acrescidos à relação fisco-contribuinte, em caráter solidário" (3). Assim, o responsável tributário nada mais é que "a pessoa vinculada ao fato gerador, obrigada a pagar o tributo se não for adimplido pelo contribuinte ou pelo substituto legal tributário" (4).

Tendo em mãos o art. 121, II, do C.T.N, percebe-se que a disposição legal expressa em lei é a que determina o conceito de responsável tributário. Em se tratando de IPTU, imposto municipal, parece claro que o município pode estabelecer os seus responsáveis tributários, e, dentre estes, o próprio locatário, em função dos interesses conexos em relação ao contribuinte. Essa competência legislativa do município se dá tanto em função do C.T.N., que no art. 121, II, admite complementação legal para fixação dos responsáveis tributários, como em função da Constituição, que, no art. 1º e 18 da C.F., garante ao município o peso de entidade federativa autônoma, permitindo no art. 30, II, da mesma Magna Carta, o poder geral de legislação naquilo que lhe compete, estabelecendo a referida competência municipal de instituição do IPTU no seu art. 156, I, cuja faculdade de legislar matéria complementar tributária é afinal reforçada pelo art. 146, III, da Constituição, como um atributo próprio dos entes federativos.


4 – Aspectos Regionais e Processuais

a) Responsabilidade Tributária por Lei Municipal e Processo de Execução

Na prática, a maioria dos municípios não responsabilizam o locatário. Mesmo assim, nas exceções, o seu chamamento só realiza apenas como um responsável tributário, invocado unicamente quando o locador é inadimplente, conforme disciplina o §3º do art. 4º da Lei de Execuções Fiscais, podendo este responsável nomear bens do proprietário antes de ser diretamente atacado pela coerção estatal.

Quando o único bem que garante a dívida é o terreno objeto do tributo, sobre qualquer hipótese contratual privada, é útil ao locatário, posto ou não na condição de responsável tributário, que pague o valor do tributo no processo judicial se o devedor originário não puder fazê-lo, expressamente ressalvando o seu direito de regresso, instituindo assim direito de crédito contra o devedor-locador, que descumpriu o art. 22, II, da Lei do Inquilinato se a obrigação privada a este era cabida. Desta maneira, quando o locatário pagar o aluguel, pode invocar a compensação de crédito, conforme o art. 368 e seguintes do C.C., pagando apenas o valor deduzido dos impostos, ao mesmo tempo em que mantém o terreno sobre o poder do antigo proprietário, conservando também a sua posse direta. Lembramos o leitor que o que ora expomos será mais bem desenvolvido na conclusão.

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Evidentemente, de nenhuma forma falamos de cessão de débito, que é disciplinada pelo art. 299 do C.C., porque 1) este instituto disciplina relações privadas, 2), e, neste caso, assegura ao locatário direito de regresso, assim como, 3) na cessão, é necessário o consentimento expresso do credor (5), que, no caso, é a Fazenda Pública, que não possuí iniciativa independente, mas decorrente de lei, nos termos do princípio da legalidade pública. E, também, 4) a relação original entre a Fazenda e o proprietário do terreno não se afeta, como deveria ocorrer na cessão, mantendo-se a qualidade do vínculo original com novos sujeitos, que não é o caso, já que se cria um novo, paralelo ao antigo, e independente deste (6).

Apesar de não haver cessão, nada impede que um outro sujeito, diferente do legítimo devedor, salde a dívida perante o Município, pois, este, como credor legal, não pode negar o pagamento por terceiro sobre o pretexto de inexistência de autorização legal, tendo em vista que o princípio da impessoalidade em si já serve como norma autorizadora do ato administrativo que salda o débito, independentemente de outras disposições legais eventuais, conforme definição do principio abaixo exposta:

"O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal .... A finalidade terá sempre um objetivo certo e inafastável de qualquer ato administrativo: o interesse público. Todo ato que se apartar desse objetivo sujeitar-se-á a invalidação por desvio de finalidade... O que o princípio da finalidade veda é a prática de ato administrativo sem interesse público ou conveniência para a Administração, visando unicamente satisfazer interesses privados, por favoritismo ou perseguição dos agentes governamentais" (7)

Desta maneira, sabendo que o ato que denega o pagamento por terceiro (e a conseqüente liquidação da dívida) é ato administrativo, mesmo quando imiscuído entre os rigores processuais, pois não perde a sua qualidade, não pode a Fazenda negar a prestação do imposto realizado por terceiros sem ferir um dos pressupostos do ato administrativo, desviando a sua finalidade, sendo que a presente recusa só seria justa se o deferimento resultasse em violação de direitos legais, o que não ocorre, pelo menos não nos termos gerais expostos. A finalidade mediata do tributo é a composição orçamentária e a possibilidade financeira de realização dos fins do estado, tendo por fim mais imediato o seu pagamento, e nada mais. Desta maneira, não pode a Fazenda Pública negar tal pagamento, impondo critérios formais, justamente porque cumprida a finalidade da norma. Eventuais debates entre os particulares devem ser resolvidos pela tutela civil, estranha a intervenção da Fazenda.

b) Substituição de Penhora e Execução Fiscal

O art. 212, §3º, do C.T.N., especifica a possibilidade do responsável tributário nomear bens de propriedade do devedor-contribuinte, mas o contrário também é possível, pois, se assim consentir o responsável, através do regime da Lei de Execuções Fiscais no art. 9º, IV, pode-se indicar bens de terceiros estranhos a relação fisco/contribuinte, que, repitamos, se expressamente autorizada por este terceiro, serão aceitos pela Fazenda Pública, desde que não constituam prejuízo ao erário público. Neste caso de acordo o locador e o locatário, a penhora poderá recair inclusive sobre um dado faturamento, o que dificultaria a negativa da Fazenda Pública, tendo em vista as prioridades do art.º 11 da Lei de Execuções Fiscais, que arrola o dinheiro como o primeiro item do elenco (8). Evidentemente, têm-se evitado a penhora do faturamento da empresa em razão do art. 620 do C.P.C., que é contra-balançado com o elenco do art. 655 do C.P.C. (para obrigações em geral) e do art. 11 da LEF (para obrigações tributárias), tendo em vista que este direito não pode ser absoluto frente a outros que merecem igual tutela, como os do devedor. No entanto, quando o próprio devedor estipula a penhora sobre o faturamento, a onerosidade excessiva só existiria em função de circunstâncias novas, que, neste caso, atenuariam o "pacta sunt servanda" através do "rebus sic stantibus". A única recusa aceitável por parte da Fazenda Pública seria baseada na menor fungibilidade do bem oferecido em função de faturamentos baixos ou uma possível falência, mas sempre respeitando a impessoalidade:

"O poder de substituição conferido ao devedor é bastante restrito, e só pode ser exercitado de forma a melhorar a liquidez da garantia em prol do exeqüente... "a interpretação do texto legal não há de ser meramente literal, mas terá de levar em conta os princípios basilares que regem a atuação do juiz no comando do processo, e com os quais não podem conviver pretensões caprichosas e despidas de qualquer fundamentação séria. Se própria Lei de Execução Fiscal garante ao devedor o direito de nomeação de bens à penhora, não pode conceder à Fazenda um poder arbitrário capaz de anular o direito do devedor" (9).


5) Conclusão

A tentativa de enquadrar o locatário como responsável tributário (art. 121 do C.T.N.), quando não há legislação específica municipal, assim como contribuinte (conforme interpretação do art. 34 da CTN), não é aceita pelos tribunais, de forma majoritária (10), mas cabe pontuar, como já explicamos, que a lei municipal pode atribuir ao locatário a posição de responsável tributário por disposição expressa em lei.

É importante ressaltar que a relação jurídica tributária possui regras específicas, vinculando ambas as partes ao cumprimento da lei, pois, quem está no pólo ativo tem o seu direito preestabelecido, sendo-lhe vedada a cobrança de valores superiores aos legais, tendo a parte contrária o direito não pagar o excesso, seguindo o princípio da legalidade privada. Desta maneira, se entendermos que o locatário pode contrapor diretamente contra a Fazenda (sem o intermédio do locador) o seu direito de não pagar mais que o devido, ou requerer os benefícios eventualmente concedidos pelo poder público, na teoria, seríamos obrigados a entender que a Fazenda poderia lançar o crédito contra o próprio locatário, tendo em vista que ambos os direitos decorrem da mesma raiz, que é bilateral simples nos casos em que o locatário não é responsável tributário, nos termos da Lei Municipal. Em outras hipóteses, por não constituir parte, a única possibilidade do locatário proteger seus interesses é constituindo-se como assistente litisconsorcial simples, tendo em vista que a influência deste pode ser decisiva, inclusive em matéria de fato, que na execução é reduzida a dois ou três parêntesis. Em se tratando de embargos, o juízo de conhecimento de matéria de fato é de certa forma alargada, ainda mais em se tratando de execução fiscal, que é execução de título sem processo de conhecimento, cujo procedimento é regido tanto pela Lei 6830/80 (Lei de execuções fiscais) como pelo C.P.C., complementarmente, que, através do seu art. 745 (11) habilita nestas execuções certos tipos de defesa típicos do processo de conhecimento, além das regulares, dispostas no art. 741 do mesmo "Codex". Desta forma, nestes casos é ainda mais legítima a intervenção de terceiro como assistente, nos termos do art. 50 do C.P.C (12) (13) . Em qualquer caso, a manifestação é facultativa e não propriamente onerosa, justamente porque o assistente não é parte, "não formula pretensão e tampouco defesa, e a sua presença no processo não faz nascer uma outra lide ... A perspectiva de que o terceiro inexoravelmente sofra efeitos indiretos ... é que dá a medida de seu interesse, legitimando ... seu ingresso ..." (14).

Através deste texto, percebemos que seria útil, em termos de política legislativa, considerar o locatário como responsável tributário, ou, pelo menos, que a legislação pública reconhecesse a responsabilização contratual como um fato tributário relevante. A utilidade desta integração legislativa entre os campos do direito público e o privado é evidente, devendo abranger todos os entes federativos em políticas semelhantes, tendo em vista, neste caso, além de garantir a dívida tributária por melhores meios, quase nenhum prejuízo terá o locatário, salvo pelas desvantagens processuais que enfrentará contra a Fazenda, pois, quando for responsável civil através do contrato de locação, será executado pela Fazenda, ao invés de pelo locatário, e se não for responsabilizado, poderá compensar o seu crédito no pagamento do aluguel, como já explicamos anteriormente. Através deste recurso, se evita o aparato judiciário, ou pelo menos reduzimos a quantidade de processos formados, diminuindo gastos públicos, utilizando-se soluções que podem ser encaminhadas na vida privada, além de aumentarmos a receita pública através de uma forma de cobrança mais eficiente.

Seria melhor que o poder público reconhecesse as curvas estabelecidas pelos privados como condições para medidas diferentes em termos de cobrança, que acabam favorecendo tanto o poder público como o mercado, na sua dinâmica macroeconômica cujos fluxos de capitais não devem em regra se perder em atividades economicamente ineficientes.


NOTAS

  1. Capanema de Souza, Sylvio. A Nova Lei do Inquilinato Comentada. 4ª Edição. Forense, Rio de Janeiro: 1994.
  2. TA-SP, 5ª Camera, Ap. s/ Rev. 709.231-00/3, Rel. Juiz LUÍS DE CARVALHO, j. 28.8.2002.
  3. Zelmo Denari. Sujeito ativo e passivo da relação jurídica tributária, in "Curso de Direito Tributário", Cejup/Centro de Extensão Universitária, apud "Comentários ao Código Tributário Nacional". Org. Ives Grandra Martins. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2002. Pág. 205.
  4. RSTJ 146/124, apud Código de processo civil e legislação processual em vigor, org., seleção e notas de Theotonio Negrão, com a colaboração de José Roberto Ferreira Gouvêa. 35ª Edição, atualizada até 13 de janeiro de 2003. São Paulo: 2003. Pág. 1285.
  5. Sobre a anuência: "Assim como o credor não é obrigado a receber coisa diversa do objeto da obrigação, ainda que mais valiosa, não é o credor obrigado a aceitar outro devedor, ainda que mais abastado". Venosa, Sílvio de Salvo. Direito Civil, vol. II. 2ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2002. Pág, 338.
  6. Sobre a inalterabilidade, ver Venosa. Opus cit. Pág. 339. Também: "Quer dizer que o direito reconhece a substituição tributária do devedor pelos seus sucessores, sem alteração na substância do vínculo obrigacional". Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. II. 15ª Ed. Rio de Janeiro, Forense, 1996. Pág. 269.
  7. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28 ed., São Paulo:Revista dos Tribunais, 1990, p. 89-90.
  8. " ´As turmas que compõem a Segunda Seção deste Tribunal têm admitido a penhora sobre o faturamento da empresa, desde que, cumulativamente: a) o devedor não possua bens ou, se os tiver, sejam esses de difícil execução ou insuficientes a saldar o crédito demandado, b) haja indicação de administrador e esquema de pagamento (CPC, arts. 678 e 719) e c) o percentual fixado sobre o faturamento não torne inviável o exercício da atividade empresarial. A penhora sobre o faturamento de empresa constitui penhora sobre dinheiro e não penhora sobre direito ou ações; em conseqüência, deve prevalecer sobre a penhora de bens móveis´ (STJ –3ª Turma, REsp 418.129-SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 15.5.02, não conheceram, v.u., DJU 24.06.02, p. 302)" In Código de processo civil e legislação processual em vigor. Opus cit. Pág. 716.
  9. Theodoro Júnior, Humberto. Lei de Execução Fiscal, Comentários e Jurisprudência. Editora Saraiva, 4ª Edição, revista. São Paulo: 1.995. Pág. 68.
  10. V. STJ, RESP 173230 / SP ; RECURSO ESPECIAL 1998/0031449-0, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ Data:28/06/1999, TJ-RS, APELAÇÃO CÍVEL 93049673, rel. JURACY VILELA DE SOUZA, j. 22/06/93.
  11. Art. 745. Quando a execução se fundar em título extrajudicial, o devedor poderá alegar, em embargos, além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento.
  12. Art. 50. Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas, o terceiro, que tiver interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá intervir no processo para assisti-la
  13. "Há dois tipos de assistentes simples: aquele que já no momento da prolação da sentença é reflexamente atingido e aquele que, proferida a sentença, passa a correr o risco de ser atingido por decisão proferida em processo posterior, que eventualmente seja movido pelo vencedor da demanda, em que este poderia ter sido assistente". Wambier, Almeida e Talamini. Opus cit. Pág. 253.
  14. Wambier, Luiz Rodrigues; Correia de Almeida, Flávio Renato; Talamini, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. Vol. 2. 2ª Ed. Revisada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. Pág. 253.
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Sobre o autor
Alessandro Rafael Bertollo de Alexandre

acadêmico de Direito na Universidade Federal do Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALEXANDRE, Alessandro Rafael Bertollo. O IPTU, a locação de imóveis e a integração legislativa entre as obrigações tributárias públicas e privadas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 115, 27 out. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4355. Acesso em: 22 dez. 2024.

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